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Prévia do material em texto

1ª Edição, 2021
Coordenação Editorial
Denise Corrêa / Daverson Guimarães
Criação Capa
Vinicius Schelck
Criação Miolo e Diagramação
Fernanda Oliveira
Produção Gráfica
Denise Corrêa / Maristela Carneiro
Revisão Ortográfica
Marcus Mendonça
Produção Digital
Loope Editora
Catalogação na publicação
Elaborada por Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166
N494
Neuroarquitetura: a neurociência no ambiente construído / Vilma
Villarouco, Nicole Ferrer, Marie Monique Paiva, et al. – Rio de
Janeiro: Rio Books, 2021.
Outras autoras
Julia Fonseca
Ana Paula Guedes
Rio de Janeiro: Rio Books, 2021.
256 p., il.; 15,7 X 23 cm
ISBN 978-65-87913-47-6
1. Neurociências. 2. Neuroarquitetura. 3. Construção. 4. Espaço
urbano. 5. Arquitetura. I. Villarouco, Vilma. II. Ferrer, Nicole. III.
Paiva, Marie Monique. IV. Título.
CDD 612.8
Índice para catálogo sistemático
I. Neurociências : Neuroarquitetura
Todos os direitos desta edição são reservados a: Editora Grupo Rio
Books.
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por
qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônicos ou mecânicos,
incluindo fotocopias e gravação) ou arquivada em qualquer sistema
de banco de dados sem permissão escrita do titular do editor. Os
artigos e as imagens reproduzidas nos textos são de inteira
responsabilidade de seus autores.
Todos os esforços foram feitos no sentido de se encontrar a fonte
dos direitos autorais de todo o material contido nesse livro.
Rio Books
Rua Valentin da Fonseca 21 / 504 – Sampaio 
Tel. (21) 99312-7220 CEP 20950-220
Rio de Janeiro – RJ
contato@riobooks.com.br
www.riobooks.com.br
mailto:contato@riobooks.com.br
https://www.riobooks.com.br/
Além de um material rico sobre Neuroarquitetura, este livro também
é a celebração de uma vida ceifada muito cedo. A Profa. Dra. Vilma
Villarouco, uma das autoras deste livro, faleceu no dia 20 de junho
de 2021 por Covid-19, deixando-nos este material como um dos
últimos projetos de sua brilhante carreira.
Vilma deixa um legado importante nos estudos da Ergonomia e
da Neuroarquitetura no ambiente construído. A preocupação com o
bem-estar da pessoa sempre foi uma questão norteadora em seu
trabalho. Com centenas de artigos publicados, dezenas de
pesquisas e queridos orientandos em mais de 30 anos de docência
na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ela nos deixa a
certeza de que devemos pensar em uma arquitetura para pessoas.
Mente inquieta, com ideias fervilhando a cada momento, seu
entusiasmo estava sempre presente, tudo isso regado de alegria e
um sorriso estampado no rosto... é assim que foi e sempre será
nossa lembrança!
Aprofundando as relações Ergonomia-Arquitetura, vislumbrou
na Neurociência o caminho para respostas às suas inquietudes
quanto à adequação espacial, tendo como seu principal protagonista
o usuário. Não basta projetar um espaço estético e agradável se
não atender aos anseios de quem nele habita numa proposição
sistêmica homem-ambiente, seja qual for a atividade ali exercida. E
assim, a felicidade de poder contribuir para a discussão se
materializou aqui nessa obra, que é claro, temos certeza de que
seria apenas o início de tantas outras.
Somos gratas à Vilma, sobretudo, por ter sido o elo que nos
uniu como grupo e frutificou em trocas criativas e intelectuais muito
ricas, que buscamos expressar nesta obra. Esperamos que este
trabalho sirva para honrar sua memória e sua trajetória profissional
e acadêmica.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO: UMA NOVA FORMA DE VER A ARQUITETURA
BASES DA NEUROCIÊNCIA
SOBRE A NEUROCIÊNCIA E SUAS ESTRUTURAS
NOSSOS PROCESSOS COGNITIVOS
FORMAS DE VER O CÉREBRO
DEFINIÇÕES DA NEUROARQUITETURA
SOBRE A NEUROARQUITETURA E SUA FORMA DE PROJETAR
PERCEPÇÃO VISUAL E O PROJETO ARQUITETÔNICO
NOÇÕES MENTAIS DE ESPACIALIDADE
A EXPERIÊNCIA ARQUITETÔNICA
NEUROARQUITETURA NA PRÁTICA
A NEURO APLICADA AOS AMBIENTES
NEUROARQUITETURA EM AMBIENTES RESIDENCIAIS
EXPERIÊNCIA DA NEUROCIÊNCIA EM AMBIENTE URBANO
UMA NOVA FORMA DE PROJETAR
CONCLUSÃO: UM OLHAR PARA O FUTURO
FONTES DE FIGURAS
REFERÊNCIAS
APRESENTAÇÃO
Foi com muita alegria que recebemos o convite da Editora Rio
Books para produzir esta obra, o que entendemos como uma
grande oportunidade para compartilhar nossos conhecimentos em
neurociência e arquitetura, além dos resultados de alguns de nossos
trabalhos.
Há algum tempo temos estudado, pesquisado e implementado
conceitos e técnicas das neurociências nos trabalhos desenvolvidos
no nosso Grupo de Pesquisa em Ergonomia Aplicada ao Ambiente
Construído, em que os estudos da percepção ambiental sempre
ocuparam uma posição de destaque. Entendemos que da mesma
forma que o ambiente construído é transformado pelo ser humano,
também o espaço pode afetar consideravelmente as pessoas em
múltiplas dimensões. Os estudos científicos das últimas décadas
cada vez mais fortalecem a importância da arquitetura na saúde
humana, tanto física quanto mental, muito mais do que os próprios
projetistas imaginavam.
Habitamos o espaço, seja ele uma sala, seja um edifício, seja
uma rua, seja uma cidade. Viver é interagir constantemente com
variados estímulos ambientais que guiam nossas emoções,
pensamentos e comportamentos. Desde a forma das coisas até
elementos que podem parecer um detalhe – como padrões, luz, cor,
sons e texturas –, os espaços nos afetam constantemente, sem
sequer percebermos que isso está acontecendo. Como isso
acontece? Por que isso acontece?
Com esses questionamentos em mente, avançamos nossos
estudos em busca de respostas, aprofundando-nos nas questões da
mente frente ao ambiente construído e sentindo a necessidade de
um maior entendimento acerca de como as pessoas percebem os
ambientes, de como eles as impactam, e de como essa relação
mútua acontece. Não seria possível esse mergulho na cognição e
percepção humanas sem a apropriação dos conhecimentos da
neurociência.
Esse foi o pano de fundo do cenário que uniu quatro arquitetas,
autoras deste livro, em uma sala de aula do curso de Pós-
graduação em Neurociências Multiprofissional, estudando
neurofisiologia, neuroanatomia, circuitos neurais, neuroquímica,
cognição, processamento de imagens e emoções, mergulhando nas
memórias e nas neurométricas, dentre tantas outras disciplinas
desafiadoras para pessoas da área da arquitetura.
Três de nós carregamos a experiência e o foco da academia,
das pesquisas apresentadas e debatidas em congressos científicos
nacionais e internacionais, das teses e dissertações, das discussões
teórico-metodológicas próprias do ambiente universitário, tudo
mesclado também com produções projetuais. Mas há também
nesse grupo uma profissional do mercado da arquitetura, que traz
em sua vivência as nuances do atendimento ao cliente, da busca do
entendimento dos desejos, de necessidades e aspirações daqueles
que procuram seu trabalho e que muito cedo despertou para a
inserção da neurociência nos seus projetos.
Foi a necessidade de aprofundar nossos conhecimentos para a
prática da neurociência aplicada à arquitetura que nos uniu, tanto
nos estudos quanto na parceria para a produção deste livro. E a
equipe já estava muito boa, mas ficou ainda mais completa e
especializada quando uma psicóloga com mestrado em
neurociências, estudiosa da interseção entre a sua área de
especialização e os estudos dos ambientes, foi incorporada ao
grupo, trazendo enormes contribuições.
O resultado da união dessas cinco mulheres está apresentado
neste livro, dividido em três sessões cujos capítulos são agrupados
por similaridade de temáticas. Introduzimos a obra estabelecendo
relações entre a arquitetura, a psicologia ambiental e a
neurociência. Percorremos uma trajetória da evolução destes
estudos, com a incorporação de nossas reflexões e alguns materiais
de autores que têm colaborado na construção do conhecimento na
área, por meio de publicações na literatura especializada.
A Seção 1 traz em seu capítulo Sobre a Neurociência e Suas
Estruturas as bases da neurociência, objetivando nos posicionar em
relação a sua forma de pensar, além deesclarecer termos e
procedimentos, recursos teóricos e metodológicos para o estudo do
cérebro. Tentamos desmistificar o funcionamento do sistema
nervoso – tanto em sua totalidade quanto em partes –, assunto tão
alheio ao vocabulário arquitetônico conhecido. No capítulo Nossos
Processos Cognitivos, debruçamo-nos sobre as questões da
cognição: atenção, percepção, aprendizado, memória, consciência e
emoções. Esses processos são extremamente importantes para o
entendimento da interação ambiente-cérebro e se conectam
diretamente com o sistema sensitivo humano: visão, audição, tato,
olfato, paladar, interocepção e propriocepção.
Essa seção encerra com o capítulo Formas de Ver o Cérebro, o
qual nos põe em contato com as neurométricas e técnicas de
neuroimagem. Elas permitem visualizar o sistema nervoso, ou parte
dele, seja para identificar estruturas ou funções em imagens
estáticas, seja para enxergar os movimentos cerebrais em tempo
real. Objetivamos aqui criar um panorama dos conceitos básicos da
neurociência. Sem saber nomear as estruturas do corpo humano e
suas relações com o funcionamento das reações cognitivas e
fisiológicas frente ao ambiente, não estaríamos falando de
neurociência quando aplicada à arquitetura.
A Seção 2 começa com o capítulo Sobre a Neuroarquitetura e
Sua Forma de Projetar, o qual introduz a neurociência aplicada à
arquitetura e essa nova forma de projetar. Estabelecem-se relações
entre mente, meio e comportamento, fazendo uma ponte com as
dimensões das emoções, percepção, cognição e psicologia
ambiental, a fim de posicionar a neurociência em sua aplicação na
arquitetura. O capítulo Percepção Visual e o Projeto Arquitetônico
desta seção aborda em detalhes a percepção visual, uma vez que a
visão é considerada hoje o principal sentido usado para entender os
estímulos ambientais. Nele tratamos de luz, cores, movimentos,
percepção da forma e utilizamos uma linguagem neurocientífica
mais simplificada para explicar os processos de formação da
imagem e das sensações por ela transmitida. O capítulo Noções
Mentais de Espacialidade chega com as noções de espacialidade,
traçando um paralelo entre arquitetura e percepção humana. Será
abordada nele a análise da forma, apresentando a perspectiva dos
estudos da psicologia experimental da Gestalt.
