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11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 1/20 ECOLOGIA AULA 4 Prof. Tiago Machado de Souza 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 2/20 CONVERSA INICIAL Agora que já estudamos com mais detalhes as populações, chegou a hora de estudarmos as comunidades ecológicas. Nós vimos que as populações variam no tempo (ex. crescem ou diminuem) e no espaço (ex. imigram ou emigram), certo? Agora, imagine que essas variações de uma população podem afetar outras populações, fazendo com que elas também variem no tempo e no espaço. Desta forma, as comunidades também devem variar, certo? É exatamente isso que acontece. Portanto, nesta etapa, iremos rever os conceitos de Comunidades e compreender melhor os temas que compõem a Ecologia de Comunidades, dentre os quais, iremos estudar sobre como avaliar a estrutura das comunidades por meio de medidas ecológicas como abundância de indivíduos, riqueza de espécies e diferentes medidas de diversidade. Ainda, iremos estudar os principais fatores, incluindo os abióticos e bióticos, que regulam a diversidade das comunidades. Por fim, iremos estudar alguns padrões espaciais de diversidade de espécies no planeta, como em gradientes latitudinais como altitudinais, assim como os padrões temporais relacionados à sucessão ecológica. TEMA 1 – INTRODUÇÃO À ECOLOGIA DE COMUNIDADES Antes de estudarmos a Ecologia de Comunidades, vamos apenas recapitular o que é uma comunidade. Como vimos, uma comunidade é composta por todas as populações das espécies que interagem e vivem em uma determinada área em um mesmo momento (Ricklefs; Relyea, 2016; Cain; Bowman; Hacker, 2018). Em termos práticos, as comunidades são delimitadas usando características arbitrárias, físicas ou biológicas (Cain; Bowman; Hacker, 2018). Por exemplo, a comunidade de uma unidade de conservação, ou a comunidade de uma ilha, ou ainda a comunidade de uma floresta. Ainda, uma comunidade pode cobrir grandes áreas, como uma floresta, ou estar contida em uma área muito pequena, como a comunidade de pequenos organismos que vivem no sistema digestório de animais, ou na água de uma bromélia. 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 3/20 Quando os ecólogos estudam uma comunidade, eles raramente estudam todas as espécies na comunidade, o que poderia chegar a centenas ou milhares, mas, em vez disso, focam em um subconjunto de espécies que vivem em uma determinada área (Ricklefs; Relyea, 2016). Um subconjunto usual de uma comunidade é uma guilda, um grupo de espécies que usam os mesmos recursos, mesmo que sejam taxonomicamente distantes, como a comunidade de frugívoros ou a comunidade de polinizadores de um local. Também podemos nos referir a uma comunidade com base em um hábitat específico, como a comunidade de uma floresta, por exemplo. Outra maneira comum de subdividir uma comunidade é com base em um grupo de espécies filogeneticamente relacionadas. Neste caso, também é utilizado o termo assembleia. Por exemplo, podemos estudar a assembleia ou comunidade de aves, ou de plantas, ou ser mais específico ainda, como a assembleia ou comunidade de samambaias de uma determinada região ou local. Desta forma, podemos imaginar que diferentes comunidades apresentam características distintas, como riqueza, abundância, diversidade e composição de espécies entre regiões e ao longo do tempo. Por outro lado, iremos ver adiante que existem alguns padrões espaciais e temporais encontrados nas comunidades que se estendem por todo o planeta. Veremos também que essas diferenças ou semelhanças entre comunidades são determinadas por distintos processos que regulam e moldam as comunidades. Portanto, a Ecologia de Comunidadesé um ramo da ecologia que estuda as comunidades avaliando a sua estrutura e organização em diferentes escalas espaciais e temporais. TEMA 2 – ESTRUTURA DE COMUNIDADES Como vimos, distintas comunidades podem ser bastante diferentes em termos de tipos e números de espécies que as compõem. Por exemplo, algumas comunidades do Ártico incluem