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Albano Macie - Direito Penal ( Textos de Apoio)

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<p>ALBANO MACIE ASSISTENTE UNIVERSITÁRIO DIREITO PENAL I TOS gráfica Maputo, 2018</p><p>ALBANO MACIE ASSISTENTE UNIVERSITÁRIO DIREITO PENAL I (TEXTOS DE APOIO) PARTE GERAL (I) Maputo. Marco de 2018</p><p>NOTA PRÉVIA Os presentes Textos de do Direito Penal 1 destinam-se aos meus estudantes e, eventualmente, a quem tiver interesse neles, e constituem suporte das minhas aulas teóricas e práticas que tenho vindo a leccionar nas universidades privadas mocambicanas desde o ano de 2013. Passados quase cinco anos de leccionação desta disciplina, parece ser oportuno disponibilizar aos meus estudantes elementos de apoio no ensino desta Disciplina. Aliás, este deve ser, na minha opinião, uma das tarefas de quem se lança no mundo académico e de investigação, em particular, como Docente Universitário. Pode causar estranheza a quem me conhece trabalhando na área da Ciência Política, Direito Constitucional, Direito Administrativo e Direito do Contencioso Administrativo, que hoje tenha tido a ousadia de preparar estes textos de apoio. Com efeito, Direito Penal constituiu, desde os tempos de estudante de 1.° e 2.°, uma das disciplinas da minha eleição, talvés por força da competência do próprio Corpo Docente que acabou me influenciando nesta No priemiro ciclo, tal influência pode ficar a dever-se à Elysa Vieira, ilustre Professora da nossa prestigiada Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane; no 2.° Ciclo ao Professor Paulo Sousa Mendes, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. A maior de todas as experiências deu-se no 3.° Ciclo a partir de 2015. No primeiro ano do Curso de Doutoramento na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, tive de encarar esta disciplina com uma responsabilidade acrescida, pois estava em minha frente e dos colegas que elegeram Direito Penal, a Professora Tereza Pizarro Beleza. Uma ilustre, exigente e brilhante Professora, por sinal, Directora da Faculdade de Direito, Ficha Técnica neste preciso momento que escrevo estas notas. Quem não utilizou os manuais desta Professora para a sua formação em Direito? Título: Direito Penal I (Textos de Apoio) A minha experiência professional como funcionário da Assembleia da Autor: Albano Macie Impressão: Topgráfica República permitiu-me um maior mergulho no Direito Penal. No ano de 2010, Maputo, Março 2018 arrancou o processo de revisão do Código Penal de 1886, tendo desse processo participado activamente. Foi, pela primeira vez, que a Assembleia da República</p><p>PARTE I elaborar um Código Penal verdadeiramente mocambicano, TEORIA GERAL DA LEI PENAL 1 CAPÍTULO I independentemente, das adequações que possa vir a sofrer. Aliás, não existe um INTRODUÇÃO GERAL 1 produto acabado nestas andanças. Os grandes códigos europeus, por exemplo, 1. Designação: "Direito Penal" "Direito Criminal'? 1 o alemão, são objecto de severas críticas, mas o trabalho dos tribunais superiores 2. Crime e pena, como componentes da Lei Penal 4 tem conseguido harmonizar e superar as insuficiências desses códigos e, não 3. Crime ou delito 5 seria caso aparte nosso "infante" Código, de apenas dois anos e meio. 4. Acto ilícito: ilícito penal, administrativo e civil 6 4.1. ilícito administrativo, em especial 9 5. Justificação e fundamento da existência do Direito Penal 10 Quanto ao texto de apoio, que, eventualmente, poderá vir, no futuro, a 6. Tarefas ou funções do Direito Penal 11 corporizar um Manual de Direito Penal Moçambicano, evitei no máximo tomar 7. Noção de bens jurídicos objecto de protecção penal 13 posições extremadas em relação às escolas penais. Não posso afirmar que os 8. Definição de Direito Penal 15 Textos adoptam a escola finalista da acção porque em certos lugares onde é 8.1. Direito penal como instrumento de controlo social formal 16 preciso afirmar, por exemplo, as escolas causal e social da acção, estas devem 8.2. Direito penal em sentido objectivo e em sentido subjectivo 19 9. Caracteres do Direito Penal 19 ser afirmadas. 10. Limites do puniendi do Estado. Princípios fundamentais do Direito Penal. 25 10.1. Função de garantia da lei penal 25 Não me considero penalista, nem pensar! Sou apenas um apaixonado também 10.2. Princípio da legalidade 26 pela área penal, em suma pelas áreas do Direito Público Interno. 10.3. Princípio do facto: Direito Penal do facto 30 10.4. Princípio da intervenção mínima: Direito Penal como "ultima ratio" 31 Aos meus alunos, vão os desejos de boa leitura e preparação das 10.4.1. Intervenção subsidiária do Direito Penal 32 10.4.2. Intervenção fragmentária do Direito Penal 32 10.5. Princípio da insignificância ou das "bagatelas penais" 33 10.6. Princípio da proporcionalidade 34 Maputo, Março de 2018. 10.7. Princípio da humanização das penas 35 10.8. Princípio "ne bis in idem" 36 10.9. Princípio da culpa ou da culpabilidade 36 CAPÍTULO II FONTES DO DIREITO PENAL 38 11. Noção de fontes de direito 38 12. Constituição Penal 38 13. Lei Penal 40 13.1. Técnica legislativa do Direito Penal 41 13.2. Norma penal como elemento integrante da Lei Penal: Teoria de BINDING 42 13.2.1. Classificação da norma penal 44 13.2.2. Características da norma penal 44 13.2.4. Norma penal em branco 46</p><p>13.3. Estrutura do Código Penal 47 29. Extradição 92 13.5. Aplicação subsidiária do Código Penal 51 29.1. Regime jurídico 92 4. Princípios gerais do direito 52 5. Direito internacional 52 SECÇÃO III 3. Fontes indirectas do Direito Penal 53 QUANTO PESSOAS 95 13.1. O costume 54 Princípio da igualdade 95 13.2. A jurisprudência 55 30.1. Prerrogativas do Presidente da República 96 13.3. A doutrina 55 30.2. Deputados da Assembleia da República 96 30.3. Membros do Governo 97 APÍTULO III 30.3. Imunidades diplomáticas 97 DA LEI PENAL 56 1. Função da interpretação 56 CAPÍTULO VI 5. Espécies de interpretação 56 DIREITO PENAL E OUTROS RAMOS DE DIREITO 98 15.1. Quanto aos sujeitos 56 31. Direito Penal Clássico e Direito Penal Secundário 98 15.2. Quanto aos meios 58 32. Direito Penal e Processo Penal 99 15.3. Quanto aos resultados 60 33. Direito Penal e Direito de Execução das Penas ou Penitenciário 99 Ponto de situação do problema da interpretação no Código Penal. 34. Direito Penal e Direito Administrativo Disciplinar 99 problema da analogia 61 35. Política Criminal 100 7. A interpretação da lei penal e o princípio "in dubio pro reo" 64 36. Criminologia 101 37. Direito Penal Internacional e Direito Internacional Penal 102 APÍTULO IV MBITO DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL 66 CAPÍTULO VII ECÇÃO I TEORIAS DE LEGITIMAÇÃO DO DIREITO PENAL: 'O TEMPO 66 FINS DAS PENAS 103 3. Princípio da não extra-actividade 66 38. O direito penal como protecção de interesses 103 18.1. Não retroactividade da lei penal 66 39. Teorias de retribuição 104 18.2. Não ultra-actividade da lei penal 67 40. Teorias relativas de prevenção 106 Excepção. A aplicação retroactiva da lei penal. Consequências 68 40.1. Prevenção geral 107 ). Tempo da prática da infracção 74 40.2. Prevenção especial e individual 109 20.1. Aplicação da teoria da actividade em alguns casos especiais 75 41. Teoria dialéctica unificadora de Claus ROXIN 111 Conflito aparente de normas penais aplicáveis a um caso 77 42. Ponto de situação dos fins das penas no Código Penal 111 ECÇÃO II CAPÍTULO VIII ESPAÇO 80 RESPONSABILIDADE CRIMINAL 114 !. Generalidades: direito penal internacional 80 43. Noção 114 i. Princípio da territorialidade 81 44. Sujeito activo do crime 115 23.1. Território nacional e sua extensão (critério de pavilhão) 82 44.1. Pessoas singulares 116 23.2. O problema do lugar ou sede do delito: "locus delicti" 84 44.2. Pessoas colectivas privadas 118 23.3. Ressalva de convenções, tratados e regras do direito internacional 87 ? 44.3. As multidões ? 121 Princípio da nacionalidade ou da personalidade 87 45. Sujeito passivo do crime 122 i. Princípio da defesa dos interesses nacionais ou real 89 46. Objecto do crime 122 Princípio universalidade ou da justiça penal universal 90 Princípio da representação 90 Eficácia das sentenças penais estrangeiras em 90</p><p>CAPÍTULO IX 55.4. Teoria adoptada pelo Código Penal 171 o NOVO DIREITO PENAL DO INIMIGO 124 55.5, Interrupção do nexo causal 173 47. Génese do Direito Penal do Inimigo 124 55.6. Nexo de causalidade nos crimes de omissão 174 Direito penal do cidadão e Direito penal do inimigo 125 48.1. A pena como contradição ou como segurança 126 48.2. Esboços 126 SECÇÃO II 48.3. Personalidade real e periculosidade fáctica 129 CRIME COMO FACTO TÍPICO (TIPICIDADE) 175 48.4. Esboço a respeito do Direito Processual Penal 130 56. Conceito de tipicidade 175 48.5. Decomposição: Cidadãos como inimigos? 131 57. Teoria do tipo 176 48.6. Personalização contrafáctica: inimigos como pessoas 131 57.1. Fase do modelo causal (final do século XIX e início do século XX) 176 19. Críticas ao Direito penal do inimigo 132 57.2. Fase do modelo finalista 180 57.2.1. Tipo de crime doloso ou subjectivo 181 PARTE II 57.2.2. Tipo de crime culposo ou objectivo 181 TEORIA GERAL DO CRIME OU DELITO 135 57.3. Fase da teoria funcionalista do tipo 182 CAPÍTULO I 57.4. Notas conclusivas sobre a teoria do tipo 184 ASPECTOS GERAIS 135 58. Funções da tipicidade 185 50. Teoria do crime. Significado 135 59. Formação do tipo e sistemática da lei 186 51. Definição do crime ou delito 136 60. Variações do tipo e sua importância 187 Crime e contravenção 138 61. Elementos do tipo 188 51.1. Definição da contravenção 140 62. Classificação ou divisão dos tipos legais (crimes ou delitos) 189 51.2. Regime jurídico das contravenções 140 62.1. Segundo a relação entre a acção e o resultado 189 Características ou elementos do crime 142 62.2. Segundo a intensidade do dano do objecto da acção visado 191 62.3. Segundo a manutenção ou a simples produção de um estado contrário ao CAPÍTULO II Direito 192 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO CRIME 143 62.4. Segundo as formas fundamentais do comportamento humano 192 I 62.5. Segundo os limites do possível círculo de autores ou "qualidade dos CRIME COMO FACTO VOLUNTÁRIO 143 autores" 193 3. Conduta humana como pressuposto do facto punível 143 62.6. Segundo o grau de preenchimento do tipo 194 53.1. Acção em Direito Penal 144 62.7. Crime simples, privilegiado e qualificado 195 53.1.1. Teoria causal-naturalistica da acção 144 62.8. Crimes comuns e políticos 195 53.1.2. Teoria finalista da acção 146 62.9. Crimes hediondos 196 53.1.3. Teoria social da acção 149 62.10. Crime progressivo 196 53.1.4. As funções e considerações das teorias da acção 150 62.11. Crimes agravados pelo resultado 196 53.1.5. Noção adoptada da acção 152 62.11.1. Crime 197 53.1.5.1. Formas da acção 152 62.11.2. Crime com duplo dolo típico: resultado agravante previsto em 4. Resultado ou evento 156 tipo legal 198 5. Nexo de causalidade entre a acção e o resultado, ou imputação do resultado à 62.11.3. Crime com dupla negligência típica 198 onduta 158 62.11.4. Crime com um resultado agravante atípico 198 Teoria da condição "sine qua non"ou de equivalência dos antecedentes causais 160 55.2. Teoria da adequação ou da causalidade adequada 164 55.3. Teoria de imputação objectiva do resultado à acção 165 55.3.1. Situações de exclusão de imputação objectiva 166 55.3.2. Níveis de imputação objectiva 169</p><p>SECÇÃO III 70.2.3. Teoria finalista da culpabilidade ou normativa pura 253 CRIME COMO FACTO ILÍCITO (ILICITUDE) 199 70.2.4. Posição de Claus ROXIN sobre o problema 253 Conceito de Ilicitude 199 70.2.5. Posição adoptada 255 Ataque bem jurídico fundamental como essência da ilicitude ou 71. Imputabilidade ou capacidade de culpa 257 antijuridicidade 201 71.1. Causas de exclusão da imputabilidade: Inimpatabilidade 258 Conduta humana como objecto de juízo de ilicitude: desvalor da acção e 71.1.1. Causas absolutas de exclusão da imputabilidade 259 desvalor do resultado 202 71.1.1.1. Efeitos do reconhecimento da inimputabilidade 66. Relação entre ilicitude e tipicidade 204 penal 262 57. Sistematização das causas de exclusão da ilicitude ou causas de justificação do 71.1.2. Causas relativas de exclusão de imputabilidade 262 facto 206 71.1.3. Actiones liberae in causa (casos de privação voluntária e acidental 67.1. Enumeração 206 da inteligência) 263 67.2. Legítima defesa própria ou alheia 207 72. Consciência da ilicitude como elemento da culpabilidade 266 67.2.1. Definição, fundamento, natureza e limite da legítima defesa 207 73. Forma ou espécies da culpabilidade 269 67.2.2. Âmbito da legítima defesa e auxílio necessário 210 73.1. Dolo 270 67.2.3. Regime jurídico da legítima defesa 211 73.1.1. Noção 270 67.3. Legítima defesa putativa 219 73.1.2. Quando haverá dolo? 271 Excesso de legítima defesa 220 73.1.3. Formas de aparecimento do dolo ou elemento emocional ou 67.5. Legítima defesa do artigo 337.° do Código Civil 221 volitivo do dolo 272 67.6. Estado de necessidade ou "direito" de necessidade 224 73.1.4. Elemento intelectual do dolo 275 67.6.1. Considerações gerais 224 73.2. Tipo de crime doloso ou subjectivo 275 67.6.2. Definição, natureza e fundamento do estado de necessidade 227 73.3. Punição do crime doloso 276 67.6.3. Regime jurídico do estado de necessidade 228 73.4. Negligência 276 67.6.3. Estado de necessidade do Código Civil (art. 233 73.4.1. Noção 277 67.6.4. Inexistência de um dever legal de enfrentar 0 perigo 234 73.4.2. Quando haverá negligência? 277 67.6.5. Excesso da acção de necessidade 235 73.4.3. Formas de aparecimento da negligência 278 67.6.6. Estado de necessidade putativo. 235 73.5. Diferença entre dolo eventual e negligência consciente 279 67.7. Conflito ou colisão de deveres 236 73.6. Tipo de Crime Negligente ou culposo 282 67.8. Obediência legalmente devida 237 73.6.1. Tipo de ilícito no crime negligente 282 67.8. Autorização legal 239 73.6.2. Modalidades ou espécies de actuação negligente 288 67.10. Acção directa 240 73.6.2.1. A imperícia 288 67.11. Consentimento do ofendido 241 73.6.2.2. A inconsideração 288 67.11.1. Consentimento presumido 244 73.6.2.3. A negligência 289 67.13. Direito político de resistência 245 73.6.2.4. A falta de destreza 289 67.14. Direito de prender em flagrante delito 246 73.6.2.5. A falta de observância de algum regulamento 289 Elementos subjectivos das causas de justificação 246 73.6.3. A culpabilidade nos crimes ou delitos negligentes 289 9. Efeitos das causas de justificação 248 73.6.4. problema da exclusão da ilicitude ou justificação do facto no crime negligente 291 IV 73.6.5. Punição da negligência no Direito Pátrio 292 CRIME COMO FACTO CULPOSO 248 74. Causas de exclusão da 293 Definição de culpa ou culpabilidade 248 74.1. Força estranha, física e 293 70.1. Precisão terminológica e conceito de culpa 248 74.2. Medo insuperável 294 70.2. Natureza e fundamento da culpabilidade. Teorias da culpabilidade 249 74.3. Caso fortuito 295 70.2.1. Teoria psicológica da culpa 250 74.4. Inexigibilidade ou não exigibilidade de conduta diversa 295 70.2.2. Teoria normativa da culpa 251 74.5. Estado de necessidade desculpante 296</p><p>74.6. Excesso da legítima defesa 298 SECÇÃO II 74.7. Obediência indevida desculpante 299 QUANTO À PARTICIPAÇÃO CRIMINAL:AGENTES DO CRIME 332 5. Teoria do erro 299 84. Enunciação 333 75.1. Conceito e tratamento doutrinal do etro 299 85. Delimitação entre autoria e participação 335 75.2. Espécies de erro 300 85.1. Teoria formal-objectiva 336 75.2.1. Erro de direito 302 85.2. Teoria subjectiva 336 75.2.2. Erro sobre objecto: pessoa ou coisa 303 85.3. Teorias materiais-objectivas 337 75.2.3. Erro na execução 305 85.4. Teoria do domínio de facto 338 75.2.4. Erro sobre o facto típico ou erro sobre o tipo e erro de 85.5. Posição adoptada e critério para a determinação do autor e proibição 308 participante 339 75.2.5. Erro sobre pressupostos das causas de justificação ou de 86. Formas doutrinais de aparecimento da autoria e o regime do artigo 21 do exculpação/justificação putativa 308 Código Penal 340 86.1. Formas doutrinais de autoria 340 86.2. Autoria no regime do artigo 21 do Código Penal 343 APÍTULO II 86.3. A instigação: uma figura entre a autoria e a participação? 347 ORMAS DO CRIME 312 86.4. O excesso e a revogação do mandato 349 ECÇÃO I 87. Participação criminosa e suas formas 351 UANTO Às FASES DO APARECIMENTO DO CRIME 312 87.1. A doutrina 351 Formas de aparecimento do crime 313 87.2. O regime do Código Penal 353 7. "Inter criminis"ou caminho do crime 313 87.2.1. Cumplicidade 353 77.1. Cogitação ou desígnio criminoso: princípio "cogitationis poenam nemo 87.2.2. Encobrimento 355 patitur" 314 77.2. Actos preparatórios e actos de execução: critérios de distinção 314 SECÇÃO III 77.3. Actos de execução 315 QUANTO AO NÚMERO DE INFRACÇÕES COMETIDAS 359 77.4. Distinção entre actos preparatórios e actos de execução 316 88. A questão da localização da matéria 359 3. Tentativa, em especial 317 89. Unidade e pluralidade de acções 360 78.1. Definição e natureza jurídica da tentativa 317 90. Concurso ou acumulação de crimes 362 78.2. Fundamento e punição da tentativa 318 90.1. Concurso/acumulação ideal ou formal = Unidade de conduta 363 78.3. Quando há tentativa e seus elementos: regime do Código Penal 318 90.2. real, verdadeiro ou próprio 364 78.4. Formas da tentativa: perfeita e imperfeita 320 90.3. Sistemas universais de punição do concurso 364 Crimes ou delitos que não admitem tentativa 321 90.3.1. Sistema de cúmulo/acumulação material 365 78.6. Aplicação da pena na tentativa 322 90.3.2. Sistema da absorção 365 78.7. Início da tentativa nas diversas formas de autoria 323 90.3.3. Sistema de responsabilidade única e da pena progressiva única 365 78.7.1. Na autoria mediata 323 90.3.4. Sistema de exasperação ou agravação da pena 366 Na co-autoria 323 90.4. O-regime do Penal 366 78.6.3. Na instigação 325 90.4.1. Punibilidade da acumulação de crimes 368 78.8. Tentativa impossível ou inidónea e delito ou crime putativo 325 91. Crime continuado 370 ). Desistência voluntária na tentativa 327 ). Frustração criminosa 328 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA Arrependimento posterior 329 Consumação criminosa 329 Exaurimento ou crime exaurido 331</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) LAS E ABREVIATURAS Art. - artigo CRM Constituição da República CP - Código Penal p. Página pp. Páginas PARTE I TEORIA GERAL DA LEI PENAL CAPÍTULO I INTRODUÇÃO GERAL 1. Designação: "Direito Penal" ou "Direito Criminal'? O primeiro problema que nos propomos discutir, logo à partida, é a designação da nossa Disciplina: "Direito Penal" ou "Direito Criminal"? Comecemos com Direito Comparado. Na Alemanha, a denominação é quase unânime desde os princípios do Século XIX É como adverte MEZGER que se tem abandonado, praticamente, a denominação optando-se por Na Itália, sucede outro tanto, as obras mais importantes dos clássicos como Carmignani, Carrara e Ferri, optaram pela denominação sem embargo de, por exemplo, Petrocelli e Battaglini adoptarem a designação Na França, a nomenclatura Penal não goza do mesmo trato que na Os termos e Pénal se utilizam indistintamente. Em Portugal, a designação preferida tem sido mesmo plano curricular da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra adoptou esta terminologia, que desde há muito foi das escolas de Lisboa. 1 Cfr. PABLOS, António Garcia, Derecho Universidad Complutense, Faculdad de Derecho,</p><p>Direito Penal i (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) A nossa prestigiosa Professora Teresa BELEZA, sobre este debate, Como nosso testemunho da designação Direito Penal, aduz introduz suas Lições, afirmando que: "A questão não tem importância nenhuma. PETROCELLI um conjunto de argumentos a favor: i) conteúdo e fim A única argumentação que se pode fazer em relação a isto é que, se se fala em fundamental do sistema de normas objecto do nosso estudo são a repressão do direito penal, pode ser que se considere que ficam de fora as medidas de delito mediante a pena; ii) o termo pena, por efeito da linguagem tradicional e segurança portanto, isso não abrangeria essa zona importante do direito penal, comum é suficientemente idóneo para distinguir as sanções estabelecidas para se fala em direito criminal, se se está a usar crime no sentido subjectivo, pleno, verdadeiros delitos de outras sanções para outras formas de ilícito, cuja de crime do qual uma pessoa é culpada, também se está a deixar de fora os actos disciplina jurídica não é compreendida pelo Direito Penal; iii) o Código Penal dos inimputáveis e, portanto, também as medidas de conhece delitos e suas penas e só de modo complementar as medidas de A designação "Direito Penal" é recente, pois, surge com rigor, com segurança5. aparecimento dos Códigos Penais a partir do Século XIX, embora tivesse sido Mas queremos chamar atenção ao facto de que existem e existiram utilizada, pela primeira vez, no Século Já a designação "Direito Criminal" autores que preferiram a designação "Direito Criminal". É caso em Portugal é mais clássica, historicamente anterior e goza de uma brilhante tradição jurídica, do respeitado Professor de Coimbra, Dr. Eduardo Correia, com o seu livro embora perdendo, na actualidade, seu uso. "Direito Criminal", que, ainda hoje, continua a ser um dos melhores manuais A designação "Direito Criminal" é mais compreensiva, na medida em universitários, cuja doutrina continua a marcar a legislação portuguesa. que abrange não só crime, mas também as respectivas consequências jurídicas. O Professor Eduardo CORREIA justifica a sua preferência pela A denominação "Direito Penal" assenta unicamente na ideia de pena, deixando denominação "Direito criminal" porque a considera mais exacta, abarca o seu de lado as chamadas medidas de objecto na sua totalidade (a penas e outras medidas, dentre as quais avultam as O debate designatório gira em torno de dois elementos nucleares: de-segurança). Apresenta um outro argumento de natureza histórica, o facto de crime e a pena. que tem por si a tradição dos velhos juristas estrangeiros (CARPZOV, Ora, neste debate todo, importa a nossa escolha! Com efeito, a nossa BOEHMER, etc.) e portugueses (PERREIRA E SOUSA, MELO FREIRE, escolha encontra-se delimitada pela opção do legislador SOUSA PINTO, etc.). De todo o modo, 0 crime é elemento central da nossa Assim, em Moçambique, a designação mais acertada é a de Direito Penal, disciplina e a conveniência de ser ele raiz da sua em obediência ao Código Penal, aprovado pela Lei n.