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PROFESSOR Dr. CLEBSON PANTOJA PIMENTEL PRINCIPAIS BIOMOLÉCULAS 1 AMINOÁCIDOS E PROTEÍNAS 1. INTRODUÇÃO As proteínas são as moléculas mais diversificadas quanto à forma e função. Desempenham tanto funções estruturais quanto dinâmicas. Formam os componentes do esqueleto celular (citoesqueleto) e de estruturas de sustentação como o colágeno e elastina; participam de grande quantidade de processos biológicos, uma vez que, como enzimas catalisam milhares de reações químicas que ocorrem nos organismo; transportam moléculas no organismo, a exemplo do oxigênio (hemoglobina e mioglobina); contribuem no mecanismo de defesa do organismo (imunoglobulinas); atuam no controle global do metabolismo através das proteínas com função hormonal (insulina); realizam o processo de contração muscular (actina e miosina) e a regulação de atividades de genes, visto que se ligam ao DNA em sítios específicos e alteram a sua expressão. Apesar de apresentarem estruturas e funções diversas, as proteínas são formadas por apenas 20 monômeros denominados de aminoácidos. Os aminoácidos comuns são conhecidos como α- aminoácidos, porque possuem grupo amino primário (–NH2), um grupo carboxílico (–COOH), um átomo de hidrogênio e uma cadeia lateral variável, denominada de grupo R, ligados a um átomo de carbono assimétrico ou quiral (figura 1). As únicas excessões a essa regra são a glicina que não apresenta carbono quiral, visto que, possui dois átomos de hidrogénio ligado ao carbono alfa; e a prolina que possui um grupo imino (amina secundária), no lugar do grupo amino. Figura 1: Estrutura Química Geral dos Aminoácidos Mais de 400 aminoácidos já foram identificados na natureza, no entanto, apenas 20 destes são considerados proteícos, pois apenas esses são reconhecidos pelo código genético das células. Os outros aminoácidos são considerados não proteícos, por não participarem da formação das proteínas. Os aminoácido não protéicos podem surgir durante os processos bioquímicos e podem ser metabólitos importantes para a manutenção da homeostasia celular. Alguns aminoácidos não proteícos são nocivos ao organismo humano, ocasionando envenenamento ou reações alucinógenas. 1.1 CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS Existem várias formas de classificar os aminoácidos, e o tipo de classificação depende, obviamente, do critério utilizado. . Classificaçao dos aminoácidos de acordo com a síntese endógena: de acordo como a síntese endógena, os aminoácidos podem ser classificados em: Aminoácidos Essenciais e Aminoácidos Não- essenciais. 2 Os aminoácidos essenciais são aqueles aminoácidos que não são produzidos pelo organismo e, portanto devem ser ingerido (obtidos) através da dieta. São representados pela: leucina, isoleucina, valina, triptofano, metionina, fenilalanina, treonina, lisina e arginina (a histidina é um aminoácido essencial na infância - até 12 anos). Os aminoácidos essenciais contribuem consideravelmente para o aumento da resistência física, pois durante as atividades de longa duração são utilizados pelos músculos para fornecimento de energia. Os aminoácidos não-essenciais são aqueles aminoácidos que são produzidos pelo organismo e são representados pela: alanina, ácido aspártico, aspargina, ácido glutâmico, cistina, cisteína, glicina, glutamina, hidroxiprolina, prolina, serina e tirosina. Tabela 1. Aminoácidos esseciais e não-essenciais Fontes de proteínas completas são aquelas que contêm todos os aminoácidos essenciais em quantidades e proporções ideais para atender às necessidades orgânicas. Destre essas fontes estão os ovos, o leite, a carne vermelha, o peixe e as aves. Os alimentos de alta qualidade protéica são essencialmente de origem animal, enquanto a maioria das proteínas vegetais (lentilhas, feijões, ervilhas, soja, etc) é incompleta em termos de conteúdo protéico. Convém salientar que todos os aminoácidos essenciais podem ser obtidos diversificando o consumo de alimentos vegetais, cada um dos quais com uma qualidade e quantidade diferentes de aminoácidos. Na realidade, todos os aminoácidos nutricionalmente essenciais devem estar disponíveis no local da síntese de proteína antes que qualquer um deles possa atuar. Isso significa que a cada refeição ingerida deve conter todos esses aminoácidos essenciais em quantidade suficiente para efetuar a síntese de proteína. Classificação dos aminoácidos de acordo com as características da cadeia lateral. Uma das formas mais utilizadas para classificação dos aminoácidos se baseia na característica química das cadeias laterais (grupo R). De acordo com a palaridade da cadeia lateral os aminoácidos são divididos em dois grandes grupos: Aminoácidos apolares (grupo R hidrofóbico não interegem (mistura) bem com a água) e aminoácidos polares (gripo R hidrofílico tem afinidade (mistura) com a água). AMINOÁCIDOS NÃO-ESSENCIAIS AMINOÁCIDOS ESSENCIAIS Alanina Arginina Ácido aspártico Fenilalanina Asparagina Isoleucina Ácido glutâmico Leucina Cistina Lisina Cisteína Metionina Glicina Treonina Glutamina Triptofano Hidroxiprolina Valina Prolina Histidina* Serina Tirosina 3 Os aminoácidos apolares têm grupos R constituídos por cadeias orgânicas com caráter de hidrocarboneto, que não interagem com a água. Esses aminoácidos têm, geralmente, uma localização interna na molécula de proteína, uma vez que, internamente eles estão protegidos da água. Os aminoácidos polares possuem cadeias lateriais com grupos que apresentam carga elétrica líquida ou residual, que os capacitam a interagir com a água. São geralmente encontrados na superfície da molécula protéica. Estes aminoácidos são subdivididos em três categorias, de acordo com a carga apresentada pelo grupo R em soluções neutras. Aminoácidos básicos, se a carga for positiva; aminoácidos ácidos, se a carga for negativa; e aminoácidos polares sem carga, se a cadeia lateral não apresentar carga líquida. (figura 2). Figura 2: Estrutura e Classificação dos Aminoácidos Protéicos 4 1.2 IONIZAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS Os grupos amino e carboxílico dos aminoácidos ionizam-se em pH fisiológico (~7,4), originando um grupo amino protonado e um grupo carboxílico desprotonado (carboxilato). Por isso, dizemos que os aminoácidos são anfóteros, pois podem agir como uma base ou um ácido. As moléculas que carregam grupos de polaridades opostas, como os aminoácidos, são conhecidos como zwitterions ou íons dipolares. Quando um aminoácido é titulado, sua curva de titulação indica a reação de cada grupo funcional com o íon hidrogênio (H+) presente no meio (figura 3). Em soluções muito ácidas, os dois grupos apresentam-se protonados (a: forma catiônica); em pH muito alcalino, ambos apresentam-se desprotonados (c: forma aniônica); e em soluções próximas da neutralidade ou na forma cristalina o aminoácido apresenta-se como um íon dipolar (b: zwitterion). Todos os pH de ionização dos grupos amino e ácido presentes na molécula de aminoácido são chamados pK (tabela 2-1). A média aritmética dos pK representa o ponto isoelétrico (pI) do aminoácido, ou seja, é o valor de pH onde predomina a forma eletricamente neutra do aminoácido. Figura 3: Curva de titulação a Alanina O valor de pH no qual o aminoácido fica eletricamente neutro (igual número de cargas positivas e negativas) corresponde ao ponto isoelétrico (pI). Para os aminoácidos que apresentam outros grupos ionizáveis na cadeia lateral, o ponto isoelétrico é calculado de outra forma. Para os aminoácidos que apresentam dois grupos carboxílicos, o ponto isoelétrico é obtido quando um dos grupos carboxílicos estiver protonado e o outro desprotonado. Por um raciocínio análogo, para os aminoácidoscom dois grupos aminos, a forma eletricamente neutra será mais abundante em valor de pH onde um dos grupos aminos estiver protonado e o outro desprotonado. 5 1.3 ESTEREOQUÍMICA DOS AMINOÁCIDOS A fórmula bidmensional mostrada na figura 1 pode transmitir somente parte da estrutura comum dos aminoácidos, porque uma das propriedades mais importantes de tais compostos é a sua forma tridimensional, ou estereoquímica. Como o carbono α dos aminoácidos apresenta quatro ligantes diferentes, com exceção da glicina, estas moléculas podem se apresentar em duas formas designadas de L e D, que são imagens especulares uma da outra. As duas formas, em cada par, são denominadas de estereoisômeros, isômeros ópticos ou enantiômeros. Os D-aminoácidos são aminoácidos que apresentam o grupo amino do lado direito, enquanto que os L-aminoácidos são os que contem o grupo amino do lado esquerdo (figura 4). Figura 4: Estereoisômeros da Alanina Todos os aminoácidos encontrados nas proteínas possuem a configuração L. Embora os aminoácidos D ocorram na natureza, mais frequentemente em paredes de células bacterianas e em alguns antibióticos, eles não são encontrados em proteínas. 1.4 AMINOÁCIDOS INCOMUNS E BIOLOGICAMENTES ATIVOS O código genético das células utiliza apenas os 20 L-aminoácidos mostrados na figura 2 para sintetizar as proteínas, entretanto após a síntese protéica alguns aminoácidos podem sofrer modificação. Em quase todos os casos, tal modificação inclue uma adição de pequenos grupos químicos as cadeias laterais de alguns aminoácidos: hidroxilação, metilação, acetilação, carboxilação e fosforilação. Em muitos casos a modificação pode ser essencial para a função da proteína. Alguns exemplos de aminoácidos modificados presentes em proteínas são: 4-hidroxi-prolina e 5- hidroxi-lisina, derivados da prolina e lisina respectivamente. Estesa aminoácidos modificados são encontrado em abundância na proteína estrutural colágeno. Desmosina e isodesmosina (na proteína estrutural elastina, resultantes da união de quatro moléculas de lisina com os grupamentos R formando um anel que permite a elasticidade característica da proteína) (figura 5). Alguns aminoácidos livres podem ser modificados pelo metabolismo celular tornando-se biologicamentes ativos, desempenhando inúmeras funções no organismo, a exemplo dos hormônios da tireóide e dopamina (derivados da tirosina), do ácido-γ-aminobutírico (GABA – derivado da glutamina), e da histamina (derivada da histidina) (figura 5). 6 Existem outros aminoácidos que surgem de vias metabólicas intermediárias, como, por exemplo: citrulina e ornitina (intermediários do ciclo da uréia); homocisteína e homosserina (intermediários do metabolismo dos aminoácidos metionina e serina); canavanina, ácido djenkóiko e β-cianoalanina (aminoácidos tóxicos existentes em alguns fungos). Os aminoácidos não são armazenados, ou pelo menos não possuem tecido destinado somente para esse fim. Desta forma, a maioria deles é destinada para a síntese de proteínas e o excesso proveniente da alimentação, se não é degradado no metabolismo energético, é destinado para a síntese de várias moléculas importantes para o organismo como as purinas e pirimidinas (aspartato e glutamina); esfingolipídios (serina); histamina (histidina); tiroxina, melanina, dopamina e epinefrina (tirosina); serotonina, melatonina e NAD+ (triptofano); purinas e porfirinas (glicina). Figura 5: Aminoácidos Incomuns e Biologicamentes Ativos 7 1.5 LIGAÇÃO PEPTÍDICA E NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO DAS PROTEÍNAS Nas proteínas (polipeptídeos), os aminoácidos que as compõe são unidos por ligações peptídicas ou amídicas. Uma ligação peptídica ocorre pela união do grupo amino (-NH2) de um aminoácido com o grupo carboxila (-COOH) de outro aminoácido, liberando uma molécula de água (figura 6). A reação descrita na figura 6 jamais ocorre dessa forma. Nos seres vivos, a união dos aminoácidos por ligação peptídica não é realizada de forma direta entre eles, mas através de um complexo aparato de síntese protéica, que inclui ácidos nucléicos, ribossomos, várias proteínas e enzimas. A equação apresenta apenas o resultado líquido do processo. Figura 6: Ligação Peptídica A ligação C-N, em um peptídeo, é especial: é 10% mais "curta" do que uma ligação C-N normal e o ângulo de ligação também é diferente do esperado para um carbono sp2. Isto ocorre, porque a ligação peptídica, na verdade, apresenta uma estrutura de ressonância (figura 7), tendo um caráter intermediário entre uma ligação simples e uma dupla ligação. Após a união, os aminoácidos passam a ser chamados de resíduos de aminoácidos, orientados da região amino-terminal (N-terminal – esquerda) para a região carboxi-terminal (C-terminal – direita). Figura 7: Estrutura de Ressonância da Ligação Peptídica 8 A estrutura das proteínas pode ser descritas em quatro níveis de organizações. Estrutura primária é a sequência de aminoácidos ao longo da cadeia polipeptídica. A estrutura primária é somente a seqüência dos aminoácidos, sem se preocupar com a orientação espacial da molécula. As interações intermoleculares dos aminoácidos das proteínas fazem com que a cadeia protéica assuma uma estrutura secundária e, algumas vezes, uma estrutura terciária. A seqüência dos aminoácidos em todas as proteínas - fator que é responsável por sua estrutura e função - é determinada geneticamente a partir da seqüência dos nucleotídeos no DNA celular. Quando uma proteína em particular é necessária, o código do DNA para esta proteína é transcrito em uma seqüência complementar de nucleotídeos ao longo de um segmento de RNA - chamado de RNA mensageiro. Em geral, as proteínas possuem pelo menos 40 resíduos de aminoácidos. Polipeptídeos menores são chamados genericamente de peptídeos. O maior polipeptídeo conhecido é a titina, de 26926 resíduos, uma proteína gigante (2900kD), que ajuda a arranjar a estrutura repetida das fibras musculares. Contudo, a maioria dos polipeptídeos contém de 100 a 1000 resíduos (tabela 2-2). Essa faixa de tamanho dos polipeptídeos provavelmente é reflexo das condições químicas e da história evolutiva dessas moléculas. O limite mínimo para uma cadeia polipeptídica dobrar-se em uma forma estável, que lhe permita desempenhar uma função específica, parece ser de 40 resíduos. Os polipeptídeos que contêm centenas de resíduos estão no limite da eficiência da maquinaria de síntese de proteínas. Quanto maior for o polipeptídeo (e quanto maior for seu correspondente mRNA e seu gene), maior será a probabilidade de introdução de erros durante a transcrição e a tradução. Tabela 2-2: Composição de Algumas Proteínas Proteínas Resíduos de Aminoácidos Subunidades Massa Molar (kD) Inibidor de Proteinase III (melão) 30 1 3409 Citocromo (humano) 104 1 13000 Ribonuclease (E. coli) 155 1 17600 Interferon-gama (humana) 288 2 34200 Hemoglobina (humana) 574 4 64500 RNA-polimerase (bacteriófago T7) 883 1 98000 Piruvato descarboxilase (levedura) 2252 4 250000 Glutamina sintetase (E. coli) 5616 12 600000 Titina (humana) 26926 1 2990000 A estrutura secundária descreve as estruturas regulares bidimensionais formadas por segmentos da cadeia polipeptídica. Duas organizações são particularmente estáveis: A α-hélice, que corresponde ao enrolamento da cadeia ao redor de um eixo imaginário, assumindo uma forma helicoidal; e a β-folha, a qual é resultado da interação lateral de segmentos de uma cadeia polipeptídica ou de cadeias diferentes (figura 2-9). 9 A α-hélice e β-folha estabilizam-se por pontes de hidrogênio entre o nitrogênio e o oxigênio dos grupos –NH e –C=O; constituintes das unidades peptídicas. Embora aponte de hidrogênio seja uma ligação fraca, o elevado número dessas ligações confere grande estabilidade à estrutura secundária. A estrutura terciária (figura 2-9) corresponde ao dobramento final da cadeia polipeptídica por interações de regiões com estrutura regular (α-hélice e β-folha) ou de regiões sem estruturas definada. É a conformação espacial da proteína, como um todo, e não de determinados segmentos particulares da cadeia protéica. A forma das proteínas está relacionada com sua estrutura terciária, que é o resultado de todas as interações dos aminoácidos das proteínas com o meio; algumas cadeias são tão longas e hidrofóbicas que perturbam a estrutura secundária helicoidal, provocando a dobra ou looping da proteína. Muitas vezes, as partes hidrofóbicas da proteína agrupam-se no interior da proteína dobrada, longe da água e dos íons do ambiente onde a proteína se encontra, deixando as partes hidrofílicas expostas na superfície da estrutura da proteína. Regiões como os "sítios ativos", "sítios regulatórios" e “motivos” são propriedades da estrutura terciária. O arranjo (ou conformação) tridimensional dos átomos da proteína na estrutura terciária é de extrema importância porque geralmente coincide com a chamada estrutura nativa, a estrutura que confere à proteína uma função biológica específica. As interações que mantêm a estrutura terciária estável são de diferentes tipos: pontes de hidrogênio (estabelecida entre os grupos R dos aminoácidos), interações hidrofóbicas (formadas entre as cadeias laterais hidrofóbicas dos aminoácidos apolares), ligações eletrostáticas ou iônicas (interações entre grupos com cargas opostas) e as pontes dissulfeto (formadas por resíduos de cisteína) (figura 2-9). A estrutura quaternária é resultado da associação de duas ou mais cadeias polipeptídicas (subunidades ou protômeros), que leva a formação de uma proteína funcional e holigomérica (figura 2- 08). Esta estrutura é mantida pelas mesmas forças que determinam as estruturas secundárias e terciárias. Figura 2-8: Estrutura Quaternária. 10 Figura 2-9. Resumos dos níveis de organização das proteinas Anotações: 11 1.6 CLASSIDICAÇÃO DAS PROTEÍNAS DE ACORDO COM A COMPOSIÇÃO: As proteínas podem ser classificdas, de acordo como sua composição em: Proteínas Simples ou homoproteínas e proteínas conjugadas ou heteroproteínas. As proteínas simples ou homoprotepinas são preínas constituídas somente por aminoácidos em sua composição, enquanto que as proteínas conjugadas ou heteroproteínas são preteínas que contém, além de aminoácidos, outros grupos orgânicos ou inorgânicos. Os grupos não protéicos que compõe as proteínas conjugadas são chamados de grupos prostéticos. São exmplos de grupo prostético: carboidratos (nas glicoproteínas), lipídeos (nas lipoproteínasEx LDL, IDL, VLDL, HDL), ácidos nucléicos (nas nucleoproteínas), DNA (nas desoxirribonucleoproteina), RNA (nas ribonucleoproteínas), metal (nas metaloproteinas), ferro (ferroproteínas), cromo (nas cromproteinas) etc. A hemoglobina é um exemplo de proteína conjugada. Ela contém 4 grupos prostéticos, cada um consistindo de um íon de ferro e a porfirina. São justamente estes grupos que habilitam a hemoglobina a carregar o oxigênio através da corrente sanguínea. 1.7 CLASSIFICAÇÃO DAS PROTEÍNAS DE ACORDO COM A FORMA: As proteínas também podem ser classificadas de acordo com a forma em Proteínas globulares ou globosas e proteínas Fibrosas. As proteínas globulares são formadas por uma ou mais cadeias polipeptídicas organizada em uma forma aproximadamente esférica ou elipsóide. São solúveis em água e desempenham várias funções dinâmicas (proteínas biologicamente ativas). Exemplos de proteínas blobulares: A) Mioglobina. A mioglobina presente no citosol das células musculares é uma proteína transportadora e armazenadora de oxigênio nos músculos esqueléticos e cardíacos dos vertebrados. A mioglobina (Figura 2-10) liga o oxigênio liberado pela hemoglobina nos capilares e posteriormente difundido através das membranas celulares. Formada por uma única cadeia polipeptídica de 153 resíduos de aminoácidos e um grupo prostético heme (anel heterocíclico porfirínico contendo quatro anéis pirrólicos e um átomo de Fe2+). 12 Figura 2-10. Estrutura da molécula de mioglobina. O esqueleto peptídico é constituído por oito α-hélices marcadas por letras, de A a H. B) Hemoglobina. A hemoglobina é uma proteína tetramérica (4 subunidades ou cadeias polipeptídica) presente nas hemáceas cuja principal função é o transporte do oxigênio dos pulmões aos tecidos periféricos. A hemoglobina também transporta CO2 e prótons, dos tecidos periféricos aos pulmões, para subseqüente excreção. A hemoglobina normal (figura 2-11) de adulto, a HbA consiste de quatro cadeias polipeptídicas: duas α (cada uma com 141 resíduos de aminoácidos) e duas β (cada uma com 146 resíduos de aminoácidos) representada por α2β2 e estabilizadas por pontes de hidrogênio e interações eletrostáticas. Outra forma encontrada em baixos teores (1 a 3,0% do total) no adulto é a HbA2 composta por cadeias α2δ2. A HbF formada por α2γ2 predomina no feto, em 60 a 90% no recémnascido e <1% após um ano. A hemoglobina H formada por quatro cadeias β, produzida quando faltam cadeias α para a síntese de HbA. A hemoglobina de Bart constituída de tetrâmero de γ, formada quando faltam cadeias α para a síntese de HbF no feto; apresenta-se em <2% no recém-nascido normal. Cada uma das cadeias de hemoglobina contém um grupo prostético, o heme (molécula de protoporfirina IX contendo um átomo de Fe2+). Figura 2-11. Estrutura da molécula de hemoglobina. 