O capítulo A Experiência Arquitetônica finaliza a Seção 2, com
foco na experiência arquitetônica, relacionada às estruturas
cerebrais da percepção ambiental: navegação espacial, simbologias
e emoções, com exemplificações a partir de edifícios emblemáticos
da arquitetura. O capítulo trata ainda do projeto da vivência no
ambiente construído e sua relação com o bem-estar das pessoas,
em um texto que combina teoria e prática arquitetônica, e desperta o
desejo de saber mais sobre cheios e vazios, luz e sombra,
proporções e percepções, ferramentas do fazer projetual. Essa
seção foi pensada para apresentar de forma didática uma evolução
da complexidade do espaço: a bidimensionalidade da imagem, com
a percepção visual; a tridimensionalidade do ambiente, com a
percepção espacial; e a inserção da quarta dimensão na experiência
humana, a progressão temporal.
A Seção 3 vem trazendo experiências práticas. Começa no
capítulo A Neuro aplicada aos Ambientes com o resgate de
publicações que mostram relatos em periódicos científicos
especializados e de alto impacto, e que abordam trabalhos
desenvolvidos em centros de pesquisas internacionais. Apresenta-
se aqui como a neurociência tem sido utilizada para o entendimento
das reações do cérebro frente a características de ambientes
construídos. Na sequência, os próximos dois capítulos foram
dedicados a apresentar pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de
Pesquisa em Ergonomia Aplicada ao Ambiente Construído, como
forma de exemplificar algumas coisas que já se sabe, mas,
principalmente, o muito que ainda é necessário explorar quanto à
aplicação da neurociência na arquitetura. No capítulo
Neuroarquitetura em Ambientes Residenciais, apresentamos uma
pesquisa que trata da neuroarquitetura em ambientes residenciais.
O trabalho avaliou salas residenciais de pessoas idosas, utilizando a
conjugação da realidade virtual imersiva (RVi) com a
eletroencefalografia (EEG). O objetivo foi identificar ativações
cerebrais para as variáveis de valência emocional, atenção e
memória no grupo pesquisado. No capítulo A Experiência da
Neurociência em Ambiente Urbano, uma experiência desenvolvida
no Nordeste brasileiro, onde princípios, teorias e técnicas da
neurociência são aplicados em uma pesquisa na temática da
acessibilidade de pessoas com cegueira no espaço urbano. O
estudo observou as respostas neurais dos sujeitos ao realizar
trajetos na cidade a partir de instruções verbalizadas e mapas táteis.
Por fim, o capítulo Uma Nova Forma de Projetar da sessão vem
trazer reflexões acerca do mercado da neuroarquitetura como uma
nova forma de projetar. Trata das contribuições da neurociência à
arquitetura e destaca que por sermos pessoas diferentes,
precisamos de soluções também diferenciadas. O capítulo
apresenta ainda exemplos de projetos internacionais, além de
experiência brasileira com a participação de uma das autoras deste
livro. Encerramos esse capítulo citando algumas publicações
pertinentes à discussão.
Assim, concluímos o livro ao trazer considerações de todo o
cenário abordado, do “estado da arte” da temática tratada nesta
obra e de perspectivas futuras. Não pretendemos dizer aqui que
todo o material existente relativo à neuroarquitetura foi esgotado
neste livro. Longe disso. Encaramos a aventura de escrever um livro
nessa temática como forma de iniciar uma discussão proveitosa,
cheia de potencial.
A maioria do material de qualidade que existe hoje sobre
neuroarquitetura está em inglês e em âmbito acadêmico, inacessível
para boa parte do público brasileiro. Também o material de
neurociência está condensado nas áreas da saúde, com um
vocabulário especializado e de difícil compreensão para arquitetas e
arquitetos. Com isso, acreditamos que esta obra ajudará a
comunidade de projetistas que se interessam e se encantam com a
forma como o nosso mundo construído pode nos afetar, assim como
ele pode guiar nossas vidas. Esperamos que este livro desperte em
você um novo olhar sobre nossos velhos conhecidos: as
edificações, as paisagens e as configurações urbanas dos espaços
que habitamos.
INTRODUÇÃO
UMA NOVA FORMA DE VER A
ARQUITETURA
É muito provável que a maioria de nós, que lê este texto agora, já
tenha se deparado com matérias em revistas ou jornais abordando
algumas palavras que iniciam com o termo neuro. Podem ter sido a
neuroeducação, o neuromarketing, o neurobusiness e tantos outros,
muito comentados em anos recentes e contando com alto índice de
interesse dos leitores. Fato é que temos assistido a um forte
crescimento das pesquisas da neurociência aplicada a diversos
ramos do conhecimento. Isso é algo positivo, já que parece que
estamos nos conscientizando do quanto o cérebro é estimulado por
tudo que acontece ao nosso redor.
O Brazilian Institute of Neuroscience and Neurotechnology
(BRAINN) nos diz que, “em apenas algumas décadas, a
humanidade passou da simples análise sob o microscópio de
Santiago1 para a observação de neurônios humanos em
funcionamento em tempo real”. Essa expansão dos estudos da
neurociência é verificada por essa nova abordagem multidisciplinar,
com a possibilidade de entendimento e exploração de sensações de
satisfação ou de repúdio frente a situações do cotidiano. Técnicas e
equipamentos já consagrados nesse ramo – e muito aplicados no
âmbito da saúde – vêm propiciando amplas possibilidades de
utilização em áreas nas quais se deseja investigar reações mentais
de usuários a partir de diferentes vivências, seja nas compras, na
educação, nas relações interpessoais e até mesmo nos ambientes
que habitamos.
Hoje sabemos que áreas distintas do cérebro são ativadas por
ondas elétricas a partir de sensações e percepções, sendo de
grande importância detectar quais estímulos correspondem às
ativações,com quais tipos de frequências e em quais regiões do
cérebro elas acontecem. Não só a neurociência nos explica como
uma reação específica acontece, como ela nos mostra porque isso
ocorreu.
Mesmo com todas essas fascinantes possibilidades, todo esse
conhecimento é ainda muito recente e exige estudos e pesquisas
aprofundadas, sob o risco de se realizarem afirmações equivocadas
– o que por vezes acaba acontecendo, caso não haja rigor científico
e interpretação correta dos dados. Na verdade, muito temos a
crescer antes de criar aplicações e conclusões, como bem comenta
a neurocientista Molly Crockett, em um TED Talk realizado em
20122, quando em poucos minutos elenca muitos erros cometidos
em nome de leituras cerebrais. A neurocientista enfatiza o poder
que uma imagem de cérebro tem sobre os consumidores quando
colocada numa embalagem, por exemplo, de um “neuro drink”, que
promete reduzir o stress, melhorar o humor ou aumentar a
concentração, mas que não apresenta qualquer evidência científica
por trás da promessa. Ela chama de “neuro absurdos” quando são
atribuídas boas sensações ao serem identificadas ativações de
algumas estruturas encefálicas que respondem também por más
sensações. Precisamos estar muito atentos ao que encontramos
nessa área.
Felizmente nem tudo é engano e ilusão e muitos estudos sérios
são conduzidos nas diversas áreas em que a neurociência tem sido
evocada. Compondo com as áreas já citadas e formando uma onda
crescente, são localizados os estudos da arquitetura que vem
inserindo os conceitos da neurociência, quando a preocupação com
o bem-estar do ser humano ao vivenciar ambientes representa o
foco principal dos projetistas. Nessa aplicação, o interesse está no
entendimento das reações registradas no cérebro, quando da
observação de ativações de regiões que representam sensações,
emoções ou comportamentos desencadeados por características do
ambiente.
De fato, os profissionais e estudiosos da arquitetura há muito
tempo têm conhecimento da interferência dos edifícios sobre as
pessoas. A aplicação da neurociência nessa área vem somar
esforços no sentido de melhor caracterizar, entender e,
principalmente, mensurar esses efeitos. Estudos nessa linha são
encontrados na última década e paradoxalmente a esse recente
incremento, insere-se aqui a colocação de Hipócrates (séc. IX
a.C.)3:
O homem deve saber que de nenhum outro lugar, mas do encéfalo,
vem a alegria, o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o ressentimento, o
desânimo e a lamentação. E por isto, de uma maneira especial,
adquirimos sabedoria e conhecimento, e enxergamos e ouvimos e
sabemos o que é justo e injusto, o que é bom e o que é ruim, o que é
doce e o que é amargo.... E pelo mesmo órgão tornamo-nos loucos e
delirantes, e medos e terrores nos assombram.... Todas estas coisas
suportamos do encéfalo quando não está sadio.... Neste sentido sou
da opinião de que o encéfalo exerce o maior poder sobre o homem.
Precisamos aqui clarear a utilização da palavra encéfalo, talvez
estranha no vocabulário arquitetônico. Esse é o termo técnico para o
que coloquialmente se chama cérebro, sendo que o cérebro em si é
na realidade parte do encéfalo, composto também pelo cerebelo e o
tronco encefálico. Não encontraremos um neurocientista, ou um
texto neurocientífico, que use a palavra cérebro referindo-se a tudo
que temos dentro do crânio.
Tratar dessa massa intracraniana é um tema tão complexo que
diversas áreas do conhecimento têm se unido à neurociência para
tentar desvendar esse poder do qual Hipócrates já falava há mais de
dois mil anos. Como essa influência acontece? Como esse
complexo órgão recebe e processa os estímulos exteriores, associa-
os às memórias e às vivências, e transmite-os ao corpo em forma
de sensações? Como essa fonte de informações e experiências
pode ser explorada em favor do corpo onde ela se insere?
De fato, o tema é denso e neurocientistas de todas as linhas se
esforçam para estabelecer as verdades a respeito do sistema
nervoso, sendo a neurociência, em si, um ramo científico
relativamente novo.
É o encéfalo que comanda todo nosso corpo, comportamentos
e ações que, dependendo do ambiente onde estamos inseridos,
pode ocorrer de maneira mais ou menos prazerosa, mais ou menos
produtiva, com maior ou menor bem-estar4. Estudiosos já tratam
desse entendimento há algum tempo, alertando para a importância
dos conceitos da Neurociência como elemento de suporte na
concepção de espaços com execução de direcionamentos,
informações e estímulos adequados visando à promoção da
segurança e bem-estar de seus usuários5.