° 35/2014, de 31 de É bom não esquecer também que problema de designação pode Dezembro4, embora ele insista em alguns articulados com a designação "lei agudizar-se nos casos em que o legislador manda substituir a pena por uma criminal" (art. 8, 9, 56, etc.). Não existe, em nenhum país, Direito Penal senão medida de segurança, por exemplo, as medidas de internamento ou através das em face direito positivo: é cria crime as respectivas alternativas à pena de prisão; no verdadeiro sentido (art. 82 89 do consequências jurídicas. CP). ? 2 BELEZA, Teresa Pizarro, Direito Penal, 1.° volume, edição (revista e actualizada), AAFDL, 1998, p. 20. 3 Para mais vide, por todos CAVALEIRO DE FERREIRA, Manuel, Penal Parte Geral I, Verbo, ed., 1982, pp. 20-21; JESUS, Evangelista de, Direito Penal, Parte Geral, 1." Volume, Editora Saraiva, ed., revista e actualizada, 1999, pp. 5 PETROCELLI, Principi di Diritto Reipression, 1949, 6. Tradução livre do autor. 4 BR 105, I 14." Suplemento, de 31 de Dezembro de 2014. 6 CORREIA, Eduardo, Direito I, Reimpressão, Almedina, 2008, pp. 1-2. 2 3</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal 1 (Textos de Apoio) 2. Crime e pena, como componentes da Lei Penal 3. Crime ou delito Os diferentes ramos do Direito se distinguem pelo conteúdo e natureza No antigo Direito Romano, crime era noxa e evoluiu para naxia, que das relações sociais que regulam, mas Direito Penal distingue-se dos demais significava "dano" e ligava-se esta noção aos conceitos de reparação e ramos pela natureza da sanção que impõe. O crime e pena são os dois pólos retribuição do mal causado, e reflectia a natureza dos efeitos do acto delitivo do fundamentais do Direito Penal. O crime é uma espécie do acto ilícito; a pena é que a infracção. uma espécie de sanção jurídica7. A expressão "delito" deriva da palavra "delinquere", que é abandonar, Sendo o crime e a pena elementos nucleares do Direito Penal, então, o resvalar, desviar. Isto é, abandono da lei penal. que será crime e que será pena? O artigo 1 do nosso Código Penal diz que "Crime ou delito é Abreviadamente, podemos dizer que o crime é um conceito da política Ora, segundo este entendimento legal, não há diferença entre crime e delito. criminal, e é muito variável do ponto de vista histórico, e liga-se à ofensa de Portanto, quando se diz, em Moçambique, crime é o mesmo que dizer bens jurídicos fundamentais da sociedade. É, neste contexto, um facto ilícito delito. Já a infracção criminal não coincide com o crime ou delito. Na nossa declarado punível pela lei penal. ordem jurídica a infracção criminal designa quer os crimes ou delitos, quer Já a pena representa a reacção da comunidade de homens àqueles também as contravenções. Confirma artigo 27 do Código Penal quando fala comportamentos penalmente proibidos por essa mesma comunidade. O que de sujeito da infracção criminal: Somente pode sujeito da criminal a bem demonstra que a pena é o reflexo de certos valores de uma comunidade pessoa que tem a necessária inteligência e liberdade". num dado momento e espaço. A pena é a reacção do homem sobre si mesmo; Mas nem sempre isto foi entendido desta maneira e com razão. Segundo é um instrumento de eficácia da justiça criminal e reflexo dos valores a gravidade da ameaça penal, todos os factos antijurídicos são divididos em fundamentais da crimes e delitos. já Von LISZT ensinava que a pena "é o mal, que, por intermédio dos Enuncia-se aqui o critério de distinção entre crime e delito: o da órgãos da administração da justiça criminal, o Estado inflige ao delinquente em gravidade da ameaça penal. Contudo, aspecto decisivo para a natureza da razão do distinção não é a pena aplicada ao caso concreto, mas a pena abstractamente A pena é uma espécie do género sanção jurídica e o crime uma espécie aplicável. do género acto ilícito. Mas tudo pode resumir-se no seguinte: Assim, são crimes os factos antijurídicos a que se comina no mínimo 1.° Não há crime sem lei anterior que defina. uma pena privativa de liberdade de um ano ou mais. E será delito facto 2.° Não há pena sem prévia cominação legal. antijurídico a que se comina no mínimo uma pena privativa de liberdade mais leve e inferior a um ano ou uma pena 10 Direito Penal p. 7. No Código Penal Alemão, dispõe o § 12: y delitos" Cfr. CAVALEIRO DE FERREIRA, Manuel, Direito Penal "(1) son hechos antijurídicos que están amenazados con pena privativa de la libertad cuyomínimo es de p. 9. VENTURA, Andre, de Direito Vol. I, Chiado Editora, 2013, pp. 21-22 un año o más. (2) Delitos son hechos antijurídicos que amenazados con pena privativa de la libertad inferior LISZT, Franz Von, Direito Penal p. 400. o com multa. (3) Agravaciones o atenuaciones que prevean según los preceptos de la parte general o para casos especialmente graves menos graves, permanecen fuera de consideración para esta 4 5</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Exemplificando: do direito, não se confinando em nenhuma área de saber e, ocorrendo, agente A conduta prevista no artigo 155 do Código Penal seria crime, pois lá se incorre em penalizações. diz que "Aquele que, voluntariamente, matar outra pessoa, será punido com prisão maior ilícito penal pertence por natureza ao Direito Penal. O ilícito de dezasseis a vinte anos". A pena cominada aqui é mais de um ano. administrativo ao Direito Administrativo e ilícito civil ao Direito Civil. Já a conduta prevista no artigo 170 seria delito, pois a pena prevista é de No caso prático 1, "A" cometeu vários ilícitos disciplinados por vários três meses de prisão: "1. Aquele que, voluntariamente, com alguma ofensa corporal ramos de direito. Ora, vejamos: maltratar alguma pessoa, não concorrendo qualquer das circunstâncias enunciadas nos artigos i) quando retorna ao serviço embriagado comete um ilícito seguintes, será condenado a prisão até três meses, mediante acusação do ofendido". administrativo-disciplinar regulado pelo Direito Administrativo Disciplinar, nomeadamente, Direito da Função Pública, previsto no Estatuto Geral dos 4. Acto ilícito: ilícito penal, administrativo e civil Funcionários e Agentes do Estado, com sanções de multa e despromoção, Caso prático: A., funcionário público respectivamente (art. 128 do EGFAE). afecto na Direcção de Educação da Cidade de ii) quando insulta director cometeu dois ilícitos, criminal e disciplinar. Maputo, no Departamento de Finanças. A. tem por O ilícito criminal é a difamação (art. 229 do CP) e o administrativo é a falta de hábito ingerir bebidas alcoólicas no período de respeito aos superiores hierárquicos e apresentação ao serviço embriagado, cuja intervalo laboral, pois desde que foi afecto naquela sanção é a despromoção (alíneas a e d) do 3 do art. 101 do EGFAE). área há cinco anos, nunca se cruzou com seu iii) quando quebra computador do serviço, cometeu um ilícito civil, director no período da tarde. Fiando-se nisso, regulado pelo Código Civil, artigo ingeriu as suas bebidas no período de almoço e regressou ao serviço, soltando gritos corredor, Então vamos agora aos respectivos regimes. momento em que o seu director, presente nesse dia O ilícito criminal ou penal é disciplinado pelo Direito Penal e consiste no serviço, confrontou-lhe. X, director de A, num facto positivo ou negativo que constitui infracção aos bens fundamentais mandou imediatamente levantar um auto de notícia da sociedade. É sempre punido pelo poder judicial e só existe quando lei anterior para início do procedimento disciplinar. A., o prescreva. ilícito criminal ou penal enseja sempre a responsabilidade penal furioso com a decisão, insultou director, dizendo ou criminal. O juiz aplica aos infractores penas. No caso prático, caberá a A, em que era baixinho inútil e incompetente, quer no sede de processo-crime, a pena de prisão até um ano. serviço, quer em sua própria casa, como a esposa As infracções e as respectivas consequencias jurídicas obedecem ao contara à amiga pessoal de A. princípio da tipicidade e da legalidade, como veremos adiante. O ilícito administrativo é um instituto autónomo do Direito Que ilícitos "A" cometera? Administrativo, que consiste na infracção a normas que constam de um estatuto Diz-se ilícito, toda a acção ou omissão humana, antijurídica, culpável, que disciplinar, em particular, da Função Pública e a sua apreciação cabe às envolve a responsabilidade do agente. Portanto, ilícito pertence à teoria geral autoridades administrativas, aplicando sanções disciplinares previstas num 6 7</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal (Textos de Apoio) estatuto. Este tipo de ilícito implica a responsabilidade administrativa disciplinar. 4.1. o ilícito administrativo, em especial superior hierárquico aplica aos infractores sanções disciplinares. No caso O ilícito administrativo pode consistir em: prático, caberá a A, sede do processo disciplinar, a sanção de despromoção infracção disciplinar; (art. 101 do EGFAE). Os factos que constituem infracção disciplinar são enumerados infracção de polícia; exemplificadamente no estatuto, salvo as sanções que são aquelas enunciadas e infracção fiscal. não outras (art. 93 do EGFAE). O ilícito civil é disciplinado pelo Direito Civil, e consiste em factos A infracção disciplinar consiste na violação das normas de disciplina no danosos, cuja consequência é a indemnização do lesado pelos danos sofridos. aparelho do Estado (note-se que mesmo nos sectores de actividade privada O ilícito civil faz nascer a responsabilidade civil, que se efectiva perante o pode e ocorre a infracção disciplinar, mas esta é regulada pela lei do trabalho). tribunal comum cível, podendo as partes concluírem acordos que afastam a Ela deriva das relações hierárquicas dos serviços da Administração pública, e intervenção do tribunal, com recurso a soluções amigáveis. Portanto, o tribunal incumbe ao superior hierárquico exercer poder disciplinar sobre os só intervém na falta de acordo entre as partes e, intervindo, fá-lo através do funcionários que lhe são subordinados. As infracções disciplinares não seguem processo-civel. Ora, a responsabilidade civil perante a Administração pode ser o princípio da tipicidade, como é a infracção penal. As infracções disciplinares por ela determinada em sede do processo disciplinar, através do desconto enumeradas nos estatutos dos funcionários são cláusulas gerais, dentro das quais salarial. superior hierárquico pode concretizar outras infracções derivadas do não No caso prático 1, deve notar-se que "A" cometeu cumulativamente os cumprimento das ordens e instruções superiores sob forma legal e matéria ilícitos penais, administrativo e civil. de serviço. Contudo, as sanções disciplinares seguem o princípio da tipicidade, funcionário "A" violou dispositivos penais e Assim, pois aqui já não pode o superior hierárquico fazer inovações. podemos falar de ilícito administrativo, penal e civil, pois transcende âmbito A infracção de polícia consiste na conduta do cidadão contrária à polícia, ou administrativo, chegando ao foro judiciário. seja, à função do Estado dirigida à prevenção geral dos danos sociais que podem A punição de cada ilícito é independente da punição do outro. Isto é, derivar da actividade A infracção de polícia nunca implica pena em superior hierárquico aplicará a sanção administrativa independentemente de sentido técnico aplicável à infracção penal. tribunal ter aplicado a pena de prisão até um ano ou de ter condenado "A" a A fiscal consiste em facto ou conduta do cidadão contrária ao pagar um valor por difamação. fisco, ou seja, à função do Estado destinada a obter os meios económicos para O tribunal, punindo um funcionário, por ter cometido unicamente um a satisfação das necessidades penal, pode agregar uma sanção administrativa como acessória ou A infracção fiscal tanto pode consistir numa contravenção como num ? residual da pena. Por exemplo, pode expulsá-lo, momento que deverá extrait crime, dependendo da sua gravidade ofensa dos interesses públicos. certidão comunicando do facto aos serviços deste (art. 65 do CP). BATTAGLINI, Giulio, Direito Parte Geral. Tradução de Paulo José da Costa JR e Ada Pellegrini Grinover, edição Saraiva, São Paulo, 1964, p. 148. 12 Giulio, Penal, p. 148. 8 9</p><p>Direito Penal I (Textos de Apoio) Direito Penal I (Textos de Apoio) 5. Justificação e fundamento da existência do Direito Penal O Direito Penal é formatado pelo tipo de Estado que cada País adopta. Caso prático: M. procura fazer com que o seu Portanto, é tipo de Estado que orienta sistema de controlo penal sobre a sociedade. vizinho X. destrua a vedação de dois metros de altura, que lhe impede de ver a outra margem da estrada. Ao ver seus Em Moçambique, o Estado de Direito Democrático (artigo 3 da intentos se frustrarem, decide pessoalmente derrubar O Constituição) coloca em primazia a dignidade do Homem, o que afasta, desde muro do numa extensão de vinte metros. logo, qualquer norma penal que seja atentatória à dignidade da pessoa humana: Que implicações jurídicas têm a conduta de M? penas perpétuas, de duração indeterminada, ilimitada ou indefinida 1 do art. 61 da CRM), maus tratos, tratamento desumano ou cruel 1 do art. 40 da CRM). A conduta de M. agrediu ilicitamente círculo jurídico de X, ao derrubar O Direito Penal aparece como um subsistema de controlo social formal seu muro e deste acontecimento resulta um facto jurídico que se integra tanto (pois, existe o controlo social informal exercido, por exemplo, pela família, no Direito Civil quanto no Direito Penal. Igrejas, etc.) a cargo do Estado e, submete-se a três níveis de formalização: No Direito Civil, 1 do artigo 483.° do Código Civil garante a X "i) nem toda a conduta causadora de um conflito, em nível de convivencialidade, é de direito à indemnização pelos prejuízos sofridos, pois M. lesou dolosa e seu interesse; ilicitamente o seu património. ii) não basta que um comportamento humano entre em atrito com 0 grupo societário Como notamos, a pretensão nem sempre protege para que 0 Direito Penal passa 0 mero desvio não é pedra de toque do exercício dessa satisfatoriamente os bens jurídicos. O interesse do Estado na manutenção dos forma controladora; seus valores fundamentais e na conservação da paz jurídica no âmbito da vida iiii) não são as actividades que fogem aos societários, mas apenas as que em sociedade só pode ser atendido quando ordem jurídica proíbe sob ameaça Estado estrutura numa moldura legal que constituem 0 objecto desse particular controlo formal. de uma sanção de natureza penal determinadas condutas socialmente M. para além de ser obrigado pelo Direito Civil a indemnizar a X, sofrerá uma sanção de natureza penal, pois a sua conduta violou um valor considerado O Direito Penal, segundo Von LIZST, "por paradoxal que possa parecer, (...) é fundamental pela sociedade, porconseguinte, protegido pelo Direito Penal. Por a Magna Carta do delinquente. Protege não a colectividade, mas 0 indivíduo que se isso, com a sua conduta M. cometeu crime previsto e punido pelo artigo 338 revolta contra ela. Garante-lhe 0 direito de ser castigado só no caso de se verificarem 05 do Código Penal (Crime de dano em edificação ou construção pertencente a pressupostos legais.. direito penal é a barreira da política criminal". outrem). 6. ou do Direito Penal Como está demonstrado no caso prático, o Direito Penal resulta, historicamente, de sua indiscutível necessidade para uma proveitosa vida A determinação das ou funções do Direito Penal nunca foi Esta é a justificação para a existência do Direito Penal. consensual ao longo da história entre vários tratadistas. 13 Cfr. WESSELS, Johannes, Direito Penal, Parte Geral (Aspectos fundamentais). Tradução de Juarez Tavares, Sérigo António Fabris Editor, Porto Alegre, 1976, p. 15 Alberto Silva et al, Código Penal e Sua Interpretação Jurisprudencial, Vol. I, Parte Geral, WESSELS, Johannes, Direito Penal, ob. revista e ampliada, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1997, 28. 10 11</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Das várias orientações, temos os seguintes três A função O Direito Penal previne o cometimento futuro 1.° Dos que entendem que a tarefa do Direito Penal é, primeiramente, das infracções criminais, através da pena aplicada, o que impõe respeito ao proteger os valores ético-sociais do ânimo (acção) próprio Direito penal. Dos que se fixaram exclusivamente na protecção dos bens jurídicos Dito só de uma vez, o Direito penal tem a função de proteger os bens (Liszt, Bettiol); fundamentais da sociedade, sendo as perias impostas aos agentes os 3.° Dos que vinculam a protecção aos bens jurídicos com outros fins instrumentos ou meios indispensáveis à realização dessa finalidade ou mais propriamente com a paz jurídica ou social (Maurach e Stratenwerth). 7. Noção de bens jurídicos objecto de protecção penal Segundo WESSELS, a função do Direito Penal consiste em proteger os valores elementares da vida comunitária no âmbito da ordem social e garantir As raízes do Dircito Penal se situam nas representações ético-sociais de a manutenção da paz jurídica. Como ordenação protectiva e pacificadora serve valor da comunidade jurídica: elas constituem a base para o aparecimento dos o Direito Penal à protecção dos bens jurídicos e à manutenção da paz bens jurídicos, das normas jurídicas e dos tipos penais. O Direito Penal constitui a medida da ultima empregue para garantir A teoria segundo a qual a tarefa do Direito Penal é proteger os bens a integridade da ordem jurídica, nos cânones do Estado de Direito Democrático, jurídicos é desenvolvida no desenrolar do Século e o problema e o não porque se remete Direito Penal para o estatuto de subsidiariedade (isto é, conceito de bens jurídicos é introduzido em 1834 por Birnbaun, com a expressa em caso de falhar outros sistemas de controlo social). A experiência mostra finalidade de obter uma definição naturalista de delito, independentemente do sempre a necessidade de Direito Penal e, não seria por acaso que a sua função direito é, justamente, a de "proteger os bens jurídicos (tais como a vida, a integridade VON LISZT, no seu Tratado de Direito Penal Alemão, escreve que física, a liberdade de autodeterminação e a propriedade) mais importantes, "Todo existe por amor-dos-homens e tem por fim proteger interesses intervindo somente nos casos de lesão de bens jurídicos fundamentais para a da vida humana. A protecção de interesses é a essência do direito, a ideia vida em finalística, a força que A seguir diz o autor que "Chamamos bens jurídicos os interesses que o Em conclusão, Direito Penal pode desempenhar duas funções direito protege. Bem jurídico pois, 0 interesse juridicamente protegido. Todos os bens juzídicos são interesses humanos, ou do indivíduo ou da colectividade. É a vida, 1.° A função repressiva: O Direito Penal defende a sociedade, castigando e não o direito, que produz o interesse, mas só a protecção jurídica converte o as infracções jurídicas cometidas. interesse em bem ? [6 Johannes, Direito p. 3. CARVALHO, Taipa de, Penal, Parte Geral-Questões fundamentais e Teoria Geral do Crime, 17 WESSELS, Johannes, Direito Penal.. p. 3. ed., Coimbra editora, 2011. p. 62 18 JESUS, Evangelista de, Penal, Volume, Parte Geral, ed, revista actualizada, Saraiva, 1999, 21 Gunter, Penal, Parte Geral, I El hecho punible, EDERSA Editores, Madrid, 1976, 4. p. 2. 19 Hans-Heinrich, Tratado de Derecho Parte General. Tradução de José Luis M. Samabuego, 22 LISZT, Franz von, Tratada de Dirrito Penal Vol. I, Colecção História do Direito Brasileiro, Brasilia, 2006, ed., Comares, Granada, 1993, p. 3. p. 93. 23 Franz von, Tratado de Direito Peual 93-94. 