13 Enquanto a mioglobina apresenta grande afinidade pelo oxigênio, a hemoglobina demonstra uma afinidade inicial lenta que se torna progressivamente mais rápida. Esse fenômeno é conhecido como interação cooperativa, uma vez que a ligação do primeiro O2 à desoxi−hemoglobina facilita a ligação de O2 às outras subunidades na molécula. Figura 2-12. Comparação entre as moléculas de mioglobina e hemoglobina De modo inverso, a dissociação do primeiro O2 da hemoglobina completamente oxigenada, Hb(O2)4, tornará mais fácil a dissociação de O2 das outras subunidades da molécula. A oxigenação da hemoglobina é acompanhada por mudanças conformacionais nas proximidades do grupo heme. A estrutura quaternária da hemoglobina desoxigenada (desoxi-Hb) é descrita como estado conformacional T (tenso) e aquela da hemoglobina oxigenada (oxi-Hb) como estado conformacional R (relaxada). A afinidade do O2 é mais baixa no estado T e mais alta no estado R. Em função da cooperatividade em associação e dissociação do oxigênio, a curva de saturação de oxigênio para a hemoglobina difere da observada para a mioglobina (Figura 2.15) C) Os anticorpos ou imunoglobulinas (figura abaixo) compõem uma família de glicoproteínas produzidas pelos linfócitos B em resposta à presença de moléculas estranhas conhecidas como antígenos (resposta imunitária humoral). As características estruturais fundamentais das imunoglobulinas são: 14 • As moléculas de anticorpo são glicoproteínas com quatro cadeias polipeptídicas. Cada molécula tem estrutura em Y contendo duas unidades idênticas chamadas cadeias pesadas (H) e duas unidades idênticas entre si, porém de menor tamanho, denominadas cadeias leves (L). • A estrutura primária das cadeias pesadas, denominadas cadeias γ, μ, α, δ e ε, é a base da classificação das imunoglobulinas em cinco classes: IgG,IgM, IgA, IgD e IgE, respectivamente. • As cadeias leves de cada molécula de imunoglobulina são formadas por apenas dois tipos κ e λ. • As quatro cadeias são covalentemente interconectados por pontes dissulfeto. No interior de cada cadeia da molécula, ligações dissulfeto intercadeias dobram a molécula em uma estrutura mais compacta. • Cada cadeia polipeptídica consiste de duas regiões região variável (V) e região constante (C) quanto à seqüência de aminoácidos, (estrutura primária). A região variável da cadeia leve (VL) é, aproximadamente, 50% do comprimento da cadeia enquanto a região variável da cadeia pesada (VH) é aproximadamente 25% do comprimento da cadeia. 15 A digestão pela papaína fornece dois fragmentos principais chamados fragmento Fab, que retém a capacidade de ligar o antígeno da molécula intacta, e o fragmento Fc, que é cristalizável. As Proteínas fibrosas apresentam forma alongada, são geralmente insolúveis em água e geralmente fazem parte da composição de materiais estruturais de órgãos e ecidos, dando a eles elasticidade e/ou resistência. Dois bons exemplos, nos animais, são o colágeno e queratina. A) O colágeno é a proteína mais abundante em vertebrados sendo componente essencial do tecido conjuntivo que, numa variedade de formas geneticamente distintas, se distribui pela matriz óssea, pele, tendões, cartilagens, córnea, vasos sangüíneos, dentes e outros tecidos. O colágeno é sintetizado pelas células do tecido conjuntivo e secretado para o espaço extracelular para fazer parte de uma rede complexa de macromoléculas localizadas na matriz extracelular. O colágeno é uma proteína extracelular pouco solúvel em água e organizada em fibras de grande resistência. Cada molécula de colágeno é constituída de três cadeias polipeptídicas (uma tripla hélice) enroladas uma em torno da outra e orientadas para a direita com cerca de 1.000 resíduos de aminoácidos cada uma. As três cadeias polipeptídicas entrelaçam-se para formar uma tríplice hélice à direita, estabilizada por pontes de hidrogênio formadas entre as cadeias polipeptídicas individuais (entre o NH da glicina de uma cadeia e a C=O da prolina ou de outro aminoácido em outra cadeia) constituindo o módulo estrutural básico do colágeno, chamado tropocolágeno. As três cadeias polipeptídicas que compõem o colágeno são denominadas cadeias α. Essas cadeias combinadas em uma estrutura em tripla hélice formam os vários tipos de colágenos presentes nos tecidos. O colágeno tipo I, o mais abundante (90% do colágeno total), é formado por duas cadeias polipeptídicas α1 e uma cadeia α2 que formam uma hélice tríplice. B) As α-queratinas são proteínas constituídas quase exclusivamente de α-hélices compostas de três cadeias polipeptídicas enroladas em forma de corda helicoidal resistente ao estiramento. São ricas em resíduos de cisteína que formam pontes covalentes de dissulfeto que estabilizam as cadeias polipeptídicas adjacentes. Apresentam também teores importantes de resíduos de aminoácidos hidrofóbicos alanina, valina, isoleucina, fenilalanina e metionina. As α-queratinas formam a proteína da pele, cabelo, unhas, chifres, penas e lã. O cabelo é constituído de células mortas. C) Fibroína da seda. Muitos insetos e aranhas produzem seda, uma estrutura que consiste da proteína fibrosa fibroína embebida em uma matriz amorfa. Na fibroína, considerada uma β-queratina, as cadeias polipeptídicas são arranjadas na conformação de folhas β-antiparalela. As folhas β são formadas porque a fibroína tem elevado conteúdo de aminoácidos com grupos R relativamente pequenos como a glicina, alanina ou serina. A seda é uma fibra resistente por estar quase completamente distendida. Para esticá-la mais, seria necessário romper as ligações covalentes de suas cadeias polipeptídicas. No entanto, a flexibilidade da seda é ocasionada pelo deslizamento das folhas β adjacentes que estão associados por forças de van der Waals. 16 Desnaturação e renaturação de proteínas A desnaturação ocorre pela alteração da conformação tridimensional nativa das proteínas sem romper as ligações peptídicas (estrutura primária). Como a estrutura tridimensional específica das proteínas é fundamental para o exercício de suas funções, alterações estruturais provocadas pela desnaturação ocasionam a perda parcial ou completa das suas funções biológicas. Muitas vezes, em condições fisiológicas, as proteínas recuperam a conformação nativa e restauram atividade biológica quando o agente desnaturante é removido em processo denominado renaturação. A desnaturação ocorre nas seguintes condições: 1. Ácidos e bases fortes. Modificações no pH resultam em alterações no estado iônico de cadeias laterais das proteínas, que modificam as pontes de hidrogênio e as pontes salinas (associação de grupos iônicos de proteínas de carga oposta). Muitas proteínas tornam-se insolúveis e precipitam na solução. 2. Solventes orgânicos. Solventes orgânicos solúveis em água como o etanol interferem com as interações hidrofóbicas por suainteração com os grupos R não-polares e forma pontes de hidrogênio com a água e grupos protéicos polares. Os solventes não-polares também rompem interações hidrofóbicas. 3. Detergentes. As moléculas anfipáticas interferem com as interações hidrofóbicas e podem desenrolar as cadeias polipeptídicas. 4. Agentes redutores. Em presença de reagentes como a uréia e β−mercaptoetanol ocorre a conversão das pontes dissulfeto em grupos sulfidrílicos. A uréia rompe pontes de hidrogênio e interações hidrofóbicas. 5. Concentração de sais. A ligação de íons salinos a grupos ionizáveis das proteínas enfraquecem as interações entre grupos de cargas opostas da molécula protéica. As moléculas de água solvatam os grupos protéicos. Com a adição de grandes quantidades de sal às proteínas em solução, formam-se precipitados. As moléculas de água competem pelo sal adicionado tornando a quantidade de solvente muito pequena e, com isso, promovendo a agregação de moléculas protéicas e a sua precipitação. Esse efeito é chamado salting out. 6. Íons de metais pesados. Metais pesados como o mercúrio e chumbo afetam a estrutura protéica de várias formas. Podem romper as pontes salinas pela formação de ligações iônicas com grupos carregados negativamente. Os metais pesados também se ligam com grupos sulfidrílicos, um processo que pode resultar em profundas alterações das estruturas e funções protéicas. Por exemplo, o chumbo liga-se aos grupos sulfidrílicos de duas enzimas da via sintética da hemoglobina causando anemia severa. 7. Alterações na temperatura. Com o aumento da temperatura, a velocidade de vibração molecular aumenta. Eventualmente, interações fracas como as pontes de hidrogênio são rompidas promovendo alterações na conformação das proteínas. 8. Estresse mecânico. Agitação e trituração rompem o delicado equilíbrio de forças que mantém a estrutura protéica. Por exemplo, a espuma formada quando a clara do ovo é batida vigorosamente contém proteína desnaturada. 17 1.8 CORRELAÇÕES CLÍNICAS Os aminoácidos se combinam com vitaminas e minerais e servem como matéria prima para que o corpo fabrique enzimas, hormônios e outros agentes metabólicos. Ao contrário das proteínas alimentares, os aminoácidos não requerem digestão e são diretamente absorvidos, além de não sobrecarregarem o estômago e os intestinos. A utilização de aminoácidos como forma de suplementação alimentar deve ser realizada sob conduta profissional, pois não havendo ambiente bioquímico apropriado nas células, esses aminoácidos podem causar problemas para o metabolismo, ocasionado distúrbios de crescimento e desenvolvimento. Como já foi descrito anteriormente, alguns aminoácidos apresentam funções biológicas importantes. Nessa perspectivas, alguns peptídeos encontrados na natureza também desempenham funções importantes, atuando como hormônios (encefalinas,oxitocina, vasopressina e glucagon), antibiótico (gramicidina) e agentes redutores (glutationa) (tabela 2-3). Tabela 2-3: Peptídeos de Importância Biológica Peptídeos Nº de AA Glândulas/ Células produtoras Efeitos Principais Encefalinas 5 Hipófise anterior e medula adrenal Analgésico Oxitocina 9 Hipotálamo Contração da musculatura uterina no parto e de glândulas mamaria na lactação Vasopressina 9 Hipotálamo Aumento da pressão sangüínea e da reabsorção de água pelo rim Glucagon 29 Células α do pâncreas Hiperglicemiante Gramicidina 10 Cepas de Bacillus brevis Antibiótico Glutationa 3 Maioria das células Anti-oxidante Os níveis estruturais de uma proteína são importantes, pois são eles que ditam a função final das proteínas. Qualquer alteração no dobramento e na conformação final leva a uma proteína com baixa ou nenhuma atividade biológica. Exemplo disso é a osteogenesis imperfecta, também conhecida como a doença dos ossos quebradiços, que é um grupo de pelo menos quatro afecções genéticas e bioquimicamente distintas com prevalência de 1:10000 recém-nascidos vivos. A gravidade da doença varia de moderada a letal e depende da natureza da mutação dos protadores. Na forma mais grave da doença, mais de 100 fraturas foram relatadas in útero. O defeito fundamental é no gene do procolágeno tipo I. Na maioria das mutações ocorre a substituição de uma única base no códon da glicina, resultando na distorção da tripla hélice de colágeno. A estabilidade do colágeno é reduzida pelo romprimento da ponte de hidrogênio N-H do resíduo de alanina (normalmente glicina) ao grupo carbonila da prolina adjacente da cadeia vizinha. A posição da mutação está relacionada com a gravidade da doença. As mutações próximas da extremidade C-terminal são mais graves que as próximas da extremidade N-terminal. Isso porque a formação da tripla hélice do colágeno inicia a partir do C-terminal e progride em direção ao N-terminal. As doenças causadas pelos prions são exemplos de doenças causadas pela forma inadequada das proteínas. A exemplo dessas afecções temos, a doença de Creutzfeldt-jakob, o Kuru e a doença da vaca louca. Estas condições ocorrem quando uma proteína cerebral, chamada de prion, transforma sua conformação normal (PrPSc). Esta transformação é autopropagante, levando a grande agregadosde PrPSc. O papel destes agregados na produção da condição patológica não é bem conhecido. 18 ENZIMAS 2. HISTÓRICO Até o final do século XVIII, muitos processos de biotransformação já tinham sido descritos. Por exemplo, a digestão da carne pelas secreções do estômago e a formação de açúcares a partir do amido, quando esse era colocado em contato com a saliva. Em 1878, Wilhelm Kühne empregou pela primeira vez o termo "enzima" para descrever o fermento, usando a palavra grega ενζυμον, que significa "levedar". O termo passou a ser mais tarde usado apenas para as proteínas com capacidade catalítica, enquanto que o termo "fermento" se refere à atividade exercida por organismos vivos (fungos). O prêmio Nobel de química em 1907 foi ganho por Eduard Buchner que descobriu que os extratos de levedo podiam fermentar o açúcar até a formação de álcool e provou que as enzimas envolvidas na fermentação continuavam funcionando mesmo quando removidos das células vivas. Por muito tempo foi discutido qual era a identidade química das enzimas. Alguns autores afirmavam que as proteínas, associadas à atividade enzimática, apenas eram o suporte da verdadeira enzima, e, por si próprias, incapazes de catálise. Em 1926, o pesquisador James B. Sumner purificou e cristalizou a urease de feijão-soja, a qual catalisa a hidrólise de uréia em amônia e gás carbônico, mostrando que tais cristais apresentavam constituição protéica. Em 1937, o mesmo autor realizou estudo semelhante com a enzima catalase e chegou as mesmas conclusões anteriores. Em 1947, o prêmio Nobel de química dado aos pesquisadores Northrop e Stanley, que em 1930, com o estudo de três enzimas digestivas (pepsina, tripsina e quimotripsina), deram a prova final da característica protéica das enzimas. J.B.S. Haldane escreveu um tratado intitulado "Enzimas", que continha a notável sugestão de que as interações por ligações fracas, entre a enzima e seu substrato, poderiam ser usadas para distorcer a molécula do substrato e catalisar a reação. As técnicas mais utilizadas atualmente para o estudo da estrutura das enzimas é a difração por raio X e ressonância magnética nuclear. A primeira enzima a ser descrita por esses métodos foi a lisozima, um enzima que existe na saliva, lágrimas e na clara de ovo e cliva a parede celular de bactérias. Começaram assim, a bioquímica e biologia estruturais, a compreender o funcionamento das enzimas a nível atômico. Figura 3-2: Histórico - Enzimologistas Wilhelm Kühne 1837 - 1900 Eduard Buchner 1860 - 1917 James B. Sumner 1887 - 1955 J.B.S. Haldane 1892 - 1964 19 2. INTRODUÇÃO As enzimas representam uma classe muito importante de proteínas biologicamente ativas. Elas são responsáveis pela catálise de diversas reações nas células. Reações que, sem o auxílio das enzimas, jamais aconteceriam ou, ainda, gerariam produtos indesejados. Outras moléculas também apresentam função catalítica, a exemplo de moléculas de RNA (ribozimas), capazes de atuar aumentando a velocidade de reações específicas. Figura 3-1: Estrutura das Enzimas As enzimas podem necessitar de grupos não protéicos para a realização da catalise. Esse grupo de moléculas é conhecido como co-fator, que pode ser orgânicos (co-enzimas) ou inorgânicos (íons metálicos). Os co-fatores podem estar tão intimamente ligados as enzimas ao ponto de não haver uma separação entre esses dois elementos, sendo assim o co-fator é chamado de grupo prostético. Tabela 3-01: Alguns Elementos Inorgânicos que são Co-fatores Elemento Enzima Cu2+ Citocromo oxidase Fe2+ ou Fe3+ Citocromo oxidase, catalase, peroxidsase e K+ piruvato cinase Mg2+ Hexocinase, glicose 6-fosfatase e piruvato cinase Mn2+ Arginase, riubonucleotídeo redutase Mo Dinitrogenase Ni2+ Urease Se Glutaiona peroxidase Zn2+ Anidrase carbônica, álcool desidrogenase, carboxipeptidase A e B Aminoácidos - Proteína Nucleotídeos - RNA 20 Tabela 3-02: Algumas Coenzimas que Transportam Átomos ou Grupos Funcionais Elemento Enzima Biocitiona CO2 Biotina Coenzima A Grupos Acil Ácido pantotênico e outros compostos 5’-Desoxiadenosilcobalamina (coenzima B12) Átomo de H Vitamina B12 Flavina adenina dinucleotídeo Elétrons Riboflavina (B2) Lipoato Elétrons e grupos acil - Nicotinamida adenina dinucleotídeo Íon hidreto (:H– ) Ácido nicotínico (B3) Piridoxal fosfato Grupo amino Piridoxina (B6) Tetrahidrofolato Carbono Folato Tiamina pirofosfato Aldeído Tiamina (B1) As enzimas atuam em um conjunto de reações biológicas chamadas de metabolismo, onde cada reação é realizada e controlada por uma enzima específica que gera um determinado produto que será posteriormente utilizado como reagente de uma reação seguinte. Diferentes enzimas catalisam diferentes passos de vias metabólicas, agindo de forma sincronizada de modo a não interromper o fluxo normal das reações químicas da célula. 2.1 PROPRIEDADES GERAIS DAS ENZIMAS - Aumenta a Velocidade das Reações: A velocidade das reações catalisadas por enzimas são tipicamente 106 a 1012 vezes maiores que as reações correspondentes não-catalisadas, isso se deve a capacidade de diminuir a energia de ativação (valor mínimo de energia que as moléculas de reagentes devem possuir para que uma colisão entre elas seja eficaz). - Condições Químicas: As reações mediadas por enzimas ocorrem, na maioria das vezes, em uma faixa de condições químicas brandas e compatíveis com a vida, ou seja, temperatura inferior a 100°C, pressão atmosférica e pH quase neutro. Existem exceçõesa essa regra, como é o caso de bactérias termófilas que habitam regiões onde a pressão e a temperatura são elevadas. - Maior Especificidade: As enzimas apresentam um grau maior de especificidade do que os catalisadores químicos em relação a identidade de seus substratos (reagentes) e do seus produtos; isto é, as reações enzimáticas poucas vezes produzem subprodutos. - Capacidade de Regulação: A atividade catalítica das enzimas varia em resposta às condições químicas do meio e as concentrações de outras substâncias presentes na reação (reagentes, inibidores, ativadores, co-fator). - Endógenas: as enzimas são moléculas produzidas pelas células, não havendo necessidade da sua obtenção por meio da alimentação. 21 2.2 NOMENCLATURA E CLASSIFICAÇÃO A forma mais comum de nomenclatura das enzimas é a indicação do substrato e a utilização do sufixo ase em uma segunda palavra que indica a reação que a enzima catalisa. Além disso, algumas enzimas, por terem sido descritas há muito tempo, permanecem com a designação clássica, como a exemplo das enzimas digestivas pepsina, tripsina e quimiotripsina. Mas essa nomenclatura usual não é tão informativa e pode levar a vários nomes para uma mesma enzima. Por isso, a determinação da nomenclatura das enzimas foi normatizada por um comitê especializado, o Nomenclature Committee of the International Union of Biochemistry and Molecular Biology / Enzyme Comission (NC-IUBMB / EC) (tabela 3-01). Tabela 3-03: Classificação das Enzimas Segundo a Comissão de Enzimas 1. Oxido-redutases (reações de oxidação-redução ou transferência de elétrons – Desidrogenases e Oxidases) 1.1.atuando em CH-OH 1.2.atuando em C=O 1.3.atuando em C=O- 1.4.atuando em CH-NH 2 1.5.atuando em CH-NH- 1.6.atuando em NADH, NADPH 2.Transferases (transferem grupos funcionais como amina, fosfato, acil, carboxil – Quinases e Transaminases) 2.1.grupos com um carbono 2.2.grupos aldeído ou cetona 2.3.grupos acil 2.4.grupos glicosil 2.7.grupos fosfatos 2.8.grupos contendo enxôfre 3.Hidrolases (reações de hidrólise de ligação covalente) 3.1.ésteres 3.2.ligações glicosídicas 3.4.ligações peptídicas 3.5.outras ligações C-N 3.6.anidridos ácidos 4.Liases (adição de grupos a duplas ligações ou remoção de grupos deixando dupla ligação) 4.1. =C=C= 4.2. =C=O 4.3. =C=N- 5.Isomerases (reações de interconversão entre isômeros óticos ou geométricos - Epimerases) 5.1.racemases 5.2.cis-trans-Isomerases 5.3.oxidoredutases intramoleculares 5.4.transferases intramoleculares 5.5.liases intramoleculares 6.Ligases (condensação de duas moléculas, sempre às custas de energia, geralmente do ATP - Sintetases) 6.1. C-O 6.2. C-S 6.3. C-N 6.4. C-C 22 Tabela 3-04: As Seis Classes de Enzimas e as Reações que Catalisam Classe Tipo de Reação Descrição 1. Oxirredutases AH2 + B A + BH2 Catalisam reações de oxirredução, transferindo elétrons, hidretos (H-) ou prótons (H+). 2. Transferases A–X + B A + B–X Transferem grupos químicos entre moléculas. 3. Hidrolases A–B + H2O A–H + B–OH Utilizam a água como receptor de grupos funcionais de outras moléculas. 4. Liases X Y l l A=B + X–Y A–B Formam ou destroem ligações duplas, respectivamente retirando ou adicionando grupos funcionais. 5. Isomerases X Y Y X l l l l A–B A–B Transformam uma molécula no seu isômero. 6. Ligases A + B A–B Formam ligações químicas por reações de condensação, consumindo energia sob a forma de ATP. A partir destas categorias principais, as enzimas ainda são subdivididas em outras categorias, podendo ser identificadas sem ambigüidade pelo seu número da EC; por exemplo, EC 5.4.2.2 é a fosfoglicomutase. 