Nesse panorama, a cautela é fundamental a fim de evitar que a
empolgação excessiva das novidades e as boas perspectivas das
descobertas embacem conceitos primordiais, como já temos
presenciado. Edificações que utilizam formas mais arrojadas,
estruturas impactantes e elementos da natureza como vegetação
em seu interior são facilmente apontadas como exemplos de
utilização da neuroarquitetura, até mesmo por profissionais que
militam na área. Tais avaliações desconsideram as diferenças
individuais sedimentadas nas experiências vivenciadas por cada
pessoa, suas preferências e memórias, que definem
particularidades e não permitem generalizações. É fundamental
para arquitetas e arquitetos entender os usuários dos espaços,
internos e externos, bem como suas finalidades e cada elemento ali
contido.
A utilização da neurociência na arquitetura apresenta muitas
novas possibilidades, mas também exacerba o desafio de alinhar
soluções projetuais a desejos e preferências de pessoas distintas
que habitam o mesmo espaço.
Revisões na literatura especializada mostram que a maioria dos
conceitos utilizados na área foram desenvolvidos em termos
teóricos, não contando ainda com validações robustas a partir de
estudos experimentais para parte significativa dessas teorias.
Mesmo com o crescente número de trabalhos científicos, o cenário
mostra que a grande variedade de conceitos requer mais pesquisa,
que terão um enorme potencial e fortes desafios. O relacionamento
entre a experiência humana e o ambiente construído a partir de
abordagens da neurociência irá influenciar fortemente os estudos
futuros, apresentando-se como uma área em plena ascensão.
As diversas linhas de conhecimento e ramos científicos que
tratam de incrementar o bem-estar do ser humano entrelaçam suas
teorias e aplicações, o que gera um largo arranjo de possibilidades
no estabelecimento de metodologias, técnicas e diretrizes para
atingir objetivos comuns. Todos esses conhecimentos se
complementam na busca de satisfação, de bem-estar e, por que não
dizer da felicidade de encontrar a sintonia entre o espaço que se
habita (no sentido mais amplo do termo), as limitações e
necessidades do corpo, os anseios da alma e as frequências do
encéfalo.
A inter-relação entre os ambientes e seus usuários acontece
com tal profundidade que consegue tatuar as marcas do sentimento
humano nas características dos espaços. Toques de organização e
agradabilidade, sensações de aconchego e limpeza raramente são
encontrados em residências de pessoas que estão “pra baixo”,
como se a ambiência avisasse aos visitantes que seus usuários não
estão bem. Por outro lado, é possível estimular essas pessoas por
meio desses mesmos ambientes. Há uma via de mão dupla nessa
relação quando entendemos que apenas “estar” em ambientes
agradáveis, leves e confortáveis pode mudar sensações e
sentimentos.
Mas, afinal, o que é um espaço agradável? Como conferir esse
atributo, quando pessoas distintas enxergam por lentes diferentes
as características do mesmo lugar?
São os estudos da percepção ambiental que iniciaram a
reflexão sobre a importância do ambiente construído na qualidade
de vida dos usuários. Por meio das ferramentas desenvolvidas no
âmbito da Psicologia Ambiental – e exploradas pela psicologia
cognitiva, neurociência e arquitetura –, busca-se entender
comportamentos e desejos das pessoas, gerando um maior
entendimento sobre como elas percebem e interpretam o espaço ao
seu redor.
Oque acontece é que o ambiente fornece estímulos
constantemente – de maior ou menor intensidade –, que são
captados pelo corpo como sensações para que a mente as
processe, gerando percepção e consciência, o que pode
desencadear uma resposta comportamental. É possível ainda dizer
que os indivíduos enxergam e reconhecem apenas o que lhes
chama a atenção, influenciados por suas crenças, visão de mundo e
pensamentos6.
Na verdade, existe uma grande proximidade entre os estudos
da percepção ambiental e os que são focados na neuroarquitetura,
chegando a haver certa confusão entre os limites de cada uma
dessas áreas. No entanto, para nós está claro que enquanto uma
busca entender comportamentos, percepções e sensações, por
intermédio de observações, verbalizações e vivências; a outra se
preocupa em investigar as reações ocorridas no interior das nossas
cabeças, o porquê dessas conexões.
Assim, o estudo do funcionamento do sistema nervoso é o foco
da neurociência e das áreas que dela se utilizam, investigando as
regiões encefálicas e suas ativações, ocorridas por ondas de
diferentes frequências elétricas, quando da interação do sujeito com
o objeto da área estudada. Assim, cabe à neuroarquitetura o estudo
das reações neurofisiológicas a partir da interação com ambientes
diversos e os estímulos que eles provocam nas pessoas.
Talvez sejam os processos de obtenção das métricas a tênue
linha divisória entre as duas competências, e tentaremos aqui tornar
mais claros os contornos das duas disciplinas, buscando um
entendimento mais detalhado, embora como marcos introdutórios.
Sendo a neuroarquitetura o objetivo e tema central deste livro,
teremo-na abordada e aprofundada ao longo do seu
desenvolvimento.
O QUE É NEUROARQUITETURA?
Hoje, experimentos científicos explicam os processos que
ocorrem no cérebro humano, bem como as localizações, dinâmicas
e interações específicas da atividade cerebral. No entanto,
experimentar o significado mental e poético do espaço, a partir das
dimensões de forma, matéria e iluminação é um fenômeno bem
diferente das observações de atividades eletroquímicas nos nossos
organismos7.
Criar essa “ponte” entre ciência e experiência vem a ser o
objetivo da neurociência aplicada à arquitetura. Classificada como
um campo multidisciplinar nascente que combina neurociência,
psicologia e arquitetura, a chamada neuroarquitetura surge como
uma nova linha de pensamento projetual, que olha para as
atividades neurais em interação com o ambiente construído.
Projetistas têm adotado cada vez mais esse termo para descrever
um novo campo de estudo que explora como a forma arquitetônica
pode servir ainda mais às funções humanas ao gerar prazer e
satisfação. Como definido pela Academy of Neuroscience for
Architecture (ANFA):
A Neuroarquitetura é um campo interdisciplinar que consiste na
aplicação da neurociência aos espaços construídos, visando maior
compreensão dos impactos da arquitetura sobre o cérebro e os
comportamentos humano8.
Assim, a interseção da neurociência e da arquitetura é vista
hoje como uma ferramenta positiva para avaliar o desempenho de
um ambiente existente. Ela fornece subsídios para decisões de
projetos que melhorem a qualidade de vida dos seres humanos em
sociedade. Mas, ainda assim, essa tarefa se apresenta como
desafio.
Há uma contradição inerente nos métodos usados nessas duas
disciplinas. Em certas áreas da teoria e projeto da arquitetura,
pesquisas são conduzidas por questões abertas e pela aplicação de
pesquisas qualitativas, muitas vezes sobre um ponto de vista
fenomenológico, que revelam uma nova abordagem e uma nova
compreensão de como as pessoas vivenciam os espaços.
Entretanto, as pesquisas no campo da neurociência utilizam
métodos com abordagem positivista, dentro de uma forma analítica
e cartesiana de ver o mundo. A neurociência utiliza uma hipótese
específica e clara para seus questionamentos, explorada em
experimentos que comprovam ou refutam a veracidade dessa
hipótese9.
Encontrar a interseção entre o positivismo e a fenomenologia
significa ter dados objetivos e baseados em evidências para criar a
experiência arquitetônica. Isso permite que arquitetas e arquitetos
fujam de “achismos” e dados empíricos na hora de projetar. Assim, o
desenvolvimento desse conhecimento não apenas permitirá
compreender o ambiente construído, mas também continuará a
desempenhar um papel cada vez mais importante, fornecendo
orientação para o futuro domínio dos estudos de arquitetura. A
neuroarquitetura passa então a ser vista como uma “solução” para
os céticos dos métodos tradicionais de projeto, muitas vezes
intuitivos e qualitativos.
Claro, sempre há o outro lado da moeda, com dúvidas que
naturalmente surgem em novos campos de pesquisa. Corremos o
risco de olhar para as ações humanas de forma exclusivamente
determinística, mecanizando as interações sociais.
Há quem diga que a neuroarquitetura muitas vezes não
considera o contexto social, cultural, político e histórico mais amplo
da questão do espaço. No entanto, esse não é o foco. Não serão
feitos “projetos neuroarquitetônicos”, se é que esse termo já foi
usado. O que é possível com o uso da neurociência aplicada à
arquitetura é encontrar explicações para os fenômenos do ambiente
construído que já são conhecidos, mas não necessariamente
entendemos como funciona. O resultado são projetos que melhor
consideram seu impacto nas pessoas, e como fazer isso de forma
positiva.
Quando falamos de neuroarquitetura, é possível subdividir o
objeto de estudo. Pode-se pensar na neurociência no processo de
projeto, que examina os cérebros dos arquitetos. É possível
considerar a arquitetura neuromórfica, que examina os “cérebros”
dos edifícios. Ou então, a neurociência da experiência arquitetônica,
a qual examina o cérebro de indivíduos que vivenciam um ambiente
construído predeterminado.
Além disso, muitos são os métodos e técnicas utilizadas nos
estudos de neurociência e do ambiente construído. Basicamente,
eles se distribuem em três grupos gerais: técnicas de pesquisas de
ambiente e comportamento; técnicas de pesquisas em neurociência
clássica; e técnicas de pesquisas com uso de ferramentas digitais.
O grupo de técnicas de pesquisas de ambiente e
comportamento trabalha com medidas observacionais, medições de
autorrelato, dados de arquivo e técnicas de mapeamento. Esses
mapeamentos tendem a utilizar ferramentas oriundas da psicologia
ambiental: mapa mental, mapa comportamental e mapa cognitivo.
São utilizados também equipamentos de mapeamento com
biossensores.
Já o grupo de técnicas de pesquisas em neurociências
investiga as medidas psicofisiológicas utilizando as técnicas de
neuroimagem – EEG, ERP, MEG, PER e fMRI (que serão mais bem
abordadas no capítulo Formas de Ver o Cérebro). Também serão
coletadas as atividades eletrodérmicas – com sensores de pele que
medem temperatura, resposta galvânica da pele e condutância de
pele –; eletromiografia; frequência cardíaca; pressão e volume
sanguíneo; e movimentos e piscar de olhos.