12 13</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Cada sociedade produz e protege os seus bens jurídicos, segundo Por exemplo, artigo 155 do Código Penal diz que "Aquele que, factores históricos, culturais, políticos e sociais, em dado voluntariamente, matar outra pessoa, será com prisão maior de dezasseis a vinte anos". Mas a definição de bens jurídicos que vamos adoptar é a do compatriota Neste tipo legal, bem jurídico protegido é a vida de uma pessoa. de Von LISZT, neste caso, WESSELS. Diz ele que: Da regra de protecção dos bens jurídicos fundamentais decorrem os "Por bens jurídicos designam-se os bens vitais, os valores sociais e os seguintes princípios interesses juridicamente reconhecidos do indivíduo ou da colectividade, que, em a) as penais indicam a mínimo que dominar a vida comunitária; virtude de seu especial significado para a sociedade, requerem jurídica. b) ético expressa-se pela proibição de determinadas ou omissões que Bens jurídicos do indivíduo são, por exemplo, a vida, a integridade física, a atentam contra interesses que, precisamente por tidos como essenciais pela maioria dos cidadãos, liberdade pessoal, a honra, a propriedade, património, etc. (Bens jurídicos delimitam as acções que a comunidade não pode tolerar; individuais). Bens jurídicos da colectividade são, por exemplo, a constituição do c) todas as leis penais devem, em principio, proteger bens jurídicos fundamentais. Estado e sua ordem democrática e liberal, a conservação dos segredos do Estado, administração da justiça, a incorruptibilidade dos funcionários, a segurança do 8. Definição de Direito Penal tráfego monetário, a fidelidade dos documentos na relação jurídica, etc. (Bens São inúmeras as definições do Direito Penal. Por questões didácticas, jurídicos vamos escolher três delas e depois ensaiaremos a nossa. bem não pode ser confundido com objecto da acção Para WESSELS por "Direito Penal designa-se a parte do ordenamento criminosa: os bens jurídicos são valores sociais, por exemplo, a vida, a jurídico que determina os pressupostos da punibilidade, bem como os caracteres propriedade, a liberdade, a honra. Ora, o objecto da acção é, em contrapartida, específicos da conduta punível, cominando determinadas penas prevendo, a a coisa concreta que forma o objecto do facto e sobre qual é executada a acção, par de outras consequências jurídicas, especialmente medidas de tratamento e por exemplo, no caso prático, com o crime de dano, o legislador protege o património, como bem jurídico, mas o objecto da acção é a coisa em si destruída, Por outro lado, MEZGER, Direito Penal é o conjunto de normas isto é o muro; a lei protege a vida embrionária, mas objecto da acção é o feto jurídicas que regulam "el ejercicio del poder punitivo del Estado, conectando en el delito da gestante em si. como presupuesto, la pena como consecuencia Contudo, próprio MEZGER Em o bem jurídico é um elemento externo do tipo legal de reconhecia que a sua definição é imperfeita, pois Direito Penal moderno tem- crime, pois as normas penais não descrevem em si os bens jurídicos por si se desenvolvido organicamente, excedendo os limites de sua expressão, protegidos, mas através da hermenêutica intérprete identifica bem jurídico ampliando seu alcance a outras consequências de essência diversa da pena, protegido. como as medidas de segurança. WESSELS, Johannes, Direito p. 3. 25 WESSELS, Johannes, p. 3. 26 Toda esta construção de que o Direito Penal protege ON bens jurídicos não ficou imune à Diz-se que uma 27 OLIVARES, Gonzalo Quintero, Derecho Parte General, Marcial Pons, Madrid, p. 61. parte da teoria dos bens jurídicos pode conceber o em relação com seu titular, mas não demonstra a 28 WESSELS, Johannes, Direito p. 4. necessidade assegurar o bem Fala-se, por exemplo, da veracidade de uma informação é 29 MEZGER, Edmund, Tratada de Derecho Tradução de Arturo Rodrigues Madrid, Revista de Derecho um bem para o seu destinatário, mas apenas em casos está reconhecida como bem jurídico. Para mais vide Privado, 1946, 1, Existe ainda um Derecho Penal, Livro de estudo, Parte Geral do Professor Edmund JAKOBS, Gunther, Derecho Parte General, Fundamentos y teoria de la imputación. Tradução de Joaquin onde diz que "Derecho Penal es el conjunto de las normas jurídicas que vinculam la pena, como Contreras e Luis Murillo, Marcial Pons, Madrid, 1997, pp. 55-58. consecuencia jurídica, a un hecho p. 27. 14 15</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal I (Textos de Apoio) Para Von LISZT, Direito Penal "é conjunto das prescrições emanadas Quanto à religião, como instrumento de controlo social, como do Estado que ligam ao crime como facto a pena como condutor do homem religioso e os valores que exalta visam unir o homem à O Direito Penal é antes um ramo de Direito Público constituído por um divindade, sendo estes valores que fazem com que homem paute a sua conduta conjunto de normas e princípios jurídicos que ligam ao crime ou delito, como social de forma a atingir a perfeição. O artigo 12 da Constituição declara o facto, a pena e medidas de segurança, como consequências jurídicas. Estado como laico, isto é, uma separação orgânica entre as Quando se fala de Direito Penal, podemos falar em dois sentidos: i) confissões religiosas e Estado. Assim, Estado não se identifica com nenhum Direito Penal, cujo objecto de estudo é a legislação penal, isto é, uma religião, pautando por uma conduta de neutralidade perante as confissões investigação do direito penal positivo conjunto de normas que constam do religiosas, mas não deixa de reconhecer e valorizar as actividades das confissões Código Penal e de outras leis penais que estabelecem os crimes e as respectivas religiosas visando promover um clima de entendimento, tolerância, paz e o sanções jurídicas; ii) Direito Penal como um conjunto de princípios que regulam reforço da unidade nacional, bem-estar espiritual e material dos cidadãos e a multiplicidade das normas (direito positivo), isto é, como ciência jurídica penal, desenvolvimento económico e social 4). As confissões religiosas são livres através de uma elaboração conceitual dos princípios informadores da legislação. na sua organização e no exercício das suas funções, mas devem respeitar as leis Em conclusão, objecto do nosso estudo não podem ser as normas do Estado. Nenhum dever religioso pode obstar ao cumprimento de um dever cotejadas no Código Penal, pois não se trata de fixar na memória os artigos do legal, salvo situações de isenção. Código, de conhecer as palavras por meio das quais as normas se manifestam, O costume é uma ordem de trato social que organiza um conjunto de mas de procurar conhecer o significado substancial das mesmas normas e padrões comportamentais que norteiam a vida do homem no sentido de pautar estabelecer os nexos que as ligam umas às outras. Se a ciência é sinónimo de sua conduta como forma de evitar rejeição por parte da colectividade concreta. saber também a ciência do direito penal não pode consistir numa O costume pode consubstanciar o chamado direito costumeiro que se confusão de conhecimentos, mas deve orientar-se para uma disposição circunscreve a uma determinada povoação, localidade, posto administrativo ou ordenada desse mesmos conhecimentos. Trata-se de sistematizar saber distrito, constituído por um conjunto de usos ou hábitos que são tomados por essa sociedade como obrigatórios, passando a ser normas de conduta social. A Constituição da República, no seu artigo 4, reconhece pluralismo jurídico. 8.1. Direito penal como instrumento de controlo social formal Com efeito, reconhece-se vários sistemas normativos de resolução de litígios, A vida em sociedade depende da coexistência harmónica de vários desde que não contrariem os valores e princípios fundamentais de um Estado mecanismos de controlo social, com o objectivo de ordenar, reger, validar e até de Direito definidos na Constituição. Portanto, profbe-se costume contra legem, mesmo garantir a vida em colectividade. Dentre tantos, tem sido destacados três tolerando-se costume secundum legem e praeter instrumentos fundamentais de controlo social, nomeadamente, a ? Na criminalidade, sistema normativo costumeiro desempenha um Costume e papel importante, pois um conjunto de crimes, relacionados com património em geral, podem ser resolvidos através da aplicação deste 30 LISZT, Franz Von, Direito p. 1. Quanto ao Direito, que nos interessa, primeiro dizer que a 31 Por todos ver BETTIOL, Giuseppe, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I. Tradução de Fernando de Miranda, interdependência entre Direito e Sociedade pode ser traduzida no conhecido Coimbra 26, Coimbra, 1970, p. 16 17</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) silogismo sócio-jurídico "ubi ibi societas, ubi societas ibi jus, ergo, ubi bomo ibi 8.2. Direito penal em sentido objectivo e em sentido subjectivo onde está o homem ai está a sociedade, onde está a sociedade aí está Em sentido objectivo, Direito penal significa um conjunto de normas Direito, logo, onde está homem ai está Direito. Mas olhemos para o Direito penais. Isto é, o Direito penal corresponde ao direito vigente, que O Estado, Penal, em concreto. através do seu órgão legislativo, produziu em forma de acto legislativo. É como Antes de mais, Direito Penal desempenha, pelo menos duas funções afirmava Von LISZT, Direito penal é conjunto de regras juridicas estabelecidas pelo de importante relevo: i) de tutela ou de protecção, de natureza social que Estado, que associam 0 crime, como facto, a pena, como legitima Corrobora traduz na protecção dos bens jurídicos considerados fundamentais em uma esta ideia BETTIOL, afirmando que "Não podemos deixar de concordar sociedade, por meio da ameaça de pena; ii) a segunda função é a garantistica, plenamente com esta afirmação, desde que não se queira fazer da positividade que consiste em proteger os cidadãos contra eventuais abusos de poder-dever um elemento essencial da noção do direito como tal, dada a existência de um de punir do Estado. direito de natureza que nenhuma positividade jamais pode e desde que O controlo social penal é um subsistema especial ou formal do controlo não se negue a utilidade de um enquadramento das normas penais na moldura social. A sua especialidade deriva, primeiro, do objecto a que se refere (não toda do período histórico em que o jurista é chamado a a conduta mas aquelas que constituem crimes) e, segundo, da Em sentido subjectivo, Direito penal corresponde ao dircito de castigar finalidade das sanções que aplica em caso de prática de crime (fins das penas: a cargo do Estado, isto é, o direito de Estado criar e aplicar direito penal prevenção e repressão). A sua forma de operar é também especial, rigorosa objectivo. Se o Estado detém ius puniendi, cidadão detém o direito à liberdade formalização em sua forma de operar (princípio da e de ser punido obedecendo o Estado um due process. Portanto, é direito penal O Direito penal simboliza o sistema normativo mais formalizado, com objectivo que limita o poder punitivo do Estado, para que este respeite os uma estrutura mais racional, e com mais elevado grau de divisão de trabalho e direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. especificidade funcional entre todos os subsistemas normativos e só entra em funcionamento quando os testantes mecanismos primários de controlo social 9. Caracteres do Direito Penal informal e formal tiverem fracassado. O Direito penal exerce a função do controlo social mais formal através O Direito Penal tem as seguintes características básicas: da pena ou medida de segurança que aplica aos infractores como retribuição ao i. Carácter positivo. O direito Penal é aquele que é estabelecido pelo crime praticado, em primeiro lugar, e depois como uma forma de prevenção Estado, através do seu órgão legislativo, a Assembleia da geral, que busca intimidar a sociedade à prática de crimes, e prevenção especial, República. Com efeito, nos termos do 1 do artigo 179 da Constituição, que sobre delinquente para que este não volte a praticar novos crimes; compete à Assembleia da legislar sobre as questões básicas da quer da convivência social, quer ressocializando-o. política interna e externa do país". O Direito Penal constitui uma das questões básicas internas, atendendo que o seu objecto gira em torno da protecção dos valores fundamentais da sociedade e cabe exclusivamente ao Estado prescrever os dispositivos penais. 33 Cfr. LISZT, Frans Von, Tratado, p. 5. 32 PABLOS, Garcia, Derecho 3. 34 BETTIOL, Giuseppe, Direito penal 167. 18 19</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Mas este carácter não é absoluto, pois dircito penal não se limita somente ao seu poder de punir, como sujeito activo, o que confere carácter público. direito legislado é mais do que Portanto, as relações estabelecidas são de subordinação e não de igualdade, como ocorre no direito privado. ii. o Direito Penal estabelece unicamente a favor do Estado o ius Mas não quer dizer que não houvesse quem entenda que Direito Penal puniendi para actuar sobre os delinquentes na defesa da sociedade contra pertence ao Direito Privado. Com efeito, um grande processualista chamado crime. GUASP35 reiterou insistentemente a opinião de que o Penal é um ramo O poder punitivo do Estado não é ilimitado, nem Os agentes do Direito Privado, alegando que a submissão do Estado à lei, enquanto auto de crime têm direito à liberdade, que consiste em não serem punidos fora dos limitação, demonstra que seu poder punitivo é uma manifestação do Direito casos previstos na lei estabelecida pelo Parlamento e a obrigação de não impedir Privado; esta natureza privada de Direito Penal se corrobora, ademais, pela a aplicação das sanções, sob pena de Estado fazê-lo através dos seus poderes igualdade das partes acusadora e acusada no processo penal. coercitivos. Está claro que esta visão processualista de igualdade das partes processuais na dedução de suas pretensões não pode ser aceite, nem que para São limites do poder de castigar do Estado: tanto este autor referisse que existem crimes de natureza particular, cujo 1.° o princípio in dubio pro reo- Os arguidos gozam da presunção de procedimento depende da queixa do ofendido, tal seria insuficiente para se inocência até decisão judicial definitiva 2 do art. 59 da CRM); proclamar o Direito Penal como ramo do Direito Privado. Aliás, imagine-se 2.° o princípio da legalidade Ninguém pode ser condenado por acto "Um direito penal privado, isto é, confiado à vontade da pessoa ofendida pelo não qualificado como crime no momento da sua prática 1 do art. 60 da crime ou de quem lhe tutela interesses, não é já coisa que se possa imaginar, pois CRM); que isso corresponderia a demolir o poder público e a tornar praticamente 3.° princípio no bis in idem Nenhum cidadão pode ser mais impossível a convivência social do que uma vez pela prática do mesmo crime, nem ser punido com pena não O Direito Penal é parte do Direito Público porque o poder punitivo do prevista na lei ou com pena mais grave do que a estabelecida na lei no momento Estado representa uma parte significativa da soberania do Estado, poder da prática da infracção criminal 3 do art. 59 da CRM); indelegável e indisponível; este ramo de direito não regula relações entre a proibição da pena de morte, do tratamento desumano, cruel (art. particulares, mas sim entre agente do crime e Estado, como representante 40 da CRM); da comunidade ou da sociedade. 5.° princípio da proibição de penas ou medidas com carácter perpétuo, ilimitado ou indeterminado São proibidas penas e medidas de segurança iv. o Direito Penal é um direito de intervenção mínima. Direito privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração Penal constitui, em primeiro lugar, a última opção ou a chamada ultima ratio do ilimitada ou indefinida 1 do art. 61 da CRM). poder punitivo do Estado. A incriminalização de uma conduta só se legitima quando constituir o meio necessário para a protecção de um bem jurídico iii. Direito Penal é, por excelência, público. Com efeito, regula uma relação jurídica em que Estado, "em relação" com o cidadão, aparece com o 35 GUASP, y la GARCIA-PABLOS, António, Derecho Penal, p. 11. 36 BETTIOL, Giuseppe, Direito p. 168. 20 21</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) fundamental. Portanto, se outras formas de protecção forem suficientes para a vi. o Direito Penal é uma ciência cultural. O direito penal integra as tutela de um bem jurídico, a intervenção do Direito Penal será injustificada. Isto ciências do "dever ser"e não as do "ser". Pois, direito penal insere-se no é, se um bem jurídico pode ainda eficazmente ser tutelado pelo Direito Civil ou domínio das ciências sociais, onde vingam normas enquanto actos de vontade Administrativo, o Direito Penal é desnecessário, pois este constitui o último geral. "braço ou opção do vii. Direito Penal tem carácter O direito penal tem a Em segundo momento, o Direito Penal protege os bens fundamentais missão de proteger ou tutelar, em regra, os valores mais elevados da sociedade, ou mais importantes da sociedade. Decorre imediatamente desta asserção duas os ditos bens jurídicos fundamentais. O direito não confere à todas as normas consequências importantes: igual valor, este varia de conformidade com o facto que lhe dá conteúdo, - Direito Penal é fragmentário, pois o Direito Penal não protege todos estabelecendo escalas hierárquicas. os bens jurídicos, nada mais do que os fundamentais e só perante ataques intoleráveis a estes bens, que se encontram sedeados em vários ramos de direito viii. o Direito Penal é uma ciência finalista. O direito penal tem como (ver infra 10.4.2). finalidade a defesa dos bens fundamentais da sociedade, nomeadamente, a vida, - O Direito Penal tem carácter subsidiário, isto é, o Estado, dispondo de a integridade física, a honra, património. Neste sentido, "a consciência social outros meios eficazes e de menor custo social, deve utilizar de forma cautelosa eleva esses interesses, tendo em vista seu valor, à categoria de bens jurídicos e escassa os seus poderes punitivos, só podendo utilizá-los de forma subsidiária, que necessitam de protecção do Direito Penal para a sobrevivência da ordem na medida em que os outros ramos de direito forem insuficientes para eficazmente tutelarem os interesses em causa (ver infra 10.4.1.). ix. Direito Penal tem um carácter sancionador. O Direito Penal V. Direito Penal é uma ciência normativa. Pois, ele tem como reage sempre à uma violação do preceito penal. "A sanção, que é a consequência função estudar os "textos" do direito penal em vigor, isto é, as normas penais, jurídica do inadimplemento de um dever, toma, no Direito Penal, nome de a fim de reconstituir seu aspecto normativo em uma visão "orgânica e pena. Esta tem carácter aflitivo, no sentido de que se traduz, sob um ponto de É attavés do direito positivo que se pode chegar à plena e exacta vista substancial, num mal infligido ao autor de uma malfeitoria compreensão do direito penal dominante numa certa sociedade. Não seria de A sanção que é aplicada no Direito Penal tem natureza técnica e recusar-se aqui attibuir-se ao direito penal o carácter dogmático, uma vez que as restrita, não é igual à sanção de que se fala na estrutura de normas jurídicas penal através de normas jurídicas, cujo cumprimento é obrigatório para todos, a sanção penal visa repreender ou punir a violação dos bens fundamentais de sob pena de sanção. uma sociedade e tem um carácter simbólico pela censura ético-jurídica que lhe caracteriza. Ademais, o direito penal através das suas cominações penais protege 3H Ver JESUS, E. de, Direito Penal... ob. cit., 6. 39 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal. 6. 37 BATTAGLINI, Giulio, 3. 40 BETTIOL, Giuseppe, Direito 187. 22 23</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) outras normas de natureza extra penal: por exemplo, direito civil regula 10. Limites do ius puniendi do Princípios fundamentais do direito à propriedade, direito constitucional estabelece direitos fundamentais, Direito Penal. como por exemplo, o direito à honra e ao bom nome; já direito penal vem estabelecer sanções que violam direito à propriedade, através dos Os princípios fundamentais do Direito Penal brotam da necessidade de crimes contra património; aqueles que violam a honra e bom nome, através proteger a dignidade da pessoa humana e, como tal, estes princípios funcionam dos crimes contra a honra, ou melhor as difamações e injúrias. como travão ou limite do poder de actuação das instituições incumbidas de exercer a função judiciária. X. Direito penal é um sistema O Direito penal vai Nestas lições vamos destacar um conjunto de princípios, dos quais têm aumentando a gravidade das sanções e leque das incriminações na medida do assento constitucional e outros com sede em legislação ordinária e no Direito agravamento do perigo sobre os bens jurídicos As molduras Internacional validamente ratificado em penais vão sendo mais graves à medida que os factos de perigo são mais Os princípios funcionam como garantia da própria lei penal. Assim consistentes e lesivos. O direito penal como sistema gradativo, muitas das vezes, cumpre analisar: suaviza as condutas mais leves, agravando por outro as penas nas condutas mais graves, sob ponto de vista do resultado, embora se diga que o Direito penal não 10.1. Função de garantia da lei penal é um dircito dos resultados, mas sim da culpa e constitui "ultimo braço armado" A função de garantia da lei penal assenta nos seguintes do Estado. i. As leis penais devem acusar, tendo em vista seus tipos penais e as respectivas consequências jurídicas, com um mínimo de determinação. Não se admite em Lei Penal xi. O Direito Penal é um direito indisponível: o Direito Penal, emprego de conceitos indeterminados e de cláusulas gerais, bem como ocupando-se dos bens jurídicos fundamentais, protege interesses indisponíveis conceitos que carecem de preenchimento de valor. Os elementos do tipo penal que, pela sua natureza, não estão à disposição das partes na relação jurídico- devem ser completa e concretamente descritos na lei, de tal forma que o seu penal. Assim, as partes não podem transigir, negociar ou subtrairem a conteúdo de sentido e significado possam ser aferidos através do processo de intervenção do Estado na resolução dos litígios de natureza criminal. Contudo, interpretação. quando as infracções são de pequena gravidade criminal, a lei penal permite que ii. normas fundamentadoras e agravadoras de penas não deve ser atribuida força as partes, com mediação do Estado, possam fazer a transacção e conciliação retroactiva, nem pelo legislador nem pelo juiz penal. Esta proibição engloba 0 "se" e penal. Apesar deste facto, não se concluir que se retira carácter "como" da punibilidade no âmbito do Direito Penal material ou substantivo, indisponível da relação jurídico-penal: o ius puniendi é e continua nas mãos que quer dizer que esta regra não cabe qua tale no Direito Processual Penal unicamente do Estado. iii. Através do costume ou da analogia não podem ser formados novos tipos de crimes, nem agravadas ou alargadas as respectivas penas ou medidas segurança e de tratamento, em prejuízo dos agentes do crime. Cfr. VENTURA, de penal. pp. 75-76. 