poucas espécies, enquanto algumas comunidades de floresta tropical apresentam muitas espécies. Além disso, as espécies que as compõem são totalmente distintas entre si. Portando, uma forma de descrever essa diferença é dizer que as comunidades têm estruturas diferentes. Desta forma, a estrutura de uma comunidade é essencialmente descrita pela sua riqueza (número de espécies), abundância (número de indivíduos) e seus números relativos (equitabilidade e dominância), composição de espécies e distintas medidas de diversidade. Assim, a seguir veremos alguns dos componentes pelos quais as estruturas das comunidades podem ser quantificadas (métricas de comunidades). 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 4/20 2.1 RIQUEZA E ABUNDÂNCIA A riqueza de espécies corresponde ao número de espécies de uma comunidade. A abundância pode ser examinada em termos absolutos (número de indivíduos de cada espécie) ou em relação às outras espécies (abundância relativa). A abundância relativa é a proporção do número de indivíduos de cada espécie em relação ao número total de indivíduos da comunidade (Ricklefs; Relyea, 2016). Sabemos que na natureza existem espécies que têm muitos indivíduos (conhecidas como espécies abundantes) e outras que têm poucos indivíduos (espécies raras) (Peroni; Hernández, 2011). Ainda, a abundância das espécies pode variar dentro das áreas das suas distribuições, tendendo a serem mais abundantes no centro e mais raras nas extremidades das áreas de distribuição. 2.2 COMPOSIÇÃO DE ESPÉCIES Duas comunidades podem apresentar as mesmas riquezas e abundância, no entanto possuírem espécies completamente distintas (como vimos entre uma comunidade do Ártico e de uma floresta tropical). Desta forma, a descrição de uma comunidade biológica pode ser realizada a partir da composição taxonômica das espécies que a compõem, produzindo uma lista de espécies. Isso pode parecer simples, mas é uma tarefa difícil em grupos pouco conhecidos taxonomicamente, como os insetos, entre os quais ainda há muitas espécies desconhecidas para a ciência (Peroni; Hernández, 2011). 2.3 EQUITABILIDADE E DOMINÂNCIA A equitabilidade, também conhecida como equabilidade ou equitatividade, é um índice que descreve a proporção dos indivíduos de cada uma das espécies presentes em uma comunidade em relação ao total de indivíduos dessa mesma comunidade. Assim, quanto mais homogêneo ou uniforme for o número de indivíduos por espécie, maior a equitabilidade dessa comunidade. Por outro lado, a dominância é um índice que mede a dominância de algumas espécies de uma comunidade, do ponto de vista das suas abundâncias, sobre as outras. Desta forma, uma comunidade com elevada dominância terá baixa equitabilidade, e vice-versa. 2.4 DIVERSIDADE TAXONÔMICA 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 5/20 A diversidade taxonômica é uma medida que combina tanto o número de espécies (riqueza) quanto a distribuição das abundâncias das espécies (equitabilidade). Assim, duas comunidades podem apresentar a mesma riqueza e abundância total, mas se a distribuição das abundâncias entre as espécies for diferente, as diversidades taxonômicas também serão. Portanto, comunidades com uma equitabilidade maior são mais diversas. Vejamos este exemplo abordado em Cain; Bowman e Hacker (2018): A contribuição da riqueza e da equabilidade de espécies para a diversidade de espécies pode ser ilustrada com um exemplo hipotético. Imagine duas comunidades de cogumelos, cada qual contendo quatro espécies. Ambas as comunidades têm a mesma riqueza de espécies, mas a equabilidade de espécies difere. Na comunidade A, uma espécie de cogumelo compreende 85% da abundância de cogumelos, enquanto as outras constituem apenas 5% cada; assim, a equabilidade de espécies é baixa. Na comunidade B, as abundânciassão igualmente divididas entre as quatro espécies (25% cada), portanto a equabilidade de espécies é alta. Nesse caso, mesmo que cada comunidade tenha a mesma riqueza de espécies (quatro espécies), a comunidade B tem a maior diversidade, pois tem maior equabilidade de espécies. Figura 1 – Exemplo de duas comunidades com riqueza e composição de espécies iguais, mas equitabilidade diferentes Créditos: Wasteresley Lima O cálculo da diversidade taxonômica considerando a riqueza e equitabilidade/dominância das espécies é realizado por meio de dois índices principais: índice de Simpson e o índice de Shannon- Wiener. O índice de Simpson é mais sensível a mudanças nas espécies mais abundantes e o de Shannon-Wiener é mais sensível a mudanças nas espécies raras da comunidade, sendo mais utilizado em programas de manejo e conservação (Peroni; Hernández, 2011). 