Quanto ao uso das ferramentas digitais, existe a possibilidade
de contribuição colaborativa (do inglês crowdsourcing), em que a
partir de uma comunidade on-line, é possível coletar ideias,
conteúdos etc. O uso de dispositivos conectados ao usuário está
sendo cada vez mais utilizado nas pesquisas do ambiente
construído, sendo possível apresentar ao participante imagens de
realidade virtual (VR do inglês virtual reality) e realidade aumentada
ou expandida (AR do inglês augmented reality), utilizando-se
equipamentos como câmera, microfone e óculos diferenciados
(HMD do inglês head-mounted display), os quais podem, por
exemplo, realizar rastreamento ocular (do inglês eye tracking). Em
pesquisas que lidam com percursos, uma tecnologia muito usada é
o Sistema de Posicionamento Global, o GPS.
A escolha de recursos que digam como respondemos à
estimulação que o ambiente construído nos proporciona é um
benefício que a neurociência oferece à arquitetura. As avaliações
dos efeitos nos indivíduos que se baseiam emdados verbais por
vezes perdem a acurácia das informações daquilo que causa o
efeito de agrado ou desagrado no indivíduo, ou que proporciona
conforto ou desconforto.
Muito do que a neurociência nos mostra é que a consciência é
uma parte pequena da vivência em um ambiente e grande parte do
que experienciamos é impalpável até mesmo para nossa própria
consideração. Ao termos acesso a informações que nos mostram
alterações na forma como o ambiente nos estimula, podemos
planejar mudanças nos próximos experimentos e projetos, comparar
com mais objetividade e permitir considerações sobre a experiência
que “fugiram das palavras”. Grande parte de nossa percepção é não
consciente. Especialmente quando relacionada ao ambiente, que
quase sempre é o fundo de outras experiências das pessoas que
não aprendem a pensar no espaço da mesma forma que um
arquiteto.
Como bem disse Juhani Pallasmaa em seu livro Os olhos da
pele, “o corpo sabe e lembra. O significado da arquitetura deriva das
respostas arcaicas e reações lembradas pelo corpo e pelos
sentidos”10. Steven Holl, outro grande arquiteto da projetação da
experiência vivida no espaço, diz no prefácio desse livro que
Pallasmaa: “pratica a arquitetura dos sentidos, impossível de ser
analisada, cujas características fenomenológicas concretizam suas
ideias sobre a filosofia da arquitetura”.
A neuroarquitetura vem abrir as fronteiras para analisar o que
era impossível ser analisado. É disso que nós falamos.
1 O cientista espanhol Santiago Ramón y Cajal conseguiu corar neurônios
individuais e descobrir padrões celulares nunca antes percebidos, abrindo
caminho para estudos iniciais das células e estruturas que permitem que o
cérebro funcione corretamente. Iniciando o ramo da ciência que busca desvendar
os quebra - cabeças por trás do poder cerebral: a neurociência. In: www.brainn.or
g.br.
2 Disponível em: https://www.ted.com/talks/molly_crockett_beware_neuro_bunk?l
anguage=pt-br#t-657523
3 Bear et al., 2002, p. 3.
4 Nasar, 2008.
5 Zeisel, 2006.
6 Okamoto, 2002.
7 Juhani Pallasmaa. In: Tidwell, 2013.
8 Mena, 2019, on-line.
9 Karakas & Yildiz, 2020.
10 Pallasmaa, 2011, p. 57.
http://www.brainn.org.br/
https://www.ted.com/talks/molly_crockett_beware_neuro_bunk?language=pt-br#t-657523
SOBRE A NEUROCIÊNCIA E
SUAS ESTRUTURAS
Existem diferentes maneiras de se olhar para o cérebro, da mesma
forma que existem diferentes maneiras de ver o mundo à nossa
volta. Também o sistema nervoso – e particularmente o cérebro –
pode ser estudado por diferentes óticas. Um psicólogo olhará para
as propriedades emergentes, entendendo o SN como um elemento
capaz de produzir comportamento e consciência. Um farmacêutico
estará interessado nas reações químicas que acontecem entre as
moléculas dentro e fora das células nervosas. Ou seja, é possível
focar em diferentes partes, estruturas, funcionamentos ou conexões
do sistema nervoso.
Considere, então, a transformação que uma simples lâmpada
fez na vida de todos. Ter energia elétrica em casa permite uma
expansão enorme da nossa capacidade produtiva, já que agora não
estamos mais “presos” às limitações do horário da luz natural. No
entanto, a iluminação elétrica é bem diferente da radiação solar,
tendo variações quanto à intensidade, o conteúdo espectral e o
próprio tempo de duração em um período diário de 24 horas.
Só que os seres humanos evoluíram ao longo de milhões de
anos considerando esse padrão dia-noite da radiação solar como
pista circadiana primária11, com nossos corpos “pré-programados”
hoje para manter um ritmo de liberação de melatonina12, além de
uma série de outros ritmos fisiológicos, incluindo o ciclo vigília-sono.
Ou seja, a iluminação elétrica no ambiente construído é geralmente
mais do que suficiente para o desempenho visual, mas pode ser
inadequada para a manutenção dos ritmos neuroendócrinos
normais para humanos. A realidade é que disciplinas como
engenharia, arquitetura e design de interiores enfatizam o
desempenho visual, enquanto a função circadiana não é sequer
mencionada. Porém, se a iluminação elétrica – como empregada
atualmente – contribui para a “desregulação circadiana”, também
pode ser uma causa importante de “desregulação endócrina”, o que
contribui para o adoecimento13.
Além disso, a vida na sociedade contemporânea é
principalmente a vida dentro de edifícios. Então, se quisermos
projetar esses espaços considerando as reações que podemos
instigar no corpo humano, parece lógico entender como esse
organismo funciona. Para isso, faz-se necessário um panorama
anatômico14 e fisiológico15 do sistema nervoso (SN), a fim de
entender e correlacionar suas propriedades funcionais.
Entende-se que o SN é responsável por coordenar, integrar,
analisar e armazenar as informações que recebemos de estímulos à
nossa volta. Assim, subdividido em sistema nervoso central (SNC) e
sistema nervoso periférico (SNP), cada parte está intimamente
relacionada com um ponto de vista morfológico e funcional do
organismo. O SNC fica dentro dos ossos no centro do corpo, o
chamado esqueleto axial, composto pela cavidade craniana, em que
fica localizado o encéfalo; e pelo canal vertebral que protege a
medula espinal – com funções ordenadoras, receptoras e aferentes.
Por sua vez, o SNP é formado pelos gânglios16 da medula espinhal,
pelos 31 pares de nervos espinhais e pelas terminações nervosas
na periferia do corpo humano (Figura 1)17.
O encéfalo é protegido por um grosso crânio, uma espessa
camada de tecido conjuntivo – conhecida como meninge18 – e
milhões de pequenas células interconectadas. Ele é, ainda,
subdividido em 3 estruturas: tronco encefálico, cérebro e cerebelo
(Figura 2).
O tronco encefálico, por sua vez, é composto pelo bulbo, ponte
e mesencéfalo. É ele quem conecta a medula espinhal com as
estruturas encefálicas superiores, sendo responsável por funções
ordenadoras e controladoras do SN. Apesar de contígua à medula
espinal, ele é diferente em sua forma e função, uma vez que contém
núcleos e tratos19 que levam a informação sensorial para os centros
superiores do cérebro20.
É Ô
FIGURA 1 – DIVISÃO DO SISTEMA NERVOSO COM BASE EM CRITÉRIOS ANATÔMICOS DO CORPO
HUMANO
FIGURA 2 – ENCÉFALO REPRESENTADO EM VISTA SAGITAL (CORTE), COM SUAS SUBDIVISÕES
ESTRUTURAIS
A porção inferior do tronco encefálico – região que se conecta
diretamente à medula espinal – é o bulbo, que participa das funções
vitais como um centro respiratório, centro vasomotor (batimentos
cardíacos e pressão sanguíneos) e centro do vômito. A ponte é a
porção mediana e funciona como uma estação para as informações
provenientes do cérebro e que se dirigem para o cerebelo. Por fim, o
mesencéfalo é a porção superior do tronco encefálico. Nele está
uma estrutura ventral conhecida como corpos quadrigêmeos,
formado pelos colículos superiores, envolvidos no controle dos
movimentos oculares; e pelos colículos inferiores, que fazem
conexão com as vias auditivas7.
Na região do tronco encefálico também estão as conexões com
os 12 pares de nervos21 cranianos, exceto os nervos I (nervo
olfatório) e II (nervo óptico). Os nervos cranianos estão relacionados
a três funções principais: inervação sensorial e motora da cabeça e
pescoço; inervação dos órgãos dos sentidos; e inervação
parassimpática22 dos gânglios do sistema autonômico23, que
controlam as vísceras – respiração, pressão arterial, deglutição,
funcionamento intestinal etc.
O cerebelo – outra estrutura que forma o encéfalo – é
considerado um “minicerébro” tanto por sua estrutura morfológica
quanto pela ampla gama de funções que participa ativamente. Ele
está envolvido no movimento involuntário, postura corporal,
equilíbrio, tônus muscular, coordenação motora e aprendizagem
motora. Ou seja, dependemos do cerebelo para interagir com nosso
espaço ao andar, correr, passear de bicicleta e tantas outras tarefas.
Definido tecnicamente como cérebro são as estruturas
encefálicas superiores, divididas em diencéfalo e telencéfalo. O
diencéfalo é um conjunto de estruturas subcorticais (abaixo do
córtex do telencéfalo)muito importantes: tálamo, hipotálamo,
subtálamo e epitálamo. Cada uma tem uma função diferente em
como identificamos o mundo e reagimos a ele. O tálamo lida com a
sensibilidade, motricidade, comportamento emocional e ativação do
córtex, além de desempenhar um papel no mecanismo de estado de
alerta. O hipotálamo lida com a atividade visceral, coordena a
homeostasia e participa do controle emocional. Já o subtálamo é
uma região do diencéfalo que faz parte do circuito motor. E, por fim,
o epitálamo tem uma função endócrina pela conexão com a
glândula pineal, e é exatamente essa estrutura que será afetada
pela lâmpada, inibindo a produção de melatonina (descobrimos o
“culpado”).
Sim, são muitos nomes e muitas estruturas, cada uma mexendo
com uma parte diferente do nosso organismo e que nos permitem
dizer quem somos e como reagimos às situações e ambientes que a
vida nos apresenta. As informações (resumidas) que estão neste
capítulo, por mais “alienígenas” que possam ser para nós arquitetas
e arquitetos, fazem parte da neurociência. Falar de neuroarquitetura
sem entender o “neuro” nessa relação nos parece contraproducente.