42 WESSELS, Johannes, cit., 11-13. 24 25</p><p>Direito Penal I (Textos de Apoio) Direito Penal 1 (Textos de Apoio) 10.2. Princípio da legalidade Assim, o princípio da legalidade implica os seguintes aspectos essenciais: i. Nullum crimen sine lege scripta (art. 60 da CRM e 1 do art. 7 do CP). É No âmbito do disposto no artigo 60 da Constituição da República a manifestação do princípio da legalidade no seu sentido formal, consistindo ninguém pode ser condenado por acto não qualificado como crime no momento da sua prática e o artigo 7 do Código Penal prescreve que: numa garantia criminal, segundo a qual somente a lei escrita será fonte de criação "1. Nenhum facto, consista em acção ou omissão, pode dos crimes, o que restringe o conceito de fontes de direito em matéria penal. julgar-se criminoso, sem que uma lei anterior 0 qualifique como tal. Esta regra pressupõe 2. Não podem ser aplicadas medidas penas criminais que não a) não crime ou delito sem que a lei tipifique ou especifique estejam previstas na previamente em que consiste a conduta delitiva. A exigência de uma lei prévia expressa-se pela proibição da retroactividade das leis, em particular, O princípio da legalidade coloca travão ao poder punitivo do Estado. as penais que punam com gravidade as infracções anteriores ou Portanto, é uma exigência da segurança jurídica que impõe a necessidade de qualificam novos factos como criminosos (entenda-se, em frente desenvolveremos isto, as leis penais favoráveis são regra geral conhecimento prévio dos crimes e das respectivas penas antes do seu cometimento e é, acima de tudo, uma garantia política de que nenhum cidadão retroactivas,); será submetido pelo Estado, nem pelos seus magistrados a penas que não sejam b) não há "delicta juris naturalis". Isto é, não existem crimes as decretadas pelos representantes do Povo na Assembleia da República. senão os consagrados na lei penal por mais imoral e perversa seja Segundo este princípio, conforme consagrado nos mandamentos uma conduta. Esta é a exigência de uma lei escrita que visa afastar o constitucional e legal, um facto somente pode ser punido quando a sua costume como fonte de direito penal; punibilidade estiver determinada antes da acção ou omissão ser perpetrada, isto c) tribunais carecem de faculdades para qualificar como crime ou é, quando facto for cometido deverá existir previamente uma lei que delito qualquer que seja a conduta fora das previstas em lei penal. Qualquer qualifique como crime e preveja os pressupostos da sua punibilidade e as juiz que ignorar esta regra estará a usurpar o poder legislativo, sendo, respectivas consequências jurídicas. por isso, a sua qualificação nula e de nenhum valor; Sobre este princípio escreveu BECCARIA que só as leis podem decretar d) as factos são qualificados definitivamente como crimes pelos tribunais, as penas dos delitos e esta autoridade deve residir no legislador, que representa através de um processo judicial legalmente determinado. toda a sociedade unida por um contrato social. Nenhum magistrado pode com justiça decretar, a sua vontade, penas contra outro indivíduo da mesma ii. Nullum crimen sine lege stricta. Esta regra impõe certo grau de precisão sociedade. Os juízes não podem, por conseguinte, aumentar a pena estabelecida pelas leis, mesmo sob pretexto de zelo ou do bem extensiva em certos casos prejudiciais ao réu. P Cfr. DEVESA, Maria Rodriguez e GOMEZ, Alfonso Serrano, Derecho Penal Espanhol Parte General, Dykinson, Madrid, 1995, 173. BECCARIA, Delitos das Penas, edição (Tradução de José de Faria Costa), Fundação Galouste 45 Diz-se que ocorre integração da lei através da analogia in quando o sujeito (agente) é prejudicado Gulbenkian, Lisboa, 2014, p. 44. sua aplicação. Na situação oposta, quando o sujeito é beneficiado, fala-se em analogia in 26 27</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) "Deve ser mulidade da sentença por violação do despronunciado a a quem são imputados principio "nulla poena sine factos que não consubstanciam nenhum crime previsto na iii. Nulla poena sine legali iudicio. Não há sem juiz legal ou natural, tal é a garantia judicial, pois "A experiência histórica demonstra que o poder iii. Nulla poena sine lege 2 do art. 7 do CP). É uma garantia penal, e que a auto limitação do Estado pelas suas próprias leis precisa de segundo a qual não há pena sem lei que a preveja. Esta regra tem as seguintes complemento indispensável através do controlo derivações: a) a lei deve determinar com clareza as molduras penais que devem ser iv. O princípio da legalidade tem como corolário o princípio da tipicidade. impostas a cada crime ou delito. Visa esta regra quebrar a arbitrariedade a que Segundo este princípio cabe à lei e só a ela determinar quais os factos ou cidadão pode estar sujeito pelos tribunais; condutas que constituem crime e quais os pressupostos que justificam a b) são proibidas penas desumanas, de duração indeterminada, aplicação de uma pena ou medida de segurança. Os tipos, ou melhor a descrição indefinida ou ilimitada 1 do art. 61 da CRM); do facto criminoso pela lei, é que servem de padrão de aferição através do qual c) a imposição de uma pena a um individuo deve ser feita por uma sentença se verifica se os comportamentos humanos encaixam nesses desenhos do tribunal e segundo um procedimento legalmente determinado; arquitectados pelo legislador, e, se se encaixam então estamos perante uma d) a execução da pena sujeita-se também à regulação legal; conduta abstractamente e) as efeitos das penas são determinados na sentença condenatória ou na lei 3 do art. 61 da Em conclusão, o princípio da legalidade ou da reserva da lei impõe que: Jurisprudência: 1. "A a legislação penal é da competência da Assembleia da condenação numa pena diversa daquela não podendo Governo tomar partido nestas matérias, prevista na norma incriminadora implica a salvo se a própria Assembleia delegar poder legislativo a ele. A matéria penal está na competência genérica da Assembleia da República, podendo, por isso, ser delegada ao Governo 1 do art. 179 da CRM). 46 p. TRIBUNAL SUPREMO, do Criminal (1990-2003), Vol. I, Maputo, 2008, Portanto, em só a lei e decreto-lei podem ser fontes de 3 do artigo 61 da CRM diz expressamente que: pend implica a perda de quaisquer civis, tipos criminais, salvo as contravenções que podem ficar a cargo de profissionais priva dos sells salva as limitações inerentes do condenação regulamentos, cujos limites são por lei definidos. às exigências Contudo, este número requere uma precisão com o que as leis especial dispuserem sobre os efeitos das penas, tendo em conta os direitos civis cm causa, profissionais ou P cabe à lei definir o que é crime e qual é a consequência jurídica No geral, a leitura literal deste número indica no sentido de que os direitos civis, profissionais ou políticos podem ser restringidos pelo juiz na declaração dos efeitos da e não o fazendo, pode entender-se que se uma lei aplicável, os seus pressupostos e as modalidades das medidas de colocar-se-ja problema da constitucionalidade da mesma. Não estamos de acordo com esta interpretação, terá sido uma redacção infeliz do legislador constituinte, mas D que se pretendia é que além segurança antes de o facto ser cometido. Isto é, a lei deverá existir daquilo que o juiz pode declarar na sentença, as leis podem cominar, segundo concretas, para situações de restrições de direitos. Por exemplo, acesso à Função Pública a certas pessoas condenadas à pena por crimes contra a segurança do Estado, crime de alta traição à pátria não podia mais tarde a concorrer para funções TRIBUNAL SUPREMO, p. 421. públicas, nem para cargos Este cidadão foi para com a pátria e seria o Estado 19 DEVESA, José Maria Rodriguez e GOMEZ, Alfonso Serrano, Derecho p. 173. 50 Cfr. M. Simão e HENRIQUES, M. Leal, p. 17. 28 29</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) previamente ou antes de facto ser cometido ou se verificarem as outro a cometer crime nos casos em que sem esse conselho ou instigação não situações às quais se aplicam. tivesse sido cometido; os casos em que há responsabilidade criminal sem facto ou quando incrimina a mera atitude do sujeito, os casos de certos estados de 10.3. Princípio do Direito Penal do facto perigosidade social. Todo o ser humano responde perante a lei penal pelo que faz ou deixa de fazer (acção e omissão) e não pelo que é. Portanto, todo o crime ou delito 10.4. Princípio da intervenção mínima: Direito Penal como "ultima prevê não só a punição da acção adequada a produzir o resultado típico, mas ratio" também da omissão da acção adequada a evitá-lo 1 do att. 2 do CP). Este princípio constitui um limite político-criminal do poder punitivo do O Direito Penal continua ao facto e não ao autor. Neste contexto, Estado e está ligado à exclusiva protecção dos bens jurídicos fundamentais. punem-se acções praticadas na realidade fáctica que se ajustem a modelos típicos, Segundo este princípio, direito penal só pode intervir na sociedade e não personalidades mal formadas ou distorcidas. quando seja estritamente necessário e imprescindível para a defesa dos bens O princípio do facto quer significar que Estado só pode incriminar jurídicos fundamentais. Não se trata de proteger todos os bens jurídicos de penalmente condutas humanas que se exteriorizem através de acções concretas qualquer classe de perigo que lhes ameace, nem de fazê-lo utilizando os ou omissões, isto é, através de factos: comportamentos exteriorizados mecanismos mais poderosos do Estado, mas de programar um controlo de percepção sensorial Este princípio tem as seguintes razoável da criminalidade, seleccionando objectos, meios e instrumentos mais consequências: eficazes. O Direito Penal constitui a "ultima ratio" na solução dos problemas i. não punibilidade da "nuda cogitatio", daí que o simples pensamento ou criminais: "como sucede com qualquer técnica de intervenção traumática, de desejo não constitui crime, pois é um momento anterior ao inter efeitos irreversíveis, só podemos a ela apelar casos de estrita necessidade ii. a forma de ser do agente, a sua personalidade, abstraindo a sua não serve para defender os bens jurídicos fundamentais contra os ataques mais graves, e de fundamento para a responsabilidade criminal e nem para a sua agravação. somente quando as restantes estratégias de natureza não penal não oferecem garantias de Este princípio cumpre uma função de certeza e serve de garantia jurídica Este princípio dirige-se, em primeira linha, ao legislador e trata-se de uma no âmbito dos direitos individuais. Este princípio está no 1 do exigência ética, cuja violação pode degenerar numa violência e hipertrofia penal. artigo 60 da CRM quando diz que ninguém pode ser condenado por acto não Não pode legislador, a pretexto de muita criminalidade, socorrer-se do direito qualificado como crime no momento da sua prática e o código penal cimenta penal para punir toda e qualquer conduta maléfica que afecta a sociedade; e nem esta-posição em vários seus dispositivos (vide 1, 3, 6, as penas mais graves poderão resolver o problema da criminalidade. Portanto, Apesar asserção, este princípio não é absoluto, pois em várias direito penal não significa menos delitos ou crimes; mais leis, penas mais disposições do Código Penal afasta-se este entendimento, por exemplo, a alínea severas, mais polícia, mais estabelecimentos prisionais, isto tudo não significa d) do 1 do art. 21 diz que são autores os que aconselharem ou instigarem menos 51 PABLOS, Antonio Garcia, Derecho pp. 260-263. 53 PABLOS, Antonio Garcia, Derecho Penal p. 272. do autor). 52 PABLOS, Antonio Garcia, Derecho 263. 54 PABLOS, Antonio Garcia, P. 273. 30 31</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) princípio intervenção mínima concretiza-se através de dois Por exemplo, a fragmentariedade do direito penal explica que em relação nomeadamente, da subsidiariedade e da fragmentariedade. a bens jurídicos não nucleares só se incriminem factos criminosos consumados e dolosos e, nalguns casos, certas modalidades de comportamentos 10.4.1. Intervenção subsidiária do Direito Penal especialmente perigosos56. A intervenção subsidiária, como mecanismo teorético limitador do poder No processo de revisão do Código Penal, aprovado em 2014, colocou- punitivo do Estado, impõe que recurso ao direito penal seja feio quando não se este problema de escolha dos comportamentos que deveriam ser se encontram outros mecanismos mais eficazes com menor custo social considerados crimes. Foi caso da embriaguez em local público, que rompesse disponíveis num Estado de Direito. Portanto, reafirma-se carácter de com freios morais, que tinha sido proposto como crime, cuja pena era de subsidiário do direito penal, que implica a necessidade de escalonar e detenção. A verdade é que esta proposta acabou sendo no Plenário, por racionalizar os meios disponíveis para responder adequadamente o problema entender-se que não merecia tutela penal, a era desnecessária e não havia criminal de forma eficaz e adequado. O Estado deve sempre optar por meios um interesse social relevante, pelas características e condições reais da sociedade menos lesivos e menos limitativos dos direitos individuais. Com efeito, política criminal deve optar pela prevenção dos crimes através da pena como último recurso do Estado, privilegiando outros 10.5. Princípio da insignificância ou das "bagatelas penais" mecanismos interdisciplinares capazes de tutelar eficazmente os bens jurídicos O princípio da insignificância tem ligação com da adequação social da postos em conduta delitiva. ROXIN ensina que às condutas socialmente admissíveis Em conclusão, escreve ROXIN, que "O direito penal é de natureza "pertence o denominado princípio da insignificância que permite na maior parte Ou seja: somente se podem punir as lesões de bens jurídicos e as dos tipos excluir desde logo dano de pouca importância: mau trato não é contravenções contra fins de assistência social, se tal for indispensável para uma qualquer tipo de lesão à integridade corporal, mas apenas um que seja relevante; vida em comum ordenada. Onde bastem os meios do direito civil ou do direito analogicamente, indecorosa, no sentido do Código Penal é somente a acção público, o direito penal deve sexual de uma certa importância; injuriosa, do ponto de vista delitivo, é tão somente a lesão grave à pretensão social de respeito. Como deve ser 10.4.2. Intervenção fragmentária do Direito Penal considerado unicamente um obstáculo de certa importância, igualmente A intervenção fragmentária significa que o direito penal não protege também a ameaça deve ser para passar o umbral da todos os bens jurídicos, senão os considerados fundamentais numa dada Contudo, princípio da insignificância não pressupõe a total aprovação sociedade e só actua, mesmo nesses casos, nas situações de perturbações ou social da conduta, mas apenas uma relativa tolerância dessa conduta, por sua violações intoleráveis à classe dos bens fundamentais, pois uma penal escassa absoluta alarmaria o Estado de Direito Democrático, acabando por reduzi-lo a um Estado de Polícia. 55 ROXIN, Claus, Problemas de Penal. Tradução de Ana paula dos Santos Luis, Maria Fernanda 56 ROXIN, Problemas Fundamentais de Penal, cit., p. 275. Palma e Ana Isabel de Figueiredo, ed., Veja 1993, p. 28. 57 ROXIN, Claus, Criminal Sistema del Derecho Penal, Bosch, Barcelona, 1972, p. 53. PUIG, Santiago Mir, El Derecho Penal Estado Socialy de Editorial Ariel, 1994, p. 461. 32 33</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Este princípio funciona como bitola interpretativa do tribunal na deverá tomar em consideração os elementos fixados neste dispositivo, devendo verificação da tipicidade do facto ilícito e é independente da expressa permissão a medida da pena ser adequada e necessária para repelir o mal cometido. legal, pois diz respeito à "economia do Com efeito, os romanos ensinaram que "minimus non curat 10.7. Princípio da humanização das penas O seu reconhecimento pelos tribunais exige uma análise profunda do O princípio da humanização das penas salvaguarda ele próprio a desvalor da acção e do desvalor do dano criado como resultado da conduta: i) dignidade da pessoa humana. Constitui, portanto, um limite do ius puniendi do mínima ofensividade da conduta; ii) inexistência de perigosidade social do acto; Estado e um sinal que tem marcado historicamente a evolução do próprio iii) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e iv) inexpressividade direito da lesão provocada. Portanto, a lei penal jamais deve ser invocada para reprovar condutas de Este princípio tem manifestações na nossa Lei Com efeito, são menor grau de lesividade, ou de pouca gravidade, pois uma lesão relevante deve consequências deste princípio: possuir um peso relevante que constrange a harmonia e paz social. a rejeição da pena de morte; Este princípio tem manifestações no Código Penal, quando o legislador introduziu as medidas educativas e socialmente úteis para punir infracções de a rejeição da tortura ou tratamentos cruéis ou desumanos; pequena gravidade (artigo 85). a proibição de penas e medidas de segurança privativas de liberdade com carácter perpétuo, indefinido ou ilimitado; 10.6. Princípio da proporcionalidade a finalidade da aplicação das penas ou medidas de segurança é a reinserção do agente na sociedade (art. 58 do Código Penal). A proporcionalidade dirige-se ao legislador è ao juiz: ao legislador impõe Este princípio procura impor que agente do crime seja tratado, em toda que este estabeleça penas proporcionais, em abstracto, com a gravidade da a extensão do processo, como um ser humano, proibindo-se, desta feita, penas conduta delitiva; ao juiz impõe que a medida concreta da pena que for infligida degradantes, indeterminadas e perpétuas. Os esforços do legislador penal em ao agente do crime deve ser proporcional à concreta gravidade do facto e à medida da sua culpa. concretizar este princípio foram enormes no Código Penal: A exigência da proporcionalidade se determina mediante um juízo de proibição de penas perpétuas, de duração ilimitada e indefinida ponderação entre a da pena e fim perseguido pela cominação art. 59; a privação da ocorre ou se mantém apenas quando, do 110 do CP estabelece que a aplicação da pena depende da do agente, tendo em atenção a gravidade do facto criminoso, liberdade, não seja possível prevenir a prática futura de crimes e garantir os seus resultados, a intensidade do dolo ou grau de culpa, ou os motivos do a protecção dos bens jurídicos artigo 58; crime e a personalidade do agente. Portanto, a ponderação a ser feita pelo juiz PABLOS, Antonio Garcia, Derecho Penal p. 290. 62 artigo 40 estabelece que "Tada à vida à integridade fisica moral sujeito à on 59 FRANCO, Alberto Silva et all, Código p. 64. tratamentos 2. Na de não há pena de morte". 1 do artigo 61 da Constituição 60 PABLOS, Antonio Garcia, Derecho Penal p. estabelece que "São penas e medidas de segurança privativas da liberdade carácter de indefinida". 