2.5 DIVERSIDADE FILOGENÉTICA E FUNCIONAL Embora venha sendo amplamente utilizada, a diversidade taxonômica tem se mostrado pouco preditiva da estrutura e, principalmente, do funcionamento das comunidades. Medidas de diversidade 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 6/20 que incorporem informações sobre as relações filogenéticas das espécies ou suas características funcionais podem ser melhores do que as medidas tradicionais para muitas finalidades (Cianciaruso, Silva; Batalha, 2009). Assim, duas abordagens recentes e promissoras vêm sendo utilizadas, as diversidades filogenética e funcional, as quais têm se mostrado mais sensíveis para detectar respostas das comunidades às mudanças ambientais. Na diversidade filogenética, as relações de parentesco (distância filogenética) entre as espécies são levadas em conta. Ou seja, quanto maior a diversidade de clados (ex. ordens e famílias) pouco aparentados em uma comunidade, maior a diversidade filogenética. Em relação à diversidade funcional, são consideradas as características das espécies (ex. massa e tamanho corporal dos animais, forma e área foliar das plantas etc.), chamados de atributos funcionais, os quais apresentam relações com o funcionamento das comunidades e ecossistemas (Cianciaruso, Silva; Batalha, 2009). Assim, quanto maior as diferenças nas características das espécies, maior a diversidade funcional da comunidade. Portanto, as medidas de diversidade filogenética e funcional podem auxiliar em ações conservacionistas uma vez que consideram informações adicionais sobre as espécies, indo além apenas da riqueza e abundância das espécies considerada pela diversidade taxonômica. Por exemplo, imagine duas comunidades com a mesma riqueza e abundância de espécies, mas com espécies distintas. A diversidade taxonômica dessas comunidades será a mesma. No entanto, a diversidade filogenética e funcional deve ser distintas uma vez que as espécies devem apresentar relações filogenéticas e características distintas. Neste caso, se fosse para escolher umas dessas comunidades para a criação de uma unidade de conservação, do ponto de vista conservacionista, seria muito mais vantajoso escolher a comunidade com maior diversidade filogenética e funcional, uma vez que estaria conservando mais história evolutiva e distintas características funcionais das espécies. 2.6 ESCALAS DE DIVERSIDADE As distintas diversidades podem ainda ser comparadas em distintas escalas espaciais. Em 1972, o ecólogo Whittaker classificou a diversidade em diferentes níveis: a diversidade alfa é aquela que se refere à diversidade de uma comunidade local; a diversidade beta é uma medida da diferença (ou da semelhança) entre comunidades diferentes, em termos da composição de espécies encontradas neles; e a diversidade gamma diz respeito à diversidade regional, incluindo a riqueza de espécies do conjunto de comunidades que integram uma paisagem (Peroni e Hernández, 2011). Por exemplo, a 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 7/20 diversidade de uma ilha é considerada como diversidade alfa, enquanto o comparativo entre duas ilhas compõe uma diversidade beta e a diversidade de todas as ilhas de um arquipélago, a diversidade gamma. TEMA 3 – REGULAÇÃO DE COMUNIDADES A regulação das comunidades estuda como os processos ecológicos e evolutivos envolvendo a dispersão de espécies de um pool regional (conjunto de espécies de uma macrorregião), assim como a seleção por filtros