23 2.3 INTERAÇÃO ENZIMA-SUBSTRATO Tal como todas as proteínas, as enzimas são formados por longas cadeias lineares de aminoácidos que se dobram resultando em uma estrutura tridimensional. Cada seqüência única de aminoácidos produz também uma estrutura tridimensional singular que apresenta propriedades específicas. Cadeias individuais de proteínas podem por vezes agrupar-se para formar um complexo protéico. Em uma proteína enzimática, existe um domínio chamado de "sítio ativo", onde se liga o substrato (a molécula reagente) e diminui a energia do estado de transição que leva ao produto desejado. A ligação entre o sítio ativo e o substrato é específica; a molécula precisa ter certas características eletrônicas e espaciais que permitam o seu "encaixe" na proteína. Por isso esta relação tem sido chamada de chave-fechadura (lock'n'key). A maioria das enzimas é maior do que o substrato sobre o qual atua, e só uma pequena porção da enzima está envolvida na catálise (sítio ativo conjunto de radicais dos resíduos de aminoácidos responsáveis pela catálise). As enzimas também podem ter sítios onde se ligam co-fatores e em outra pode haver um sítio de ligação para pequenas moléculas efetoras (sítio alostérico), que são produtos ou substratos, diretos ou indiretos, da reação enzimática. Estas moléculas, ao ligarem ao sítio alostérico, são capazes de aumentar ou diminuir a atividade da enzima. A análise mais apuradas (difração de raio X e ressonância magnética) da estrutura das enzimas permitiu aos enzimologista a compreenderem que o substrato induz modificações sutis na estrutura das enzimas, o que torna a catálise mais eficiente. Esse modelo é conhecido como encaixe induzido e baseia- se nas modificações sofridas pelas enzimas durante a catálise. Figura 3-3: Modelos de Interação entre Enzima e Substrato Cada enzima apresenta grau de especificidade, podem agir em vários substratos correlacionados ou ser capa de diferenciar isômeros de um mesmo composto. Exemplo disso são as enzimas digestivas que degradam proteínas dos alimentos, mas não atuam em carboidratos e lipídeos; e as enzimas responsáveis pela síntese de DNA que apresentam taxas de 1 erro em 1.000.000 nucleotídeos, sendo capaz de retornar verificando se o nucleotídeo adicionado ao DNA está corretamente pareado. As enzimas possuem normalmente uma alta especificidade em relação às reações que catalisam e aos substratos que estão envolvidos nessas reações. A forma complementar, carga e características hidrofílicas/hidrofóbicas, são responsáveis por esta especificidade. As enzimas exibem também elevados níveis de estereoespecificidade, regioseletividade e quimioseletividade. Algumas enzimas que produzem metabolitos secundários são descritos como promíscuos, visto que podem atuar num largo espectro de diferentes substratos. Tem sido sugerido que este tipo de especificidade diminuída é importante nos processos de evolução de novas vias no metabolismo. Modelo Chave-Fechadura Modelo Encaixe-Induzido Enzima Sítio Ativo Substrato Complexo Ativado (Complexo ES) Enzima Sítio Ativo Substrato Complexo Ativado (Complexo ES) 24 2.4 ENZIMAS ALOSTÉRICAS As enzimas reguladas por modificações não-covalentes são chamadas de alostéricas. As mesmas são encontradas em quase todas as vias metabólicas e geralmente catalisa uma reação irreversível localizada no início da via. Quanto à sua estrutura, são oligoméricas, ou seja, compostas de varias cadeias polipeptídicas, cada uma com um sítio alostérico. A ligação do substrato ao sítio alostérico de uma das subunidades afeta a conformação das demais, facilitando ou dificultando a ligação dos demais substratos ao sítio ativo. As enzimas alostéricas são sensíveis à reguladores do metabolismo, pois ao se ligarem a determinados metabólitos celulares sofrem grandes alterações em sua atividade. Estes metabólitos também podem ser chamados de efetuadores ou moduladores alostéricos, e podem ser positivos (aumento da velocidade da enzima) ou negativos (redução da velocidade da enzima) de acordocom o seu efeito. Portanto, os moduladores alostéricos podem atuar tanto como inibidores como ativadores da reação enzimática. Na maioria das vias metabólicas é comum que o produto final atue como modulador alostérico negativo da enzima que catalisa as primeiras reações da via. Portanto, quando a concentração deste produto fica aumentada ele age como um inibidor alostérico, diminuindo a velocidade da via e a sua própria produção. Este mecanismo é denominado inibição por retroalimentação ou feedback. Caso o produto final comece a ser consumido, consequentemente sua concentração diminui, deixando de inibir a via metabólica, proporcionando o retorno do funcionamento da mesma. Figura 3-04: Enzima Alostérica 2.5 ISOENZIMAS As isoenzimas são enzimas que diferem na seqüência de aminoácidos, mas catalisam a mesma reação química. Elas são codificadas por genes diferentes e apresentam parâmetros cinéticos peculiares, ou seja, diferentes valores de KM e diferentes propriedades de regulação. As isoenzimas são o resultado de diferentes alterações nucleotídicas, a exemplo de duplicação de genes e inserção ou deleção de bases. O acúmulo de mutações pode ocasionar a perda de função de uma das isoenzimas, mas algumas dessas enzimas persistiram durante a evolução, pois sua função é idêntica à original, com pequenas alterações nos mecanismo de regulação de cada uma das isoformas. A existência de isoenzimas permite o ajuste fino do metabolismo por satisfazer as necessidade particulares de um determinado tecido ou um dado estágio do desenvolvimento. Considerem a lactato desidrogenase (LDH), uma enzima que funciona no metabolismo anaeróbio e na síntese da glicose. Os seres humanos têm duas cadeias isoenzímicas para esta enzima; a isoenzima H, muito expressa no coração, e a isoenzima M, encontrado no músculo esquelético. A sequência de aminoácidos entre as duas isoformas é 75% idêntica. Estado 1 (Inativo) Estado 2 (Ativo) 25 A enzima funcional é um tetrâmero, e são possíveis muitas combinações diferentes das duas subunidades. A isoenzima H4, encontrada no coração, tem maior afinidade pelo substrato do que M4. As duas isoenzimas também diferem porque os nívesi altos de piruvato inibem alostericamente a H4, mas não a isoenzima M4. As outras combinações, como H3M, têm propriedades intermediárias dependendo da proporção destes dois tipos de cadeia. Figura 3-04: Isoenzimas – Lactato Desidrogenase Coração Rins Hemácias Cérebro Leucócito Músculo Fígado 26 2.6 ATIVIDADE ENZIMÁTICA As enzimas convertem reagentes (substratos) em produtos específicos. Isso significa que, em geral, uma enzima catalisa um tipo de reação química. Conseqüentemente, o tipo de enzimas encontrados numa célula determina o tipo de metabolismo que a célula efetua. A velocidade da reação catalisada por uma enzima é aumentada devido a diminuição da energia de ativação necessária para converter o substrato em produto. O aumento da velocidade da reação pode ser da ordem de milhões de vezes: por exemplo, a enzima orotidina-5'-fosfato descarboxilase diminui o tempo da reação por ela catalisada de 78 milhões de anos para 25 milissegundos. A velocidade da reação catalisada pelas enzimas é diretamente proporcional à concentração dos reagentes, ou seja, em uma transformação simples de A→B a velocidade pode ser representada por v=k[A]; com o decorrer da reação a concentração de A diminui e, conseqüentemente, a velocidade da reação diminui. O método utilizado para obtenção da velocidade de uma reação enzimática é baseado em uma padronização laboratorial chamada de velocidade inicial (v0). A velocidade de uma reação química é definida pelo número de moléculas de reagente(s) que são convertidas em produto(s), em um período de tempo especificado e depende da concentração dos componentes químicos envolvidos no processo e das constantes de velocidade, que são características da reação. A maioria das reações que ocorrem na natureza é reversível. Cada reação química apresenta um ponto de equilíbrio característico, onde as velocidades absolutas na direção da formação de produto(s) e na direção de formação de reagente(s) são iguais. Este ponto de equilíbrio é descrito por uma constante de equilíbrio, que corresponde à relação entre as duas constantes de velocidade. Figura 3-05: Enzimas: um catalisador biológico Esta velocidade é obtida medindo-se a quantidade de produto formado em tempos suficientemente curtos para que, no máximo, 5% do reagente (substrato) seja consumido. Com esse método pode-se considerar que a concentração do substrato permanece aproximadamente constante durante o tempo medido. Outro fator relevante é o tempo da reação, que não é semelhante entre as enzimas, isto é, cada enzima apresenta afinidade diferente pelo seu substrato e tempos diferentes de reação. 27 k1 k2 k3 As enzimas, como outros catalisadores, não interferem na constante de equilíbrio das reações, mas aumentam a velocidade das reações químicas, diminuindo a energia de ativação dos reagentes necessa´ria para alcançar o estado de transição. As enzimas não somente aceleram as reações, mas também acoplam reações endergônicas e exergônicas. Considere a energia livre (ΔG°’) necessária para transformar glicose em glicose-6-fosfato: Glicose + Pi → Glicose-6-Pi ΔG°’ = 4,0 kcal/mol e a energia de hidrólise do ATP: ATP → ADP + Pi ΔG°’ = -7,3 kcal/mol Das reações citadas acima, somente a hidrólise do ATP é possível, pois é uma reação exotérmica (liberação de energia) e dessa forma diminui a energia do sistema. A reação de glicose para glico-6-Pi é endotérmica, aumentado a entropia do sistema, logo é uma reação dita impossível. Mas a enzima hexocinase catalisa o acoplamento destas duas reações, gerando glicose-6-fosfato, com ΔG°’ de hidrólise -3,3 kcal/mol: Glicose + ATP → Glicose-6-Pi + ADP + Pi ΔG°’ = -3,3 kcal/mol Em 1913, Leonor Michaelis e Maud Menten propuseram um modelo simples para explicar essas características cinéticas. Elas propuseram que uma enzima, E, combina-se com o substrato, S, formando um complexo ES (complexo ativado), com uma constante de velocidade k1. O complexo ES pode dissociar-se para E e S, com uma constante de velocidade k2, ou pode prosseguir formando o produto P, com uma constante de velocidade k3. Na etapa inicial da reação, antes que a concentração de produto seja apreciável, quase nada do produto é revertido para o substrato inicial. E + S ⇌ ES ES → E + P E + S ⇌ ES → E + P A velocidade de formação ES será v1=k1 [E][S] [E] representa a quantidade de enzima livre, que é a diferença entre a concentração de enzima total [Et] e a concentração de enzima ligada ao substrato [ES]. Substituindo esses valores em [E] temos: v1=k1 ([Et] – [ES]) . [S] 28 A velocidade de desaparecimento de ES será a soma de v2 = k2 [ES] dissociação de ES em E + S v3 = k3 [ES] transformação de ES em E + P ou seja, v2 + v3 = k2 [ES] + k3 [ES] → v2 + v3 = (k2 + k3) . [ES] Durante os tempos considerados iniciais da reação, a concentração de ES mantém-se constante, com o estabelecimento de um equilíbrio estacionário (steady-state). As velocidades de formação (v1) e de desaparecimento (v2 + v3) de ES são, portanto, iguais. v1 = v2 + v3 k1 ([Et] – [ES]) . [S] = (k2 + k3) . [ES] ([Et] – [ES]) . [S] = (k2 + k3) . [ES] k1 [Et] . [S] – [ES] . [S] = (k2 + k3) . [ES] k1 [Et] . [S] = (k2 + k3) . [ES] + [ES] . [S] k1 [Et] . [S] = [ES] (k2 + k3) + [S] k1 [ES] = [Et] . [S] Equação A (k2 + k3) + [S] k1 A velocidade inicial da reação total é a velocidade do aparecimento do produto. v0 = k3 [ES] Substituindo o valor de [ES] na equação A:v0 = k3 [Et] . [S] (k2 + k3) + [S] k1 29 A velocidade máxima (Vmáx) da reação corresponde ao produto k3 . [Et] v0 = Vmáx . [S] (k2 + k3) + [S] k1 A relação entre (k2 + k3)/ k1 foi definida por Michaelis-Menten como uma nova constante, KM (Constante de Michaelis-Menten). Chega-se assim à expressão final da equação de Michaelis-Menten. v0 = Vmáx . [S] KM + [S] Quando a velocidade inicial é igual à metade da velocidade máxima teremos Vmáx = Vmáx . [S] 2 KM + [S] 1 = [S] 2 KM + [S] KM + [S] = 2 [S] → KM = [S] A última igualdade indica que a constate de Michaelis-Menten (KM) é numericamente igual à concentração de substrato que determina a metade da velocidade máxima, o que permite a fácil determinação experimental dessa constante. 2.7 FATORES QUE INTERFEREM NA ATIVIDADE ENZIMÁTICA A atividade enzimática depende de muitos fatores, dentre eles podemos citar a concentração do substrato e da enzima, a temperatura, o pH e a pressão. Quanto a concentração do substrato, a atividade aumenta linearmente com o aumento da concentração do reagente, indicando que durante a reação ainda havia moléculas de enzimas livres, mas depois de uma determinada concentração a velocidade mantém-se constante, indicando que toda enzima está na forma de ezima-substarto [ES] e, nesse ponto a velocidade não aumenta, permanecendo constante. Figura 3-5: Concentração do Substrato x Atividade Enzimática 30 O aumento da concentração da enzima aumenta a velocidade da reação, pois disponibiliza mais enzima livre, e dessa forma pode haver mais formação do complexo enzima-substrato e transformação de substrato em produto. Figura 3-6: Concentração da Enzima x Atividade Enzimática A elevação da temperatura aumenta o grau de agitação das moléculas, podendo ocasionar o rompimento das forças que matem a estrutura das enzimas, alterando a estrutura tridimensional desses catalisadores. O pH também é um fator importante, uma vez que alguns dos aminoácidos que compõe a estrutura da enzima apresenta grupos que podem ser protonados ou desprotonados, isso pode alterar a conformação espacial e carga elétrica das enzimas interrompendo a interação desse catalizador com o meio e com o seu substrato. Quando a enzima perde a sua estrutura tridimensional e, portanto, as suas propriedades, dizemos que ela sofreu desnaturação. Cada enzima possui um KM característico para um dado substrato; este parâmetro é muitas vezes usado para demonstrar a afinidade da enzima para diferentes substratos. Um exemplo disso é a enzima hexocinase, que degrada carboidratos com seis carbonos, mas apresenta afinidade diferente para cada um deles. No caso em que o substrato é a glicose, a metade da Vmáx é obtida com concentração do açúcar igual a 0,15mM, ou seja, é necessário uma concentração de 0,15mM de glicose para que metade da enzima disponível encontre-se ligada à glicose. Para conseguir situação análoga com a frutose, é necessário uma concentração de frutose 10 vezes maior, ou seja, 1,5mM. Então, a hexocinase tem maior afinidade pela glicose, pois seu KM para esse substrato é menor. 2.8 TRANSFORMAÇÃO DE LINEWEAVER-BURK A equação de Michaelis-Menten é a equação de uma hipérbole retangular; portanto, rigorosamente, os valores de Vmáx nunca são atingidos, pois a curva tem assíntota no valor do eixo v0. Este fato dificulta a determinação do KM, ainda mais levando-se em conta que boas aproximações dos valores de Vmáx devem ser obtidas com concentração tão altas de substratos que são, às vezes, experimentalmente difíceis de conseguir. 31 O problema de determinação exata do KM e da Vmáx pode, entretanto, ser resolvido através da transformação algébrica da equação de Michaelis-Menten. Esta transformação, formulada por Lineweaver e Burk, é obtida tomando o inverso daquela equação. 1 = KM + [S] v0 Vmáx . [S] ou 1 = KM . 1 + 1 v0 Vmáx [S] Vmáx que é uma reta do tipo y = ax + b Um gráfico com valores de 1/v0 contra valores de 1/[S] é, portanto, uma reta cujo intercepto nas ordenadas é 1/Vmáx e, nas abscissas, – 1/KM. Esta inversão permiti a determinação do valor de KM (e de Vmáx) sem que seja necessário determinar experimentalmente o valor de Vmáx, já que a reta pode ser traçada a partir de alguns pontos experimentais, prolongando-se a reta até o eixo das ordenadas, encontram-se o valor do inverso de Vmáx; o ponto em que a reta corta o eixo das abscissas fornecerá o valor negativo do inverso de KM. Figura 3-6: Transformação De Lineweaver-Burk 2.9 INIBIDORES Os inibidores são moléculas capazes de impedir o diminuir a atividade das enzimas. Os inibidores podem ser utilizados pelas células para controlar processos biológicos complexos, a exemplo das vias metabólicas. Algumas vezes os inibidores podem ser tornar venenos, pois o excesso deles pode desativar muitas enzimas; ou ainda, os inibidores são utilizados como fármacos no controle de estados metabólicos indesejados. Os inibidores são classificados em: - Inibidores Irreversíveis: são moléculas que reagem com as enzimas levando-as praticamente a inativação total. Esses inibidores dissociam-se muito lentamente de suas enzimas, porque ficam ligados muito fortemente à enzima, por covalência ou não. Exemplos de inibidores irreversíveis são os compostos organofosforados, que formam ligações covalentes com os resíduos de aminoácidos das enzimas (principalmente serina e cisteína); a aspirina (ácido acetil-salicílico) que age modificando covalentemente a enzima ciclo-oxigenase, reduzindo a síntese de sinais de inflamação; a penicilina, que atua modificando por covalência a enzima transpeptidase, impedindo a síntese da parede celular bacteriana. 32 - Inibidores Reversíveis: São substâncias que inativam as enzimas por um pequeno período de tempo, ou seja, o inibidor reversível é caracterizado por uma rápida dissociação do complexo enzima-inibidor. Os inibidores reversíveis podem ser divididos em: a) Inibição Competitiva: o inibidor tem estrutura espacial semelhante ao do substrato, por isso existe uma competição pelo centro ativo da enzima. A molécula que estiver em maior concentração, inibidor ou substrato, é aquela que vai se ligar primeiramente a enzima, impedindo dessa forma ligação da outra. Um inibidor competitivo diminui a velocidade de catálise ao reduzir a proporção de moléculas de enzimas ligadas a um substrato. A velocidade máxima da reação não é alterada, mas o KM aumenta. b) Inibição Não-Competitiva: o minibidor não apresenta semelhança estrutural como substrato, logo não compete pelo sítio ativo da enzima. Esse inibidor apresenta outro sítio de ligação, podendo associar-se a enzima livre ou como o complexo enzima-substrato. A velocidade máxima da reação diminui, mas o KM não é alterado. c) Inibição Incompetitiva: nesse caso o inibidor só se liga ao complexo enzima substrato. Isso acontece, porque o sítio de ligação do inibidor só surge após a interação da enzima com o seu substrato. Logo, quanto mais substrato maior será a inibição. A velocidade máxima da reação diminui e o KM é alterado. Figura 3-7: Inibidores Irreversíveis Compostos Organofosforados Malathion Dimetoato Chlorfenvinphos Parathion Tetraetil Fosfato - TEPP Trichlorfon Fármacos Ácido Acetilsalicílico Penicilina Amoxicilin a Ampicilina Tetracilina Estreptomici na Neomicina 33 Figura 3-8: Inibidores Não-Competitivos: Metais Pesados Figura 3-8: Inibidores Competitivos Substrato Enzima Inibidor Diidropteroato sintase Adenilsuccinatosintase Timidilato sintase Diidrofolato redutase Sulfanilamida: utilizado para combater infecções bacterianas Mercaptopurina: utilizado no tratamento de leucemia Fluorouracila: utilizado no combate de tumores Metotrexato: utilizado no tratamento de leucemia AZT (3’-azido-2’-desotimidina): utilizado no tratamento de AIDS p-Aminobenzoato Hipoxantina Uracila Diidrofolato Desotimidina DNA polimerase viral 34 35 2.10 CORRELAÇÕES CLÍNICAS As enzimas são proteínas com propriedades catalisadoras sobre as reações que ocorrem nos sistemas biológicos. Elas têm um elevado grau de especificidade sobre seus substratos acelerando reações específicas sem serem alteradas ou consumidas durante o processo. O estudo das enzimas tem imensa importância clínica. Em algumas doenças as atividades de certas enzimas são medidas, principalmente, no plasma sangüíneo, eritrócitos ou tecidos. Todas as enzimas presentes no corpo humano são sintetizadas intracelularmente. Três casos se destacam: Enzimas plasma-específicas: Enzimas ativas no plasma e utilizadas no mecanismo de coagulação sangüínea e fibrinólise. Ex.: pró-coagulantes: trombina, fator XII, fator X e outros. Enzimas secretadas: São secretadas geralmente na forma inativa e após ativação atuam em locais extracelulares. Os exemplos mais óbvios são as proteases ou hidrolases produzidas no sistema digestório. Ex.: lipase, α-amilase, tripsinogênio e antígeno prostático específico. Enzimas celulares: Normalmente apresentam baixos teores séricos, mas os níveis aumentam quando são liberadas a partir de tecidos lesados por alguma doença. Isto permite inferir a localização e a natureza das variações patológicas em alguns órgãos, tais como: fígado, pâncreas e miocárdio. A elevação da atividade sérica depende do conteúdo de enzima do tecido envolvido, da extensão e do tipo de necrose. São exemplos de enzimas celulares as transaminases, lactato desidrogenases, etc. As meias-vidas das enzimas teciduais após liberação no plasma apresentam grande variabilidade – nos casos de enzimas medidas com propósitos diagnósticos e prognósticos podem variar desde algumas horas até semanas. Em condições normais as atividades enzimáticas permanecem constantes, refletindo o equilíbrio entre estes processos. Modificações nos níveis de atividade enzimática ocorrem em situações onde este balanço é alterado. As elevações na atividade enzimática são devidas: Aumento na liberação de enzimas para o plasma é conseqüência de: - Lesão celular extensa, as lesões celulares são geralmente causadas por isquemia ou toxinas celulares, por exemplo: na elevação da atividade da isoenzima CK-MB após infarto do miocárdio. - Proliferação celular e aumento na renovação celular, por exemplo: aumentos na fosfatase alcalina pela elevação da atividade osteoblástica durante o crescimento ou restauração óssea após fraturas. - Aumento na síntese enzimática, por exemplo: marcada elevação na atividade da γ-glutamil transferase após a ingestão de álcool. - Obstrução de ductos – afeta as enzimas normalmente encontradas nas secreções exócrinas, por exemplo: a amilase e a lipase no suco pancreático. Estas enzimas podem regurgitar para a corrente circulatória se o ducto pancreático-biliar estiver bloqueado. 