34 35</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de introdução de medidas educativas e socialmente úteis para punir infracções de pequena gravidade artigo 85; Segundo a concepção dogmática e da política criminal (a mais adequada), introdução de medidas alternativas à pena de prisão artigo 88; culpabilidade, em sentido lato, refere-se ao conjunto de pressupostos introdução de penas alternativas à de prisão, substituindo necessários para se imputar alguém pelo cometimento de uma infracção que as condenações que vão até oito anos de prisão artigo 89. motiva a aplicação de uma pena no sentido restrito, a culpabilidade refere-se princípio da dignidade da pessoa humana procura como fim último somente aos pressupostos que possibilitam a atribuição de um facto antijurídico seu reeducar e reinserir agente do crime na sociedade, ou melhor, manifesta- ao seu autor. se pela ressocialização do agente do crime. Na doutrina clássica, segundo os retribucionistas, a culpabilidade aparece vinculada às ideias do livre arbitro e retribuição, com uma poderosa carga 10.8. Princípio "ne bis in idem" moralizante. Se homem detém a capacidade de autodeterminação será responsável pelos seus actos, merecendo castigo quando faz mau uso da sua Este princípio está enunciado no artigo 59, 3, nos seguintes termos: liberdade. cidadão pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime A culpabilidade funda-se no princípio da dignidade da pessoa humana, Isto é, ninguém pode ser punido duas vezes pelo mesmo facto. Este princípio esteio de um Estado de Direito Democrático do indivíduo, tem um duplo significado: "i) penal material: ninguém pode safrer duas penas em face permitindo que o cidadão evite a pena, comportando-se conforme é de direito. do mesmo crime; ii) processual: ninguém pode ser processado e julgado duas vezes pelo mesmo Assim, deriva da culpabilidade que: será castigado por um facto ilícito albeio - princípio da pessoalidade da culpa (art. 27 do CP); 10.9. Princípio da culpa ou da será castigado pelo seu carácter 0 seu modo de ser princípio O princípio da culpabilidade constitui limite do ius puniendi do Estado, de responsabilidade pelo facto (Direito penal de facto), da legalidade e pois pressuposto de aplicação da pena é a culpa (art. 110 do CP). de termo culpabilidade pode compreender dois significados no âmbito a exigência do dolo e da culpa para que possa ser responsabilizado do Direito penal: criminalmente a chamada imputação subjectiva: não há pena sem dolo, e nos i) como sinónimo de isto é, como exigência de casos especialmente consagrados por lei, sem culpa ou negligência (art. 102 do CP); e da culpa para fundamentar a imposição de uma sanção penal. Neste sentido, a imputação pessoal que impede a imposição de uma pena a um deriva que o caso fortuito não é punível escola causalista da autor de um facto antijurídico que não preencha algumas condições ii) como sinónimo de da isto é, a possibilidade de atribuir psíquicas que lhe permitam ter consciência sobre as proibições um facto antijurídico ao seu autor. Nesta segunda acepção, excluem-se os casos de infringidas, é o caso dos inimputáveis. inimputabilidade, como menoridade e enfermidade mental escola finalista da 63 JESUS, Damásio E. de, p. 11. 289. Cfr. PUIG, Santiago Mir, Derecho 95-99 e PABLOS, António Garcia, Derecho pp. 283- 36 37</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) princípios e critérios que limitam e conformam Direito Penal, bem como legitima o poder punitivo do Estado. A Constituição Penal conforma validamente Direito Penal por uma das CAPÍTULO II três razões: "a Constituição pode conformar o Direito Penal porque funciona FONTES DO DIREITO PENAL como uma espécie de norma fundamental autorizadora do Direito ordinário, assumindo um papel hierarquicamente superior o que, no Estado de direito 11. Noção de fontes de direito democrático, tem um específico fundamento de legitimidade, já que a São fontes do Direito Penal os lugares donde provém as normas penais. Constituição é o pacto fundamental em que todos participam; a Constituição Distinguem-se no direito penal, fontes materiais e formais. As primeiras dizem deve ser a essência dos valores e razões que justificam um Estado e o seu Direito; respeito à génese da norma penal, com referência ao órgão encarregue de e, finalmente, uma resposta que combine as duas anteriores, dando, no entanto, produzir a norma penal. Já as segundas, as formais, correspondem aos processos em certos aspectos, prevalência a uma de exteriorização do Direito Penal ou como as suas regras se revelam, "vale A Constituição penal reduz-se a um conjunto de normas dizer, as fontes no único sentido técnico e princípios que se acham directa ou indirectamente consagrados na Em as normas penais são produzidas, por preponderância Constituição. Assim, constituem o núcleo da Constituição Penal as seguintes (não por exclusividade), pela Assembleia da República. A competência em normas: matéria penal integra a chamada competência genérica da Assembleia da A subordinação do Estado à Constituição e à legalidade, bem República (n.°1 do artigo 179), dai que, sendo ela genérica, pode nos termos do como a imposição do respeito e garantia dos direitos e liberdades 3 do artigo 179 da Constituição delegá-la ao Governo para decretar normas fundamentais, como ponto de partida para exercício do poder punitivo penais através de decretos-lei. do Estado (art. 2, n°s 3 e 4 e art. 3); Mas para estas lições, vamos desenvolver as fontes formais. As fontes O princípio da universalidade e igualdade perante a lei penal formais do Direito penal podem ser directas e indirectas. As directas ou art. 35; imediatas são a Constituição, as leis, os princípios gerais do direito e o direito imposição de limites ao poder punitivo do Estado, devendo internacional, e as indirectas são costume, a jurisprudência e a doutrina. respeitar o direito à vida, que se manifesta pela proibição da pena de morte; a salvaguarda da integridade física e moral, a proibição da tortura 12. Constituição ou tratamentos cruéis ou desumanos art. 40; o princípio da irretroactividade da lei penal mais severa - art. A Constituição da República é fonte directa e indirecta de todo o 57; ? Direito Penal. É Direito Constitucional que determina todos os valores, 65 BATTAGLINI, Giulio, Direito Penal, p. 21. 66 A professora Maria Fernanda Palma analisou Direito Penal sob prisma da Constituição, chegando a propor um tal "Direito Constitucional Penal", Constitucional Penal. Almedina, 2011. 67 PALMA, Maria Fernanda, Direito pp. 16-17. 38 39</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal (Textos de Apoio) o princípio da legalidade da prisão, da anterioridade da lei penal, 13.1. Técnica legislativa do Direito Penal do julgamento e das penas; o princípio da presunção da inocência e de "ne bis in idem" art. 59; A elaboração das normas penais obedece a uma técnica legislativa especial, que não se reconduz ao processo de elaboração comum aplicável a o princípio da reserva da lei e da anterioridade da lei penal art. 60; qualquer ramo de direito. Esta especificidade é justificada pelos valores fundamentais que o Direito Penal visa tutelar, como também pelos bens A limitação das penas e das medidas de segurança art. 61; jurídicos que as sanções impostas pelo Direito penal atingem: tudo gira em torno O princípio do acesso aos tribunais art. 62; de bens juridicos fundamentais da sociedade aqueles que o agente do crime atingiu O princípio da defesa art. 63; com a sua acção, como aqueles que, em retaliação ao mal praticado, Direito A limitação da prisão preventiva art. 64; Penal vai atingir com as suas pertencentes ao criminoso. A legalidade das detenções art. 66; Em primeiro lugar, quanto às normas incriminadores, ou que condutas Cabe ao legislador ordinário definir os crimes e as respectivas delitivas, temos a seguinte penas, podendo esta competência ser delegada ao Governo art. 179, Na técnica legislativa da norma penal, legislador não diz expressamente 1 e 3; que, por exemplo, matar é que é proibido matar, mas sim que a destruição Concentração exclusiva do poder de punir os crimes aos da vida de uma pessoa por outra enseja a aplicação de determinada tribunais art. 212. O preceito imperativo que deve ser obedecido não se acha de maneira expressa na norma penal: comportamento ilícito e a sanção é que são 13. Lei Penal Exemplo: O artigo 155 do CP diz que que, voluntariamente, matar A expressão "lei penal" compreende tanto Código aprovado outra pessoa, será punido com prisão maior de dezasseis a vinte pela Lei 35/2014, de 31 de Dezembro, como também o conjunto de leis O comportamento humano ilícito é "matar outra pessoa"; mas esta extravagantes que complementam o Código Penal, as leis especiais, e outras que norma contém um preceito proibitivo implícito, que é não matarás, ou melbor, é constituem chamado "Direito Penal proibido matar uma Assim, nos crimes de homicídio o do O Código Penal constitui a lei geral penal, a qual é aplicada às matérias é determinado em todos os casos através da destruição da vida reguladas por outras leis penais, salvo se tais disposições penais humana alheia. Importante para o da é, em primeira linha, o A lei penal é a principal fonte de Direito Penal, sendo dela que nascem modo do cometimento doloso ou negligente do crime. crimes e as respectivas sanções Portanto, como quer MEZGER, Com esta construção, BINDING chegou a concluir que o agente do "Só a lei abre as portas da prisão". crime não transgride a lei penal, mas a norma penal, que é constituída pelo preceito proibitivo. No nosso exemplo, preceito transgredido seria "é proibido matar ou não matarás". "Direito Penal Secundário" é constituído pelas normas penais que o ao ambiente, direito económico, o direito do consumidor, e por ai. 69 JESUS, Damásio E. de, Direito p. 14. 40 41</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Assim, segundo este autor, a norma penal incriminadora tem duas partes A norma penal endereça-se a todos os cidadãos genericamente distintas: considerados, através de preceitos imperativos positivos ou negativos preceito primário, que é constituído pelo comportamento (proibições), implícita e previamente estabelecidos, pois não se encontra na humano ilícito: que, voluntariamente, matar outra pessoan; norma penal ordens directas do tipo proibido roubar; não matar, não ofender 0 preceito secundário, que é constituído pela sanção que se associa a integridade física, mas sim, existem comandos indirectos, nos quais se ao comportamento delitivo: punido com prisão maior de dezasseis a vinte descreve o comportamento humano pressuposto da sanção penal. Esta técnica de redacção, levou BINDING a afirmar que agente do Esta técnica legislativa fundamenta-se no princípio da reserva da lei crime, na verdade, quando pratica a conduta delitiva prevista num tipo penal, expresso no 1 do artigo 60 da Constituição: pode ser condenado por não infringia a lei penal, pois o seu comportamento se moldava perfeitamente acto não qualificado como crime no momento da sua Portanto, para que haja no tipo penal incriminador. Isto é"... se nos fixarmos na redacção dos preceitos crime, lei anterior à prática do facto que se pretende punir deverá estabelecer contidos na lei penal, veremos que a proibição está implícita, pois a forma de essa conduta como crime e, a partir dai, o Estado adquire em concreto o poder expressar os factos hipotéticos é meramente descritiva. Portanto, o delinquente de punir. não viola a lei, mas sim algo que está por cima da regra escrita; antes da lei penal Quanto às normas não incriminadoras, ou aquelas que descrevem principios sobre a e sobre ela está a norma: 0 delinquente, ao invés de transgredir a lei penal, deve, cm todo aplicação limitação das incriminadoras, teremos que. caso ao contrário, agir de conformidade com a parte dessa lei, em consonância com A técnica legislativa quanto às normas não incriminadoras é diversa. Aqui Assim, no nosso exemplo, o delinquente ao subtrait fraudulentamente o preceito imperativo, existindo, é enunciado de forma expressa e enseja a coisa que lhe não pertença, não infringe a lei penal, mas sim, segundo utilização de fórmulas abertas e não fechadas como ocorre nas normas BINDING, a realiza; pratica um facto que se molda à definição legal do crime incriminadoras. de furto: 0 criminosa viola algo que está acima da lei penal, isto é, a norma ou mandamento proibitivo não 13.2. Norma penal como elemento integrante da Lei Penal: Teoria Na óptica da teoria de BINDING, a norma penal distingue-se da lei de BINDING penal. A lei penal cria crime ou delito, descrevendo-o, ao mesmo tempo que Como vimos, em todas as normas incriminadoras existem dois preceitos, fornece ao Estado poder punitivo; já a norma penal cria o antijurídico ou o o primário e secundário. ilícito, contendo preceito de forma imperativa e precede conceitualmente a lei artigo 270 do CP diz que que cometer 0 crime de furto, subtraindo penal. É a norma que traz consigo o valor a ser protegido pela lei penal que pune fraudulentamente uma coisa que The não pertença, será punido com pena de: a) prisão até seis furto; no meses e multa até um mês Esta formulação foi objecto de lei e norma legal, porém, não há Este dispositivo contém dois preceitos. O primário "aquele que subtrair esta diferença encontrada por BINDING. Mais correcto é afirmar que a lei é a fonte da uma coisa que the não o secundário "será punido com a pena norma penal. A norma é conteúdo da lei penal. Como diz Eduardo Correia, a norma proibe de prisão até seis meses e multa até um mês ou impõe concretamente a respectiva conduta que descreve. A regra jurídica que define um 70 JESUS, E. de, Direito Penal, ob. cit., p. 16. 42 43</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) comportamento determina uma penalidade como consequência, está proibindo a conduta. Das gerais, importa analisar a generalidade da norma penal. Assim, fundamento da lei é um de comportamento, uma norma. A lei penal contém A generalidade, como é conhecida teoria geral da norma jurídica, significa uma norma, que é a proibição da conduta por ela Em "matar tal pena, que a norma penal perante todas as pessoas e tem eficácia erga omnes. Ora, está contida a norma proibitiva tem sido salientado a propósito da generalidade da norma penal seguinte problema: a quem se destina a norma penal? 13.2.1. Classificação da norma penal As normas penais não incriminadoras dirigem-se aos As normas penais podem classificar-se em: poderes públicos, nomeadamente, aos órgãos incumbidos de exercer a a) Normas penais incriminadoras: são todas as normas penais que função jurisdicional e seus auxiliares. descrevem condutas puníveis e impõem as respectivas consequências jurídicas. O problema maior levanta-se quanto às normas incriminadoras, isto é, Normalmente, estas normas encontram-se inseridas na parte especial dos as que crimes e suas penas. O entendimento sobre o destinatário Códigos Penais. São exemplos os artigos 155, 157, 159, etc. destas normas é seguinte: b) Normas penais não incriminadoras: consistem em normas penais preceito primário, que é a parte que fixa a conduta ilícita, destina- permissivas e finais, complementares ou explicativas. São permissivas as que se a todos os cidadãos; ao passo que o preceito secundário, embora determinam a não punição de certas condutas, embora sejam típicas em face das dirigindo-se a todos os cidadãos, o seu principal são os normas incriminadoras, por exemplo, artigo 32 do CP; São finais, complementares tribunais, pois são eles que aplicam as sanções previstas no preceito ou explicativas, as que esclarecem o conteúdo de outras normas ou delimitam âmbito da sua aplicação, por exemplo, as normas que constam da parte geral O problema não é assim tão simples. As normas incriminadoras dirigem- dos Códigos Penais. se a todos os cidadãos. Contudo, tem-se entendido que os inimputáveis, como c) Normas penais comuns e especiais: esta classificação respeita a os menores de dezasseis anos e os que sofrem de doença mental sem intervalos divisão Direito Penal Comum e Direito Penal Especial. lúcidos (art. 46 CP), ou os chamados alienados mentais não podem ser d) Normas penais completas e incompletas: as primeiras definem os destinatários das normas incriminadoras. crimes com todos os seus elementos constitutivos e as segundas são compostas BATTAGLINI e PETROCELLI entendem que os inimputáveis não pelas chamadas normas penais em branco (ver Infra 13.2.4). podem ser destinatários de normas penais incriminadoras, pois "com a sua função definidora dos factos puníveis e a sua força intimidativa pela ameaça da 13.2.2. Características da norma sanção, a norma penal não pode ter eficácia àqueles que não possuem plena As normas penais, integrando a categoria de normas jurídicas, cumulam capacidade de entender o carácter criminoso do facto e de de as seguintes gerais: a imperatividade, generalidade e ? acordo com esse entendimento em geral, nas legislações modernas, os Em especial, a norma penal tende a ser exclusiva, pois só ela define os menores já estão fora do Direito Penal e os deficitários e os doentes mentais, crimes e comina as respectivas penas. segundo o grau da sua inimputabilidade, estão isentos da pena. Não somente a 71 JESUS, Damásio E. de, Direito ob p. 17. 72 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, pp. 18-20. 44 45</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) pena não lhes é aplicável, a própria lei penal não pode logicamente ser Ora, podemos notar que o conteúdo de informação legalmente considerada como dirigida a classificada em confidencial, secreta e segredo de Estado não se acha no âmbito É mais acertada a crítica de GRISPIGNI ao afirmar que o Estado não do Código Penal, mas através de dispositivos legais, quer sejam actos pode de antemão saber a que sujeitos terá eficácia a norma penal; por isso, a legislativos ou actos regulamentares. Portanto, existe aqui uma a determinação cominação legal da sanção se dirige a todos, para que após a prática do facto da sanção, mas falta a definição legal do que são informações classificadas, que proibido possa ter-se em conta a individualidade própria do autor da infracção, fica a cargo de outra legislação, que confere a esta norma do artigo 374 o para se lhe aplicar, em lugar da pena, a medida de segurança carácter de norma penal em branco. A determinação da capacidade penal de cada infractor é feita pelo tribunal mediante a prova presente, não caberia à lei excluir certas categorias de 13.3. Estrutura do Código Penal pessoas pelo facto de as considerar inimputáveis. No geral, a lei destina-se a À coberto da Resolução n° 46/2010, de 28 de Dezembro, a Assembleia todos, a responsabilidade penal caso a caso. No nosso caso, um da República mandatou a Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos menor de dezasseis anos, sabendo que está fora do Direito Penal, poderia, muito Humanos e de Legalidade, Comissão, para "apresentar instrumentos adequados bem, agir em desconformidade só pelo facto estar excluído do âmbito da lei para atingir 0 desiderato da revisão do Código penal. O crime é uma conduta voluntária que é declarada punível pela lei penal. Ocorre lembrar que sistema penal tem a sua origem no Portanto, a inimputabilidade não afasta a ilicitude ou antijuridicidade da conduta, Direito colonial através do Código Penal aprovado no longínquo ano mas evita que uma pessoa sem o suficiente seja considerada de 1886, que recebeu materialmente Código de 1852, embora com algumas pessoa capaz de entender o bem do mal. alterações que foram sendo introduzidas. Portanto, a Lei 35/2014, de 31 de Dezembro, constitui um novo Código Penal e o primeiro elaborado pelo 13.2.4. Norma penal em branco Legislador Diz-se norma penal em branco ou incompleta, aquela que contém a pena Toda a sociedade moçambicana era unânime em considerar aquele determinada, contudo, a previsão ou preceito a que se liga tal consequência Código de obsoleto e desajustado para a realidade actual. Aliás, jurídica do crime não é formulado senão como proibição genérica, devendo ser desajustamento daquele instrumento é, desde logo, notório com a proclamação completado por outra lei, no sentido material, isto é, uma lei do mesmo nível ou da Independência Nacional, em 1975, momento em que várias disposições do de nível inferior. mesmo cederam perante as normas e princípios constitucionais. Por exemplo, artigo 374 do CP diz que "Aquele que fizer divulgação não Com a aprovação da Constituição de 1990, e consequente introdução do autorizada de ou informação legalmente a qualquer pais entidade Estado de Direito Democrático e de Justiça Social aumentaram-se as será punido com a pena de: a) prisão de meses a tratando-se se contestações ao Código Penal, por este não ser mais capaz de se integrar nas informação confidencial; b) prisão de dois a oito anos, tratando-se de informações secretas; c) mudanças políticas e sociais operadas. Este desajustamento acabou por afectar prisão de oito a daze anos, tratando-se de informação classificada como segredo de gozo pleno dos direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos consagrados na Constituição. 73 apud JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, p. 20. 74 JESUS, Damásio E. de, Direito p. 21. 75 Cfr. artigo 1 da Resolução supracitada. 