abióticos (condições ambientais) e bióticos (interações entre espécies) determinam quais espécies terão sucesso em colonizar e coexistir formando uma comunidade (Figura 2). Por exemplo, de todas as espécies presentes na região de um arquipélago (pool regional), somente as espécies capazes de chegar em uma determinada ilha (capacidade de dispersão) poderão colonizá- la. No entanto, as condições ambientais desta ilha (tipo de solo, vegetação, abrigos etc.) serão favoráveis para algumas espécies, mas desfavoráveis para outras (filtro abiótico ou ambiental), impedindo que estas se estabeleçam nesta ilha. Por fim, essas espécies que foram capazes de chegar nesta ilha e que encontram condições ambientais favoráveis para se estabelecerem, ainda terão que transpor os filtros bióticos (interações com outras espécies). Por exemplo, dependerão da ausência de um competidor dominante, e/ou um herbívoro (no caso das plantas) ou predador (no caso dos animais) para conseguirem colonizar a ilha e estabelecerem suas populações. Caso contrário, os indivíduos destas espécies que chegaram nesta ilha podem não sobreviver pela pressão de outras espécies, impedindo que colonizem e se estabeleçam na ilha. No entanto, alguns fatores podem permitir a coexistência das espécies mesmo havendo interações com outras espécies, conforme veremos a seguir. Figura 2 – Ilustração exemplificando o processo de organização de uma comunidade a partir da dispersão de espécies de um pool regional (conjunto de espécies de uma macrorregião), assim como a seleção por filtros abióticos (condições ambientais) e bióticos (interações entre espécies) 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 8/20 Crédito: Jefferson Schnaider. 3.1 FILTROS ABIÓTICOS Como vimos, a partir da perspectiva do nicho, as condições ambientais de um determinado habitat atuam como filtros abióticos permitindo que somente espécies com características propícias e determinados níveis de tolerâncias para transpor estes filtros se estabeleçam e persistam neste habitat. Como vimos em etapa anterior, o nicho fundamental de uma espécie é composto pelas condições e recursos que permitem uma determinada espécie existir e reproduzir-se. Assim, qualquer condição de temperatura, umidade, PH, salinidade, luminosidade etc. fora dos limites toleráveis de uma espécie, se torna uma condição desfavorável podendo agir como um filtro ambiental. Portanto, estas diferenças entre condições ambientais abióticas são restrições claras (ou 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 9/20 requisitos, dependendo do ponto de vista) que amplamente determinam onde certas espécies podem ou não ocorrer em uma região (Cain; Bowman; Hacker, 2018). Por exemplo, podemos pensar em uma semente de uma espécie de árvore de interior de floresta, um ambiente bem sombreado, sendo dispersada até um campo de futebol, ou ainda, peixes marinhos soltos em rios ou lagos de água doce, os quais provavelmente não sobreviverão nestes ambientes. 3.2 INTERAÇÕES BIÓTICAS Como vimos, as interações bióticas podem atuar como filtros bióticos regulando ou até impedindo a coexistência de espécies. As maneiras pelas quais as interações entre as populações podem moldar as comunidades, envolvem as interações entre espécies do mesmo nível trófico (competição por recursos) eas interações entre espécies de diferentes níveis tróficos (ex. herbivoria, predação) (Peroni; Hernández, 2011). 3.2.1 Competição por recursos Na década de 1930, o soviético Georgii Gause realizou uma pesquisa influente sobre a forma como a competiçãoage na organização das comunidades. Gause realizou experimentos com três espécies do Paramecium spp. onde estas eram tratadas com diferentes alimentos: fermentos, bactérias ou ambos. Os experimentos revelaram que uma espécie de Paramecium spp. sempre levaria à extinção da outra se tivessem que competir pelo mesmo recurso. Isso levou à ideia de que as espécies ecologicamente muito semelhantes não podem coexistir, o que ficou conhecido como exclusão competitiva (Gause, 1934). Na década de 1950, Hairston, estudando