SOMOS O QUE PENSAMOS
Podemos dizer que o cérebro é o “computador central” de tudo
aquilo que somos, fazemos e pensamos. É ele que reúne as
informações, reage às situações e toma a decisão. Hoje, sabemos
que um ambiente amplo e iluminado ajuda na concentração do
estudo; o uso de cores em locais estratégicos pode aumentar a
produtividade; e a escolha inteligente de móveis pode induzir a
pessoa ao relaxamento. Mas por quê? O que acontece em nós para
que tenhamos essas reações? Tudo isso se passa no cérebro e
falar de cérebro é falar de conexão.
O interessante é que esse órgão que se conecta com todas as
partes do corpo – e é responsável por “funcionarmos” – representa
apenas 2% da massa corporal. Ao mesmo tempo, ele consome pelo
menos 20% da energia que produzimos. Além disso, apesar de ter
se tornado comum dizer que o cérebro deve ser treinado e
exercitado para evitar atrofia, ele não é um músculo.
Esse órgão principal do sistema nervoso é composto por dois
tipos celulares principais: os neurônios e os gliócitos. O neurônio é
uma célula excitável (Figura 3), visto como a unidade sinalizadora
responsável por processar e transmitir os sinais químicos e/ou
elétricos em conexões chamadas de sinapses, que acontecem na
zona de contato – chamada fenda sináptica (Figura 4) – entre dois
neurônios, ou entre um neurônio e uma célula muscular, fornecendo
informações para diferentes partes do sistema24.
Responsáveis pela conexão do cérebro com o corpo, eles
podem ter formas diferentes a depender da região e da informação
que irão transmitir. Mas de modo geral, a morfologia do neurônio é
adaptada para suas funções, sendo composto por uma região que
recebe a informação de outros neurônios (o soma, ou corpo
neuronal), na qual ficam seu núcleo e organelas, além de vários
pequenos prolongamentos e ramificações (os dendritos), que
captam a informação enviada; e a outra região que, configurada
como um longo prolongamento (o axônio), envia os sinais recebidos
pelo soma para o próximo neurônio na forma de disparos elétricos,
chegando a pequenas hastes no fim do axônio (os terminais
sinápticos).
Já os gliócitos são um conjunto de células não neurais que
desempenham funções de infraestrutura no sistema nervoso. Em
maior número que os neurônios, eles “nutrem as outras células, dão
sustentação mecânica, controlam o metabolismo dos neurônios”25.
Os gliócitos possibilitam o trabalho dos neurônios, que estão
agrupados em grandes conjuntos de papéis funcionais específicos.
Diante do disparo elétrico no neurônio, as terminações
sinápticas liberam moléculas chamadas de neurotransmissores26,
mediadores químicos que servirão para estimular os dendritos de
outros neurônios, em uma grande cadeia de comunicação. Talvez
você já tenha ouvido falar em serotonina ou dopamina: essas
substâncias são exemplos de neurotransmissores. Além desses,
ainda existem outros: GABA, glutamato, noradrenalina, acetilcolina,
ocitocina e endorfina. Concentrados em pequenas vesículas nos
terminais sinápticos, os neurotransmissores são liberados na fenda
sináptica, uma vez que recebem sinal elétrico com carga suficiente.
Geralmente, caracterizadas por certos tipos de atividades
cerebrais, a serotonina está relacionada às emoções, a dopamina à
motivação, a ocitocina ao amor e afeto, a noradrenalina ao estresse,
e assim por diante. Entretanto, essas são representações
ultrassimplificadas dessas substâncias. Podemos sim separá-las por
certo nível de especialização que diferencia quais neurônios
poderão se comunicar com o receptor, um tipo de fechadura
existente nos dendritos de cada neurônio. Serão eles que permitirão
que os neurotransmissores influenciem o neurônio.
FIGURA 3 – ESTRUTURA DO NEURÔNIO, CÉLULA ESPECIALIZADA QUE RECEBE E TRANSMITE
SINAIS ELÉTRICOS
FIGURA 4 – REPRESENTAÇÃO DA CONEXÃO ENTRE TERMINAL DO AXÔNIO E DENDRITO ATRAVÉS
DA SINAPSE, COM LIBERAÇÃO DE NEUROTRANSMISSORES NA FENDA SINÁPTICA
Vale considerar que a serotonina, por exemplo, tem um papel
importante na região do cérebro relacionada às emoções (o sistema
límbico27), mas outros neurotransmissores também o são. Por isso a
importância de evitar o completo reducionismo dos conceitos.
Uma forma mais correta de diferenciar os neurotransmissores
seria pelos tipos de receptores com os quais fazem conexão. A
composição das moléculas fará com que eles se liguem a apenas
alguns tipos de receptores: aminoácidos (GABA e Glutamato),
peptídeos (ocitocina e endorfinas), monoaminas (noradrenalina,
histamina, dopamina, serotonina), purinas (adenosina e ATP),
gasotransmissores (óxido nítrico e monóxido de carbono) e a
acetilcolina (que é o único transmissor de sua classe).
Também é possível diferenciá-los por suas funções no
organismo: neurotransmissores excitatórios aumentam a
probabilidade de um neurônio disparar seu sinal elétrico, como a
noradrenalina e o glutamato. Os neurotransmissores inibitórios
diminuem a probabilidade de um neurônio disparar seu sinal
elétrico, como a serotonina e o GABA.
Contudo, a dopamina e a acetilcolina, por exemplo, são de
certo modo polivalentes. Elas podem criar tanto efeitos excitatórios
quanto inibitórios, dependendo do tipo de receptores que uma
determinada célula tenha, chamando-os de neurotransmissores
moduladores ou neuromoduladores. Alguns tipos podem até mesmo
impactar no efeito de outros neurotransmissores, complexificando o
tipo de comunicação que nossos neurônios podem fazer.
Entender as substâncias liberadas do corpo representa uma
ferramenta a mais para explorar as possibilidades projetuais do
espaço. Afinal, são os neurotransmissores que ativam, ou não, uma
determinada emoção ou “impulsionam” um comportamento
específico. Como dizia uma linha de pensamento de neurocientistas
que estudavam a sinapse, somos uma “sopinha química”.
Bom, já falamos que o cérebro é formado pelo diencéfalo e o
telencéfalo. Juntos, integram e consolidam as informações
recebidas pelos estímulos do ambiente construído. Além disso, o
cérebro é responsável pelas atividades voluntárias (as que
escolhemos fazer em nível consciente).
FIGURA 5 – DIVISÃO DO CÉREBRO EM LOBOS: (I) VISTA LATERAL; (II) VISTA LATERAL COM
ABERTURA PARA VISUALIZAÇÃO DA ÍNSULA; (III) VISTA SUPERIOR; (IV) VISTA SAGITAL (EM CORTE)
Estruturalmente, o cérebro pode ser visto em duas partes,
conhecidas como hemisférios cerebrais, divididos pelo plano
mediano do corpo. Separados por um grande sulco (a fissura
longitudinal), o cérebro é descrito como tendo um hemisfério
esquerdo e outro direito.
No entanto, eles não trabalham bem de forma isolada,
necessitando de uma conexão para o desempenho saudável de
suas funções. Essa ligação é feita pelo corpo caloso, um grande
feixe de fibras nervosas. Vale ressaltar que quando há uma “ponte”
entre os hemisférios, diz-se que ela é uma comissura – e existem
algumas outras menores no encéfalo28, como a comissura anterior,
a comissura posteriore o fórnix –, que transferem informações entre
os dois hemisférios para coordenar funções localizadas. Isso pode
ser visto no processamento de sinais sensoriais, por exemplo, que é
tipicamente recebido em um hemisfério para depois ser
compartilhado com o outro.
Em uma visão lateral, os hemisférios podem ser subdivididos
em lobos (Figura 5 acima). Essa organização identifica certas
regiões cerebrais que se comunicam principalmente com outras
regiões do próprio encéfalo, que por sua vez se especializa em
certos tipos de atividades cerebrais. O lobo frontal é responsável
pelo movimento do corpo e pelas capacidades cognitivas
superiores, como raciocínio, decisão e planejamento; o lobo
temporal lida com o processamento de sinais auditivos, além de ter
importância na cognição do aprendizado e da memória; o lobo
parietal integra as informações cognitivas sensoriais, e é
responsável pela atenção, além da representação do espaço à
nossa volta; o lobo occipital foca no processamento da visão; e o
lobo da ínsula processa o paladar e faz conexão com o sistema
límbico. Lembremos que as funções de cada região não devem ser
completamente simplificadas, uma vez que possuem nuances e
podem participar de funções em outros contextos dependendo da
necessidade e da conexão neural29.
Além disso, o córtex tem sua superfície “dobrada”, o que cria
algumas estruturas com um leve relevo que chamamos de GIROS,
marcados por depressões chamadas de SULCOS. Essas duas
configurações criam a imagem de textura rugosa do cérebro. Além
disso, são essas composições topográficas que permitem uma
divisão ainda mais detalhada dos lobos, especificando aos nossos
olhos sub-regiões.
MOVER OU SENTIR, EIS A QUESTÃO
Não podemos dizer que nosso fascínio pelo cérebro é recente.
Cientistas de diferentes áreas de estudo vêm há décadas tentando
entender e “mapear” o principal órgão do sistema nervoso, em que o
telencéfalo se mostrou foco de análise. Em sua área mais central
existe a massa ou substância branca, composta principalmente
pelos axônios dos neurônios, o que permite a conexão entre suas
diferentes regiões (as fibras30 de associação) e com outras
estruturas cerebrais (as fibras de projeção). A camada externa é o
córtex cerebral, área de processamento mais sofisticado do cérebro.
Também conhecido como massa ou substância cinzenta, é rico em
neurônios, sendo a concentração dos somas (o corpo celular) o que
lhe atribui essa coloração.
Depois de muitos experimentos, os neurocientistas descobriram
um aspecto interessante da estruturação do córtex e sua conexão
com o restante do corpo: a retroalimentação sensorial. O conceito
de retroalimentação, também denominada por feedback, refere-se a
um efeito retroativo, em que a informação que o emissor envia é
produzida como resposta à mensagem que o receptor enviou antes,
mantendo-se essa relação constante. Ou seja, na conexão entre
mente e corpo, o organismo capta continuamente estímulos do
ambiente para fornecer informações ao córtex para que ele possa
ajustar processos de percepção, controle motor, excitação,
homeostase, motivação, aprendizado ou memória.
Para isso, o sistema nervoso faz uso de certos tipos de
neurônios: aferente, eferente e interneurônio. As vias aferentes
formam uma grande população de neurônios distribuídos
estrategicamente por todo o corpo, onde recebem a informação
sensorial do espaço a partir de receptores31 e enviam para
diferentes áreas corticais primárias32. No córtex, a informação é
processada e analisada, sendo possível integrar várias modalidades
sensoriais. Em seguida, faz uso das vias eferentes para levar uma
resposta aos músculos e glândulas alvos de diversas partes do
corpo. Já os interneurônios fazem conexões entre as vias aferentes
e eferentes do corpo, ajustando o sinal em percurso.