46 47</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) O Actual Código Penal revolucionou a técnica legislativa de 1886, quanto à básica do articulado. Neste contexto, na parte especial, os crimes os princípios de privação da liberdade a finalidade das penas; contra a vida e integridade física têm preferência sobre os crimes contra património e contra Estado. a classificação das penas e medidas criminais, desde O Código Penal estrutura-se em dois Livros, com 567 artigos, as privativas de liberdade, acessórias, as medidas de antecedidos de uma Lei preambular, dedicando-se Primeiro à Parte Geral e o segurança, medidas educativas e socialmente úteis e as Segundo à Parte Especial. penas alternativas à privação da liberdade; os efeitos das penas; Assim, o Código Penal compreende: os mecanismos de aplicação das penas e medidas criminais; Uma Lei Preambular que procede à aprovação do Código e integra dispositivos que estabelecem regras atinentes ao direito a execução das e medidas criminais; intertemporal, revogando disposições de algumas leis por incorporação a extinção da responsabilidade criminal. e consagrando garantias relativas à promoção da soltura e libertação de presos, bem como a instituição do salário mínimo da Função Pública No Livro II, Parte especial, com X Títulos, destacando-se: como critério para a determinação do valor das multas decorrentes das primeiro, "Crimes contra as pessoas", com cerca de XII medidas penais e criminais previstas no Código. capítulos, aborda, no os crimes contra a vida; Relativamente ao texto do Código Penal, salientam-se, no Livro Primeiro, os crimes contra a integridade física; na Parte Geral, dois títulos: as disposições aplicáveis aos capítulos precedentes; O primeiro, com quatro capítulos, dedicado à "Criminalidade duelo e a participação em rixa; agentes do crime", compreendendo: os crimes contra a liberdade das pessoas; as disposições gerais relativas ao crime e às formas os crimes contra o estado das pessoas; do seu aparecimento; os crimes contra a liberdade sexual; a criminalidade; os crimes contra a honra; os agentes ou sujeitos do crime ou da infracção os crimes contra a reserva da vida privada, criminal; a violação de leis sobre inumações, violação de a responsabilidade túmulos; os crimes contra a saúde pública. O segundo Título, com a epígrafe "Penas, seus efeitos e medidas criminais", com oito capítulos, integrando: O Título II, "Crimes contra 0 desdobrando-se em II capítulos, sendo de realçar os crimes de: venda da terra; 48 49</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) furto, roubo e usurpação de coisa móvel; embriagues, vadiagem e mendicidade; falências, burlas e outras defraudações. lotarias, convenções ilícitas sobre fundos públicos e abusos em casas de empréstimos sobre penhores; Título III, "Crimes informáticos", com III capítulos, especulação e contrabando. destacando-se: Título VII, "Crimes praticados no exercício de funções", com II os crimes informáticos; capítulos, destacando-se: a agravação, atenuação e perda nos crimes crimes praticados pelos servidores públicos; informáticos; crimes de corrupção, peculato e concussão. os crimes relativos aos instrumentos de pagamento. Título VIII, "Falsidades", com V capítulos, dos quais se Título IV, "Crimes de perigo comum", com III capítulos, destaca: desdobrados em crimes: Falsidade de moeda, notas de bancos nacionais e de incêndios e danos; de alguns títulos do Estado; contra o ambiente; Falsificação dos escritos; de armas, caça e pesca. Falsificação dos selos, cunhas e marcas; Falso testemunho e outras falsas declarações Título V, "Crimes contra Estado", com III capítulos, perante a autoridade pública. desdobrados em: crimes contra a segurança exterior Título IX, "Provocação pública ao crime" e, por fim, crimes que ofendam os interesses do Estado em Título X, "Contravenções de relação às nações estrangeiras; crimes contra a segurança interior do Estado. 13.5. Aplicação subsidiária do Código Penal O Direito Penal não se resume ao Código Penal. Este constitui O Título VI, "Crimes contra a ordem e tranquilidade públicas", com chamado Direito Penal Geral, ou em sentido restrito, nomeadamente, a parte VII capítulos, desdobrados em: geral e a parte especial. No sentido amplo, Direito Penal é mais do que isso: reuniões criminosas; sedição e assuada; ele comporta ainda Direito Penal Especial e 0 Direito Processual Penal. injúrias contra autoridades públicas; O Direito Penal Especial é constituído por várias ramificações: 0 tirada e fugida de presos e dos que não cumprem penal internacional, 0 direito penal económico, financeiro, aduaneiro, tributário, militar, as suas condenações; maritimo, médico, de imprensa, 0 direito penal de execução de penas, etc. acolhimento de malfeitores; Estas ramificações implicam, muitas vezes, a existência de legislação ilícitos eleitorais; penal específica ou especial que rege. 50 51</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Nesta panóplia, o Código Penal constitui sempre a lei fundamental, normativos aprovados pela Assembleia da República; ao passo que os acordos constituindo-se como lei geral aplicável em caso de lacunas naqueles sectores internacionais são assumidos pelo Governo e por ele ratificados, valendo como especiais. Neste sentido, traçaremos seguinte esquema de apoio às tal, de acordo com valor jurídico dos decretos do Conselho de Ministros. sectorizações: No Direito Penal não basta que o tratado seja ratificado pela Assembleia "se a lei especial, ao incriminar tal ou tais factos, dita regras da República, para se concluir que pode ser aplicado pelo juiz particulares para a sua aplicação, em antinomia com os princípios gerais perante um caso concreto. É preciso que a Assembleia da República faça a do Código, são aquelas as aplicáveis de acordo com a regra in toto jure transposição do tratado em leis penais concretizadoras das cláusulas gerais que generi per speciem derogatur; este contém, salvo se tratado emanar normas que vinculem o Estado se se limita a prever definir ex novo uma infracção, então tem a um outro somente, dentro das chamadas relações bilaterais, de entender-se que as regras gerais do Código é que são as aplicáveis, pois neste sentido, tratado regulará questões concretas entre os cidadãos tudo se passando como se a infracção estivesse prevista e definida no desses dois países. próprio texto da sua parte Sendo um tratado genérico e multilateral, ou emanado por organismos internacionais, não há como aplicá-lo directamente pelos tribunais, pois carece 14. Princípios gerais do direito de transposição através de leis penais que possam concretizar em crimes e Os princípios gerais de direito são fontes imediatas do Direito Penal. Di- respectivas penas as respectivas injunções internacionais. lo artigo 214 da Constituição que "Nos feitos submetidos a julgamento tribunais Por exemplo, Moçambique ratificou a Convenção da ONU sobre a não podem aplicar leis ou que ofendam a Constituição". Tortura, Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, que obriga os Isto quer dizer em concreto que o tribunal, perante um caso concreto, Estados a adoptarem medidas legislativas, administrativas, judiciais ouquaisquer pode aplicar directamente uma norma ou um princípio resolvendo a outras que se afigurem eficazes para impedir que actos de tortura sejam questão posta à sua consideração. cometidos em qualquer território sob a sua jurisdição, mas os tribunais não poderão aplicar este É necessário que o legislador concretize tratado 15. Direito internacional em lei penal, que defina a tortura e imponha as devidas penas. Tal tentativa, O Direito Internacional é constituído, no ordenamento jurídico nacional, menos conseguida, foi feita pelo legislador ao estabelecer no artigo 160 do CP, pelos tratados e acordos internacionais. O Direito Internacional só vigora em a tortura como uma das formas de manifestação dos crimes hediondos. Moçambique quando validamente aprovado e ratificado, como publicado no Boletim Oficial (art. 18 da CRM). 13. Fontes indirectas do Direito Penal Os tratados são assinados pelo chefe do Estado e ratificados pela São fontes indirectas ou mediatas do Direito Penal, o costume, a Assembleia da República e, quando é assim, assumem valor dos actos jurisprudência e a doutrina. 76 SANTOS, M. Simas e HENRIQUES, M. Leal, Nações Elementares do Direito Edição revista e actualizada, Editora Rei dos Livros, 2009, p. 52. 52 53</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal (Textos de Apoio) 13.1. costume tipificados na lei penal variam conforme a zona e meio social. Determinada Diz-se costume, o conjunto de normas de comportamento a que as acção pode ser considerada lesiva da honra, à dignidade e decoro, reputação, pessoas obedecem de maneira uniforme e constante pela da sua injúria, segundo os usos e costumes, em certo ambiente, e perfeitamente normal Portanto, costume comporta dois elementos constitutivos, em outro. O caso, por exemplo, de certos comportamentos que nas cidades nomeadamente, 0 uso, como elemento que é um pratica repetida e reiterada podem ser ofensivos à integridade física ou noutros casos, o consumo de de um comportamento; e a de obrigatoriedade, como elemento subjectivo, que substâncias proibidas por lei, como canabis sativa (vulgo soruma), em certas consiste no convencimento geral da necessidade da conduta. É a opinio juris et regiões do país, esta substância é um estimulante para trabalho na machamba. necessitatis que distingue o costume do uso ou hábito, como é referido pelo artigo Portanto, costume, como elemento de interpretação, pode desempenhar certa 3.° do Código Civil. função no momento da determinação da incriminação. Quanto à relação com a lei, o costume pode ser: i) contra legem, que é aquele que consiste num comportamento que fere ou afronta por isso ilegal 13.2. A jurisprudência e inadmissível; ii) praeter legem, que é o costume que estatui para além da lei, A jurisprudência constitui um procedimento interpretativo do Direito desintegrando a lei; iii) secundum legem, que estatui conforme a lei, isto é, que se Penal, pois consiste num conjunto de decisões dos tribunais na aplicação da lei integra na lei. penal aos casos concretos a eles submetidos. Portanto, porque a jurisprudência se forma num trabalho exegético dos tribunais, no exercício da função A questão importante é saber se costume pode ser fonte do direito jurisdicional, nada repugna que seja uma fonte secundária do Direito Penal, em penal? particular, quando tais orientações constam de assentos do Tribunal Supremo, O artigo 7 do Código Penal estabelece que "1. Nenhum facto, consista em que uniformizam diversas decisões dos tribunais ou omissão, pode julgar-se criminoso, sem que uma lei anterior 0 como tal. 2. Não podem ser aplicadas medidas ou penas criminais que não estejam previstas na lei". 13.3. A doutrina Portanto, o costume, em homenagem ao princípio da reserva legal, não Constitui também a doutrina uma fonte de interpretação do Direito pode criar crimes ou delitos, nem pode determinar penas ou medidas criminais Penal, e consiste num conjunto de estudos, investigações e reflexões teóricas e em nenhum momento o nosso Código Penal a ele se refere como fonte de dos estudiosos em Direito Penal. Portanto, a communis opinio doctorum, por direito importante que seja seu autor, não é fonte do Direito Mas não podemos O costume não é considerado, de forma alguma, fonte directa nem negar o seu papel na interpretação das leis penais, ou na elaboração das mesmas, indirecta do Direito pois os limites do poder punitivo do Estado mas não passa mais do que isso. devem ser claros, mediante garantias suficientes assentes no princípio da legalidade. Mas isto não lhe impede de exercer alguma função no campo penal. Na vida quotidiana e tendo em conta a diversidade cultural os factos JESUS, Damásio E. de, Direito Penal. p. 27. 54 55</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal (Textos de Apoio) 552 que define o conceito de servidor público, etc.; também pode ser feita a posteriori através de uma nova lei interpretativa. CAPÍTULO III Sublinhe-se que os trabalhos preparatórios de uma lei (anteprojectos, INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL exposição de motivos, debates parlamentares), embora revelando a intenção do legislador, não constituem parte integrante da interpretação autêntica, são sim 14. Função da interpretação elementos históricos que integram a interpretação doutrinal, uma vez que não Toda a norma jurídica demanda interpretação para que seja aplicada. têm força normativa; não são obrigatórios; não são lei e até pode notar-se Assim, a interpretação busca esclarecer significa da norma jurídica ou antinomias com o texto legal. conceitos jurídicos através dos quais a norma se expressa. Portanto, fim da interpretação é fixar sentido da lei e, sendo disso caso, adaptar a lei às novas II. A interpretação doutrinária é a explicitação do sentido da norma necessidades e concepções dominantes na actualidade sobre alcance da norma. fornecida pela doutrina, através de escritos comentários às leis. Toda a teoria jurídica tem um efeito prático, pois nenhuma actividade prática despreza São vários critérios de recurso para a interpretação da lei. Assim, a os estudos pois reduzir-se-ia num "perigoso Em caso interpretação pode ser: i) quanto aos sujeitos; ii) quanto aos meios; iii) quanto aos de concordância de opiniões entre os doutrinadores acerca da interpretação de resultados. uma norma, essa interpretação atinge grau de certeza, ao contrário situar-nos- emos no estado de probabilidade. 15. Espécies de interpretação 15.1. Quanto aos sujeitos III. A interpretação judicial é a que é feita pelos tribunais, na aplicação da lei aos casos concretos que lhes são submetidos e não tem força obrigatória geral, A interpretação da lei quanto aos sujeitos pode ser autêntica, doutrinária senão perante processo em causa ou entre as partes envolvidas. e judicial. O caso precedente em Moçambique não tem força obrigatória geral e I. A interpretação autêntica ou legislativa é aquela que é feita pelo próprio não vincula o julgador para futuros casos a ele submetidos, pois juiz não cria autor da norma, de uma fonte de igual valor jurídico. A lei que se destina Direito. Contudo, os assentos têm certa importância: 1.° Nos termos do artigo a explicar significado de uma lei anterior designa-se por lei interpretativa, e como 2.° do Código Civil, os tribunais podem fixar, através de assentos, doutrina com doutrina expressa no n.° 1 do artigo 13.° do Código Civil, ela integra-se na lei força obrigatória geral; 2.° fixado assento, este é obrigatório para os tribunais; interpretada e tem eficácia retroactiva, embora fiquem ressalvados os efeitos já 3.° os assentos quando fixados pelo Tribunal Supremo devem ser publicados no produzidos pelo cumprimento de obrigações por sentença em Boletim da República (art. 143, 1, alínca d) da CRM). Assim, os assentos julgado. 7 servem para garantir a exacta observância e a uniforme interpretação da lei nos A interpretação autêntica pode ser feita no próprio texto da lei, através futuros casos. de enunciação de definições do âmbito de conceitos utilizados. É o caso, no Não podemos deixar de criticar este entendimento legal, pois 0 juiz não Código Penal, do artigo 13 que define o conceito de crime frustrado, artigo 78 BATTAGLINI, Giulio, 56 57</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal I (Textos de Apoio) pode criar leis ou melhor não pode se substituir ao legislador, em homenagem normativo da lei e do próprio sistema jurídico, dai se impõe a necessidade de ao princípio da separação de poderes, o que implicaria a revogação expressa do recurso à interpretação lógica. artigo do Código Civil e a eliminação do ordenamento de todas as normas que conferem doutrina com força obrigatória geral aos assentos. II. A interpretação lógica é, por natureza, uma interpretação subjectiva, o que traz consigo graves Por isso, torna-se importante o brocardo latino 15.2. Quanto aos meios "Scire leges non est verba earum tenere sed vim ac Procura-se agora a O Código Civil, no artigo 9.°, reza o seguinte sobre a interpretação: "1. vontade da lei ou a intenção objectivada na lei pelo legislador, isto é, busca-se A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos pensamento e a vontade da lei, através dos seguintes elementos: pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as a) elemento sistemático: assenta no que Direito positivo oferece ordem e circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que é aplicada. sistema dentro dele e, então, nenhum dispositivo legal vive isolado, mas sim em 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete pensamento legislativo que não tenha na conexão com outros artigos, secções, capítulos, títulos, partes e livros e com letra da lei um minimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na todo o sistema jurídico. Mas a confrontação deve ser feita com dispositivos que fixação do sentido e alcance da lei, 0 presumirá que legislador consagrous as soluções tenham relação com o objecto da lide, portanto, é um critério que deve ser mais acertadas e soube exprimir 0 seu pensamento em termos adequados". utilizado com muita cautela. Conforme esta norma a interpretação pode i) gramatical, literal ou b) a ratio legis ou 0 elemento finalistico, que se alcança pela finalidade ou sintáctica (1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei) ; ii) lógica ou teleológica escopo prático da norma. Em Direito penal, "o juiz deve não somente (mas reconstituir a partir dos textos pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a determinar quais os bens e interesses (valores éticos, ...) que o legislador unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições entendeu tutelar penalmente, como também fixar, em concreto, os limites de específicas do tempo em que é aplicada). aplicação de determinado texto, relativamente à sua Ora, o intérprete pode utilizar vários elementos de interpretação lógica, Este elemento impõe que a jurisprudência dos conceitos se integre na nomeadamente, elemento histórico, sistemático, extrajurídicos, etc. jurisprudência dos interesses. I. A interpretação gramatical é a forma menos subjectiva na interpretação da A ratio legis não pode ser confundida com a occasio legis, pois esta consiste lei e consiste basicamente na extracção do conteúdo e do sentido da lei a partir nos motivos ocasionais que estiveram por detrás da elaboração da lei. das próprias palavras que o dispositivo emprega. Isto é, em primeiro lugar, deve c) 0 elemento pois o Direito Penal é fruto de uma longa evolução apelar-se às próprias palavras que foram utilizadas para a construção frásica histórica, e a norma jurídica penal não surge por mero acaso, é resultado de uma segundo a sua Portanto, apela-se a lingua, pois "a lingua é para um povo o rosto é para indivíduo; espelha o conjunto característico e intérprete deve procurar a origem da norma, seguir o seu desenvolvimento inconfundível de disposições, sentimentos, ideias que diferenciam uma histórico, as modificações que sofreu, antes de examiná-la no momento colectividade nacional de presente. É normal, neste caso, recurso aos trabalhos preparatórios, as A interpretação gramatical não deve abster-se da visão de todo o sistema Saber a lei não é reter suas palavras, mas sua força e seu poder. 79 BATTAGLINI, Giulio, p. 54. BATTAGLINI, Giulio, Direito p. 55. 