a abundância das espécies de artrópodes de solo e buscando entender os padrões de dominância das espécies mais abundantes, concluiu seu estudo afirmando que a organização de uma comunidade, no sentido da distribuição das abundâncias entre as espécies (equitabilidade), é resultado da competição interespecífica por um recurso disponível. Esse resultado seria expresso tanto na abundância relativa quanto na distribuição espacial das espécies. A partir de então, inicia-se o envolvimento direto do conceito de nicho na busca por compreender os processos envolvidos na regulação e organização das comunidades. Muitos trabalhos do início da década de 1960 focaram na sobreposição de nicho como um fator limitante na coexistência de algumas espécies. Após este grande debate, MacArthur e Levins (1967) em um estudo clássico sobre 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 10/20 coexistência de espécies competidoras e nicho concluíram que há um limite na similaridade (similaridade limitante) das espécies competidoras que podem coexistir. Assim, para que as espécies coexistam e evitem a competição deve haver uma complementaridade no uso dos recursos, de forma que haja uma partição dos nichos das espécies de forma que estes não se sobreponham completamente, ou seja, as espécies não dependam dos mesmos recursos para sobreviver (Hutchinson 1959; MacArthur; Levins 1967; Chesson, 2000). Portanto, como vimos, a competição por recursos dificulta a coexistência de espécies ecologicamente ou morfologicamente similares (nichos sobrepostos) devido à limitação de similaridade ecológica. Por outro lado, a partição de nicho e complementaridade no uso dos recursos favorece à coexistência das espécies reduzindo a competição pelos recursos e evitando a exclusão competitiva (Gause, 1934). 3.2.2 Coexistência mediada pelo consumidor A coexistência mediada pelo consumidor pode ocorrer tanto por herbivoria quanto por predação. Basicamente, quando um herbívoro pastador ou um predador generalista consomem moderadamente seus recursos alimentares, acabam impedindo que dentre as espécies consumidas (nível trófico abaixo), as potencialmente dominantes eliminem as demais espécies do mesmo nível trófico por competição. Assim, a presença do herbívoro ou predador pode elevar a riqueza, equitabilidade e consequentemente a diversidade de espécies do seu nível trófico inferior. Por exemplo, experimentos pastos de gado mostraram que, em pastagens nativas, mais espécies vegetais ocorrem em níveis intermediários de herbivoria pelo gado (Peroni; Hernández, 2011). Por outro lado, na ausência do herbívoro ou predador, as populações das espécies do nível trófico inferior que forem melhores competidoras irão crescer, se tornar dominantes e até eliminar outras espécies, reduzindo a diversidade da comunidade. No entanto, sob altas intensidades de herbivoria pelo gado a riqueza de plantas também pode diminuir (Peroni; Hernández, 2011). 3.2.3 Facilitação e mutualismo Considerando as interações bióticas de mesmo nível trófico, muita atenção tem sido dada às interações competitivas na organização das comunidades locais. Por outro lado, interações bióticas positivas, como a facilitação e interações mutualísticas (ex. frugívoros ou polinizadores), têm sido pouco enfatizadas em estudos desta natureza, apesar de sua reconhecida importância (Bascompte; Jordano, 2007; Sargent; Ackerly, 2008; Cavender-Bares et al., 2009, Machado-de-Souza et al., 2013). 