Essa complexa relação de feedback contínuo vêm sendo
estudada exaustivamente, tanto do ponto de vista sensorial quanto
do motor. Para isso se deu o nome de sistema somatossensorial ou
sensorial somático, um conjunto de estruturas que nos dão a
capacidade de receber informações sobre as diferentes partes do
corpo. Assim, os sentidos somáticos ou somestésicos,
especificamente, irão lidar com o tato e a identificação de textura; o
reconhecimento da localização espacial do corpo e noção de
posição e movimento (propriocepção); a percepção da temperatura
(termocepção); e percepção da dor (nocicepção).
No contexto de mapeamento do córtex em relação a essas
percepções (processo de somatotopia), o médico neurocirurgião
Wield Penfield (1891-1976) identificou a região específica de
controle motor e sensorial do corpo humano. Conhecida hoje como
homúnculo de Penfield – do latim “homem pequeno” –, temos hoje
uma representação da figura humana com proporções
correspondentes a cada área especializada (Figura 6). Vale
ressaltar que os trabalhos deste neurocientista foram fundamentais
para o desenvolvimento das interfaces cérebro máquina (ICMs).
De forma mais ampla, o mapeamento do córtex chamado Área
de Brodmann (Figura 7), desenvolvido pelo anatomista alemão
Korbinian Brodmann (1868-1918), define o córtex cerebral em 52
áreas distintas. De forma geral, essas áreas se organizam em três
grandes grupos: o córtex pré-frontal está envolvido com a cognição
(raciocínio, controle inibitório, memória de trabalho) e ações
motoras; o córtex parieto-têmporo-occipital se relaciona com
funções sensoriais mais elaboradas, além da linguagem; e o córtex
límbico lida com a memória, emoção e aspectos motivacionais do
comportamento.
FIGURA 6 – REPRESENTAÇÃO CORTICAL DO HOMÚNCULO DE PENFIELD, IDENTIFICANDO A
PROPORÇÃO DE SENSIBILIDADE DAS DIVERSAS PARTES DO CORPO
FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO DAS ATIVIDADES CORTICAIS COM APROXIMAÇÃO DE LOCALIZAÇÃO
Algumas das áreas de Brodmann são mencionadas com mais
frequência na leitura de neurociência. O córtex visual primário
corresponde à área 17. O córtex auditivo primário é composto pelas
áreas 41 e 42, importantes para os processos cognitivos de
percepção e linguagem. A área 4 é o córtex motor primário, e está
situado no giro pré-central. O giro pós-central, no qual se localizam
as áreas somatossensoriais, é dividido em áreas 1, 2 e 3.
Evolutivamente, o córtex pré-frontal é a área que mais se
modificou nos últimos tempos, desenvolvendo-se em nossa espécie
de forma impressionante em comparação a outras espécies. Talvez
por isso seja tão difícil de sumarizar suas características, uma vez
que ele é uma área de associação de informações muito diversas.
Essa região cortical recebe as informações íntero e exteroceptivas
(sensações internas e externas ao corpo), de forma a selecionar as
respostas motoras apropriadas para cada estímulo, dentre as várias
disponíveis.
Uma de suas funções fundamentais – e que talvez seja uma
das mais importantes para caracterizar nossa humanidade – é a
capacidade de avaliar as consequências de planejamentos e ações
futuras, ainda que ele participe de muitas outras funções. De
maneira geral, podemos considerar que o córtex pré-frontal sintetiza
todas as informações sensoriais e experiências emocionais de
forma a produzir percepções conscientes que resultam em
comportamentos específicos, e consonantes com os estímulos que
chegam ao cérebro.
O nosso contato com o mundo está diretamente ligado ao
estado do nosso meio interno (fome, sede, sexo, raiva e prazer)33. A
fome pode fazer com que a voz do professor perca o foco, enquanto
que o cheiro do almoço no restaurante controla completamente seus
pensamentos, por mais que se saiba que aquelas informações do
professor são importantes.
As emoções que experimentamos são regidas pelo sistema
límbico e o córtex pré-frontal, interconectados de forma que o
indivíduo pode também exercer um controle sobre seu estado
emocional (usando estratégias cognitivas para manter o foco); ou ter
um controle emocional de seus pensamentos (perdendo o foco pela
fome ou a imaginação do almoço em casa). De uma maneira geral,
podemos considerar que o córtex pré-frontal integra todas as
informações sensoriais e experiênciasemocionais, de forma a
produzir percepções conscientes. Isso leva à produção de
comportamentos específicos e consonantes com a estimulação
cerebral.
Já no córtex occipital, um determinado padrão de atividade
disparado por estímulos visuais envia informações para o córtex
parieto-têmporo-occipital, em que a informação é processada em
função das características espaciais e para o reconhecimento
desses estímulos.
É interessante pensar que se esse é seu primeiro contato com
a neurociência, talvez tudo isso pareça difuso e exija também algum
tempo de anotações. Mesmo os neurocientistas mais experientes
precisam repassar essas relações, e algumas delas aprofundam-se
muito, sendo motivo para especialização. Contudo, você
inevitavelmente lidará com os nomes dessas estruturas em suas
leituras de neuroarquitetura, e reconhecê-las e ter uma referência
para encontrá-las é importante no caminhar de quem começa a
buscar as pontes entre neurociência e arquitetura.
11 Ritmo (ou ciclo) circadiano é o período de aproximadamente 24 horas em
que se baseia o ciclo biológico do ser humano; é influenciado pela variação dia-
noite de condicionantes como luz, temperatura, marés e ventos.
12 Melatonina é um hormônio produzido pela glândula pineal, que só é ativada
quando não há estímulos luminosos; ou seja, a produção de melatonina só ocorre
à noite e induz o sono.
13 Stevens & Rea, 2001.
14 Anatomia é o estudo da forma e da estrutura do organismo, bem como suas
partes.
15 Fisiologia é o estudo das funções e funcionamento do organismo em função
de processos físico-químicos.
16 Gânglios são formados pelo agrupamento de corpos de neurônios no SNP
17 Purves et al., 2008.
18 Meninge é cada uma das três membranas superpostas (dura-máter, aracnoide
e pia-máter) que envolvem o sistema nervoso central.
19 Tratos são vias neurais que percorrem a medula espinal (para cima ou para
baixo) e representam os caminhos do sistema nervoso central (SNC).
20 Brandão et al., 2005.
21 Nervo é o prolongamento de axônios do neurônio que formam fibras nervosas.
22 O sistema nervoso parassimpático é parte do sistema nervoso autônomo,
sendo responsável por estímulos de calma, saciedade, repouso e digestão.
23 O sistema nervoso autônomo (SNA) faz parte do SNC e controla grande
parte das funções viscerais do organismo.
24 Lent, 2010.
25 Lent, 2010, p. 2.
26 Brandão et al., 2005.
27 Sistema límbico, também conhecido como cérebro emocional, é um conjunto
de estruturas subcorticais responsáveis pelas respostas emocionais aos estímulos
captados.
28 Encéfalo é a junção do cérebro, do cerebelo e do tronco encefálico, todos
protegidos pela estrutura craniana.
29 Eysenck & Keane, 2017; Purves et al., 2008.
30 Fibras são os prolongamentos dos neurônios (os axônios), que se agrupam
para formar feixes.
31 Receptores são células especializadas responsáveis pela captação da energia
do estímulo e sua conversão em um sinal biológico.
32 Áreas Primárias são regiões corticais que têm relação diretamente com a
sensibilidade ou com a motricidade.
33 Brandão et al., 2005; Purves et al., 2008.
NOSSOS PROCESSOS
COGNITIVOS
Um ponto importante para compreensão da neurociência é que não
existe análise técnica sem uma base teórica consistente. Ainda que
seja possível compreender vários fatores sobre a fisiologia do
cérebro por meio de tecnologias existentes, a interpretação desses
achados depende diretamente de conceitos bem definidos e
coerentes que estabeleçam os critérios para as referências
comportamentais usadas nos experimentos.
Predomina na neurociência a forte influência da teoria da
Psicologia Cognitiva, que oferece bases experimentais muito
importantes para definir claramente dimensões da mente, como:
percepção, aprendizagem, atenção, memória, consciência e
emoção. Muitas das características dessas atividades cognitivas
não são ainda correlacionadas com eventos que conhecemos em
termos fisiológicos, ou até são, mas ainda são discutidas propostas
conceituais distintas, que levam a dados fisiológicos diferentes. Por
isso, avaliar o conjunto de evidências dessas linhas teóricas permite
produzir revisões bibliográficas importantes, que são tão relevantes
quanto o desenvolvimento de uma nova tecnologia34.
Existe, por exemplo, mais de uma definição sobre memória de
trabalho ainda em debate, com pesquisadores de diferentes linhas
de estudo buscando o melhor delineamento para que ela possa ser
operacionalizada como variável em experimentos que buscam seus
correspondentes fisiológicos. A aprendizagem também depende de
um tipo de ativação chamada potenciação de longa duração35 (LTP,
do inglês long term potentiation), da qual são conhecidos alguns
aspectos, mas ainda não se sabe qual neurotransmissor é
responsável por iniciá-la. A hipótese mais promissora tem sido o
óxido nítrico, mas ainda são necessárias mais evidências científicas
para de fato apontá-lo como causa para as LTPs.
Além disso, como usamos comportamentos expressos em
tarefas para descrever uma habilidade cognitiva, escolher uma
tarefa que acreditamos medir um determinado fator envolve um
importante trabalho de refletir sobre experimentos e suas
delimitações. Em usos muito equivocados de apropriação da
neurociência, muitas vezes, pesquisadores se precipitam em atribuir
relações para tarefas que querem medir. Por isso, quando os
conceitos são operacionalizados em uma tarefa que pode ser
aplicada em um experimento – ou seja, descritos como habilidades
e comportamentos que podem ser observados –, precisam atentar
para a validade ecológica da tarefa. Isto é, verificar se as condições
analógicas criadas realmente correspondem às condições que se
quer recriar de tais habilidades e comportamentos observados na
vida real.
Por exemplo, uma pessoa que simplesmente use o jogo da
memória para avaliar as habilidades de memória de curto prazo, não
leva em consideração que esse jogo é conhecido por muitas
pessoas. Alguém pode ir bem em sua tarefa não pelo uso da
habilidade de memória de curto prazo, mas por ter outras
estratégias advindas da experiência com o jogo, usando na verdade
aspectos da memória de trabalho.