58 59</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal 1 (Textos de Apoio) exposições de motivos, os anteprojectos até ao projecto final, bem como aos anos, agravado nos termos do artigo 118, quando dessa tortura resultar a morte debates parlamentares havidos. da vítima. É caso do crime de bigamia, conceito de casamento é restrito, não d) elemento comparativo, isto a direito comparado, em que o intérprete faz a inclui uniões de facto, nem casamento tradicional ou religioso não na comparação do texto que interpreta com os ordenamentos estrangeiros do Conservatória de Civil (art. 206). mesmo sistema, apoiando-se na doutrina e na jurisprudência desses países. III. A interpretação extensiva. Existe quando implica a ampliação, e) 0 elemento que consiste na análise virada para elementos ultrapassando a letra do texto da lei, a fim de fazê-lo corresponder à vontade político-sociais, onde se faz a pesquisa de elementos políticos, sociais, real do legislador. O legislador disse menos do que pretendia. O artigo 269 do económicos e geográficos que poderão ter influenciado na elaboração da norma. Às vezes, faz-se recurso a outras ciências que não jurídicas para a compreensão Código Penal diz que "Aquele que, arrogando-se de proprietário ou titular, vender, ou por qualquer outra forma alienar, hipotecar ou penhorar a terra do fenómeno jurídico. São exemplos no Código Penal a compreensão do que seja doença mental, intervalos lúcidos, etc. termo proprietário deve ser entendido como qualquer titular do DUAT ou legítimo titular por direito consuetudinário. A interpretação extensiva não é admissível em Direito Penal 15.3. Quanto aos resultados relativamente à qualificação de factos como crime, sendo sempre necessário que A interpretação quanto aos resultados pode ser declarativa, restritiva e se verifiquem os elementos essencialmente constitutivos do facto criminoso que extensiva. a lei criminal declarar. I. A interpretação declarativa consiste em sanar a dúvida ao encontrar a correspondência exacta entre da lei e suas palavras, sem necessidade 16. Ponto de situação do problema da interpretação no Código de conferir à fórmula um sentido mais restrito ou mais amplo e sem contestar a Penal. problema da analogia propriedade da locução. Exemplo, agrava a pena, a circunstância de'o crime ter Enquanto a interpretação da lei visa esclarecer sentido da lei, em certas sido cometido "na casa de habitação do agente, quando não haja provocação do condições, adaptá-la às novas necessidades, a analogia, ao contrário, visa ofendido" (art. 37, alínea p). O intérprete que afirmar que não agrava a pena preenchimento ou integração de lacunas legais através do alargamento e facto de crime ter sido cometido na viatura do agente, estará a fazer a interpretação declaratória. posterior desenvolvimento de uma disposição jurídica. Isto é, uma nova criação do Direito, em face de omissões, cuja solução se alcança com a aplicação do II. A interpretação restritiva consiste na diminuição do alcance da locução caso ou das palavras da lei, reputando-se que pensamento da lei não permite que Estabelece o artigo 9 do Código Penal que "Não é admissível a analogia ou se atribua à letra todo sentido que a mesma poderia ter. Aqui, legislador disse mais do que pretendia, restringir seu sentido e alcance. Exemplo, diz indução por paridade, maioria de razão, para qualificar facto como crime, sendo sempre necessário que se verifiquem elementos essencialmente constitutivos do facto criminoso, que a o artigo 160, 2 que "os crimes hediondos compreendem: i) tortura, quando agente sofrimento físico ou psicológico por crueldade, intimidação, punição para obter uma confissão, informação ou simplesmente por prazer". que a analogia scja permitida no Direito é preciso que ocorra i) que facto considerado não tenha sido regulado pelo legislador; ii) o legislador, no entanto, regulou situação que oferece relação decoincidência, Deve entender-se que só é aplicável a pena de prisão de vinte a vinte e quatro de identidade com caso não regulado; iii) o ponto comum às duas situações (a regulada e a omissa) constitui o ponto determinante na implantação do referente à situação considerada pelo iv) que haja compatibilidade entre os fins prosseguidos pelas 60 61</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal 1 (Textos de Apoio) lei criminal do Direito Civil e não penal. No Direito Penal vigoram os princípios da reserva legal e da tipicidade Quanto à da proibição da indução por paridade, ou maioria de razão. em relação aos preceitos primários e secundários das normas incriminadoras ou Pense-se no seguinte dispositivo normativo penal: "Aquele que constranger alguém, definidoras das condutas puníveis e respectivas Portanto, a analogia não mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho será punido com prisão pode criar novas figuras delitivas não previstas expressamente no Código Penal até seis meses". ou pena que legislador não haja determinado. Ora, a questão é a seguinte: Imagine que "B" constrangeu "C" a não Comecemos com exemplo de proibição de analogia e depois da celebrar contrato de trabalho por grave ameaça. É possível punir "B" com proibição da indução por paridade, ou maioria de razão. recurso à norma anterior? Imagine-se que "A" cria pássaros para vendê-los aos interessados. Num Note-se que a lei omite a hipótese de constrangimento para "não belo dia "X" visita "A" doente, só que, "X" acha que os pássaros passavam celebrar" contrato. Por paridade ou maioria de razão este facto deve ser por estarem engaiolados e liberta-os, pois pertencem à natureza. Ora, enquadrado na norma anterior, mas apesar da igualdade de razão para incluir comportamento de "X" pode ser considerado como furto ou dano (artigos 270 este aspecto no preceito primário da norma anterior, caso não pode ser e 347, respectivamente), por força de aplicação analógica destes dispositivos? enquadrado naquela definição legal, porque violaria o artigo 9 que proíbe este Para "X", os eram coisas móveis alheias, pois pertenciam ao mecanismo de integração da lei. círculo patrimonial de "A". Mas para dizer que é furto, nos termos do artigo Em conclusão, como reconhece a Professora Teresa BELEZA "o direito 270 do CP, falta aqui um elemento essencial que é "subtrair fraudulentamente penal é, neste sentido, um sistema fechado; as suas situações devem ser uma o que significa que rompimento da posse alheia com rigorosamente limitadas a certos casos que a lei prevê e, ao contrário do que violência. Ora, será possível integrar o comportamento de "X" no crime de acontece no direito civil, não tem a pretensão de abranger situações que estão, dano, nos termos do artigo 347? Diz essa norma que "Fora dos cgsos especificados digamos assim, entre espaço preenchido por essas várias incriminações. E neste todos danos causados voluntariamente em propriedade alheia móvel ou imóvel, nesse sentido se pode dizer: 0 direito penal não tem lacunas, isto é 0 direito penal não serão punidos com pena de prisão até seis meses". tem lacunas que possam ser integradas processos normalmente admitidos em direito, Neste caso, podem pontificar-se duas i) a de que se trata de concretamente contidos no art. do Código uma pura privação da posse de "A", e não enquadrável no artigo 347; outra Está assente que a analogia deve ser negada, nos termos do artigo 9 do pode ser a de que se trata do crime de dano, pois a atitude de "X" provocou CP, para as seguintes situações (analogia in malam partem): prejuízos na esfera de "A", pois causar danos não implica necessariamente para qualificar factos como crimes a proibição resulta do "destruir", mas inclui toda a privação do uso finalístico do objecto determinado da tipicidade como do princípio da legalidade; pelo titular. segundo qual os factos que constituem crime e as devidas A primeira opinião é a acertada, a de que, na verdade, "X" não cometeu consequências jurídicas devem ser determinados previamente por lei e nenhum crime, pois não se tratou de ou "danificar" bem nenhum, somente cabe a ela a sua definição; pelo princípio da proibição da analogia. "X" responderá no foro civil, através para determinar as consequências jurídicas do crime, nomeadamente Ver WESSELS, Johannes, p. 15. PIZARRO, Teresa Beleza, Direito Penal, ob. 86-88. 62 63</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal 1 (Textos de Apoio) penas, medidas de segurança, medidas educativas e socialmente úteis; 2.° admitir que seja resolvida contra agente ou contra a sociedade, para certas situações de normas que constam da parte geral do Código segundo livre convencimento do intérprete; Penal e que constituem alargamentos da punibilidade de comportamentos previstos 3.° resolver a questão da forma mais favorável ao agente. Em outros como crimes na parte especial. São exemplos dessas normas as que qualificam termos, se a vontade da lei não se torna nítida, se não chegar 0 juiz a saber se a lei quis isso actos de execução, preparatórios, a tentativa, agravantes, etc.; ou aquilo, se nem ao menos determinar que ela pretendeu, deverá seguir a para definir um estado de perigosidade do agente; interpretação mais favorável ao réu (desde que usados todos os meios para situações em que a sua aplicação implique a agravação da responsabilidade do agente. Já CORREIA entende que "a liberdade é a regra e a limitação a excepção Portanto, a analogia no direito penal confronta-se naturalmente com o (o que) poderá permitir, quando uma das interpretações conduza a limitar a princípio da tipicidade, o qual limita e afasta-a. Todavia, nada repugna que a liberdade, que se renuncie a essa benefício da outra. (...). E quando analogia seja aplicada, fora dos casos apontados, enquanto benefício atribuído nenhuma das interpretações conduza a uma limitação da liberdade? Há então ao agente quando as circunstâncias forem semelhantes a outras geradoras desse um único caminho a seguir, que é de dar valor à interpretação que melhor mesmo benefício, a chamada analogia in bonam corresponda à justiça Nesta hipótese, sempre haverá lugar para um certo subjectivismo (...9 decidindo, no fim de contas, a visão concreta do 17. A interpretação da lei penal e o princípio "in dubio pro reo" Em conclusão, é preciso notar que a adopção de um dos deve Em que medida é eficaz o princípio in dubio pro reo em sede da ser nos casos de dúvida insanável entre as possíveis interpretações, podendo o interpretação da lei penal? juiz optar pela via da aplicação do princípio in dubio pro reo, pois a limitação da Primeiro, conteúdo do princípio. O princípio in dubio pro significa liberdade constitui uma excepção e a liberdade a regra. Trata-se do que intérprete, em caso de dúvida, deve seguir aquela interpretação que mais reconhecimento do princípio de que a lei penal deve ser interpretada favoreça ao réu. restritivamente quando seja prejudicial ao réu e extensivamente, quando a ele Como se vê, o princípio tem catiz processual e não substantivo e tem favorável (favorabilia sunt amplianda, odiosa sunt restringenda). relação com princípio da presunção da inocência (art. 59, 2 da CRM). A eficácia deste princípio em sede da interpretação do direito penal prende-se com a resposta à questão de saber que juiz deve fazer, depois de realizado todo trabalho hermenêutico, quando a dúvida persistir quanto à vontade da norma? São três os caminhos propostos por admitir que a dúvida deva ser resolvida contra agente (in dubio pro societate); 85 PUIG, Santiago Mir, Derecho pp. 120-121. JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, 44-45. CORREIA, Eduardo, Direito Criminal. 150-151. 64 65</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) prática de um facto só levado a cabo pela convicção de que era Isto criaria, como bem se compreende, a maior intranquilidade e liga-se ao próprio princípio da segurança jurídica dos cidadãos e constitui a garantia do próprio CAPÍTULO IV delinquente em face do poder punitivo estatal. ÂMBITO DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL Este princípio quer significar que facto criminoso deverá ser punido pela vigente no momento da sua prática, ao contrário seria negar dispositivo constitucional do 1 do artigo 60, que é, na verdade, a tradução do princípio SECÇÃO I nullum crimen sine lege, nulla sine lege. NO TEMPO A não retroactividade tem seu âmbito de aplicação no Direito Penal, nomeadamente é proibida a retroactividade da relativamente a todos os A matéria da aplicação da lei no tempo é disciplinada pelo artigo 60 da elementos da punibilidade, à limitação de causas de justificação, de exclusão ou Constituição e desenvolvido pelo artigo 8 do Código Penal É a de diminuição da culpa e às consequências jurídica do crime, qualquer que seja partir deles que traçaremos a respectiva disciplina jurídica, com apoio da a sua espécie (penas, medidas de segurança, consequências doutrina. 18.2. Não ultra-actividade da lei penal 18. Princípio da não extra-actividade Esta regra significa que um facto que não seja previsto como crime por O princípio da não extra-actividade da lei penal compreende duas lei posterior não poderá ser punido com base em lei precedente, uma vez que situações de importante que constituem o desenvolvimento da regra esta não é Isto é, ninguém poderá ser punido por facto que a lei tempus regit actum. i) a não retroactividade da lei penal e ii) a não da lei nova deixa de o considerar crime, só pelo facto de que a lei anterior penal. considerava crime, pois esta, a lei anterior, não é ultra-activa 1 do art. 60 da CRM). 18.1. Não retroactividade da lei penal Por isso, quando a nova lei elimina um facto como crime (descriminaliza), Não fugindo à regra geral do 1 do artigo do Código Civil sobre deverão ficar sustados a execução e os efeitos penais da condenação por ventura a aplicação da lei no tempo, veio 1 do artigo 8 do Código Penal estabelecer ocorrida. Assim, no Direito Penal é destruída a sentença com força de caso o princípio de que "A lei criminal não tem efeito ...". julgado, diferente do que ocorre no Direito Civil. Este enunciado liga-se ao 1 do artigo 60 da Constituição, segundo qual ninguém pode ser condenado por acto não qualificado como crime no momento da sua prática, isto é, o princípio crimen sine lege, nulla poena sine Trata-se, como quer Eduardo CORREIA, de defender o indivíduo Eduardo, Direito p. 153. do próprio legislador, que poderia, através de uma nova incriminação, in punir a FIGUEIREDO DIAS, Jorge, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, ed., impressão), Coimbra, 2011, p. 196. BATTAGLINI, Giulio, Penal, ob p. 74. 66 67</p><p>Direito Penal (Textos de Direito Penal (Textos de Apoio) 19. Excepção. A aplicação retroactiva da lei penal. Consequências SC suprime a concessibilidade de extradição". Prescreve 2 do artigo 60 da Constituição que "A lei penal só se aplica retroactivamente quando disso resultar beneficio ao arguido". O 1 do artigo 8 do Código Penal enuncia um conjunto de excepções A regra da não retroactividade da lei penal funciona simplesmente ao princípio da não retroactividade da lei penal, cuja sede se encontra nos quando a nova lei for mais severa, admitindo-se, no âmbito do direito transitório subsequentes números 2 a 6. Vamos analisá-las: e intertemporal, a aplicação retroactiva da lei mais benéfica ao agente do crime. I. Eliminação de preceitos incriminadores pela nova lei. Diz Uma lei posterior será favorável ao agente do crime que "A infracção punível por lei vigente, ao tempo em que foi cometida, deixa de 0 ser se uma "a pena cominada na lei posterior ao crime é, quanto à sua lei nova a eliminar do número das infracções". Portanto, se a nova lei deixou de natureza, mais branda que a da lei anterior; criminalizar um facto, seria injusto sujeitar à responsabilidade o seu autor. Trata- a pena actual, embora da mesma natureza, é menos rigorosa se da revogação pelo legislador de tipos penais anteriores c, assim sendo, esses quanto ao modo de execução; crimes já não são e ninguém poderá ser acusado por praticar que era crime quantum da pena in abstracto é reduzido ou, mantido esse à face de uma lei revogada. quantum, critério da sua medida in concreto é menos rigoroso que o da lei Neste caso, porque eliminada a norma incriminadora do ordenamento anterior; jurídico, importa as seguintes consequências: há circunstâncias, alheias à lei anterior, que influem todas as condenações, transitadas ou não em julgado, em face da lei favoravelmente na graduação ou medida da pena (atenuantes, causas de anterior revogada cessam a ficando extintas a respectiva pena e seus efeitos: especial diminuição de pena ou condições de menor punibilidade ou que desrespeita-se caso julgado. suprimem agravantes ou majorantes (qualificativas, causas de especial É a regra que resulta do 3 do artigo 8 do CP. "Tendo bavido já condenação aumento de pena ou de maior punibilidade); transitada em julgado, fica extinta a pena, tenha ou não começado 0 seu cumprimento". Esta se instituem benefícios (no sentido da eliminação, suspensão regra fala de condenação transitada em julgado, porque se trata do mal maior, ab initio ou interrupção da execução da pena) desconhecidos na pretérita, deve entender-se como fizemos ao enunciar a consequência anterior, que ou se facilita a sua obtenção; ficam extintas também as condenações não transitadas em julgado. criam causas extintivas de punibilidade ou se torna mais fácil a Esta norma pode ser alargada para outros campos, sua obtenção; Imputabilidade: se uma nova lei passar a exigir certos se estabelecem condições de procedibilidade que a lei anterior requisitados de imputabilidade deve ser aplicada retroactivamente, pois não exigia; da sua aplicação pode resultar a exclusão da incriminação. É 0 caso do aumentam as causas de irresponsabilidade penal, de isenção de novo artigo 46, que veio a fixar nova idade para subindo pena, de exclusão de crime ou de culpabilidade; para 16 anos dos anteriores 12 anos. Ora, inversamente, se a nova lei não se excluem ou atenuam penas acessórias; 91 SANTOS, M. Simas e HENRIQUES, M. Leal, ob pp. 29-30. 92 CORREIA, Eduardo, Direito ob 161-163 e SANTOS, Simas e HENRIQUES, M. Leal, pp. 31-36. 68 69</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) exigisse nenhum requisito para a imputação, não deverá ser aplicada as disposições do novo Código, desde que, concretamente, se mostrem pois corresponderia a uma nova incriminação. mais favoráveis ao sujeito da medida. Não poderá razoavelmente Circunstâncias atenuantes e agravantes: se a nova lei fixar novas invocar-se, aqui, efeito impeditivo do caso julgado, porquanto este se atenuantes ou eliminar certas agravantes, esta deverá ser aplicada refere à estabilidade da decisão mas não às condições em que é executada, retroactivamente, pois resultará uma vantagem para o agente, atenuando- sendo certo que a própria lei vigente já admite, por exemplo, que o se a pena. Ora, se esta fixar uma nova agravante, não deverá ser aplicada, internamento finde quando tribunal verificar que cessou estado de pois piora a situação do delinquente. perigosidade que lhe deu Prazos de prescrição: a prescrição é um facto que extingue a ou o procedimento penal pelo decurso de um lapso de tempo. Ora, a II. Hipóteses de modificação das penas ou medidas de segurança. nova lei não pode afectar uma prescrição já adquirida no domínio da lei Estabelece o 4 que "Quando a pena estabelecida na lei vigente ao tempo em que é anterior, pois constitui uma garantia do delinquente contra o poder praticada a infracção for diversa da estabelecida em leis posteriores, é sempre aplicado 0 regime punitivo do Estado. As leis de prescrição do procedimento e da pena, que, concretamente, se mostrar mais favorável ao agente do crime, mesmo que já tenha bavido porque afectam direitos do cidadão, quando traduzirem concretamente condenação com sentença transitada em um regime mais favorável em relação às anteriores deverão ser aplicadas, Esta norma precisa de ser desfeita em vários enunciados para a sua como também se forem desfavoráveis não serão aplicadas. compreensão. Quando se afirma que a pena estabelecida seja diversa da consagrada em Se os prazos da prescrição são encurtados, ou alongados, a lei nova deve leis posteriores, isto quer dizer o seguinte: ser aplicada segundo a doutrina estabelecida no artigo 297.° do Código Civil: "1. a) Que a lei nova pode cominar pena ou medida de segurança mais leve que a lei A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que a fixado na lei anterior anterior. Neste caso, tenha havido ou não condenação transitada em julgado, a é também aplicável aos prazos que já estiverem em mas 0 prazo so se conta a partir da pena ou medida de segurança que consta da lei nova deverá ser aplicada entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para 0 obrigatoriamente, por ser mais favorável ao arguido. Se processo ainda não prazo se completar. 2. A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos foi julgado, é lógico que a lei nova será aplicada, pois julgamento coincidirá que já estejam em curso, mas neles todo 0 tempo decorrido desde 0 momento com a sua vigência. b) Que a lei nova pode cominar pena ou medida de segurança mais grave que a lei Medidas de segurança: as medidas de segurança fundam-se no antiga ou anterior. Neste caso deve ser aplicada a lei antiga, que é a lei que estava estade de do indivíduo; visam combater potencial da do indivíduo, como a probabilidade de delinquir. A lei nova não deve ser aplicada, nem o caso julgado deve ser destruído, ele disciplina geral aceite é a da aplicação imediata da nova lei penal. mantém-se intangível. Contudo, se a medida de segurança foi decretada pelo juiz ao abrigo da lei antiga e a nova lei a mantém, embora com pressupostos não coincidentes, parece "deverem aplicar-se, neste caso, retroactivamente, 93 LOPES ROCHA, Aplicação da Lei Criminal apud SANTOS, M. Simas e HENRIQUES, M. Leal, 32. 