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 11/20 A facilitação por si só já é um processo no qual a presença de uma espécie facilita a ocorrência de outras, aumentando a diversidade da comunidade. Por exemplo, uma espécie de planta pioneira pode tornar um ambiente praticamente inóspito em um ambiente apropriado para a colonização de outras espécies de plantas, seja por gerar sombra, ou por tornar as condições do solo favoráveis. Da mesma forma, uma espécie mutualista favorece a presença de seu parceiro de interação, uma vez que são mutuamente dependentes entre si. Ainda, ambos os processos podem agir conjuntamente em uma comunidade. Por exemplo, algumas plantas raras florescem juntamente com plantas abundantes da comunidade, assim se aproveitam dos polinizadores atraídos pela floração da planta abundante. Ainda, em interações mutualísticas entre plantas e aves frugívoras, Machado-de-Souza et al. (2013) verificaram que as características dos frutos de uma comunidade atuam como filtros bióticos selecionando quais aves devem ocorrer nas comunidades a partir de seus atributos funcionais. Por exemplo, em florestas mais conservadas os frutos tendem a serem maiores, filtrando a ocorrência aves com bicos menores por falta de recurso e favorecendo aves com bicos maiores, as quais conseguem ingeri-los com mais facilidade. TEMA 4 – PADRÕES DE DIVERSIDADE Antes mesmo de a ecologia existir como ciência, os naturalistas já estavam interessados nos padrões de distribuição das espécies nas comunidades naturais. Por volta de 1802, Alexander von Humboldt, estudando a vegetação da montanha Chimborazo e outras montanhas vizinhas, buscou entender os padrões da vegetação em relação à latitude, altitude, clima, solo, entre outros fatores. Futuramente, essa abordagem passou a ser chamada de análise de gradiente por Whittaker (1967), que buscava entender a estrutura e a variação da vegetação de uma paisagem (padrões espaciais) a partir de gradientes. Assim, a análise de gradientes avaliava fatores ambientais, populações de espécies e características das comunidades. Recentemente, o estudo dos gradientes ambientais tem sido muito valorizado, pois torna possível avaliar a importância de fatores abióticos (filtros ambientais) e bióticos (interações entre espécies) na regulação e estrutura das comunidades. 4.1 GRADIENTE LATITUDINAL 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 12/20 De forma geral, as comunidades com as maiores diversidades de espécies tendem a serem encontradas em áreas próximas à linha do Equador (baixas latitudes), onde há muita energia solar (sustentando alta produtividade primária), temperaturas quentes, grandes quantidades de chuva e pouca mudança sazonal (Figura 3). Em contraste, comunidades menos diversas são encontradas perto dos polos, que recebem menos energia solar e são mais frias, secas e menos propícias à vida. No entanto, como veremos a seguir, existem outros fatores que também geram padrões de diversidade. Figura 3 – Gradiente latitudinal de diversidade Créditos: VectorMine/Shutterstock. 4.2 GRADIENTE ALTITUDINAL Com a mudança nas condições ambientais, algumas espécies tornam-se mais capazes de sobreviver e competir. Se caminharmos da base até o cume de uma montanha, vamos observar mudanças notáveis na vegetação. Em altitudes mais baixas, na base da montanha, haverá maior diversidade de espécies, com florestas mais vistosas. À medida que subimos a montanha, essa diversidade e complexidade vai diminuindo conforme a altitude aumenta. Isso ocorre porque, com o 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 13/20 aumento da altitude, há uma redução na temperatura, umidade, profundidade do solo e aumento do estresse pelo vento (Figura 4). As zonas nas quais cada espécie ocorre refletem os intervalos diferentes de tolerância das condições ambientais (fatores abióticos), assim como diferentes capacidades para competircom outras espécies (fatores bióticos). Há mudanças semelhantes nas espécies de animais que vivem em diferentes altitudes nas montanhas. As mudanças nas plantas e nos animais em diferentes altitudes criam alterações contínuas na composição da comunidade, desde a base das montanhas até os picos mais altos. Figura 4 – Exemplo de um gradiente altitudinal de diversidade Créditos: alinabel/Shutterstock. 