Assim, é preciso saber qual aspecto se deseja avaliar,
identificar outras habilidades cognitivas que podem turvar os dados
que serão obtidos e prever esse aspecto no estudo. Por isso, há
experimentos especializados exclusivamente em validação de testes
e atividades que podem ser usadas para avaliar uma habilidade
cognitiva. A neuropsicologia e a psicologia cognitiva tiveram
importantes avanços nesse quesito e podem ser uma boa busca
para arquitetos que desejem fazer esse tipo de análise.
Aliás, esse é só o início da jornada. A neurociência tem muitas
outras formas de interagir com a arquitetura. Sua aplicação permite
entender melhor os efeitos que o ambiente construído tem no
cérebro humano. Muitos conhecimentos sobre as habilidades
cognitivas conhecidas pela neurociência podem ser um ponto rico
de trocas para criação de projetos arquitetônicos. Até mesmo o
conhecimento da saúde do cérebro e seu desenvolvimento podem
ser interessantes para escolhas projetuais que ofereçam qualidade
de vida específica para pessoas com deficiência, crianças, idosos
ou mesmo adultos em busca de um estilo de vida menos
estressante.
O FUNCIONAMENTO DA MENTE
Vamos apresentar aqui de forma resumida alguns dos
resultados mais amplamente aceitos sobre atenção, percepção,
memória, consciência e emoções. Esses são os conceitos mais
frequentemente emprestados da psicologia cognitiva para os
estudos experimentais de neurofisiologia ou para definir aspectos
clínicos das atividades cerebrais.
Tudo começa nos nossos sentidos: visão, audição, tato, olfato,
paladar, interocepção36 e propriocepção37. As informações são
recebidas continuamente, todas ao mesmo tempo, ainda que elas
sejam de certa forma um filtro. Isso porque não detectamos todos os
tipos de luz, como o infravermelho ou luz ultravioleta; nem ouvimos
todas as ondas sonoras possíveis, como os cães e gatos são
capazes.
Ainda assim, essas informações chegamdurante cada segundo
de vida e é fácil imaginar o mar de informações recebidas pelo
corpo. Logo, a experiência mental reflete uma parte ínfima de
informações que inunda o ser humano a cada momento. A
habilidade cognitiva que realiza uma primeira triagem dessas
informações é nossa atenção. Ela é geralmente dividida em atenção
focalizada e atenção dividida38.
A atenção focalizada se refere a situações em que os
indivíduos tentam prestar atenção a apenas uma fonte de
informação, ignorando outros estímulos; também conhecida como
atenção seletiva. A palavra ignorar aqui é importante. O controle
inibitório – uma característica do córtex pré-frontal que envolve
deprimir atividades em certas áreas cerebrais – será muito
importante para a atenção e autocontrole. De certo modo, ele
“silenciará” as áreas que processariam as informações que não são
importantes para a tarefa em foco naquele momento. Um exemplo
simples são os momentos em que estamos tão imersos à leitura de
um livro que até esquecemos do resto do ambiente. Os estímulos do
ambiente são recebidos pelos seus sentidos, mas as áreas que irão
processá-los estarão enfraquecidas ou inibidas por interferirem na
produção da sensação de mergulhar na sua história. O que faz você
não ouvir a chaleira apitando na cozinha com seu chá.
A atenção dividida, por sua vez, diz respeito a situações em que
lidamos com duas ou mais tarefas ao mesmo tempo, como o ato de
dirigir, por exemplo, que requer prestar atenção na pista, mas
também em pedestres e outros veículos. É importante ressaltar que
alteramos os períodos de foco mais rapidamente entre as tarefas,
em vez de mergulhar em um estado de concentração em apenas
uma. Isso faz diferença, porque a mudança de foco também
significa momentos de negligência para o que não está em foco.
Essa mudança apenas é mais rápida que a negligência da sua
chaleira quando mergulhados na leitura.
Uns parênteses importantes aqui: por mais que possamos
monitorar dois eventos ou duas tarefas ao mesmo tempo, nossa
atenção é muito mais limitada do que gostaríamos de acreditar. A
atenção dividida permite que não entremos num estado de foco e
concentração tão profundos para que possamos transitar entre dois
ou mais elementos ambientais. Mas isso significa um custo maior de
energia para o cérebro, com uma qualidade menor de eficiência. E
essa perda de qualidade é proporcionalmente menor quando
aumentamos o número de tarefas e quando envolvemos tarefas que
não são automatizadas em nossa vida.
Não entenda mal, a habilidade de atenção dividida é importante
e pode ser melhorada em situações em que estamos muito bem
treinados nas tarefas envolvidas. No entanto, sempre que se
precisar fazer algo bem, prefira organizar sua tarefa de modo a se
permitir foco em uma atividade por vez. Em casos como dirigir, em
que a atenção dividida é inevitável e você precisa prestar atenção
em diferentes aspectos ambientais para uma direção adequada, é
importante se expor para que essa atividade melhore com a
repetição e automatização, e não inclua mais atividades não
essenciais nesse processo, como falar ao celular ou digitar uma
mensagem. Uma tarefa a mais pode ser o elemento que torne sua
resposta às prioridades lenta e com menos qualidade.
O cérebro não é uma máquina com energia infinita, e é
importante saber que o “uso”, ao estar acordado e responsivo
(chamado estadode vigília), faz com que sua qualidade atencional
vá se tornando pior ao longo do dia, assim como seus músculos se
cansam de sentar, andar e correr em sua rotina. Todo seu corpo,
não importa o tipo de tecido, desgasta-se, cansa e precisa do
período restaurador do sono profundo para funcionar bem.
Com nosso cérebro não é diferente e isso é bem mais palpável
no caso da atenção concentrada. O sono adequado e intervalos de
relaxamento são essenciais para que seu corpo se recupere de
grandes gastos energéticos por tarefas de atenção concentrada (ou
focalizada) e atenção dividida prolongada.
Há outra distinção entre características da atenção muito
usadas, dessa vez entre a atenção externa e interna. Atenção
externa se refere à seleção e processamento das informações dos
sentidos em contato com o meio externo (como visão, tato, olfato e
paladar), enquanto a atenção interna diz respeito à seleção e
processamento de informações internas (tarefas que dependem de
memória, imaginação ou raciocínio).
Essa subdivisão lança luz sobre outra forma de olhar para a
atenção e colabora para entender alguns fenômenos. Um exemplo
interessante é o que os cientistas chamaram de “the cocktail party
effect” (em português, o efeito do coquetel). Ele diz respeito à
interferência na qualidade da sua atenção a uma voz quando duas
ou mais pessoas estão falando ao mesmo tempo – esperamos que
se lembre carinhosamente desse texto quando for conversar
durante uma aula ou reunião.
A atenção seria responsável, então, por realizar uma triagem da
inundação de informações captadas pelos sentidos. Contudo, essas
informações filtradas pela atenção interagem com a percepção, que
simultaneamente organiza essas informações segundo os padrões
que o cérebro aprendeu a reconhecer. Assim, o cérebro formula
uma experiência integrada dessas informações, permitindo o
processamento daquilo que já foi visto e redireciona a atenção para
aquilo que parece novo ou estranho, o que se torna prioritário para o
indivíduo.
AO PERCEBER O MUNDO
Padrão é uma palavra essencial. Não se enxerga o mundo
como ele é, mas sim como se aprendeu a ver. A percepção é
então esse processo de colocar as informações dentro do que a
memória permite reconhecer, unidas a fim de identificar situações de
perigo, posicionamento espacial, reconhecimento de formas.
Contudo, parte desse reconhecimento envolve preencher lacunas e
reaproveitar padrões mais recorrentes, anulando certos elementos
de variabilidade de informações nesse processo. Essa característica
de funcionamento é o que favorece a existências de fenômenos
cognitivos como a constância perceptiva e as ilusões perceptivas.
No caso da constância perceptiva, as informações recebidas do
ambiente são variáveis, mas a percepção se mantém constante. Um
exemplo interessante é a variação de luz ao longo do dia e dos
ambientes pelos quais passamos: se o reconhecimento da imagem
de uma pessoa dependesse de que todos os estímulos que a
identificam permanecessem iguais (como tom de pele, dimensão
dos detalhes do rosto, formato do corpo, roupas) as mudanças de
luz, maquiagem, roupas ou detalhes no cabelo já não
corresponderiam a esse conjunto tão detalhado39.
Por isso, a constância perceptiva é o que permite que alguns
aspectos daquela experiência sejam detectados como essenciais
para o reconhecimento de elementos e outros possam ser
desprezados nesse processo. Por isso que por vezes uma
maquiagem nova e bonita ainda permite que reconheçamos a
pessoa, mesmo que os estímulos desprezados nesse processo
sejam inefáveis e nos deem a sensação de que algo mudou, mas
sem saber exatamente o quê.
O escritor argentino Jorge Luis Borges (1899-1986) criou o
personagem Funes, o memorioso, que nos permite inclusive pensar
como esse processo é tão dependente do que aprendemos e
memorizamos, mas não do que vemos diante dos nossos olhos. Em
seu livro de ficção, Borges diz que Funes:
Havia aprendido sem esforço o inglês, o francês, o português, o latim.
Suspeito, contudo, que não era muito capaz de pensar. Pensar é
esquecer diferenças, é generalizar, abstrair. No mundo abarrotado de
Funes não havia senão detalhes, quase imediatos40.
Funes era um indivíduo incapaz de esquecer, e porque não
esquecia mesmo os mínimos detalhes, não podia reconhecer. A
iluminação, posição e comportamento de um cachorrinho eram tão
diferentes de outros cachorros, que até mesmo no cachorro de duas
horas atrás era impossível ver a mesma experiência. As memórias
detalhadas tornavam impossível agrupar similaridades, porque tudo
era visto e lembrado. Tudo merecia um nome novo porque seriam
diferentes demais para serem agrupados.
As repetições das nossasexperiências estabelecem o que mais
se repete como aquilo que será lembrado, e as variações desses
momentos serão esquecidas. Aquilo que se esquece para
reconhecer é o que permite a constância perceptiva, o que é
essencial para termos a capacidade de abstração.
Há o que chamamos de constâncias perceptivas de forma,
tamanho e cor. A primeira, a constância da forma, permite o
reconhecimento de rosto, objetos, estímulos, por desprezar a
variação de alguns elementos que não correspondem ao “gabarito”
aprendido sobre o que sou no espelho, quem é minha mãe, qual é a
minha blusa, ou minha letra cursiva. Já a constância de tamanho
envolve a interpretação da variação do espaço que uma imagem
ocupa em relação a nós mesmos a depender do tamanho
comparado dos outros elementos do ambiente41.