36 Redução da remoção de enzimas do plasma devido à insuficiência renal. Afetas enzimas excretadas na urina, por exemplo: a amilase pode estar elevada na insuficiência renal. A redução nos níveis de atividade enzimática são comuns e ocorrem na: - Síntese enzimática reduzida, por exemplo: colinesterase baixa na insuficiência hepática grave pela redução do número de hepatócitos. - Deficiência congênita de enzimas, por exemplo: baixa atividade da enzima fosfatase alcalina plasmática na hipofosfatasemia congênita. - Variantes enzimáticas inerentes com baixa atividade biológica, por exemplo, variantes anormais da colinesterase. A utilidade diagnóstica da medida das enzimas plasmáticas reside no fato que as alterações em suas atividades fornecem indicadores sensíveis de lesão ou proliferação celular. Estas modificações ajudam a detectar e, em alguns casos, localizar a lesão tecidual, monitorar o tratamento e o progresso da doença. No entanto, muitas vezes falta especificidade, isto é, existem dificuldades em relacionar a atividade enzimática aumentada com os tecidos lesados. Isto porque as enzimas não estão confinadas a tecidos ou órgãos específicos, pois estão grandemente distribuídas e suas atividades podem refletir desordens envolvendo vários tecidos. Na prática, a falta de especificidade é parcialmente superada pela medida de vários parâmetros (que incluem várias enzimas). Como as concentrações relativas das enzimas variam consideravelmente em diferentes tecidos, é possível, pelo menos em parte, identificar a origem de algumas enzimas. Por exemplo, apesar das enzimas transaminases ALT (GTP) e AST (GOT) serem igualmente abundantes no tecido hepático, a AST (GOT) apresenta concentração 20 vezes maior que a ALT (GTP) no músculo cardíaco. A determin ação simultânea das duas enzimas fornece uma clara indicação da provável localização da lesão tecidual. A especificidade enzimática pode também ser aumentada pela análise das formas isoenzimáticas de algumas enzimas como na lactato desidrogenase. A seleção de quais enzimas medir com propósitos diagnósticos e prognósticos depende de vários fatores. As principais enzimas de uso clínico, juntamente com seus tecidos de origem e aplicações clínicas são listadas na tabela 3-05. Tabela 3-05: Distribuição de algumas enzimas de importância diagnóstica Enzima Principal fonte Principais aplicações clínicas Amilase ovários Glândulas salivares, pâncreas, Enfermidade pancreática Aminotransferases (transaminases) Fígado, músculo esquelético, coração, rim, eritrócitos Doenças do parênquima hepático, infarto do miocárdio, doença muscular Antígeno prostático específico Próstata Carcinoma de próstata Creatina quinase Músculo esquelético, cérebr o, coração, músculo liso Infarto do miocárdio, Fosfatase ácida Próstata, eritrócitos Carcinoma da próstata Fosfatase alcalina Fígado, osso, mucosa intestinal, placenta, rim Doenças ósseas, enfermidades hepáticas γ-Glutamiltransferase Fígado, rim Enfermidade hepatobiliar, alcoolismo Lactato desidrogenase Coração, fígado, músculo esquelético, eritrócitos, plaquetas, nódulos linfáticos Infarto do miocárdio, hemólise, doenças do parênquima hepático Lipase Pâncreas Enfermidade pancreática 37 CARBODRATOS 3. INTRODUÇÃO O açúcar que as pessoas põem no café, as fibras de uma folha de papel e o principal constituinte da carapaça de um besouro são substâncias que pertencem ao mesmo grupo: os carboidratos. Sabe-se, há muito tempo, que essas substâncias atuam como reservas de energia do organismo, mas estudos recentes revelam que elas têm outras – e importantes – funções biológicas. Os carboidratos são as macromoléculas mais abundantes na natureza. Suas propriedades já eram estudadas pelos alquimistas, no século 12. Durante muito tempo acreditou-se que essas moléculas tinham função apenas energética no organismo humano. A glicose, por exemplo, é o principal carboidrato utilizado nas células como fonte de energia. O avanço do estudo desses compostos, porém, permitiu descobrir outros eventos biológicos relacionados aos carboidratos, como o reconhecimento e a sinalização celular, e tornou possível entender os mecanismos moleculares envolvidos em algumas doenças causadas por deficiência ou excesso dessas moléculas. O avanço científico permitiu conhecer de modo mais detalhado as propriedades físico-químicas dos carboidratos, resultando na exploração dessas características em diversos processos industriais, como nas áreas alimentar e farmacêutica. Um dos carboidratoscom maior utilização médica é a heparina, composto de estrutura complexa, com ação anticoagulante e antitrombótica. A combinação das diferentes funções bioquímicas de cada uma dessas moléculas permite a integridade da célula e de todos os processos metabólicos, fisiológicos e genéticos dos organismos vivos. A partir da década de 1970, o surgimento de técnicas avançadas de cromatografia, eletroforese e espectrometria permitiram ampliar a compreensão das funções dos carboidratos. Hoje existe um novo ramo da ciência – a glicobiologia – voltado apenas para o estudo desses compostos. Sabe-se agora que eles participam da sinalização entre células e da interação entre outras moléculas, ações biológicas essenciais para a vida. Os primórdios do estudo de carboidratos estão ligados ao seu uso como agentes adoçantes (mel) ou no preparo do vinho a partir da uva. Nos escritos dos alquimistas mouros, no século 12, há referências ao açúcar da uva, conhecido hoje como glicose. Os relatos iniciais sobre açúcares na história vêm dos árabes e persas. Na Europa, o primeiro agente adoçante foi sem dúvida o mel, cuja composição inclui frutose, glicose, água, vitaminas e muitas outras substâncias. Há indícios de que Alexandre, o Grande – o imperador Alexandre III da Macedônia (356-323a.C.) – introduziu na Europa o açúcar obtido da cana-de-açúcar, conhecido hoje como sacarose (e o primeiro açúcar a ser cristalizado). A dificuldade do cultivo da cana-de-açúcar no clima europeu levou ao uso, como alternativa, do açúcar obtido da beterraba (glicose), cristalizado em 1747 pelo farmacêutico alemão Andreas Marggraf (1709-1782). A história dos carboidratos está associada a seu efeito adoçante, mas hoje sabemos que a maioria desses compostos não apresenta essa propriedade. Os carboidratos são os “combustíveis da vida”. Eles armazenam a energia nos seres vivos, na forma de amido e glicogênio (outro polissacarídeo), e a liberam para as reações metabólicas quando são degradados (em especial a glicose). Atuam ainda como doadores de carbono para a síntese de outros constituintes das células. São os principais produtos da fotossíntese, processo em que a energia solar é transformada em energia química pelas plantas e depois transferida, através da cadeia alimentar, para os animais. Estima-se que sejam formados mais de 100 bilhões de toneladas de carboidratos na Terra, a cada ano, pela fotossíntese – nesse processo, as plantas captam a luz solar e usam sua energia para promover reações, envolvendo moléculas de gás carbônico (CO2) e de água (H2O), que produzem glicose, armazenada depois como amido nos tecidos vegetais. 38 Entretanto, os carboidratos não têm apenas função energética. Estão presentes também na superfície externa da membrana das células. Nesse caso, podem ser glicoproteínas (quando ligados a uma proteína), glicolipídios (se unidos a um lipídio) ou proteoglicanos (quando estão na forma de cadeias de glicosaminoglicanos – um tipo de polissacarídeo – unidas a uma proteína). Essas formas conjugadas presentes nas membranas atuam como receptores e sinalizadores, interagindo com moléculas e outras células. A remoção de hemácias envelhecidas do sangue foi um dos primeiros eventos biológicos estudados que revelou a participação da estrutura dos carboidratos (em glicoproteínas) em um processo de “sinalização”. Hemácias jovens têm, em sua superfície, glicoproteínas cuja extremidade é rica em ácido siálico. Quando tais células envelhecem, suas glicoproteínas perdem esse ácido e passam a expressar, em sua extremidade, a galactose. Esse monossacarídeo é reconhecido por receptores do fígado, que então capturam e removem da circulação as hemácias “velhas”. Os grupos sangüíneos A, B, O e AB são outros exemplo típicos de um sistema de sinalização controlado pela estrutura de carboidratos em glicoproteínas. Os grupos A e B diferem em apenas um tipo de monossacarídeo nos glicolipídios ou glicoproteínas das hemácias. No A está presente a N- acetilgalactosamina (uma galactose ligada a grupos químicos amino e acetil) e o B tem a galactose – a diferença entre esses dois carboidratos está em apenas alguns átomos, mas isso pode levar a um resultado fatal, se o indivíduo receber o tipo sangüíneo incompatível em uma transfusão. Os carboidratos encontrados nesses compostos mistos também funcionam como receptores na membrana celular. A ação de diversas toxinas de plantas e bactérias (da cólera, da difteria, do tétano e do botulismo, entre outras) depende da interação com gangliosídios (glicolipídios ácidos) específicos de suas células-alvo. Por isso, estudos nessa área pretendem projetar agentes terapêuticos capazes de inibir essa interação, evitando os efeitos nocivos das toxinas. Em 2005, o glicocientista Lior Horonchik e seus colaboradores, do Departamento de Biologia Molecular da Escola de Medicina de Jerusalém (em Israel), mostraram que a degeneração dos neurônios causada por infecção pelo príon (proteína responsável pelo chamado “mal da vaca louca”) depende da presença, na superfície das células nervosas, de receptores (proteoglicanos) que contêm glicosaminoglicanos. O príon precisa interagir com esses polissacarídeos para entrar no neurônio – isso significa que o papel deles no reconhecimento celular é fundamental para o desenvolvimento dessa infecção. Algumas moléculas reguladoras da proliferação de tipos celulares – como o fator de crescimento para fibroblastos (FGF) e o fator de transformação do crescimento β (TGF- β) – também atuam interagindo com os carboidratos dos proteoglicanos. Essas informações permitem que os glicocientistas desenvolvam moléculas com o objetivo de regular esses processos biológicos. Além da importância biológica dos carboidratos, esses compostos são matérias-primas para indústrias importantes, como as de madeira, papel, fibras têxteis, produtos farmacêuticos e alimentícios. A celulose é o principal carboidrato industrial, com um consumo mundial estimado em quase 1 bilhão de toneladas por ano. Alguns polissacarídeos, como ágar, pectinas e carragenanas, extraídos de algas marinhas, são utilizados – graças a suas propriedades gelatinosas – em cosméticos, remédios e alimentos. A carragenana é empregada para revestir cápsulas (drágeas) de medicamentos, para que o fármaco seja liberado apenas no intestino, aumentando a sua absorção. O ágar serve ainda para a cultura de microorganismos, em laboratórios. Tanto o ágar como a carragenana são também usados, como espessantes, na produção de sorvetes. A sacarose (extraída da cana-de-açúcar) é o principal adoçante empregado na culinária e na indústria de doces. O açúcar ‘invertido’ (obtido pela ‘quebra’ da sacarose, que resulta em uma mistura de glicose e frutose) é menos 39 cristalizável, mas muito usado na fabricação de balas e biscoitos. A quitosana, um polissacarídeo derivado da quitina, tem sido utilizada no tratamento da água (para absorver as gorduras), na alimentação e na saúde. Por sua atuação na redução da gordura e do colesterol, a quitosana pode ajudar no combate à obesidade, e estudos farmacológicos recentes comprovaram que ela apresenta efeitos antimicrobianos e antioxidantes. Outro exemplo de polissacarídeo usado na indústria farmacêutica é o condroitim-sulfato, um tipo de glicosaminoglicano. Os colírios oftalmológicos, em sua maioria, são soluções de condroitim- sulfato, já que esse composto é o constituinte predominante da matriz extracelular do globo ocular e tem grande afinidade por água, o que permite melhor lubrificação. Também vem sendo utilizado na prevenção e tratamento da osteoartrose, talvez porque seja abundante em proteoglicanos do tecido cartilaginoso. 3.1 CLASSIFICAÇÃO Os carboidratos (também chamados sacarídeos, glicídios, oses, hidratos de carbono ou açúcares), são definidos, quimicamente, como poli-hidróxi-cetonas (cetoses) ou poli-hidróxi-aldeídos (aldoses), ou seja, compostos orgânicos com, pelo menos três carbonos onde todos oscarbonos possuem uma hidroxila, com exceção de um, que possui a carbonila primária (grupamento aldeídico) ou a carbonila secundária (grupamento cetônico). Eles são quimicamente mais simples do que os nucleotídeos ou aminoácidos, pois na maioria das vezes apresenta apenas três elementos – carbono, hidrogênio e oxigênio – combinados de acordo com a fórmula (CH2O)n, onde n pode variar de 3 a 8. Os carboidratos não catalisam reações químicas como as proteínas, nem se replicam como os ácidos nucléicos, mas devido ao fato dos carboidratos não serem construídos de acordo com um molde genético, eles tendem a ser muito mais heterogêneos, tanto em tamanho como em forma. a) Monossacarídeos São os carboidratos mais simples. Possuem de 3 a 8 carbonos, sendo denominados, respectivamente, trioses, tetroses, pentoses, hexoses, heptoses e octoses. Têm uma única unidade cetônica ou aldeídica, possuindo pelo menos um átomo de carbono assimétrico (C*) existindo, portanto, formas estereoisoméricas, com exceção da di-hidróxi-cetona, que não possui C* (Figura 4-1). Figura 4-1: Estrutura Química do Gliceraldeido e da Dihidroxicetona Os C* possibilitam a existência de isômeros ópticos e caracterizam a região da molécula denominada centro quiral, do latim quiros = mão, em referência a conformação isomérica semelhante a duas mãos que não se superpõe, mas são idênticas. Os monossacarídeos possuem, portanto, inúmeros isômeros estruturais e ópticos, com os quais compartilham a prioridade nos processos bioenergéticos. Para o gliceraldeido, o C2 é o centro assimétrico 40 que origina dois estereoisômeros: o D-gliceraldeido e o L-gliceraldeido, que são enatiômeros (imagens especulares) um dos outros (Figura 4-2). Figura 4-2: Formas Isoméricas (Enatiômeros) Todo açúcar com a mesma configuração do D-gliceraldeido e, portanto, com a mesma configuração no centro assimétrico mais afastado do grupo funcional, são da série D. As propriedades ópticas dos monossacarídeos são designados pelos sinais (+), dextrorrotatória e (-), levorrotatória. Os estereoisômeros que não são enatiômeros são chamados de diastereoisômeros. Os açúcares D- ribose e D-arabidose são diastereoisômeros por serem isômeros, mas não são imagens especulares (Figura 4-3). Figura 4-3: Diastereoisômeros Os diastereoisômeros que diferem na configuração ao redor de um único C são denominados epímeros. A D-glicose e a D-galactose são epímeros, porque diferem somente na configuração do grupo OH no C4 (Figura 4-4). A D-galactose e a D-manose não são epímeros, pois suas configurações diferem em mais de um carbono (Figura 4-5). Figura 4-4: Epímeros Figura 4-5: Não Epímeros 41 Este grande número de isômeros leva a ocorrência de uma mistura racêmica quando os carboidratos encontram-se dissolvidos em água. Entretanto, o equilíbrio tende para a forma mais estável que é obtida por uma reação intramolecular que ocorre entre a carbonila do grupamento funcional com uma das muitas hidroxilas da molécula, formando um composto cíclico denominado hemiacetal. Esta forma cíclica dos monossacaríedeos é possível graças à grande diferença de eletronegatividade do oxigênio e os átomos de carbono e hidrogênio da molécula, que dá aos carbonos e hidrogênio uma carga elétrica parcialmente positiva e aos oxigênios uma carga parcialmente negativa. Entretanto, devido à configuração espacial final da molécula de hexoses e pentoses, há a possibilidade de reação intramolecular entre o grupamento funcional e um dos carbonos mais distantes, formando um composto cíclico (hemiacetal) que se mostra mais estável que a forma aberta, não cíclica (Figura 4-6). Figura 4-6: Formação do Hemicetal 42 Os monossacarídeos de ocorrência natural mais comum, como a ribose (5C), glicose (6C), frutose (6C) e manose (6C), existem na forma de hemiacetais quer na formas de furanose (um anel de 5 elementos, menos estável) ou de piranose (um anel de 6 elementos, mais estável). Esta denominação está relacionada com a semelhança com o furano e o pirano (figura 4-7), poderosos solventes orgânicos, mas que não tem nenhuma relação com os monossacarídeos, a não ser a semelhança estrutural. Figura 4-7: Furano e o Pirano Esta forma estrutural cíclica de hemiacetal resulta da reação intramolecular entre o grupamento funcional (C1 nas aldoses e C2 nas cetoses) e um dos carbonos hidroxilados do restante da molécula (C4 na furanose e C5 na piranose). Furanoses e piranoses ocorrem nas formas isoméricas α e β (cis ou trans), conforme a posição da hidroxila do C2 em relação à hidroxila do C1 (figura 4-8). Figura 4-8: Formas Ismoméricas α e β 43 Uma propriedade química importante de monossacarídeos livres ou ligados a outros elementos (inclusive a outros monossacarídeos), é o poder redutor (são oxidados) se o o C1, na forma de hemiacetal, apresentar hidroxila livre, ou seja, não esteja ligado a nenhum composto. Este poder redutor pode ser comprovado ao reagir um carboidrato (p.ex.: a glicose) com um reagente suscetível a redução (um oxidante), como o Cu+2, que se reduz a Cu+1. Essas reações clássicas de oxi-redução foram um dos primeiros métodos de identificar glicose em líquidos orgânicos. O poder redutor da glicose revela, também, a sua capacidade de se oxidar durante o processo metabólico. a oxidação química da glicose no C1 fornece o ácido glicônico, enquanto o produto final da oxidação enzimática completa no metabolismo celular é CO2 e H2O. Uma implicação importante deste poder redutor é comprovada na caracterização do poder redutor em cetoses (normalmente, cetonas não são redutores, aldeídos sim). Isto pode ser explicado pelo fato de cetoses e aldoses se interconverterem através de um fenômeno químico chamado tautomeria, devido a um rearranjo molecular entre o C2 e o C1 das cetoses, formando seu isômero aldose. Assim a frutose, por exemplo, converte-se em glicose e, como tal, apresenta poder redutor. De fato, uma solução de glicose contém na verdade uma mistura em equilíbrio de glicose e frutose. Todos os monossacarídeos possuem inúmeros isômeros ópticos, estruturais e de função, mas apenas a α-D-glicopiranose possui uma via metabólica comum a todos os seres vivos. Este fato faz deste monossacarídeo o mais importante para o metabolismo energético, com os demais tendo que ser convertido em glicose ou em intermediários de seu metabolismo. O fato de a glicose ser o carboidrato de eleição para o metabolismo energético celular tem uma justificativa evolucionária, onde se atribui o sucesso de sua utilização pelas células primordiais tendo favorecido as gerações que apresentaram enzimas adaptadas à forma tridimensional da α-D-glicopiranose ao invés dos demais isômeros. 