4.3 ZONEAMENTO EM COSTÕES ROCHOSOS 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 14/20 O zoneamento em costões rochosos é um padrão vertical na distribuição, riqueza e abundância das espécies causado pela ação de ondas, amplitude de marés e tipo de substrato (fatores abióticos), assim como pela competição, predação e herbivoria (fatores bióticos). Em locais mais expostos, há maior incidência solar, causando um maior efeito de dessecamento. Ainda, a maior incidência das ondas pode atuar como um estresse para espécies que não conseguem se fixar no substrato, também limitando a ocorrência de algumas espécies nestes locais, o que resulta em uma menor diversidade de espécies. Portanto, há um aumento de diversidade ao longo das diferentes faixas horizontais ocorrendo progressivamente de cima (áreas expostas) para baixo (áreas mais profundas), ou seja, há um aumento da diversidade em maiores profundidades. Isso forma um padrão zoneamento em costões rochosos formando quatro zonas distintas, sendo a Supralitoral coberta apenas nas marés mais altas de sizígia (lua cheia e nova); Mesolitoral superior e Mesolitoral inferior são cobertas e descobertas pelas marés diárias e Infralitoral, que fica descoberta somente nas marés mais baixas de sizígia (Figura 5). Figura 5 – Exemplo de zonação em costões rochosos Créditos: BlueRingMedia/Shutterstock. A ocupação de zonas diferentes é um padrão que se repete entre as diversas variedades de espécies das comunidades aquáticas de regiões entremarés. Por exemplo, em um caso de competição 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 15/20 entre espécies de cracas nas costas rochosas da Grã-bretanha, cracas estreladas vivem na zona Supralitoral, já as cracas rochosas na Infralitoral (Ricklefs; Relyea, 2016). 4.4 ESTRATIFICAÇÃO VERTICAL EM FLORESTAS De forma geral, uma floresta bem conservada é dividida em quatro estratos verticais com base na altura das plantas, sendo o mais alto o estrato emergente, com árvores que se elevam acima da maioria das outras árvores (como as castanheiras da Amazônia) (Figura 6). O dossel consiste em um estrato contínuo de árvores de grande porte que compõem o “teto” da floresta. O sub-bosque é composto por árvores e arbustos de menor porte que crescem à sombra do dossel, reduzindo ainda mais a luz que finalmente alcança o estrato herbáceo, composto por arbustos e plantas herbáceas de pequeno porte que vivem próximas ao chão da floresta, onde dependem, para a fotossíntese, dos raios de luz que atravessam os demais estratos da floresta durante o dia (Ricklefs; Relyea, 2016). Figura 6 – Estratificação vertical em florestas Créditos: BlueRingMedia/Shutterstock. TEMA 5 – SUCESSÃO ECOLÓGICA A sucessão ecológica refere-se à mudança na composição de espécies das comunidades ao longo do tempo (Cain; Bowman e Hacker, 2018). Esta mudança na composição se deve a eventos de colonização e extinção gerando uma substituição de espécies como resultado de diversos fatores 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 16/20 abióticos (físicos e químicos) e bióticos. Dentre os casos de sucessão ecológica, a sucessão florestal é um dos casos mais estudados devido à sua importância nos ecossistemas terrestres. Como veremos a seguir, a sucessão florestal é dividida em sucessão primária e sucessão secundária, as quais se distinguem em sua origem. 5.1 SUCESSÃO PRIMÁRIA A sucessão primária é o desenvolvimento de comunidades em habitats que são inicialmente desprovidos de plantas e solo orgânico, como dunas de areia, fluxos de lava e rochas nuas (Ricklefs e Relyea, 2016). Como você pode imaginar, a sucessão primária pode ser muito lenta, pois as primeiras colonizadoras (conhecidas como espécies pioneiras ou espécies sucessionais iniciais) em geral enfrentam condições extremamente inóspitas (Cain et al., 2018). Mesmo os mais básicos recursos necessários à vida, como solo, nutrientes e água, podem estar faltando. Esses ambientes inóspitos são colonizados por espécies capazes de resistir a grandes estresses fisiológicos que não exigem solo, como os liquens e musgos que podem viver sobre superfícies de rochas, ou como as gramíneas tolerantes à seca, capazes de colonizar dunas secas de areia (Ricklefs; Relyea, 2016; Cain; Bowman; Hacker, 2018). Assim, os primeiros colonizadores tendem a ser e transformar o hábitat de modo a beneficiar seu crescimento e expansão, assim como das espécies subsequentes (Figura 7). Ou seja, as espécies que colonizam primeiro esses lugares produzem pequenas partes de matéria orgânica, que se combinam com os processos de intemperização da rocha e atividade microbiana para criar solos que tornam o lugar mais hospitaleiro para outras espécies (Ricklefs; Relyea, 2016). Figura 7 – Processo de sucessão primária 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 17/20 Créditos: vectormine/Shutterstock. 