70 71</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) c) A aplicação do regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente. que tal indemnização já não é devida por aquela condenação. Claro, conforme Portanto, tal regime será materializado em concreto pelo juiz um caso o estatuído neste número 5, agente não reaverá o valor pago a título de concreto. Por exemplo, uma nova lei pode eliminar a pena de prisão, indemnização apesar de a lei nova ser favorável a ele, pois estamos em sede de substituindo-a por uma multa bem elevada. Neste caso, o regime mais favorável, direitos de terceiros, legalmente salvaguardados por esta norma. em concreto, será aplicar a multa nem que seja elevada, do que a privação da Se a nova lei estabelecer efeitos mais severos que da lei anterior, deve liberdade. Trata-se de hierarquização dos valores fundamentais, onde a entender-se que só se aplica para os casos futuros, que forem cometidos no liberdade deve prevalecer como regra, não podendo ser posta em causa por âmbito da sua vigência. a insuficiência económica. Ora, a situação pode complicar-se nos casos em que a lei admite que a IV. A ultra-actividade das leis temporárias e excepcionais. O 6 pena aplicada seja medida ou pena alternativa à pena de prisão (art. 88 e 89 do do CP dispõe que "Os factos praticados na vigência de uma lei temporária são por ela CP). Nestes casos, porque nenhuma das duas limita a liberdade, o juiz, tendo julgados, salvo se legalmente se dispuser 0 em conta as circunstâncias em concreto do caso e da situação económica do delinquente, optará por aquela que melhor se adeque à finalidade do acordo O dispositivo trata apenas de leis temporárias, mas vamos incluir as leis excepcionais por terem regime idêntico, e, na verdade, uma lei excepcional é judicial havido entre réu e a vítima e menos gravosa se revelar para criminoso 104). também temporária. Ora, vejamos. São leis temporárias as que possuem vigência previamente fixada pelo legislador, isto é, legislador diz que a lei vigorará até certa data. E são III. Sobre a modificação dos efeitos das penas pela lei Diz excepcionais, as leis penais promulgadas na sequência de decretação de estados 5 que "As disposições da lei sobre as efeitos da pena têm efeito retroactivo, em tudo quanto seja favorável ao agente do crime, ainda que este esteja condenado por transitada em de emergência ou de sítio, de guerra, ou revoluções e outros fenómenos que julgado, ao tempo da promulgação da mesma lei, salvo direitos de terceiros" perturbam a ordem pública. Estas leis só se aplicam aos factos verificados durante a sua vigência, Os efeitos das penas são as consequências secundárias que resultam da mesmo depois de terem cessado ou auto-revogados. Por isso, são ultra-activas condenação a certas categorias de penas, e podem ser não penais (art. 106) e pois se aplicam mesmo depois de terem cessado a sua vigência, desde que os penais. Os efeitos das penas têm lugar em virtude da lei, independentemente da declaração na sentença condenatória (art. 109 do CP). factos em causa se reportem ou tenham sido praticados durante a sua vigência. A disciplina nesta matéria sobre a sucessão de leis é simples e consiste A disciplina que se estabelece sobre elas é a de que os factos praticados na vigência dessas leis temporárias e excepcionais continuam a ser julgados por no que se a lei nova tem efeitos retroactivos se as suas prescrições sobre os efeitos das penas forem favoráveis ao agente, tenha ou não transitado em essas leis, nem que tenham cessado automaticamente de vigorar, salvo se uma julgado a sentença condenatória, no tempo da promulgação da lei e sua entrada lei dispuser em contrário. O objectivo fundamental desta doutrina é a de "impedir que, tratando-se de leis previamente limitadas no tempo, possam ser em vigor, excepcionados os direitos de terceiros. Isto é, por exemplo, imaginemos que no momento da condenação, agente foi sujeito ao pagamento frustradas as suas sanções por expedientes astuciosos no sentido de de uma indemnização ao ofendido pelos danos causados e a nova lei vem dizer retardamento dos processos 94 JESUS, Damásio de, Direito p. 96. 72 73</p><p>Direito Penal I (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) 20. Tempo da prática da infracção Faz sentido a adopção da teoria da actividade, pois se a acção do agente O estudo do âmbito da aplicação da lei penal no tempo implica a é ilícita no momento da sua prática, ilícito será o seu resultado, nem que ocorra determinação do momento da prática do crime, com vista a fixar a lei aplicável perante a vigência da nova lei, salvo se a nova lei vier a suprimir a conduta como e os pressupostos de imputabilidade. O tema ganha maior relevo quanto aos crime e a teoria de ubiquidade peca pelo facto de não ser possível considerar um crimes continuado, permanente e habituais, pois após realizada a actividade facto cometido sob a vigência de duas leis diferentes, ao mesmo tempo. delitiva e antes de produzido o resultado típico, pode surgir uma nova lei alterando a legislação anterior que regulava a matéria. Ora, a questão que se deve Alguns exemplos interessantes sobre a resolver é a de saber qual é a lei aplicável: a do tempo da actividade a lei em vigor Imagine-se que "A", de 15 anos, fere com golpes de catana "B", que fica no momento da produção do resultado? internado. Contudo "B" vem a falecer por efeito desses golpes dois anos mais tarde, depois de "A" atingir a maioridade penal. Será "A" punível por este facto? A doutrina avança três teorias para solucionar o problema. A resposta é negativa, pois no momento da prática da acção "A" era inimputável I. A teoria da actividade diz que se deve atender o momento e o lugar da absolutamente (art. 46). Portanto, é esta a teoria que vinga, a de actividade. prática da acção ou da omissão do dever jurídico. Por exemplo, nos crimes segundo exemplo, seria se "A", agora de 25 anos, matasse "B", só que contra a honra, violação do segredo profissional e burlas. No caso de burla, no momento do seu julgamento se encontrar incapacitado por doença mental, aplica-se, em princípio, a lei em vigor no momento em que agente finge ser claro que será internado, mas processo ficará suspenso até que retome as suas senhor da coisa, ou que induz ou mantém alguém em erro. faculdades mentais para responder pelo crime, pois a acção teve lugar numa II. A teoria do resultado ou de evento, que manda considerar praticado o crime situação normal de imputabilidade de "A". no momento e lugar da produção do resultado ou evento. No crime de homicídio, por exemplo, que é crime material, momento da do crime 20.1. Aplicação da teoria da actividade em alguns casos especiais é da verificação da morte, e não da prática de actos de execução. Fixaremos a nossa atenção aos crimes continuado, permanentes e III. A teoria mista ou de ubiquidade, o tempus delicti é, indiferentemente, habituais. momento da acção ou do resultado. Isto é, é tanto o momento da realização da I. Quanto ao crime continuado. Nos termos do 1 do artigo 42, "Constitui acção, quanto momento da verificação do resultado. crime continuado as várias condutas do mesmo agente que violem a mesma norma ou normas O nosso Código Penal não tomou uma posição expressa sobre este facto. diferentes que tutelem 0 mesmo bem jurídico ou bens jurídicos de idêntica natureza que, pelas Mas da leitura do artigo 2, que diz "Salvo se outra for a intenção da lei, 0 crime condições de tempo, lugar e maneira de execução, as subsequentes se possam considerar como ou delito não punição da acção adequada a produzir resultado tipico, mas tambem mera continuação das anteriores". O crime pela sua disciplina de omissão da adequada a é possível a seguinte regra: facto aplicação da pena, constitui váries crimes, contudo, unificados juridicamente considera-se praticado no momento em que 0 agente actuou (acção) ou deveria ter actuado (omissão)", o que faz com que o resultado não tenha influência na determinação do tempus delicti, o que nos faz presumir que se adoptou a teoria da actividade. 95 Cfr. JESUS, Damásio E. de, Penal, ob. p. 105. 96 SILVA, Germano Marques da, Direito Penal Parte Geral I (Introdução e Teoria da Lei Penal), ed., revista, editorial Verbo, 2001, p. 294. 74 75</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) para a punição, nos termos do artigo 128. O artigo 128 diz que "1. crime IV. Quanto aos crimes habituais. São habituais os crimes que exigem uma continuado é com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação". reiteração na actuação criminosa que revele uma tendência ou inclinação da a solução consistirá em o intérprete se fixar na conduta mais vontade para a prática de determinados como sucede com a grave. prostituição ou crimes de maus tratos. "Se a lei vigente (ou posterior) for mais severa Sendo a nova lei mais favorável que a anterior, quanto à conduta mais do que a lei em vigor à data em que se a sucessão de actos reveladores da habitualidade, grave, esta deve ser aplicada retroactivamente, pois é a mais favorável porque é aquela a aplicável, já que nenhuma razão, quer de justiça, quer de protecção do agente se diminui a responsabilidade. Sendo inversa a situação, a lei aplicável será a da pode invocar, na medida em que aquele sabia que, continuando a prática sucessiva de actos prática do facto mais grave. criminosos já no dominio da lei nova, cairia sob a alcada das sanções cominadas nesta. Se, Contudo, existem outros entendimentos, os quais não sufragamos, que pelo contrário, a lei nova for mais benévola nenbum problema se consideram crime continuado como um comportamento 21. Conflito aparente de normas penais aplicáveis a um II. Quanto crime permanente. Este consiste numa só acção ou omissão, cuja consumação se prolonga por um tempo mais longo e, enquanto dura essa Perante um caso concreto, o juiz, às vezes, confronta-se com duas permanência, agente encontra-se no estado de flagrante delito. É caso do normas penais aparentemente aplicáveis ao crime de cárcere privado art. 200. Por exemplo, suponha-se que "A", vizinho de "B", viu este adquirir um A lei aplicável ao crime permanente é a que estiver em vigor no momento televisor "top de gama" para a sua sala. "A" pretende subtrair fraudulentamente da permanência do crime, independentemente de ser gravosa ou branda, pois o televisor. De facto, na noite seguinte, "A" arromba a porta da casa de "B", só em "cada momento da permanência ocorre a intenção de o agente continuar a que, depois de subtrair o aparelho, "B" aparece-lhe à frente, gritando pelo nome prática Isto é, "nos crimes cuja execução se prolonga no tempo, se de "A", este atira mortalmente no "B". durante seu decurso surgir uma lei nova, ainda que mais gravosa, é esta a lei Ora, qual é a norma penal que pune a conduta de "A" das duas (furto e aplicável a todo comportamento, uma vez que não é possível distinguir partes homicídio)? do Diz o artigo 157, 1, alínea c), sobre homicídio qualificado, que "Será punido com pena de prisão maior de vinte a vinte e quatro anos 0 crime de voluntário III. Quanto aos crimes contra 0 estado das pessoas. O tempo da prática da declarado no artigo 155 quando concorrer qualquer das circunstâncias seguintes: c) a mesmo infracção é aquele em que esse estado ocorre. Por exemplo, na bigamia, o tempo crime tiver por objecto preparar ou facilitar ou executar qualquer outro crime ou assegurar a do crime é de surgimento do segundo casamento. sua impunidade". Doutra banda, o artigo 282 diz, sobre roubo concorrendo com o crime de homicídio, que "Quando 0 roubo for cometido ou tentado, concorrendo 0 crime será aplicada aos criminosos a pena de prisão maior de vinte a vinte e quatro anos". 97 Ver FERREIRA, Manuel Cavalciro de, Penal 123; SANTOS, Simas e HENRIQUES, Leal, p. 36; JESUS, Damásio E. de, Direito p. 104. Vide para mais SANTOS, M. Simas e HENRIQUES, M. Leal, p. 34. 99 SILVA, Germano Marques da, Direito Penal..., cit., p. 295. 101 SANTOS, M. Simas e HENRIQUES, M. Leal, p. 35. 102 JESUS, Damásio E. de, pp. 107-119. 76 77</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) Pela conexão teológica, a acção de "A" enquadra-se no crime de homicídio é geral em relação as que definem os crimes de infanticídio e homicídio, pois "A" mata "B" para executar crime de roubo e, igualmente, assegurar a sua impunidade. No nosso exemplo, "A" matou "B" para executar o crime de roubo e Por outro, o facto conecta-se com roubo concorrendo com o assegurar a sua impunidade, dado que "B" conhecia, eliminando-o evita que homicídio. seja denunciado. Portanto, em relação ao roubo concorrendo com homicídio, Quanto aos resultados, estes são os mesmos nas duas normas: pena de o crime de homicídio qualificado é especial, pelos seus elementos qualificadores. vinte a vinte e quatro Existindo duas normas a descrever mesmo facto, a questão que se II. Principio da Haverá subsidiariedade entre normas penais, mantém é qual é a norma aplicável? quando descrevem graus de violação do mesmo bem jurídico, de forma que a Surge, então, o chamado concurso ou conflito aparente ou fictício de infracção definida pela subsidiária, de menor gravidade que a da principal, é normas penais aplicáveis a um caso. É na verdade aparente porque uma norma absorvida por esta: Lex primaria derogat subsidiariae. Eis o exemplo: artigo 173 é que será aplicável ao caso, e a ordem jurídica penal fornece a solução, pois se "Ofensas corporais de que resulta a morte por circunstância acidental" é não fornecesse estaríamos perante um concurso real negativo. subsidiária do artigo 155 "Crime de homicídio". Como se vê, não há sucessão de normas no tempo, que existe é Em conclusão, crime definido pela norma subsidiária, "soldado de problema da subsunção dos factos à norma aplicável. reserva" (Nélson Hungria), não é só de menor gravidade que a da principal, mas São os seguintes os pressupostos de conflito de dela se diferencia em relação à maneira de execução. unidade do facto; pluralidade de normas identificando o mesmo facto como III. da consumpção ou de absorção. Ocorre a absorção quando um crime ou delituoso. facto definido por uma norma incriminadora é meio necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime, bem como quando constitui conduta Para a solução do conflito aparente de normas, concorrem três princípios anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma finalidade. Por exemplo, crime de furto ou roubo (art. 270 e ss.) absorve o crime I. Principio da especialidade. Uma norma penal incriminadora é especial em de introdução em casa alheia (art. 261); o homicídio absorve o crime de ofensas relação à norma geral, quando possui em sua definição legal todos os elementos corporais. Portanto, crime de maior gravidade absorve crime de menor típicos desta, e mais alguns, de natureza objectiva ou subjectiva, denominados gravidade. Como se nota, existe na absorção a sucessão de crimes em que o mais especializantes, apresentando, por isso, um minus ou um plus de severidade. As grave normas especial e geral podem constar da mesma lei ou em leis diversas. progressivos, pois, por exemplo, um criminoso que furta numa casa habitada, Portanto, trata-se do enunciado segundo o qual a norma especial em primeiro lugar comete crime de introdução em casa alheia e depois de prevalece sobre a norma geral: por exemplo a norma que define o crime de 103 JESUS, Damásio de, Direito Penal. p. 108. JESUS, Damásio E. de, Penal. p. 109. 78 79</p><p>Direito Penal (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) furto, mas sendo de furto mais grave, absorve o anterior (crime progressivo) 105 pois os tribunais nacionais aplicarão sempre a lei penal e nunca a estrangeira. Esta matéria tem sido regida por um corpo de princípios e regras que procuram delimitar a eficácia espacial da lei penal de um Estado. São princípios SECÇÃO II aplicáveis para resolver problema, os seguintes: NO ESPAÇO princípio da territorialidade; princípio da nacionalidade; 22. Generalidades: o direito penal internacional princípio da defesa dos interesses nacionais; O direito penal internacional designa conjunto de normas que princípio universalidade ou da justiça penal universal; disciplinam o ius puniendi de um Estado na sua coexistência com poder princípio da representação. punitivo de outros A questão que se levanta no âmbito do estudo da aplicação da lei no 23. Princípio da territorialidade espaço é a seguinte: "submeter-se-ão ao império do direito nacional apenas os A territorialidade é o princípio regra ou predominante. Segundo ele, a lei factos criminosos praticados por cidadãos ou por dentro do penal só tem aplicação no território do Estado que a emanou, sem atender à território, ou serão também abrangidos e em que medida os factos praticados nacionalidade do sujeito que praticou o crime ou do titular do bem jurídico no lesado com a prática do crime. De per si este princípio exclui a aplicação da lei É deste modo que surge a designação dessas matérias como parte penal de um país fora do seu território. Portanto, é um princípio e pertencentes ao direito penal internacional, pois refere-se "ao estudo do modo absoluto, pois é a "expressão de uma consciência, por parte do Estado, da sua como um determinado ordenamento jurídico interno procura, com referência à soberania e de um consequente agudo sentimento de ciúme em relação aos matéria penal, resolver os problemas impostos ao Estado, de que esse ordenamentos penais ordenamento é emanação, pelo facto da sua coexistência com outros Estados, Este princípio colhe aplausos em três dimensões: "Sob 0 prisma no quadro da superior comunidade processual, enorme seria a dificuldade em processar-se um cidadão em país que Portanto, trata-se de analisar as normas aplicáveis em caso de a conduta não aquele em que foi praticado o delito. Por outro lado, o prisma punitivo, a punível lesar dois ou mais ordenamentos jurídicos. Não se trate de um aplicação da sanção penal em outro lugar que não do locus delicti commissi, verdadeiro direito de colisão entre a lei penal e as estrangeiras, excluiria uma das funções da pena: a intimidativa. Por último, 0 prisma criminosa No crime progressivo existe uma única vontade a de cometer crime mais grave, enquanto na progressão há uma pluralidade de factos cometidos de forma continuada: progressão a intenção do agente é de crime depois é que inter criminis resolve mais Seja como for, mas durante a agressão tortura, resolve matar a vitima. mais grave absorve os pois na progressão criminosa a intenção do agente pode ser de sempre bater a 109 O carácter exclusivo do ordenamento harmonicamente com carácter universal das penais, 106 SILVA, Germano Marques da, Direito p. 298. pelo menos 00 sentido de que a exclusividade refere às fontes não também interesses tuteladose aos limites 107 BATTAGLINI, Giulio, Direito Penal, ob p. 81. da relevância penal dos comportamentos individuais, vide DEAN BETTIOL, Giuseppe, ob. 108 QUADRI, Diritto penale p. 69 apud BETTIOL, Giuseppe, Penal, p. 274. p.275 110 Giuseppe, Penal, ob p. 275. 80 81</p><p>Direito Penal I (Textos de Apoio) Direito Penal (Textos de Apoio) internacional, a função punitiva do Estado é legítima emanação de sua própria O artigo 2 do CP, procura demarcar território nacional, reafirmando que não será somente a superfície territorial, a zona marítima e o princípio da territorialidade está consagrado no artigo 56 do Código espaço aéreo, mas também, por extensão, "as embarcações e aeronaves mocambicanas, Penal. de natureza pública a serviço do Estado onde quer que se encontrem, bem Dispõe 1 do artigo 56 que "Aplica-se a lei criminal moçambicana, sem como as aeronaves e as embarcações mocambicanas, mercantes ou de propriedade privada, que prejuizo de convenções, tratados e regras de direito internacional, crime cometido no território se achem, respectivamente, no correspondente ou em O 2 alarga território nacional, concretizando que se designa de Assim, a lei penal obriga a todos os cidadãos critério de pavilhão, que considera as embarcações e aeronaves estrangeiros e apátridas que se encontram no território nacional como formalmente território nacional para efeitos de aplicação da lei penal. e nele cometam crimes. Os navios, conforme artigo 56, 2, podem ser: Com efeito, a lei moçambicana deve aplicar-se sempre que em território públicos (ex. os vasos de guerra, em serviço militar; ao serviço nacional agente da infracção pratique qualquer facto ou que nele se produza do Estado polícia, alfândegas, etc.), quer se encontrem em qualquer resultado criminoso derivado de uma acção ou omissão ilícita, sempre territorial nacional ou estrangeiro, quer se achem no alto-mar, são que esse facto ou o resultado sejam criminalmente relevantes em relação à lei considerados parte do território nacional e, para todos efeitos penais, penal (cfr. Beleza dos sujeitam-se à lei criminal nacional, daí as expressões da lei "onde quer que Para a análise deste princípio importa ter em conta dois aspectos se encontrem" (art. 56, n.° 2, primeira parte). Esta doutrina é aplicável às essenciais: i) a abrangência do território nacional e ii) o problema da sede do aeronaves. delito ou melhor locus A correspondente norma deste 2 para terceiros Estados é a de que Por fim, neste princípio, vamos analisar a ressalva de convenções, as embarcações ou aeronaves públicas estrangeiras ou ao serviço desses tratados e regras do direito internacional. Estados, encontrando-se em território nacional, espaço aéreo nacional ou na zona marítima nacional, não se sujeitam à lei penal pois são 23.1. Território nacional e sua extensão (critério de pavilhão) regidos pela lei dos respectivos países. Por território nacional entende-se, nos termos do artigo 6 da privados (podem ser mercantes, de recreio, etc.), quando sejam Constituição, a superfície terrestre, a zona marítima e o espaço aéreo delimitados sujeitam-se igualmente à lei em alto-mar pelas fronteiras nacionais. Isto é, território nacional será, na verdade, todo (ou região que não pertence a ninguém). Igual sujeição é aplicável às lugar onde Estado exerce a sua soberania, desde que tal lugar aeronaves privadas, quando estejam no espaço aereo correspondente ao não esteja sujeito à lei estrangeira de acordo com o direito internacional. território nacional parte do Ora, ao contrário, deve entender-se que as embarcações e aeronaves privadas, quando surtos em portos ou mares estrangeiros, seguem a lei do país onde se encontram. Igual 111 JESUS, Damásio E. Direito Penal. pp. 112 Manuel Lopes Maia, Código Penal doutrina e na 2.° ed., Almedina, Coimbra, 1994, p. 127. 113 artigo 56 corresponde ao artigo do Código Penal Brasileiro, com as devidas adaptações. 82 83</p>

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