44 A figura 4-9 apresenta os principais carboidratos (aldoses e cetoses) presentes na natureza. Figura 4-9: Principais Monossacarídeos: (a) Aldoses e (b) Cetoses (a) (b) 45 b) Dissacarídeos São formados por dois monossacarídeos unidos por ligação covalente (ligação glicosídica). A ligação glicosídica ocorre entre as hidroxilas do C1 de um monossacarído com qualquer um outro carbono do outro monossacarídeo. Esta ligação pode ocorrer entre carbonos que estejam no mesmo plano espacial (cis ou α) ou entre carbonos em diferentes planos (trans ou β). Existem vários dissacarídeos presentes na alimentação, como, por exemplo: - Maltose: é obtida pela hidrólise do amido e consistede dois resíduos de glicose unidos por uma ligação glicosídica α (14), onde o C1 de uma glicose liga-se ao C4 de outra glicose. O segundo resíduo de glicose da maltose contém um átomo de carbono anomérico livre (C1) capaz de existir na forma α ou β- piranosídica, sendo assim, um açúcar redutor, além de apresentar atividade óptica. A maltose (figura 4- 10) é o principal substrato para a produção de cervejas fermentadas, como a cerveja e destilados como o uísque. Figura 4-10: A Molécula de Maltose - Sacarose: é constituída pela união de uma α-D-glicose com a β-D-frutose, pela ligação glicosídica α, β (12) indicando que a ligação ocorre entre os carbonos anoméricos de cada açúcar, por isso a sacarose é um açúcar não-redutor e não apresenta atividade óptica. A sacarose (figura 4-11) é o dissacarídeo mais consumido o principal composto de sabor adocicado adicionado à alimentação humana. Figura 4-11: A Molécula de Sacarose - Lactose: é encontrada no leite, sendo formada pela do C1 união da β-D-galactose com o C4 da α-D- glicose, pela ligação glicosídica β (14). Esse açúcar é redutor e apresenta atividade óptica, pois possui carbono anomérico livre (C1 da glicose). A lactose (figura 4-12) é o dissacarídeo mais importante na alimentação dos mamíferos jovens (fase de amamentação). Posteriormente, a maioria dos animais perde a capacidade de degradar a lactose devido à queda na produção intestinal da enzima que a degrada, a lactase (em humanos, isto ocorre, freqüentemente, na velhice). Figura 4-12: A Molécula de Lactose 46 c) Polissacarídeos Os polissacarídeos ou glicanas são formados por longas cadeias de unidades de monossacarídeos unidas entre si por ligação glicosídica. Os polissacarídeos podem ser classificados em: - Homopolissacarídeos: contém apenas um tipo de monossacarídeo, por exemplo, amido, glicogênio e celulose. - Heteropolissacarídeo: contém dois ou mais tipos de monossacarídeos, por exemplo, o ácido hialurônico, condroitin sulfato, dermatan sulfato e heparina, que também são conhecidos como glicosaminoglicanos. Os polissacarídeos de reserva mais importantes são o amido e o glicogênio (figura 4-13), ambos de alto peso molecular e polímeros da glicose em ligações α(14) nas cadeias principais e ligações α(16) nos pontos de ramificação, sendo o glicogênio mais compacto por apresentar mais ramificações em sua molécula. Apenas a forma de amilose do amido não é ramificada, pois possui somente ligações do tipo α(14); a forma amilopectina do amido é semelhante à molécula de glicogênio (ramificada). Outros polissacarídeos possuem papel estrutural nas paredes celulares. A celulose (figura 4-13) é formada por moléculas de glicose unidas por ligações β(14) e é o principal constituinte estrutural da parede celular dos vegetais, responsável por extrema resistência. Graças à natureza da ligação β(14) entre as unidades de glicose, há a formação de pontes de hidrogênio dentro da molécula, o que torna a molécula de celulose bastante rígida e plana, permitindo o empilhamento de várias cadeias formando uma estrutura polimérica extremamente resistente. Os vertebrados não possuem celulase e, portanto, não podem hidrolisar as ligações β(14) da celulose presentes na madeira e fibras vegetais. Entretanto, alguns herbívoros apresentam em seu estômago microrganismos produtores de celulase, razão pela qual podem digerir celulose. A celulose, como fibras vegetais, é importante na composição dos alimentos por manterem o trânsito intestinal e melhorar o metabolismo de proteínas, carboidratos e lipídios. Figura 4-13: Polissacarídeos – Amido, Glicogênio e Celulose Amido Glicogênio Celulose 47 A carapaça dos insetos contém quitina (figura 4-14), um polímero de N-acetilglicosamina que dá resistência extrema ao exo-esqueleto. É grande a semelhança entre a estrutura molecular da quitina e da celulose, ambas isômeros β(14), o que as coloca como os polissacarídeos mais resistentes da Terra e, sem dúvida, os mais abundantes, haja vista o grande número de insetos e vegetais. Figura 4-14: Quitina Os glicosaminoglicanos são importantes heteropolissacarídeos presentes na matriz extracelular, apresentando forma linear constituída de resíduos repetitivos de dissacarídeos de ácido urônico e de N- acetilglicosamina (figura 4-15). Em alguns glicosaminoglicanos uma ou mais hidroxilas do açúcar aminado estão estereficados com sulfatos. Os grupos carboixilatos e sulfatos contribuem para alta densidade de cargas negativas dos glicosaminoglicanos. Tanto a carga elétrica como a estrutura macromolecular, colabora para seu papel de lubrificar e manter o tecido conjuntivo íntegro. Esses compostos formam soluções de alta viscosidade e elasticidade pela absorção de grandes quantidades de água. Atuam assim, na estabilidade e suporte de elementos fibrosos e celulares dos tecidos, também como contribuem na manutenção do equilíbrio de água e sal dor organismo. Figura 4-15: Carboidratos presentes nos glicosaminoglicanos Quitina 48 Os principais dissacarídeos presentes na estrutura dos glicosaminoglicanos estão apresentados na tabela 4-1. Tabela 4-1: Principais dissacarídeos repetidos de alguns glicosaminoglicanos da matriz extracelular Glicosaminjoglicanos Principais dissacarídeos Ligação glicosídica Componente 1 Ligação glicosídica Componente 2 Ácido Hialurônico D-glicuronato β (13) N-acetilglicosamina β (14) Condroitin Sulfato D-glicuronato β (13) N-acetilgalactosamina β (14) Dermatan Sulfato L-iduronato α (13) N-acetilgalactosamina β (14) Queratan Sulfato D-glicuronato β (13) N-acetilglicosamina β (13) Heparina D-iduronato α (14) N-sulfoglicosamina α (14) Um outro grupo de heteropolissacrídeo é representado pelos proteoglicanos, que fazem parte da parede celular de muitas bactérias. Essas moléculas são chamadas de peptídeoglicanos, sendo formadas por cadeias de heteroglicanos ligados a peptídeos. Os estudos desses glicídeos é importante, pois a virulência e os antígenos da parede celular das bactérias são propriedades do revestimento de peptídeosglicanos. A partir do estudo da estruturas dos carboidratos da parede celular das bactérias foi desenvolvido um método de coloração chamado de Método de Gram. As bactérias que apresentam coloração são gram-positivas e possuem parede celular espessa formada por várias camadas de peptídeioglicanos que envolvem sua membrana plasmática. As bactérias que apresentam coloração vermelha são gram-negativas e possuem parede celular delgada consistindo de uma única camada de peptídeoglicano inserida entre membranas lipídicas interna e externa. Essa estrutura é responsável pela maior resistência das bactérias gram-negativas aos antibióticos. A estrutura polimérica dos peptídeoglicanos é composta de cadeias lineares de N-acetil-D- glicosamina (GlcNAc) e de ácido acetilmurâmico (MurNAc) alternadas, unidas por ligações β (14). As cadeias dessas estruturas são covalentemente cruzadas pelas cadeias laterais de seus tetrapeptídeos constituída alternativamente por resíduos de D- e L-aminoácidos. d) Glicoconjugados Quando os carboidratos são ligados a proteínas e aos lipídios, eles passam a ser chamados de glicoconjugados. A dois grupos de glicoconjugados: Glicoproteínas e Proteoglicanos. - Glicoproteínas: são proteínas conjugadas que apresentam como grupo prostético vários oligossacarídeos, formando um série de unidades repetidas ligadas covalentemente aos resíduos de aminoácidos da proteína. Essas moléculas estão presentes na célula ou no líquido extracelular e são representadas pela transferrina (transporte de ferro), ceruloplasmina (transporte de cobre), fatores de coagulação sangüínea, muitos componentes do complemento (proteínas do sistema imunológico), hormônio FSH, ribonucleases,Bomba de sódio e potássio (Na+/K+ ATPase), proteína gp120 (glicoproteína ligadora da célula-alvo do vírus HIV), proteínas do glicocálix (adesão entre as células). - Proteoglicanos: são moléculas presentes na matriz extracelular, constituída pela união covalente e não- covalente de proteínas e glicosaminoglicanos (GAGs). Esse conjunto liga-se a um longo filamento de 49 Ácidos hialurônco e está presente em muitos tecidos, a exemplo da cartilagem, que é formada por uma rede de fibrilas de colágeno preenchida por proteoglicanos. 3.2 CORRELAÇÕES CLÍNICAS O fato de que muitas doenças, genéticas ou adquiridas, decorrem de defeitos no metabolismo de carboidratos é outro forte estímulo para o estudo desses compostos. A galactosemia, por exemplo, é uma doença hereditária rara, caracterizada pela deficiência em enzimas que processam a galactose. Nos portadores dessa doença, esse carboidrato, normalmente convertido em glicose, é acumulado na forma de galactose-fosfato, o que leva a deficiência mental grave e, com freqüência, à morte. Recém- nascidos e crianças com galactosemia não podem ingerir substâncias com galactose, em particular o leite (a lactose, presente no leite, é um dissacarídeo formado por glicose e galactose). Várias doenças metabólicas hereditárias denominadas de mucopolissacaridoses são causadas por defeitos no metabolismo de glicosaminoglicanos. Essas desordens são caracterizadas pelo acúmulo de oligossacarídeos derivados da degradação incompleta de dos glicosaminoglicanos no interior dos lisossomos. A tabela 4-2 apresenta as principais mucopolissacaridoses. Tabela 4-2: As Mucopolissacaridoses Síndrome Sinais clínicos Enzima deficiente Produtos acumulados Hurler Deficiência mental, embasamento da córnea e defeitos ósseos α-L-iduronidase Dermatan sulfato Heparan sulfato Sheie Embasamento da córnea e defeitos ósseos α-L-iduronidase Dermatan sulfato Heparan sulfato Hunter Deficiência mental e defeitos ósseos Iduronatosulfatase Dermatan sulfato Heparan sulfato Sanfilippo A Deficiência mental Heparan sulfatase Heparan sulfato Sanfilippo B Deficiência mental e defeitos ósseos N-Acetilglicosaminidase Heparan sulfato Maroteaux- Lamy Graves defeitos ósseos N-Acetilglicosamina sulfatase Dermatan sulfato Morquio Graves defeitos ósseos e embasamento da córnea Galactosamina sulfatase Queratan sulfato Condroitin sulfato Sly Deficiência mental β-D-glicuronidase Dermatan sulfato Heparan sulfato DiFerrante Deficiência mental Glicosamina-6-sulfato sulfatase Queratan sulfato Heparan sulfato A doença mais conhecida relacionada aos carboidratos é o diabetes mellitus, decorrente de fatores hereditários e ambientais, que levam a uma deficiência na produção ou a uma incapacidade de ação da insulina (hormônio cuja função principal é controlar a entrada de glicose nas células). Nos portadores, a quantidade de glicose no sangue aumenta, comprometendo vários órgãos e os sistemas renal, nervoso e circulatório. A doença pode ser regulada pelo consumo controlado de carboidratos e, em casos mais severos, pela administração de insulina. 50 Além do diabetes mellitus, uma dieta exagerada em carboidratos pode acarretar outros problemas, como obesidade, doenças cardiovasculares, tromboses e avanço da aterosclerose (depósito de substâncias nas paredes dos vasos sangüíneos, obstruindo a circulação). O excesso na ingestão desses compostos também intensifica a síntese e o armazenamento de gordura, além de desestimular os receptores de insulina nas células, gerando a forma mais grave do diabetes mellitus. Esse quadro piora com um estilo de vida sedentário, que reduz a metabolização dos glicídios. Em contrapartida, dietas com poucos carboidratos também podem prejudicar a saúde, já que eles são a fonte principal de energia para as células. A intolerância à lactose, também causada por deficiência enzimática, pode ter três origens: defeito genético raro na capacidade de sintetizar a lactase intestinal, redução da produção da enzima devido a doenças intestinais ou deficiência adquirida com o avanço da idade. Tanto na galactosemia quanto na intolerância à lactose, é essencial uma dieta livre de lactose. Os avanços no estudo das funções dos carboidratos ajudaram a entender doenças associadas a essas moléculas, a conhecer a ação farmacológica de alguns polissacarídeos e a desenvolver novos compostos desse tipo com ação terapêutica. Um bom exemplo é a heparina, um glicosaminoglicano com atuação anticoagulante e antitrombótica, hoje o segundo composto natural mais usado na medicina, perdendo apenas para a insulina. Sua utilização é freqüente por causa da incidência de doenças cardiovasculares. Estas, segundo a Organização Mundial de Saúde, são responsáveis por cerca de 30% das mortes em todo o mundo. No Brasil, 70% das mortes estão associadas a essas doenças, índice similar ao dos países desenvolvidos. A heparina tem uma potente atividade anticoagulante porque amplifica a ação de dois compostos presentes no plasma, antitrombina e co-fator II da heparina, capazes de inibir a ação da trombina (enzima que promove a coagulação) e do fator X ativado (proteína que acelera a formação da trombina). A heparina interage simultaneamente com esses compostos e com a trombina ou o fator X ativado. Essa interação ocorre principalmente entre as cargas negativas da heparina e as regiões positivas dos inibidores plasmáticos e da trombina. A formação desses complexos inibe a ação da trombina, interrompendo o processo de coagulação do sangue. O uso clínico desse glicosaminoglicano, no entanto, apresenta efeitos colaterais, como redução da quantidade de plaquetas (trombocitopenia) e propensão a hemorragias. Além disso, a dose necessária para obter o resultado adequado varia de paciente para paciente e a heparina precisa ser extraída de tecidos de mamíferos (como intestino de porco e pulmão bovino), onde ocorre em baixa concentração e ainda apresenta risco de contaminação por vírus e príons. Os efeitos indesejados desse composto, associados ao aumento da incidência de doenças tromboembólicas no mundo, motivam a pesquisa de novos agentes anticoagulantes e antitrombóticos. 51 LIPÍDEOS 4. INTRODUÇÃO Os lipídios são biomoléculas não poliméricas e com estrutura química muito variada, o que acaba ocasionando um problema quanto a classificação dessas substâncias. Os lipídeos são vulgarmente conhecidos como gorduras e a característica comum entre essas moléculas é seu caráter hidrofóbico (baixa solubilidade em água e outros solvente polares e alta solubilidade em solventes apolares) e sua síntese ocorre a partir da acetil-CoA. Este fato coloca os lipídios como uma importante molécula dentro do metabolismo energético, uma vez que a acetil-CoA é a molécula que inicia os principais processos bioenergéticos. São vários os usos dos lipídios, seja na alimentação (óleos de grãos, margarina, manteiga, maionese), seja como produtos manufaturados (sabões, resinas, cosméticos, lubrificantes). Várias pesquisas nacionais recentes indicam os lipídios como importantes combustíveis alternativos, como é o caso do óleo vegetal transestereficado que corresponde a uma mistura de ácidos graxos vegetais tratados com etanol e ácido sulfúrico que substitui o óleo diesel, não sendo preciso nenhuma modificação do motor, além de ser muito menos poluente e isento de enxofre. Os lipídeos apresentam várias funções nas células: - Membranas: Os lipídios em solução aquosa tendem a agregar-se pela cauda apolar deixando a cabeça polar em contato com o meio aquoso, formando uma molécula globosa denominada micela que será tanto mais solúvel, quanto maior for a polaridade da cabeça polar. As membranas biológicas (figura 5-1) são compostas de bicamadas lipídicas (micelas), responsáveis pela separação entre meio extracelular e intracelular, favorecendo a diferença de composição entre a célula e o meioque a circunda. Além de proteger o conteúdo do citoplasma, os lipídeos formam organelas membranosas, a exemplo de mitocôndrias, complexo de golgi, reticulo endoplasmático, carioteca, etc. Figura 5-1: Membrana Biológica - Vitaminas: a vitamina D (figura 5-2) é um grupo de moléculas derivadas do colesterol, responsáveis pelo metabolismo do cálcio, juntamente com os hormônios calcitonina e paratormônio. Figura 5-2: Vitamina D2 52 - Reserva Energética: os lipídios, na forma de triglicerídeos, são a principal reservar de energia das células. Seu caráter hidrofóbico permite o armazenamento de sob a forma anidra, o que diminui o peso dessa reserva. Além disso, sua oxidação libera muito mais energia do que a degradação de açucares ou proteínas. De certa forma, os lipídios possuem uma função energética mais reservada ao armazenamento do que o aproveitamento puro e simples de seu poder energético, uma vez que, justamente pelo fato de serem muito calóricos, possuem vias metabólicas alternativas ao metabolismo energético que, muitas vezes, levam a danos ao organismo gerando doenças graves, denominadas dislipidemias. - Sinalização: alguns lipídeos de membrana são responsáveis pela propagação de sinais hormonais (figura 5-3). Essas moléculas geram um segundo mensageiro responsável pela amplificação de uma mensagem química (hormônio), ocasionando uma resposta do tecido alvo a condição metabólica vigente. Figura 5-3: Membrana e Sinalização Celular - Isolantes: os lipídios apresentam função de isolante elétrico e térmico. A bainha de mielina é composta de lipídeos responsáveis pelo isolamento elétrico do axônio dos neurônios (figura5-4), permitindo uma maior velocidade na propagação do impulso nervoso. Alguns animais apresentam uma camada de lipídeos sob a pele, que apresenta função de isolante térmico, diminuindo a perda de calor para o ambiente. Figura 5-4: Neurônio e Bainha de Mielina 53 - Hormônios: alguns esteróides apresentam função hormonal, a exemplo da testosterona (figura 5-4) e estrógenos, que são responsáveis pelo controle da gametogênese e do desenvolvimento das características sexuais. Figura 5-4: Testosterona 4.1 CLASSIFICAÇÃO Devido a grande variabilidade estrutural dos lipídios, muitos tipos de classificações são propostas dependendo do ponto de vista, se químico ou biológico. Nesse texto os lipídeos serão classificados da seguinte forma: Ácidos graxos, Acilgliceróis, Glicerolfosfolipídeos, Esfingolipídeos, Esteróides, Terpenos e Eicosanóides. a) Ácidos Graxos Os ácidos graxos são ácidos carboxílicos com uma longa cadeia de carbono que pode ser saturada (figura 5-5) ou insaturada (mono ou poliinsaturados) (figura 5-6) e quase sempre de número par de carbonos e de cadeia não linear. As carcterísticas físicoquímicas dos ácidos graxos está associada ao tamanho da cadeia carbonada e do número de insaturações. Apesar de a maioria dos ácidos graxos possuírem nomes vulgares de largo uso na prática diária, a nomenclatura oficial obedece às regras para ácidos carboxílicos, com a terminação óico adicionada o número de carbonos. Em geral, a cadeia de carbonos é numerada a partir da carboxila e, se houver insaturações, elas são indicadas da seguinte forma – 16:1Δ9 – indicando a presença de uma insaturação no carbono 9. Desta forma, o ácido láurico (nome vulgar) é denominado ácido duodecanóico (12:0), ou seja, um ácido graxo saturado de 12 carbonos. O ácido linoléico é o ácido octadienodecanóico (18:2Δ9,12), ou seja, um ácido graxo insaturado de 18 carbonos e com as duplas ligações nos carbonos 9 e 12. Na tabela 5-1 estão citados os principais ácidos graxos e suas nomenclaturas vulgar e oficial. Figura 5-5: Ácido Graxo Saturado (Ácido Palmítico) 54 Tabela 5-1: Ácidos Graxos Saturados N0 de C Insaturação Nome Comum Nome Sistemático Estrutura Tfusão (°C) 12:0 Ácido Láurico Ácido Dodecanóico CH3-(-CH2-)10-COOH 44,2 14:0 Ácido Mirístico Ácido Tetradecanóico CH3-(-CH2-)12-COOH 52 16:0 Ácido Palmítico Ácido Hexadecanóico CH3-(-CH2-)16-COOH 63,1 18:0 Ácido Esteárico Ácido Octadecanóico CH3-(-CH2-)18-COOH 69,1 20:0 Ácido Araquidônico Ácido Eicosanóico CH3-(-CH2-)20-COOH 75,4 22:0 Ácido Beêntico Ácido Docosanóico CH3-(-CH2-)22-COOH 81 24:0 Ácido Lignocérico Ácido Tetracosanóico CH3-(-CH2-)24-COOH 84,2 Figura 5-6: Ácido Graxo Insaturado (ácido linoléico) 55 Os ácidos graxos insaturados podem ser denominados acrescentando-se enóico depois da indicação do número de duplas ligações e em quais carbonos estão localizadas. Assim, o ácido araquidônico é o ácido 5,8,11,14-eicosatetraenóico (tabela 5-2). Tabela 5-1: Ácidos Graxos Insaturados N0 de C Insaturação Nome Comum Nome Sistemático Estrutura Tfusão (°C) 16:1 Δ9 Ácido Palmítoléico Ácido 9- Hexadecenóico CH3-(-CH2-)5-CH=CH-(-CH2-)7-COOH - 0,5 18:1 Δ9 Ácido Oléico Ácido 9- Octadecenóico CH3-(-CH2-)7-CH=CH-(-CH2-)7-COOH 13,2 18:2 Δ9,12 Ácido Linoléico Ácido 9,12- Octadecadienóico CH3-(-CH2-)4-CH=CH-CH2-CH=CH-(-CH2- )7-COOH - 9 18:3 Δ9,12,15 Ácido - Linoléico Ácido 9,12,15- Octadecatrienóico CH3-(-CH2-CH=CH)3(-CH2-)7-COOH - 17 20:4 Δ5,8,11,14 Ácido Araquidônico Ácido 5,8,11,14- Eicosatetraenóico CH3-(-CH2)3-(CH2-CH=CH)4(-CH2-)3- COOH - 49,5 Outra forma de denominar os ácidos graxos é através da utilização de letras gregas, sendo o carbono α (alfa) o da carbonila, o β (beta) o segundo na seqüência e ω (ômega) o último da cadeia. As duplas ligações costumam ser indicadas a partir do carbono ômega, o que faz com que o ácido oléico seja também denominado de ácido octadecanóico ômega-9. Os ácidos graxos saturados são sintetizados tanto por vegetais quanto por animais, o que lhes dá larga distribuição na natureza. Possuem uma boa estabilidade estrutural devido organização em camadas de grande adesividade devido a forma linear das cadeias hidrocarbonadas. Esta alta estabilidade lhes confere altas temperaturas de fusão, ou seja, em temperatura ambiente, eles estão no estado sólido (o ácido láurico possui a mais baixa temperatura de fusão: 44oC enquanto que o ácido lignocérico liquefaz-se somente em 84,2oC). Esta propriedade permite que os lipídios ricos em ácidos graxos saturados tenham o aspecto de gordura sólida (sebo), o que é comum nas gorduras animais. Os ácidos graxos insaturados possuem um arranjo estrutural menos estável, devido à dupla ligação que desestabiliza as camadas de lipídios, conferindo uma temperatura de fusão bastante baixa (ácido nevrônico apresenta temperatura de fusão é de 39oC enquanto que no ácido araquidônico é de -49,5oC). Desta forma, os lipídios ricos em ácidos insaturados possuem o estado líquido (óleos) em temperatura ambiente, o que é próprio das gorduras vegetais. Os mamíferos não possuem enzimas que sintetizam ácidos graxos insaturados (dessaturases) cuja dupla ligação esteja abaixo do C16, o que torna esses ácidos graxos insaturados essenciais na dieta. Os ácidos araquidônico, linoléico, linolênico e oléico são considerados ácidos graxos essenciais justamente por esse motivo e assiociado ao fato de possuírem funções especialíssimas na biologia celular. Uma alimentação isenta de gorduras levará à carência desses ácidos graxos com conseqüências patológicas graves, como dermatite, desidratação, má cicatrização e até a morte. 