5.2 SUCESSÃO SECUNDÁRIA A sucessão secundária é o desenvolvimento de comunidades em habitats que foram perturbados e perdendo sua cobertura vegetal, mas ainda contendo um solo orgânico. Por exemplo, a sucessão secundária ocorre em campos que foram arados ou florestas arrasadas por um furacão ou erupção de um vulcão. Esses habitats tipicamente contêm solos bem desenvolvidos, raízes de plantas e sementes, e isso contribui para um rápido desenvolvimento de novas plantas após a perturbação (Ricklefs; Relyea, 2016). Por exemplo, quando um campo é arado, mas não cultivado, ele logo é colonizado por gramíneas e flores silvestres. Em condições favoráveis, as gramíneas e as flores silvestres serão, em algum momento, substituídas por arbustos e, então, por árvores grandes (Ricklefs; Relyea, 2016) (Figura 8). Figura 8 – Processo de sucessão secundária 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 18/20 Créditos: vectormine/Shutterstock. NA PRÁTICA Tendo em vista os temas abordados nesta etapa, responda às perguntas a seguir, como proposta de sistematização do conhecimento: 1. Qual o objetivo da Ecologia de Comunidades? 2. Quais as diferentes formas de medir a diversidade de uma comunidade, considerando medidas taxonômicas, filogenéticas e funcionais? 3. Como distintos processos regulam as comunidades? 4. Descreva dois padrões de diversidade encontrados em nosso planeta. 5. Explique e diferencie sucessão primária de sucessão secundária. FINALIZANDO Nesta etapa, estudamos os diversos temas abordados pela Ecologia de Comunidades. Vimos as distintas formas de avaliar a estrutura das comunidades, como riqueza, abundância e as distintas medidas de diversidade. Ainda, vimos os distintos processos reguladores das comunidades e como fatores ambientais podem atuar como filtros abióticos e como as interações entre as espécies moldam as comunidades impedindo ou permitindo a coexistência das espécies. Assim, compreendemos como a diversidade de espécies difere entre as comunidades por conta de variações no pool regional de espécies, nas condições abióticas e nas interações de espécies. 11/02/2024, 16:05 UNINTER https://univirtus.uninter.com/ava/web/roa/ 19/20 Por fim, estudamos alguns padrões de diversidade em distintas escalas espaciais (ex. maior diversidade em baixas latitudes e altitudes) e temporais, a partir do entendimento do aumento da diversidade ao longo da sucessão florestal, assim como as diferenças entre sucessão primária e secundária. REFERÊNCIAS BASCOMPTE, J.; JORDANO, P. Plant-Animal Mutualistic Networks: The Architecture of Biodiversity.The Annual Review of Ecology, Evolution and Systematics, v. 38, p. 567-593, 2007. CAIN, M. L.; BOWMAN, W. D.; HACKER, S. D. Ecologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018. CAVENDER-BARES, J.; KOZAK, K. H.; FINE, P. V. A.; KEMBEL, S. W. The merging of community ecology and phylogenetic biology. Ecology letters, v. 12, n. 7, p. 693-715, 2009. CIANCIARUSO, M. V.; SILVA, I. A.; BATALHA, M. A. Diversidades filogenética e funcional: novas abordagens para a Ecologia de comunidades. Biota Neotropica, v. 9, n. 3, p. 93-103, 2009. HUTCHINSON, G. E. Homage to Santa Rosalia or why are there so many kinds of animals? American Naturalist, v. 93, n. 870, p. 145-159, 1959. MACARTHUR, R.; LEVINS, R. The Limiting Similarity, Convergence, and Divergence of Coexisting Species. The American Naturalist, v. 101, n. 921, p. 377-385, 1967. PERONI, N.; HERNÁNDEZ. M.I. Ecologia de populações e comunidades. Florianópolis: CCB/EAD/UFSC, 2011. RICKLEFS, R.; RELYEA, R. A economia da natureza. 7. ed. 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