56 b) Acilgliceróis Os acilgliceróis são lipídeos formados pela esterificação de um, dois ou três ácidos graxos (saturados ou insaturados, iguais ou não) com uma molécula de glicerol, formando mono, di ou triacilglicerol, comumente denominados de mono, di ou triglicerídeos, denominação vulgar e quimicamente incorreta, mas degrande uso na prática clínica e laboratorial. Os triglicerídeos (figura 5-7) são os principais lipídios de reserva tantos de animais quanto de vegetais. Nos animais eles são armazenados no tecido adiposo e nos vegetais essa reserva encontra-se principalmente nas sementes e caule. Os mono-acil-gliceróis e os di-acil-gliceróis estão presentes em concentrações muito baixas no organismo, sendo resultantes de processos intermediários do metabolismo de triglicerídeos ou de outros lipídios, como é o caso do di-acil-glicerol que é um segundo mensageiro de algumas reações celulares, liberado após a degradação de fosfolipídios, como será visto a seguir. Tabela 5-7: Triacilgliceróis c) Glicerolfosfolipídeos São os principais componentes lipídicos das membranas biológicas. Eles são formados pela esterificação de dois ácidos graxos a molécula de glicerol-3-fosfato. Geralmente, o segundo carbono é um ácido graxo insaturado (freqüentemente o ácido araquidônico) e o fosfato pode estar ligado a outro grupo de origem variada (Figura 5-). Ligação Éster Triacilglicerol ou Triglicerídeo 3 Ácidos Graxos Glicerol 57 Figura 5-8: Glicerolfosfolipídeos Ácido fosfatídico Fosfatidiletanolamina Fosfatidilcolina Fosfatidilserina Fosfatidilinositol Cardiolipina 58 d) Esfingolipídios Os esfingolipídios são formados pela esterificação de um ácido graxo a um aminoálcool chamado de esfingosina. Os esfingolipídeos apresentam um grupo variável (X), onde se ligam diferentes radiais. A ceramida possui o –H como cabeça polar, enquanto que os demais possuem grupamentos bem definidos, agrupando-se em três classes distintas: esfingomielinas, cerebrosídeos e gangliosídeos. Figura 5-9: Esfingolipídeos Os esfingomielinas possuem como grupamentos X a fosfoetanolamina e a fosfocolina. Esses esfingolipídios possuem função de proteção e revestimento elétrico dos axônios neuronais, sendo os principais constituintes da bainha de mielina dos neurônios. Nos cerebrosídeos o grupo X é um carboidrato, que são importantes componentes da bainha mieliníca. Os gangliosídeos possuem como grupo X oligossacarídeos unidos ao ácido siálico (um derivado da glicose). Possuem função estrutural importante da superfície das membranas celulares, com a cabeça polar de carboidratos projetando-se para o meio extracelular funcionando como receptores celulares. 59 e) Esteróides Estes lipídeos apresentam como estrutura química principal núcleo-pentano-per-hidro-fenantreno (figura 5-10). Os esteróides são responsáveis por muitas funções, que vão desde estrutural até a ação hormonal e de vitamina (Vitamina D). Neste grupo, o principal lipídeo é o colesterol, pois ele é o precursor de todos os outros esteróides e é exclusivamente sintetizado nos animais. O colesterol faz parte da estrutura da membrana das células animais, diminuindo a fluidez dessa estrutura. Figura 5-10: Colesterol f) Terpenos Esses lipídeos são produzidos em grandes quantidades pelos vegetais e são utilizados como proteção contra agentes biológicos, ou seja, as plantas utilizam essas como um sistema imunológico. Os terpenos são utilizados na culinária como temperos, pois possuem propriedade organolépticas (realçam o sabor e o odor dos alimentos - temperos). A estrutura química comum entre os terpenos é o iso-prenóide (figura 5-11). As vitaminas E e K são terpenos de função bioquímica especializada. Figura 5-11: Terpenos 60 g) Ceras São misturas álcoois graxos (com cadeia longa de 16 a 20C) e ácidos graxos (com cadeia de 16 a 30C). Elas possuem função estrutura bem definida na formação de favos em colméias de insetos sociais. As baleias do tipo cachalote possuem grande quantidade de ceras e outros lipídios em uma enorme cavidade nasal especializada que funciona como órgão flutuador, de acordo com o fluxo sanguíneo. Essa mistura de lipídios foi utilizada durante quase todo o século XVII como produto de beleza capilar pela sociedade européia e americana, conhecido como espermacete de baleia, além, é claro, da utilização como combustível juntamente com a gordura do tecido adiposo da baleia. Este fato levou quase à extinção esses animais e ao conseqüente declínio da economia (na sociedade norte-americana, a indústria baleeira foi a principal base da economia durante vários anos) fato superado graças à invenção de máquinas movidas à combustível fóssil. g) Eicosanóides Os eicosanóides são lipídeos derivados do ácido araquidônico (figura 7-12) e possuem funções específicas: hormonal, reação inflamatória, contração da musculatura lisa, controle do sono e da vigília e formação de trombos. Eles não são eliminados na corrente sanguínea como os hormônios clássicos. Os principais eicosanóide são: - Prostaglandinas: são produzidas em quase todos os tecidos e estão envolvidas nos processos de sono e vigília, resposta inflamatória e contração dos músculos lisos do útero. - Tromboxanas: são produzidas pelas plaquetas e atuam na diminuição do fluxo sangüíneo e na formação de trombos (tampões celulares que impedem a hemorragia de pequenos vasos). 61 - Leuciotrienos: são produzidos pelos leucócitos atuando na contração da musculatura lisa dos pulmões. Figura 5-10: Terpenos 1. CORRELAÇÕES CLÍNICAS a) A Mileina e a Esclerose Múltipla A mielina é uma bainha de membranas, ricas em lipídeos, que circunda o axônio de células nervosas e tem um conteúdo particularmente alto de esfingomielina. Ao contrário de muitos tipos de membranas, a mielina é, em essência, uma bicamada lipídica com uma pequena quantidade de proteínas. Sua estrutura, composta seguimentos e interrupções (nódulo), promove a transmissão nervosa. Na esclerose múltipla, uma doença degenerativa e fatal, bainha de mielina é destruída de modo progressivo placas escleróticas, que afetam cérebro e a medula espinhal. Tais placas parecem ter origem auto-imune; contudo, os epidemiologistas levantaram questões acerca do envolvimento de infecção viral na instalação da doemça. O progresso doença é marcado por períodos de destruição ativa da mielina intermediada por períodos em que não há destruição da bainha de mielina. As pessoas afetadas pela esclerose múltipla sofrem de fraqueza, perda de coordenação motora visual e de fala. 62 b) Fármacos e os Eicosanóides A maioria dos medicamentos que atuam inibindo o processo de dor (analgésicos não derivados de esteróides) é inibidor da via de síntese das prostaglandinas. Os medicamentos que inibem a síntese de leucotrienos são excelentes anti-asmáticos e os que inibem a síntese de tromboxanas acarretam uma diminuição da formação de trombos, útil para quem tem problemas de coagulação intravascular disseminada (uma doença que possibilita o despreendimento de trombos e a bostrução de vasos sanguíneos). A biossíntese dos eicosanóides constitui-se importante capítulo na compreensão da farmacologia desses medicamentos e será abordado no Capítulo sobre metabolismo lipídico. c) A Química da Visão A principal reação da visão, responsável pela geração de impulso para o nervo óptico, envolve uma isomerização cis e trans em torno de uma ligação dupla na porção retinal da rodopsina. Quando a rodopsina está ativa, isto é, quando ela responde pela luz visível, a ligação dupla entre os carbonos 11 e 12 do retinal (11-cis-retinal) tem orientação cis. Sob a influência da luz, ocorre uma isomerização nessa ligação, produzindo o trans-retinal. Uma vez que essa forma de retinal não se liga a opsina, o trans-retinal e a opsina livre são liberados.Como resultado dessa reação, um impulso elétrico é gerado no nervo óptico e transmitido ao cérebro, para ser processado como um evento visual. A forma ativa da rodopsina é regenerada pela isomerização enzimática do trans-retinal de volta à forma 11-cis-retinal e pela subseqüente formação da rodopsina. A deficiência da vitamina A pode ter conseqüências graves, como previsto a partir de sua importância na visão. A cegueira noturna e cegueira total podem ocorrer especialmente em crianças. Por outro lado, o excesso de vitamina A também pode causar danos, como fragilidade óssea. Em função de os compostos lipossolúveis não serem excretados tão prontamente quanto os compostos hidrossolúveis, é possível quantidades excessivas de vitaminas lipossolúveis se acumulem no tecido adiposo. d) Ácido graxo Ômega-3 e Plaquetas na Doença Cardíaca As plaquetas são elementos do sangue que participam da coagulação sangüínea e o reparo tissular, por liberarem fatores de coagulação e o fator de crescimento derivado de plaquetas (platelet-derived growth factor, PDGF). As turbulências na corrente circulatória podem ocasionar o rompimento de plaquetas. Os depósitos de gordura e bifurcações das artérias levam a tal turbulência, de maneira que as plaquetas e PDGF estãoi associados a coagulação e a formação de placas aterioescleróticas. Além disso, as condições anaeróbias das placas de ateroma podem levar a fragilidade e à morte celular da parede arterial, agravando o problema. Em populações que têm o peixe como principal fonte alimentar, incluindo algumas tribos de esquimós, a incidência de doença cardíaca é muito baixa, apesar de tais povos ingerirem uma alimentação rica em lipídeos terem altos níveis de colesterol. É interessante notar que essas pessoas apresentam hematomas com muita facilidade, provavelmente por causa de sangramento subcutâneo aumentado. A análise das suas dietas levou à descoberta de que certos ácidos graxos altamente insaturados são encontrados em óleos de peixes e mamíferos subaquáticos. Uma das classes desses ácidos graxos é chamada de ômega-3 (ω3), tendo como exemplo o ácido eicosapentenóico (EPA): CH3CH2 (CH=CHCH2)5CH2(CH2)2COOH. 63 Observe a presença de uma ligação dupla no terceiro átomo de carbono a partir do final da cadeia alifática. Como ω é a última letra do alfabeto grego, essa característica estrutural deu origem ao nome dos ácidos graxos nos quais ela ocorre. Sabe-se atualmente que os ácidos graxos ω3 inibem a formação de certas prostaglandinas. Os troboxanos lançados na artéria lesada causa adesão das plaquetas no sítio da lesão aumentando o tamanho do coágulo. Assim, qualquer coisa que diminua a síntese de troboxanos resultará em uma menor tendêmncia de formação de coágulos e diminuirá a possibilidade de danos às artérias. É interessante notar que a aspirina é também um inibidor da síntese de prostaglandinas, embora menos potente que o EPA. A aspirina inibi a síntese de prostaglandinas responsáveis pela inflamação e pela percepção da dor. Esse fármaco tem sido considerado como capaz de diminuir a incidência de doença cardíaca, provavelmente por um mecanismo similar ao do EPA. A asprina não deve ser usada por pessoas que tomam anticoagulantes ou por pessoas com tendência a sangramento. e) Surfactante Pulmonar O dipalmitoil-fosfatidilcolina (fosfatidilcolina cujos ácidos graxos são o ácido palmítico) é o principal componente da substância surfactante pulmonar que impede o colabamento (união das superfícies internas) dos alvéolos pulmonares. Esta substância ajuda a diminuir, também, o efeito físico da pressão dos gases respiratórios sobre o alvéolo. A produção desta substância surfactante, entretanto encontra-se em plena produção somente após o nascimento, o que leva as crianças que nascem prematuramente, portanto com pouco surfactante pulmonar, a desenvolverem um quadro sério de insuficiência respiratória devido a dificuldade de encher os alvéolos colabados. Esta condição patológica (conhecida como síndrome da angústia respiratória) também pode se estabelecer em adultos sempre que diminui a produção desse fosfolipídio. f) Derivados dos Glicerolfosfolipídeos Quando há a retirada de um dos ácidos graxos da molécula de um fosfolipídio, a molécula resultante (fosfolisolipídio) possui potente ação detergente e, realmente, destrói a membrana, provocando, obviamente, a morte celular. Enzimas que possuem essa função (fosfolipase A2) estão presentes em venenos de cobra e de abelhas, justificando a potente ação lítica tecidual. Outras enzimas que retiram a cabeça polar (fosfolipase C) geram diacilgliceróis que agem como segundo mensageiros de alguns hormônios. 64 VITAMINAS 1. INTRODUÇÃO As vitaminas são elementos nutritivos essenciais para a vida (VITA), que na sua maioria possuem na sua estrutura compostos nitrogenados (AMINAS), os quais o organismo não é capaz de sintetizar e que, se faltarem na nutrição provocam manifestações clínicas indesejáveis ao organismo. O corpo humano deve receber as vitaminas através da alimentação (fonte vegetal: principalmente cereais, folhas verdes e legumes; fonte animal: principalmente leite, ovo e fígado), por administração exógena (injeção ou via oral), ou por aproveitamento das vitaminas formadas pela microbiota intestinal (algumas vitaminas podem ser produzidas nos intestinos de cada indivíduo pela ação da microbiota intestinal). A falta de vitaminas pode ser total (avitaminose), ou parcial (hipovitaminose). Em ambas as situações, podem surgir manifestações classificadas como as doenças carenciais. A falta de vitaminas pode ser provocada por: redução de ingestão, pela diminuição da absorção, pelas alterações da microbiota intestinal e pelas alterações do metabolismo. O excesso de vitaminas (hipervitaminose) pode ser a conseqüência da ingestão, ou da administração exagerada de vitaminas. É importante ressaltar que as manifestações clínicas associadas à deficiência alimentar de uma única vitamina é um caso raro, pois isso ocorre em situações muito específicas. O mais comum, em decorrência da desnutrição, é haver um quadro clínico complexo causado pela deficiência de várias vitaminas. As vitaminas são muito comercializadas, pois o senso comum associa essas biomoléculas a uma fonte de energia e saúde. Porém, é importante explicar que as vitaminas não geram energia para o metabolismo, sua principal funções é atuar como um coadjuvante (cofator) nas reações metabólicas, ou seja, elas são necessárias para a manutenção da homeostasia das reações celulares, através de funções específicas como: transporte de grupos e elétrons, doadoras de grupos funcionais, formação de compostos intermediários e agentes antioxidantes. O uso terapêutico das vitaminas reside em sua função farmacológica, que ainda não é muito compreendida, mas a utilização de vitaminas pode reverter quadros clínicos como: dores musculares, vertigens, fadiga, enjôo, etc. É importante que a utilização de vitaminas seja acompanhada de uma orientação médica, uma vez o excesso dessas moléculas pode ocasionar danos ao organismo (hipervitaminose), pois a ingestão de vitaminas, indiscriminadamente, pode causar e, mesmo, agravar algumas doenças. Nenhum tipo de tablete, pílula ou cápsula disponível comercialmente, pode substituir uma dieta saudável ou compensar uma má dieta. Para uma boa nutrição e boa saúde a solução é simples: alimentação rica em nutrientes como frutas, vegetais e grãos. A nomenclatura das vitaminas é baseada na ordem de descobrimento das mesmas. Então a primeira vitamina descrita foi chamada de A. Ela está associada a problemas visuais e como Hipócrates (300 a.C) já havia descrito um tipo de cegueira que era revertida com a alimentação de fígado de animais, essa foi considerada a primeira descrição de vitamina. Depois, foi descoberta a vitamina B por Casimir Funk (1911), que extraiu da casca do arroz uma substância que curavaa doença conhecida como polineurite (ou Beribéri). Seguiu-se um desdobramento: a vitamina B era composta de diversos elementos; daí surgiram a B1, B2, B3 e, sucessivamente, mais algumas. Daí, a denominação Complexo B. No século XVI, as longas navegações transoceânicas dos exploradores, revelaram que os marinheiros sofriam de uma doença descrita como escorbuto, caracterizada por sangramento gengival, hoje conhecida como conseqüência da hipovitaminose C. O interessante é que os oficiais destes navios, muitas vezes não apresentavam esses sintomas, fato que levou, em 1729, o médico inglês Jackson Smith 65 determinar a obrigatoriedade da ingestão de suco de limão durante as viagens, como medida preventiva contra o escorbuto, pois ele observou que a alimentação da tripulação era diferenciada no que diz respeito a sucos cítricos. Esta medida foi suficiente para erradicar o escorbuto. Muitas das vitaminas são termolábeis, (sensíveis ao calor) e fotolábeis (sensíveis a luz), o que torna necessário que o alimento que as contêm seja ingerido in natura (o cozimento destrói essas vitaminas) e deva ser armazenado ao abrigo da luz. Os alimentos industrializados que devem ser esterilizados pelo calor precisam ser adicionados de quantidades significativas dessas vitaminas para garantir sua qualidade nutricional. 2. CLASSIFICAÇÃO DAS VITAMINAS a) Hidrossolúveis - Vitamina C (Ácido ascórbico). A forma ativa da vitamina C é o ácido ascórbico (ascorbato), cuja principal função é como agente redutor de diversas reações no organismo. A vitamina C tem papel bem-documentado como coenzima nas reações de hidroxilação dos resíduos de prolil e lisil do colágeno. Portanto a vitamina C é importante para a manutensão normal do tecido conectivo, assim como para repor tecidos danificados. Além disso, a vitamina C participa da formação de catecolaminas e contribui para uma absorção eficientes de ferro. A deficiência de ácido ascórbito resulta numa doença chamada de escorbuto, a qual caracteriza-se por gengivas doloridas e esponjosas, dentre frouxos, fragilidades dos vasos sanguíneos, adema nas articulações e anemia. A maioria dos sintomas na doença pode ser explicado por uma deficiência na hidroxilação do colágeno, resultando em tecido conectivo defeituoso. O excesso de vitamina C esta asociado a formação de cálculos renais. A vitamina C é um nutriente, que junto com a vitmamina E e o beta-caroteno são conhecidos como antioxidantes. O consumo de dietas ricas nesses compostos está associada com a diminuição da incidênci de algumas doença crônicas, tais como doença coronariana e alguns tipos de câncer. No entnto testes clínicos envolvendo a suplementação de um antioxidante isolado têm falhado na determinação de qualquer efeito benéfico convicente. Histórico: o escorbuto é a doença causada pela falta da vitamina C (figura 6-1), sendo conhecida desde o tempo das cruzadas e diagnosticada principalmente nos habitantes do norte da Europa, onde a alimentação era pobre em verduras e frutas frescas durante o inverno. No século 17, com a introdução da batata na alimentação dos europeus do norte o escorbuto tornou-se raro. Com as grandes navegações dos séculos 16 até 18, o escorbuto tornou-se a doença clássica dos marinheiros que passavam longos períodos em alto mar sem ingerirem frutas ou verduras frescas. Em 1535, os índios do Canadá ensinaram ao capitão marinheiro Jacques Cartier que um chá feito com brotos de pinheiros do Canadá curava o escorbuto. Somente em 1747, Lind, um médico da marinha inglesa, fez um estudo dando a diferentes grupos de marinheiros alimentos diferentes, visando tratar o escorbuto. Dos grupos, um recebia mostarda, outro cidra, outro vinagre, outro laranjas e limões, outro água do mar. No fim verificou que o grupo alimentado com limões e laranjas recuperava-se rapidamente da doença. Com isso a marinha inglesa introduziu na ração de seus marinheiros o suco de limão. Em 1870, só no Real Hospital Naval de Portsmouth, foram tratados 1.457 casos de escorbuto, em 1780, depois da introdução do suco de limão, só houve 2 casos da doença. Depois, descobriu-se que a maioria dos animais sintetiza a vitamina C. No entanto, o porco da Índia, os macacos não humanóides, os morcegos das frutas 66 da Índia e os humanos não são capazes de formarem o ácido ascórbico. Só em 1936, o ácido ascórbico foi isolado e identificado. Hoje, é produzido industrialmente. Um cirurgião inglês, de nome Crandon submeteu-se voluntariamente a uma dieta de 161 dias sem vitamina C. Após 41 dias, a vitamina C já não era mais detectável no seu plasma e dos glóbulos brancos desapareceu em 121 dias. Após 120 dias, surgiu hiperceratose perifolicular e, em 161 dias de dieta, manifestaram-se os sangramentos subcutâneos e percebeu-se que um ferimento parou de cicatrizar. O efeito preventivo ou curador de doenças virais, como gripe, a prevenção de câncer, reduzir risco de doença cardíaca e catarata, o aumento das defesas orgânicas, tudo isso não está comprovado como sendo um efeito terapêutico útil da vitamina C. As chances de obter um benefício para a saúde com o uso de altas doses de vitamina C são bem menores do que as de se conseguir uma doença a mais. Figura 6-1: Vitamina C Doses diárias recomendadas: 60 mg Principais funções: participa na formação de catecolaminas e do colágeno; aumenta a absorção de ferro pelo intestino. Principais fontes: frutas e verduras frescas. Hipovitaminose: lesões do colágeno. O escorbuto, um mal clássico dos marinheiros de longo curso, é, hoje em dia, uma doença praticamente desconhecida. Uma manifestação observada nos cabelos que pode sugerir a carência de vitamina C é quando os pelos se tornam crespos nos locais onde antes eram lisos. Hipervitaminose: formação de cálculos nos rins. Note-se que a dose diária recomendada é de 60 mg/dia. Alguns produtos comerciais contêm até 2000 mg por comprimido, o que significa a ingestão de 35 ou mais vezes o dose diária recomenda. - Vitamina B1 (Tiamina) A forma biologicamente ativa da vitmanina B1 é o pirofosfato de de tiamina, o qual se forma pela transferência do grupo fosfato de ATP para a tiamina. O pirofosfato de tiamina serve como coenzima na formação ou na degradação de alfa-cetóis pela transferência pela transcetolase, e na descarboxilação oxidativa dos alfa-catoácidos. A deficiência da tiamina prejudica a descarboxilação oxidativa do piruvato e do alfa-cetoglutarato, os quais desempenham papel chave no metabolismo energético da maioria das células, o que leva a uma diminuição da produção de ATP prejudicando a função celular. A hipovitaminase de tiamina também pode causar uma grave síndrome conhecido como Beribéri, aqual pode efetar tanto crianças como adultos. O Beribéri infantil caracteriza-se pela taquicardia, vômito, convulsões e, se não tratada, a mote. Essa síndrome pode ter um rápido início em lactentes cujas mães são deficiêntes em tiamina. Enquanto 67 que o Beribéri adulto é caracterizado por pele seca, irritabilidade, pensamento desordenados e paralisia progressiva. A dificiência de tiamina, em função da insuficiência na dieta ou da mal absorção intestina; quando associada com o alcoolismo crônico, pode levar ao surgimento de uma síndrome denominada de Wernicke-Korsakoff, caracterizada por apatia, perda de memória e um movimento ritmico dos globos oculares. Histórico: A vitamina B1 (figura 6-2) foi a primeira do complexo B a ser descoberta. A sua falta provoca o beribéri, doença cuja incidência aumentou significativamente no século 19, principalmente na Ásia quando se começou a produzir o arroz polido. Em 1880 o almirante Takaki da marinha japonesa provou que a causa do beribéri era alimentar, ao acrescentar à dieta dos marinheiros peixes, carnes, cevada e vegetais. Em 1897 Eijkman, um médico holandês que atuava em Java observou que o pó resultante do polimento do arroz, se diluído em água ese administrado aos portadores de beribéri, curava a doença. Em 1936 a vitamina B1 foi isolada e foi batizada com o nome de tiamina. Figura 6-2: Vitamina B1 Doses diárias recomendadas: 1,5 mg. Para mães que amamentam e para idosos a dose é de 3,0 mg Principais funções: atua principalmente no metabolismo energético dos açúcares (grupo protético das enzimas: 2-cetoglutarato desidrogenase e transcetolase). Principais fontes: carnes, cereais, nozes, verduras e cerveja. Nota: alguns peixes e crustáceos e chás pretos podem conter fatores anti-tiamina. Hipovitaminose: a doença carencial clássica é o Beribéri que se manifesta principalmente em alcoólatras e pessoas desnutridas. A manifestação neurológica da carência de vitamina B1 é também denominada de Beribéri seco, caracterizando-se por neurites periféricas, distúrbios da sensibilidade com zonas de anestesia ou de hiperestesia, perda de forças até a paralisia de membros. No cérebro, pode haver depressão, perda de energia, falta de memória até síndromes de demência como a psicose de Korsakoff e a encefalopatia de Wernicke. As manifestações cardíacas decorrentes da falta de vitamina B1 são denominadas de Beribéri úmido, que se manifesta por falta de ar, aumento do coração, palpitações, taquicardia, alterações do eletrocardiograma, inclusive insuficiência cardíaca do tipo débito elevado. Nas crianças de peito a falta de vitamina B1 pode aparecer por ser o leite materno muito pobre em tiamina, principalmente se a mãe não receber suplemento de vitamina B1. Nos portadores de hipertireoidismo, havendo um aumento do metabolismo decorrente da atividade exagerada do hormônio da tireóide, podem surgir manifestações de carência de vitamina B1 causada pelo consumo aumentado. Hipervitaminose: mesmo em doses elevadas, a tiamina não é tóxica. Os eventuais excessos ingeridos são eliminados pelos rins, deixando a urina amarelada. 68 - Vitamina B2 (Riboflavina) As duas formas biologicamente ativa da vitamina B2 são flavina mononucleotídeo (FMN) e flavina adenina dinucleotídeo (FAD) formadas pela transferência de um AMP do ATP para o FMN. O FNM e FAD são capazes de aceitarem reversivelmente dois átomos de hidrogênio, formando FMNH2 OU FADH2. O FMN e o são fortimente ligados (algumas vezes covalentimente) a flovoenzimas que catalizam a oxidação ou a redução de substrato. A hipovitaminose é muito rara. Podem aparecer em gestantes, nos esportistas de alta performance ou em doenças digestivas que alterem a sua absorção. As primeiras manifestações de carência são inflamações da língua (glossite), rachaduras nos cantos da boca (queilose), lábios avermelhados, dermatite seborréica da face, tronco e extremidades, anemia e neuropatias. Nos olhos, pode surgir a formação de vasos nas conjuntivas, além de catarata. As carências de vitamina B2 costumam acompanhar a falta de outras vitaminas. A hipervitaminose não é tóxica, mesmo em altas doses. Os excessos são eliminados pelos rins. Histórico: até 1879, observações de uma série de compostos amarelados isolados de alimentos foram denominados de flavinas. Verificaram que uma parte era lábil ao calor, denominado de B1, e uma outra, que era estável ao calor, foi denominado de B2 (figura 6-3), mais tarde vitamina B2 (a radiação UV inativa a riboflavina.). Figura 6-3: Vitamina B2 Doses diárias recomendadas: 1,7 mg para homens e 1,6 mg/dia para mulheres. Principais funções: A forma ativa é o FAD (flavina adenina nucleotídeo) e o FMN (flavina adenina mononucleotídeo), que recebem e prótons e elétrons, convertendo-se de formas oxidadas (FAD+ e FMN+) para reduzida (FADH2 e FMNH2). O FAD é um importante transportador de elétrons e prótons na cadeia respira-tória mitocondrial. Principais fontes: leite, carne e verduras. - Vitamina B3 (Niacina ou Ácido nicotínico e Niacinamida - fator PP) A vitmina B3, também chamada de Niacina ou ácido nicotínico é um derivado da piridina. As formas biologicamente ativas são nitotinamida-adenina-dinucleotídeo (NAD+), e seu derivado fosforilado, nicotinamida-adenina-dinucleotídeo-fosfato (NADP+). A nicotina, um derivado do ácido nicotínico, que contém uma amina substituindo um grupo carboxila, também ocorre na dieta. A nicotina é rapidamente desaminada no organismo e, dessa forma, é nutricialmente equivalente ao ácido nicotínico. 69 O NAD+ e o FAD+ servem como coenzimas nas reações de oxirredução, nas quais a coenzima sofre redução do anel piridina, pela inconporação de um íon hidreto. A deficiência de vitamina B3 causa a pelagra, uma doença que envolve a pele, a trato gastrointestinal e o sistema vervoso central (SNC). Os sintomas de evolução da pelagra compreendem três Ds: Dermatite, diarréia, demência, e se não tratada, Morte. Histórico: Pelle agra é o termo em italiano para pele áspera, doença conhecida há séculos na Itália, onde se comia principalmente milho. Em 1914, Funk postulou que a pelagra era uma doença carencial. Pouco tempo depois Goldberg demonstrou que se podia curar a pelagra com carne fresca, ovos e leite. Goldberg também observou que se dava a dieta carente dos humanos aos cães, causando a doença da língua preta. Depois verificaram ser também um componente hidrossolúvel, termo estável que acompanhava o complexo B. Em 1935, Warburg e outros isolaram o ácido nicotínico (figura 6-4) do sangue de cavalos. Figura 6-4: Vitamina B3 Doses diárias recomendadas: 15 mg. Principais funções: participa da molécula de NAD (nicotinamida adenina dinucleotí-deo), importantíssimo transportador de pró-tons e elétrons no metabolismo energético mitocondrial. Influencia a formação de colágeno e a pigmentação da pele provocada pela radiação ultravioleta. No cérebro, a niacina age na formação de substâncias mensageiras, como a adrenalina, influenciando a atividade nervosa. Principais fontes: carnes e cereais. Origina-se do metabolismo do triptofano: 60 mg de triptofano produzem 1 mg de Niacina. As pessoas que se alimentam principalmente à base de milho são propensas a manifestações de carência de Niacina por ser o milho muito pobre em triptofano. Hipovitaminose: a doença dos 3 "D", composta por Diarréia, Demência e Dermatite. A língua pode apresentar cor avermelhada, ulcerações e edema. Pode haver salivação excessiva e aumento das glândulas salivares. Podem aparecer dermatites parecidas com queimaduras de pele, diarréia, esteatorréia, náuseas e vômitos. No sistema nervoso, aparecem manifestações como cefaléia, tonturas, insônia, depressão, perda de memória e, nos casos mais severos, alucinações, demência e alterações motoras e alterações neurológicas com períodos de ausência e sensações nervosas alteradas. Hipervitaminose: a Niacina não costuma ser tóxica, mesmo em altas doses, mas pode provocar coceira, ondas de calor, hepatotoxicidade, distúrbios digestivos e ativação de úlceras pépticas. 70 Observação: a denominação PP significa Previne Pelagra, manifestação encontrada principalmente em alcoólatras de destilados quando mal-alimentados. - Vitamina B5 (Ácido Pantotênico) O ácido pantotênico é um componente da coenzima A, a qual atua na transferência de grupos acila. A coenzima A contém um griupo tiol que transporta composto acila como ésteres de tiol ativados. Exemplos de tais estruturas são acetil-CoA, succinil-CoA e Acil-CoA. O ácido pantotênico é também componente das sintase dos ácidos graxos. Histórico: O ácido pantotênico (figura 6-5) foi descoberto por Williams em 1933 como sendo uma substância essencial para o crescimento de leveduras. O seu nome vem do grego, em que Panthos significa de todos os lugares. Isso porque o ácido pantotênico é encontrado em toda a parte. O seu primeiro papel foi verificado que uma doença denominada pelagra dos pintos, curada com extratos de fígado, mas não com o ácido nicotínico. Foi demonstrado por Wooley e Jokes que o fator que curavaa dermatite das aves era o ácido pantotênico. Em 1947, Lipmann mostrou que a acetilação da sulfanilamida necessitava de um cofator que continha ácido pantotênico. Figura 6-5: Ácido Pantotênico Doses diárias recomendadas: estimada em até 10 ug. É difícil determinar a dose mínima diária necessária por serem os estados carenciais praticamente desconhecidos. Principais funções: faz parte da molécula de coenzima A (CoA) e é responsável por reações de aceti- lação, atuando no metabolismo da maioria das células, na produção de hidratos de carbono, proteínas e lipídios. Principais fontes: carnes, ovos, frutas, cereais e verduras, sendo encontrada, praticamente, em todos os alimentos. Hipovitaminose: são muito raras. As carências podem ser produzidas experimentalmente com alimentos artificiais, pelo uso de alguns antibióticos, nesses casos surgem cansaço, distúrbios do equilíbrio e do sono, cãibras e distúrbios digestivos, como flatulência e cólicas abdominais. Foi relatada uma síndrome do pé ardente descrita em pelotões da segunda grande guerra cuja ração apresentava uma deficiência em ácido pantotênico. Hipervitaminose: o excesso de ingestão (mais de 10 a 20 mg/dia) pode provocar diarréia. Como acontece com as demais vitaminas hidrossolúveis, os excessos são eliminados pelos rins, na urina. - Vitamina B6 (Piridoxina, Piridoxal e Piridoxamina) 71 A vitamina B6 é um termo coletivo para designar três compostos: piridoxaina, piridoxal e piridoxamina, todo derivados da piridina. Esses compostos diferem apenas na natureza do grupo funcional ligado ao anel. A piridoxina ocorre principalmente nas plantas, enquanto que o pridoxal e piridoxamina são encontrados em alimente de origem aminal. Todos os três compostos podem funcionar como precursores da vitamina (coenzima) biologicamente ativa, o piridoxal fosfato. O piridoxal fosfato funciana como uma coenzima para um grande número de enzimas, particularmente aquelas que catalizam reações envolvendo aminoácidos. A isoniazida (hidrazida de ácido isonicotínico), uma droga utilizada para o tratamento de tuberculose, pode provocar uma deficiência de B6 pela formação de um composto inatino com o piridoxal fosfato. Portanto a suplementação de B6 na dieta e, assim um adjuvante para o tratamento com isoniazida. Por outro lado dietas deficientes em B6 são raras, mas tém sido observada em recém nascidos alimentados com leito em pó com baixos nícveis de B6, em mulheres que fazem uso de contraceptivos orais e em alcolistas. . Histórico: em 1926, foi verificado que uma das conseqüências da falta de vitamina B2 era a dermatite. Em 1936 György separou da vitamina B2 um fator solúvel em água cuja falta era a real causa das dermatites. Denominou-a de vitamina B6 (figura 6-6). Diversos produtos têm a mesma propriedade biológica atribuída à vitamina B6. Figura 6-6: Vitamina B6 Doses diárias recomendadas: a necessidade diária de Piridoxina é diretamente proporcional à ingestão de proteínas na dieta. Por exemplo, quem ingere 100 g/dia de proteínas necessita receber 1,5 mg/dia de piridoxina. Mulheres grávidas, fumantes e alcoólatras têm necessidade de doses maiores da vitamina B6. Principais funções: a vitamina B6 é uma coenzima e atua no metabolismo dos aminoácidos e lipídeos. Atua na produção de hormônios e é estimulante das funções defensivas das células. Principais fontes: cereais, carnes, frutas e verduras. O cozimento reduz os teores de B6 dos alimentos. Hipovitaminose: são muito raras, e caracterizam-se por lesões seborréicas em torno dos olhos, nariz e boca, acompanhadas de glossite e estomatite. Quanto ao sistema nervoso, a carência de vitamina B6 pode provocar convulsões e edema de nervos periféricos, havendo suspeitas de que possa provocar a síndrome do túnel carpiano. Distúrbios do crescimento e anemia são atribuídos à carência de vitamina B6. Hipervitaminose: a Piridoxina tem baixa toxicidade aguda, mas doses de 200 mg/dia, tanto por via oral como parenteral, podem provocar intoxicações neurológicas, surgindo sintomas como formigamentos nas mãos e diminuição da audição. Foram relatados casos de dependência da piridoxina. 72 - Vitamina B12 (Cobalamina) A vitamina B12 é necessária para o organismo humano para duas reações enzimáticas essenciais. A síntese de metionina e a isomerização de metilmalonil-Coa, que é produzida durante a degradação de alguns aminoácidos e de ácidos graxos com número ímpar de átomos de carbono. Quando a vitamina é deficiente ácidos graxos anormais acumulam-se e são incorporados na membrana celulares, inclui ndo as do sistema nervoso central. Isso pode contribuir para algumas das manifestações neurológicas da deficiênecia da vitamina B12. A vitamina B12 não está presenta em vegetais. Os animais obtem a vitamina pré-formada a partir de sua microbiota intestinal normal ou pela ingestão de alimentos derivados de outros animais. Ao contrário de outras vitaminas hidrosolúveis, quantidades significativas de (4 a 5 mg) de vitamina B12 são armazenadas no organismo. Como resultado podem ser que vários anos sejam necessários para que se desenvolva sintomas clínicos de deficiência de vitamina B12 nos indivíduos que tenham sofrido gastrectomia total ou parcial (os quais tornam-se deficientes no fator intrínseco e não possam mais absorvber a vitamina). A deficiência de cobalamina são mais comuns em células que se dividem rapidamente, tais como o tecido eritropoiético da medula óssea e as células da mucosa intestinal. Esses tecidos necessitam das formas N,N-metileno e N-formil do tetraidrofolato para a síntese de nucleotídeos, necessários para replicação do DNA. Entretanto na deficiência de B12 a forma N-metiltetraidrofolato não é usada eficientimente. Uma vez que a forma metilada não pode ser convertida diretamente em outras de tetraidrofolato, aforma N-metil acumula, enquanto os níveis das demais diminuiem. Assim sendo, a deficiências de B12 leva a uma deficiência de formas de tetraidrofolato necessárias para a síntese de purinas e timinas, resultando nos sintomas de anemia megaloglástica A deficiência de vitamina B12 raramente resulta da ausência da vitamina na dieta. É muito mais comum encontrar deficiência em pacientes com falhas na absorção da vitamina no intestino, resultando na anemia perniciosa. Essa doença geralmente resultado de uma destruição auto-imune das células gástricas parietais, que são responsáveis pela síntese de uma glicoproteína chamada fator intrínseco. A vitamina B12 liga-se ou fator intrínseco no intestino. O complexo fator intrínseco-cobalamina viaja pelo intestino e eventualmente liga-se a receptores específicos nas superfícies das celulas mucoses do ílio. A cobalamina ligada é transportada para as células e, consequentimente chega a circulação geral, onde é transportada por proteínas de ligação á B12. A falta do fator intrínseco impedi a absorção da vitamina B12, resultando na anemia perniciosa. Pacientes com deficiência de vitamina B12 frequentimente são anêmicos, porém, com o desenvolvimento da doença apresentam sintomas neuropsiquiátricos. No entanto sintomas do sistema nervoso central podem ocorrer na ausência da anemia. Os efeitos no sistema nervo central são irreversíveis e ocorrem por mecanismo que parecem ser diferentes daqueles descrito para amenia megaloblástica. A amenia perniciosa é tratada com altas doses de vitmanina B12 ou injeção intramuscular de cianocobalamina. A terapia deve continuar por toda vida do paciente. Histórico: a vitamina B12 (figura 6-7), na sua história como nas suas funções, está intimamente ligada ao ácido fólico e tem no seu currículo dois prêmios Nobel. A história começou em 1824 quando Combe e Addison descreveram casos de anemia megaloblástica. Combe associou essa anemia a fatores digestivos, mas, somente em 1860, Austin Flint descreveu uma severa atrofia gástrica e falou da possibilidade duma eventual relaçãocom a anemia anteriormente citada. 73 Em 1872, Biermer deu-lhe o nome de anemia perniciosa. Em 1925, Whipple observou que o fígado contém um potente fator que corrigia as anemias ferroprivas de cães. Minot e Murphy seguindo e continuando nessa linha de observações descreveram a eficácia da alimentação com fígado para reverter a anemia perniciosa e receberam o prêmio máximo da medicina. Pouco tempo depois, Castle observou a existência de um fator secretado pelas células parietais do estômago, denominado de fator intrínseco, que era necessário para corrigir a anemia perniciosa e que agia em conjunto com um fator extrínseco, semelhante a uma vitamina, obtido do fígado. Somente 20 anos depois Rickes, Smith e Parker isolaram e cristalizaram a vitamina B12. Depois Dorothy Hodgkin determinou a estrutura cristalina da Vitamina B12 e por isso também recebeu um Prêmio Nobel. Nas tentativas de purificar o fator extrínseco, Wills descreveu uma forma de anemia perniciosa na Índia, que respondia ao fator extraído do fígado, mas que não respondia às frações purificadas que se sabia serem eficazes no tratamento da anemia perniciosa. Era conhecido com o fator de Wills, depois denominado de Vitamina M e hoje conhecido como ácido fólico, que foi isolado, em 1941, por Mitchell. Figura 6-7: Vitamina B12 Doses diárias recomendadas: 6 ug/dia. Os níveis de vitamina B12 no sangue podem ser medidos e assim fazer um diagnóstico de carência ou não. Principais funções: É cofator de reações de reorganização estrutural (conversão de metil-malonil-CoA em succinil-CoA) e reações de metilação (conversão de homocisteína em metionina), por isso é essencial para o crescimento de replicação celular. Importante na formação das hemácias (os glóbulos vermelhos do sangue). Principais fontes: carne e fígado. É também produzida pela flora do intestino grosso, mas lá não é absorvida. A absorção se dá no intestino delgado depois dela ter sido ativada no estômago aonde chega com a ingestão de alimentos. A vitamina B12 necessita do chamado "fator intrínseco", existente nos 74 estômagos normais, para ser absorvida. A vitamina B 12 formada nos intestinos, por não ter sido ativada pelo fator intrínseco quase não é absorvida. Cerca de 12% das pessoas com mais de 65 anos apresenta níveis plasmáticos de cobalamina menor do que 258 pmol/L, decorrentes de uma menor absorção da vitamina B12. Níveis baixos dessa vitamina estariam associados com um maior risco de câncer e de doenças vasculares. Os vegetais não contêm vitamina B12, isso poderia levar os vegetarianos a apresentarem a hipovitaminose. Contudo isso nem sempre acontece porque bactérias contaminantes dos vegetais ou mesmo as do trato intestinal, agindo sobre os restos desses vegetais, formam a vitamina B12 e, assim, suprem parcialmente o organismo daqueles que não ingerem carne, fígado, ovos ou leite e seus derivados. Hipovitaminose: anemia macrocítica ou perniciosa é a principal manifestação. Existem evidências de que níveis baixos de vitamina B12 estariam associados a uma maior incidência de doenças vasculares e cancerosas. Células de regeneração e replicação rápida (mucosas e epitélio cervical uterino) também sofrem com a falta de vitamina B12. A carência de vitamina B12 é comum em pessoas operadas do estômago quando foi retirada a parte que produz o fator intrínseco responsável pela absorção da vitamina B12. São propensos a apresentarem manifestações de falta de vitamina B12 os vegetarianos restritos (que não ingerem carnes, ovos, leite e seus derivados), os portadores de parasitoses intestinais, as pessoas operadas do pâncreas, os portadores de doenças inflamatórias crônicas dos intestinos e os idosos. As deficiências de vitamina B12 podem provocar lesões irreversíveis do sistema nervoso causadas pela morte de neurônios. Os sintomas neurológicos são os mais variados e decorrem da morte ou perda de função das células atingidas nos mais diferentes setores do cérebro e medula. As alterações neurológicas podem acontecer mesmo não havendo ainda anemia. Hipervitaminose: não há relato na literatura médica. - Ácido Fólico (Tetra-hidro-folato) Histórico: o ácido fólico (figura 6-8) foi descrito em conjunto com a vitamina B12. Figura 6-8: Ácido Fólico Doses diárias recomendadas: 0,2 mg para crianças e 0,4 mg para adultos. É imprescindível para mulheres antes da concepção e no primeiro mês da gravidez a fim de evitar doenças congênitas da criança, como anencefalia e espinha bífida. A dieta habitual contém em torno de 0,2 mg de ácido fólico. O cozimento prolongado dos alimentos pode destruir até 90% do seu conteúdo em ácido fólico. 75 Principais funções: atua em conjunto com a vitamina B12 na transformação e síntese de proteínas. É necessária na formação dos glóbulos vermelhos, no crescimento dos tecidos e na formação do ácido desoxiribonucleico (É importante na síntese de purinas e timina.), que interfere na hereditariedade. O ácido fólico tem um papel na prevenção de doenças cardiovasculares, principalmente nos portadores de distúrbios metabólicos em que há um aumento da hemocisteína no sangue, onde atua como redutor dessa substância tóxica. Existem países, entre os quais a Inglaterra e o Chile, em que o ácido fólico é acrescentado à farinha de trigo de uso doméstico. Nesses países, a suplementação por outras vias é desnecessária. Principais fontes: carnes, verduras escuras, cereais, feijões e batatas. Um copo de cerveja, de 200 ml, contém 0,06 mg de ácido fólico. Hipovitaminose: a manifestação principal da carência de ácido fólico é a alta incidência de crianças com malformações congênitas do sistema nervoso nascidas de mães tinham carência alimentar de ácido fólico no início da gravidez. Também está correlacionada com a incidência de lábio leporino e fissura palatina. Estima-se que a administração preventiva de ácido fólico neste período e durante toda a gestação, reduziria a incidência de malformações congênitas em 70%. A falta de ácido fólico aumenta a incidência de partos prematuros. A carência de ácido fólico é comum em alcoólatras, em desnutridos crônicos, em pessoas que não consomem vegetais verdes, como espinafre, acelga, brócolis e nas pessoas que se alimentam, principalmente, de comidas industrializadas. A carência de ácido fólico, junto com a carência de vitamina B12, pode levar as pessoas a sentirem vertigens, cansaço, perda de memória, alucinações e fraqueza muscular. Hipervitaminose: não relatada. - Biotina Histórico: em 1916, Bateman observou que ratos alimentados com clara de ovo como única fonte de proteínas desenvolviam desordens neuromusculares, dermatite e perda de cabelos. Esta síndrome poderia ser prevenida caso se cozinhasse a clara ou se fosse acrescentado fígado ou levedura à dieta. Em 1936, Kögl e Tönis isolaram da gema do ovo uma substância que era essencial para o crescimento da levedura e a denominaram de biotina (figura 6-10). Depois, verificou-se que esse fator e aquele que prevenia a intoxicação da clara de ovo cozido eram o mesmo. Figura 6-10: Biotina Doses diárias recomendadas: 100 a 200μg. 76 Principais fontes: carnes, gema de ovos, leite, peixes e nozes. A biotina é estável ao cozimento. É produzida em grande quantidade pela flora bacteriana intestinal normal do ser humano. Principais funções: é coenzima de enzimas carboxilases, des-carboxilases e transcarboxilases transportan-do o CO2 para os substratos. Hipovitaminose: muito raras e praticamente só aparecem se houver destruição das bactérias intestinais, administração de antimetabólicos da biotina e alimentação com clara de ovo crua para que aconteça a carência de biotina. Nestes casos surgem glossite atrófica, dores musculares, falta de apetite, flacidez, dermatite e alterações do eletrocardiograma. Pessoas que se alimentam por longo tempo somente de ovos crus têmapresentado estas manifestações. Pessoas alimentadas por via parenteral também podem apresentar sinais e sintomas de carência de biotina. As lesões da pele caraterizam-se por dermatite esfoliativa grave e queda de cabelos que são reversíveis com a administração de biotina. Crianças com seborréia infantil e pessoas com defeitos genéticos são tratados com doses de 5 a 10 mg/dia de biotina. Hipervitaminose: grandes doses de biotina podem provocar diarréia. b) Lipossolúveis - Vitamina A (Retinol e Retinal) A vitamina A (retinol) é um termo frequentimente utilizado como coletivo para várias moléculas relacionadas, biologicamente ativas. O termo retinóides inclui as formas natural e sintética da vitamina A, que podem ou não ter atividade de vitamina A. Os retinóides são essenciais para a visão, a reprodução, o crescimento e a manutenção dos tecidos epiteliais. O ácido retinóico, derivado da oxidação do retinol da dieta, medeia a maioria das ações dos retinóides, exceto para a visão, a qual depende do retinal, o derivado aldeído do retinol. O retinol é um álcool primário encontrado nos tecidos animais como um éster retinil com ácidos graxos de cadeia longa. Já o retinal é o derivado aldeído do retinol. O retinal e retinol podem ser facilmente interconvertidos. O ácifo retinóico é o ácido derivado da oxidação do retinal. O ácido retinóico não pode ser reduzido no organismo e por isso não pode originar retinol uo retinal. O beta-caroteno é encontrado em vegetais e podem ser clivadi oxidativamente no intestino originando duas moléculas de retinal. Em humanos e conversão é ineficiente, a atividade de vitamina A do beta-carotena é apenas um sexta da do retinol. O retinol derivado dos ésteres e de clivagem e redução de beta-carotenos é estereficados a ácidos graxos na mucosa do intestino e secretado como componjente dos quilimicra no sistema linfáticos em seguida são captados e armazenados no fígados. Quando é necessário o retinol é liberado do fígado e transportados para os tecidos extra-hepáticos pela proteína plasmática ligadora de retinol (PLR). O complexo PLR-retinol liga-se a receptores específicos na suérfícies das células dos tecidos periférico, permitindo a entrada do retinol. Muitas tecidos possuem uma proteína celular ligadora de retinol, que transporta o retinol para sítios no núcleo, onde a vitamina atua semelhante aos hormônios esteróides. Mecanismo de ação 77 O ácidos retinóico com alta afinidade a proteínas receptoras específicas, no núcleo de células-alvo, tais como as c´leulas epiteliais. O complexo ativado receptoracido retinóico interagem com a cromatina nuclear, estimulando a síntese de RNA retinóide-específico, resultando na produção de proteínas específicas, as quais medeiam a várias funções fisiológicas. Por exemplo, os retinóides controlam a expressão do gene da queratina na maior parte dos tecidos epiteliais do corpo. Função da vitamina A A vitamina A é um componente dos pigmentos visuais das células cones e bastonetes. Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx. Os animais providos de vitamina A inicialmente perdem a apetite, possivelmente pela queratinização das papilas gustativas. O crescimento ósseo é lento e não acompanha o crescmento de sistema nervoso, originando danos ao sistema nervoso central. O retinol e po retinal são essenciais para a reprodução normal, mantendo a espermatog ênese nos machos e prevenindo a reabsorção fetal nas fêneas. O ácido retinóico é inativo na manutenção da reprodução e no ciclo visual, mas promove a crescimento e diferenciação das células epiteliais, assim, animais que recebem vitamina A somente com ácido retinóico desde o nascimento são cegos e estéreis. Histórico: a cegueira noturna, a principal manifestação da carência de vitamina A (figura 6-11), já era conhecida dos egípcios há mais de 3 mil anos. Eles desconheciam a razão dessa manifestação, mas a tratavam empiricamente com compressas de fígado frito ou cozido sobre os olhos. Hipócrates há dois mil anos já recomendava comer fígado para tratar a cegueira noturna. Em 1865, no Brasil, foi descrita a Oftalmia brasiliana, uma doença que atingia escravos mal-alimentados. Só em 1913, num estudo experimental, foi descrito que animais atingidos pela xeroftalmia (secura dos olhos) tinham essa manifestação curada pela ingestão de gema de ovos, leite, manteiga e óleo de fígado de bacalhau. Durante a guerra mundial de 1914 a 1918, foi observado que a xeroftalmia em humanos era decorrente da carência de manteiga na dieta. Figura 6-11: Vitamina A Doses diárias recomendadas: 1 mg por dia para pessoas normais. Para mulheres grávidas, pessoas com distúrbios de digestão das gorduras, diabete, idosos e alcoólatras são recomendas doses 25 a 50% maiores. Principais funções: importante para as funções da retina (produção do estímulo nervoso), principalmente para a visão noturna. Exerce ainda função na cornificação da pele e das mucosas, no reforço do sistema imunológico, na formação dos ossos, da pele, cabelos e unhas. 78 A vitamina A tem função antioxidante, ela fixa-se aos chamados radicais livres que se originam da oxidação de diversos elementos. Esses radicais livres teriam um efeito nocivo para as células e são tidos como causadores de arterioesclerose, catarata, tumores, doenças da pele e doenças reumáticas. Principais fontes (100g de alimento): Fígado - 25 mg; Fígado de galinha - 11 mg; Fígado de gado - 8 mg; Patê de fígado - 2 mg; Cenouras -1 mg. Hipovitaminose: Olhos: a ceratomalácia (“amolecimento” da córnea), olhos secos, com ulcerações e xerose da conjuntiva e córnea são as manifestações mais precoces. A cegueira noturna, a mais conhecida, é uma das primeiras manifestações de carência da Vitamina A. A dificuldade extrema de visão, inclusive a cegueira total são as manifestações mais graves da sua carência. Sistema respiratório: o epitélio das vias aéreas sofre alterações, a queratinização, o que propicia um aumento de infeções. Pode haver uma diminuição da elasticidade pulmonar dificultando a respiração. Pele: a queratinização e a secura da pele levam à erupção de pápulas que envolvem os folículos sebáceos principalmente nas extremidades dos membros. Sistema gênito-urinário: a deficiência de vitamina A leva a formação de cálculos renais. O epitélio das vias urinárias torna-se rugoso o que facilita o depósito de cristais e a formação dos cálculos. Ocorrem ainda alterações na formação de espermatozóides, degeneração de testículos, abortos, anomalias e mortes fetais. Sistema digestivo: ocorrem alterações no epitélio intestinal, metaplasias no epitélio dos dutos pancreáticos, que seriam responsáveis pelas diarréias atribuídas à falta de vitamina A. Glândulas sudoríparas: podem atrofiar e sofrer queratinização. As alterações do suor podem alterar os cheiros do corpo, para pior. Ossos: nos animais, experimentalmente, a falta de vitamina A provoca alterações como o aumento da porosidade e espessamento dos ossos. Sistema nervoso: alterações do olfato, do paladar e da audição podem ocorrer. Lesões de nervos e aumento na produção de líquor com hidrocefalia têm sido relatados. Hipervitaminose: O excesso de vitamina A, uma situação freqüente em pessoas que ingerem vitaminas deliberadamente, pode causar manifestações clinicas desagradáveis e até perigosas. A intoxicação por vitamina A poder ser aguda ou crônica. A ingestão prolongada de 30 mg/dia de retinol, durante 6 meses ou mais, provoca intoxicações. Algumas pessoas mesmo com 10 mg/dia já apresentam sintomas. Em crianças, 7,5 a 15 mg/dia durante um mês já produz manifestações de toxicidade. Para ocorrer uma intoxicação aguda são necessários, para um adulto, 500 mg; para um jovem, 100 mg; e para uma criança, 30 mg. Pela ingestão exagerada podem surgir manifestações como pele seca, áspera e descamativa, fissuras nos lábios, ceratose folicular, dores ósseas e articulares, doresde cabeça, tonturas e náuseas, queda de cabelos, cãibras, lesões hepáticas e paradas do crescimento além de dores ósseas. Podem surgir também falta de apetite, edema, cansaço, irritabilidade e sangramentos. 79 Aumentos do baço e fígado, alterações de provas de função hepática, redução dos níveis de colesterol e HDL colesterol também podem ocorrer. Já foram observados casos de envenenamento fatais pela ingestão de fígado de urso polar. Grande cuidado deve ser dado a produtos que contenham o ácido retinóico usado no tratamento do acne. - Vitamina E (α-Tocoferol) Histórico: em 1922, Evans e Bischop observaram que ratazanas grávidas não conseguiam manter a gravidez na falta de um fator desconhecido. Engravidavam, mas abortavam posteriormente. Também foram observadas alterações nos testículos dos ratos carentes dessa substância, considerada como sendo antiesterilidade, daí vitamina E (figura 6-12). Evans isolou a vitamina e em 1936, verificou que se tratava de tocoferóis, num total de oito, sendo o alfatocoferol o mais importante. Figura 6-12: Vitamina E Dose diária recomendada: 10 a 30 UI. Principais funções: inicialmente, era tida como a vitamina da fertilidade sendo indicada para tratar a impotência sexual. Para desilusão de alguns, isso nunca foi comprovado. Em cobaias a falta de vitamina E provoca alterações neurológicas degenerativas da medula. Em humanos a falta de vitamina E provoca alterações neurológicas como diminuição dos reflexos, diminuição da sensibilidade vibratória, da propriocepção e oftalmoplegia. As dificuldades visuais podem ser agravadas pela retinopatia pigmentar também provocada pela falta de vitamina E. Não existem provas que demonstrem ser a vitamina E de utilidade no tratamento de distúrbios menstruais, vaginites, alterações de menopausa, toxemia gravídica e dificuldades reprodutivas. A vitamina E ajuda no tratamento de miopatias necrosantes, mas não é útil no tratamento da distrofia muscular. Os tocoferóis agem como antioxidantes, protegendo as células dos efeitos nocivos das substâncias tóxicas, principalmente dos radicais ácidos. Atualmente, admite-se que protegem do câncer, da arteriosclerose, das inflamações articulares e das complicações do diabete, por bloquearem as modificações oxidativas das lipoproteínas de baixa densidade. É discutível se doses altas de Vitamina E exerçam algum benefício na prevenção de doenças cardiovasculares. Existem observações em que foram administrados 400 UI/dia de Vitamina E em pacientes portadores de doença isquêmica do coração. Nesse grupo, a incidência de um infarto do miocárdio foi reduzida para a metade, mas a vida média essas pessoas não foi prolongada. Um outro estudo mostrou que, em pacientes submetidos à diálise renal, por serem portadores de insuficiência renal crônica, a incidência de mortes por doença do coração caiu para a metade do esperado quando lhes foi administrada a Vitamina E. Já em num estudo realizado na Itália, na mesma situação clínica, não se verificou uma mudança significativa da incidência de doenças cardiovasculares ao lhe administrarem altas doses de Vitamina E. No entanto, o número de mortes por causas cardíacas foi significativamente menor. 80 Principais fontes: azeites vegetais, cereais e verduras frescas. O leite de mulher contém vitamina E suficiente para o filho em aleitamento ao peito, ao contrário do leite de vaca. Hipovitaminose: esterelidade Hipervitaminose: a vitamina E mesmo em altas doses não é tida como tóxica, mas, se ingerida em excesso, pode, eventualmente, competir na absorção e reduzir a disponibilidade das outras vitaminas lipossolúveis, além do ferro dos alimentos, e, assim, colaborar para o desencadeamento de anemias. - Vitamina K (2-metil-1,4-naftoquinona) Histórico: em 1929, Dam observou que aves alimentadas com certas rações apresentavam sangramentos decorrentes da diminuição dos níveis de protrombina no sangue. Seis anos depois verificou que uma substância desconhecida, solúvel em gorduras, combatia as perdas de sangue. Deu-lhe o nome de vitamina K (Koagulations Vitamine) (figura 6-13). Na mesma época, outros investigadores, observando pacientes ictéricos e pesquisando as causas da diminuição da coagulação do sangue, verificaram ser a diminuição de protrombina o fator responsável. Em 1936, observaram que animais com fístulas biliares, em que a bile não chegava ao intestino, apresentavam o mesmo problema e verificaram que podiam corrigi-lo alimentando os animais com sais biliares. Figura 6-13: Vitamina K Doses diárias recomendadas: não estão ainda determinadas as doses mínimas diárias necessárias para manter a normalidade da coagulação. Admite-se como sendo 0,5 a 1 micrograma por kg de peso. Pessoas deficientes em vitamina K são tratadas com 0,03 microgramas por kg de peso. Em adultos a vitamina K2 é formada no próprio intestino do indivíduo por ação de bactérias sobre o conteúdo intestinal. A vitamina K1 vem dos vegetais. Principais funções: as vitaminas K1 e a K2 praticamente não têm atividade farmacodinâmica em pessoas normais. A vitamina K atua na produção de protrombina, fator importante na coagulação do sangue. Age, ainda, na prevenção de osteoporose em idosos e mulheres depois da menopausa. Principais fontes: verduras e fígado. Hipovitaminose: em adultos, é extremamente rara e pode ser a conseqüência de doenças hepáticas, distúrbios de absorção intestinal, alterações da flora intestinal (uso prolongado ou intensivo de antibióticos) ou desnutrição. A carência manifesta-se por tendência ao sangramento. Hipervitaminose: as vitaminas K1 e K2 não são tóxicas, mesmo em altas doses. Já a vitamina K3 em altas doses pode provocar anemia e lesões no fígado. 81 A injeção de Fitonadione na veia pode provocar dores no peito, choque e raramente a morte, o que por alguns é atribuído aos solventes usados nas soluções injetáveis. O Menadione é irritante para a pele e para os pulmões, pode provocar anemia hemolítica, kernicterus nos recém nascidos, principalmente em crianças prematuras. Em pessoas doentes do fígado, tanto a menadione com o fitonadione podem deprimir ainda mais a função hepática. - Vitamina D (Calciferol) As vitaminas D são um grupo e esteróides que apresentam uma função do tipo hormonal. A molécula ativa, 1,25 diidroxicolecalciferol, liga-se a proteínas receptoras intracelular. O complexo receptor-1,25diidroxicolecalciferol interage com o DNA no núcleo de células-alvo de forma semelhante à vitamina A, e estimula ou reprime de forma seletiva a transcrição gênica. A ação mais proeminente dessa vitamina é a regulação dos níveis plasmáticos de cálcio e fosforo. Histórico: a vitamina D (figura 6-14) é a denominação atribuída a duas substâncias, o colecalciferol e o ergocalciferol. A vitamina D foi descrita primeiramente como tendo a propriedade de evitar ou curar o raquitismo, que era atribuído à falta de ar fresco e de sol para as crianças criadas em zonas urbanas. Outros autores creditavam a doença a erros alimentares. Em 1919, Mellanby e Huldschinsky verificaram que todos tinham razão, pois adicionar óleo de fígado de bacalhau à dieta ou expor as crianças ao sol, prevenia ou curava a doença. Em 1924, Heis, Steenbock e Black verificaram que irradiando as rações animais com radiação ultravioleta também curava ou prevenia o raquitismo. Figura 6-14: Vitamina D Doses diárias recomendadas: 400 UI Principais funções: a vitamina D age com um hormônio na regulação do cálcio plasmático. Principais fontes: o organismo humano é capaz de sintetizar a vitamina D a partir do colesterol, por isso, poderia deixar de ser considerada uma vitamina segundo a definição das mesmas. Nas regiões em que há pouca radiação solar o corpo humano tem a necessidade de complementar as carências alimentares e/ou ambientais. As principais fontes são: fígado, óleos de peixes e gema de ovos. Hipovitaminose:a carência de vitamina D provoca, nas crianças, o raquitismo e nos adultos a osteomalácia (“amolecimento” dos ossos). Nos idosos leva à osteoporose. Hipervitaminose: doses exageradas de vitamina D provocam a hipercalcemia (excesso de cálcio no sangue) o que favorece o depósito de cálcio nos vasos (arteriosclerose) e ainda a eliminação aumentada de cálcio na urina o que por sua vez favorece a formação de cálculos urinários. Altos teores de cálcio no sangue alteram as funções do coração e dos nervos. Tanto o excesso como a carência de vitamina D altera a formação dos ossos.