FIGURA 1 – GRAVURAS DO LIVRO ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS (1865) ESCRITO POR LEWIS
CARROLL
Imaginemos ver Alice em um vácuo flutuante. Nesse caso, ao
beber de um vidrinho, enxergamos que ela aumentou ou diminuiu
por compará-la com os objetos registrados e, nossa memória
recente, vista há poucos minutos. Entretanto, se ao fundo o país das
maravilhas, onde existem linhas de perspectiva e outros estímulos
conhecidos que sabemos seu tamanho em comparação a Alice, e
todos eles aumentarem ou diminuírem proporcionalmente à menina.
Não interpretaremos mais que ela cresceu, mas que ela ainda tem o
mesmo tamanho, caso esteja mais perto ou mais longe de nós
(Figura 1).
Se essa análise que faz uso das pistas perceptuais
mencionadas do resto do ambiente não envolvessem constância,
toda aproximação de um objeto poderia levar equivocadamente à
interpretação de que um objeto cresceu ou que ele não é mais o
mesmo. Manter essas referências constantes e desprezar essas
mudanças como elemento diferenciador fazem com que
mantenhamos nosso reconhecimento da Alice como a mesma e
com o mesmo tamanho.
A percepção também está relacionada à constância da cor, que
é a tendência que uma superfície ou objeto tem de ser percebido
como tendo a mesma cor quando os comprimentos de onda
mudam42. Sem ela, as mudanças de um ambiente com luz amarela
para outro com luz branca mudaria tanto as cores dos objetos e dos
seres naquele ambiente que não o reconheceríamos. Manter a
identificação da cor vermelha de uma blusa como o mesmo
vermelho, apesar de a luz do ambiente modificar sua tonalidade,
permite que possamos encontrá-la; ainda que se esteja procurando
em um quarto escurecido pelas cortinas semicerradas para não
acordar a pessoa nesse quarto. Claro que, nesse caso, conhecer
bem a blusa ajuda na constância de cor. Não seria tão fácil
reconhecê-la no escuro pelo seu tom de vermelho tendo a visto
poucas vezes.
Outra possibilidade que colabora para a constância de cor é o
decréscimo rápido da iluminação. Nesses casos, tende-se a
perceber menos a mudança de luz e manter a percepção das cores
vistas quando havia mais iluminação (adaptação cromática). Nesse
caso, não seria preciso grande conhecimento dos objetos vistos,
apenas contato com eles enquanto as mudanças de luz acontecem.
O cérebro tenta manter uma visão que favorece o reconhecimento
daquele ambiente, por mais que a luz mude rapidamente. Essas
constâncias e pistas perceptuais são ferramentas que economizam
muita energia cerebral e guiam a experiência perceptual, como os
arquitetos sabem bem e usam no dia a dia de escolha de cores, luz
e perspectivas de um projeto.
O templo do Partenon, edifício da Grécia Antiga (Figuras 2 e 3),
é um grande exemplo de como o pensamento arquitetônico pode
depois ser descrito em pistas perceptuais. O edifício faz uso da
êntase, uma técnica projetual que auxilia na redução da ilusão
óptica gerada por uma coluna quando as duas linhas do limite visual
do fuste parecem curvar para dentro.
FIGURA 2 – PARTENON NA ACRÓPOLE DE ATENAS, GRÉCIA (SÉCULO V A.C.) PROJETADO POR
CALÍCRATES E ICTINOS, VISTO DE LONGE
FIGURA 3 – DETALHAMENTO DOS ELEMENTOS VERTICAIS DA GRÉCIA ANTIGA: À DIREITA, AS
COLUNAS DO PÓRTICO DAS CARIÁTIDES DO TEMPLO ERECTEION NA ACRÓPOLE DE ATENAS (421
A.C.); À ESQUERDA, AS COLUNAS DO PARTENON NA ACRÓPOLE DE ATENAS (SÉCULO V A.C.)
Apesar de parecerem retas e paralelas, as colunas do Partenon
são levemente curvadas para fora no meio, para poder compensar a
tendência de visualização das linhas paralelas se curvando para
dentro. Da mesma forma, as linhas horizontais das vigas que
cruzam o topo das colunas e a plataforma do piso são levemente
inclinadas para cima, a fim de compensar a percepção de que elas
se curvam para baixo. As próprias cariátides do templo Erecteion
são ajustadas, e suas formas humanas funcionam para diminuir a
distorção óptica (Figura 4).
Além disso, as colunas sempre se inclinam ligeiramente para
dentro no topo, para compensar a tendência de serem percebidas
como se estivessem se abrindo, quando vistas do ponto de vista do
observador, que entra na Acrópole em um nível mais baixo. Esse é
um conhecimento arquitetônico que perdura e que serviu de
exemplo para discussões sobre quais estímulos são interessantes
para investigar mudanças na percepção.
FIGURA 4 – DIAGRAMAS DA ILUSÃO DE ÓPTICA DO PARTENON: (I) O QUE IMAGINAMOS VER COMO
RESULTADO DO PROJETO; (II) EXAGERAÇÃO DAS PEQUENAS DEFORMAÇÕES DA TÉCNICA DE
ÊNTASE USADAS
AO COMPREENDER O MUNDO
Até o momento foi falado aqui sobre a percepção dar sentido ao
que está sendo recebido, entretanto, o perceber nem sempre será
consciente. Perceber não será o mesmo que compreender o que
está acontecendo. Apenas uma pequena parte de todo conteúdo
processado chegará a esse patamar.
Cabe aqui diferenciar: usa-se o termo consciência,
especialmente na neurociência médica, para identificar o nível de
responsividade do cérebro aos estímulos ambientais. Nesse caso, é
possível variar entre um estado de coma ao estado de pleno
funcionamento, como quando apresentamos a vigília adequada que
permitirá boa qualidade atencional e do funcionamento dos outros
processos cognitivos. Os registros de atividade cerebral em onda
apresentados no capítulo anterior são inclusive muito úteis para
estabelecer referências mensuráveis sobre esses tipos de ativação.
Contudo, parte da literatura busca estudar também esse estado
de percepção consciente que dá a sensação de eu. Ela se refere à
informação sobre estímulos internos e externos ao corpo:
pensamentos, memórias, imaginações e autoconsciência e
autocontrole de seu comportamento, chamados de consciência
fenomenal. Essa seria a consciência envolvida na capacidade de
raciocinar e criar uma experiência subjetiva43.
Como se pode imaginar, essas definições geram bastante
debate e não são conceitos simples. Ao fazer um pequeno
panorama sobre as funções consensualmente atribuídas a essa
consciência, é possível estabelecer uma associação à percepção do
ambiente, que desempenha um papel importante na comunicação
social e na compreensão do que outras pessoas estão pensando
(chamado na literatura de metacognição ou cognição social). A
consciência fenomenal também desempenha um papel no controle
das ações, o que permite refletir sobre as situações vividas – tanto
no momento em que ela ocorre como um posterior – e, por fim, ela
integra e combina vários tipos de informações.
Um aspecto importante a ser ressaltado é que falamos em “dar
sentido” quando nos referimos à percepção, mas não falamos
especificamente de consciência. A vigília, a atenção e a percepção
são etapas importantes para o funcionamento do organismo
humano, mas grande parte delas representa uma pequena parcela
desse funcionamento. Isso mesmo elas sendo usadas de modo
determinante para uma atividade cerebral adequada e a consciência
tal como é conhecida (consciência das ações e do que se pode ver).
A consciência ajuda muito na resolução de problemas e no
processamento de adequação rápida ao ambiente. No longo
caminho entre a padaria e a casa feito pela primeira vez, o processo
consciente de agir em cada etapa da condução do carro é preciso,
uma vez que todos esses movimentos e reações não estão
automatizados.Na próxima vez, é possível se corrigir para melhorar
e estar mais preparado para perigos, que talvez no início não se
tenha tanta habilidade para resolver de repente.
Entretanto, com mais experiência para dirigir nesse trajeto, a
consciência de todos os seus movimentos e todos os aspectos
percebidos no ambiente será menos exigida. A partir de então, o
motorista chegará ao seu destino em um piscar de olhos, como
também não lembrará com muitos detalhes como dirigiu, ou
detalhes do processo de dirigir, pois a consciência poderá dividir o
espaço com alguns detalhes mais importantes do caminho e do
carro, como pensamentos ou conversas dentro do carro.
Outro aspecto interessante a ser ressaltado é a controvérsia a
respeito das evidências comportamentais que sugerem que a noção
de controle consciente das ações é uma ilusão, conduzida pelos
princípios de prioridade, consistência e exclusividade. Os estudos
de neuroimagem indicam que algum processamento de decisões
relevantes ocorre antes da percepção consciente. Essas questões
surgem principalmente pelo grande papel que as emoções exercem
no controle das nossas capacidades cognitivas, principalmente
atenção, percepção, memória e autocontrole.
Estados emocionais envolvendo uma intensidade motivacional
elevada estão associados à prioridade no foco da atenção,
enquanto aqueles envolvendo baixa intensidade emocional estão
associados à ampliação da atenção – em outras palavras, a busca
por estímulos mais interessantes. A limitação e a ampliação da
atenção determinam parcialmente o que é lembrado na memória de
longo prazo, porque você perceberá com mais detalhes. Quantos de
nós não temos momentos fugazes que na memória parecem durar
horas. Essas emoções também induzem a consolidação mais rápida
da memória. Emoções muito intensas, como a paixão ou o medo
forte (especialmente o medo), parecem ter prioridade para se tornar
uma memória de longo prazo quando comparado com situações de
baixa intensidade emocional. Até mesmo o julgamento e a tomada
de decisão sofrem grande interferência de sentimentos como
ansiedade, tristeza, raiva e afetos positivos, levando a diferentes
padrões de efeitos sobre esses processos cognitivos44.
O controle das emoções está até mesmo na própria consciência
– com análises que passam pelo filtro do senso comum para julgá-
las racionais –, e estará sempre profundamente enviesado por
nossas emoções. A ansiedade e a depressão têm sido associadas a
tipos de quatro vieses cognitivos: viés de atenção, viés
interpretativo, viés de memória explícita e viés de memória implícita.
Mas nem só de psicopatologias são feitos os vieses. Ficamos sim
“cegos de paixão” ou empolgação, simplesmente porque certos
momentos ganham mais relevância para a atenção por serem
emocionalmente mais intensos. Se esses estímulos não estiverem
concorrendo com perigos, que normalmente ganham no
balanceamento dessa atenção, fortes emoções como paixão,
atração sexual e euforia podem, sim, cegar-nos para outros
estímulos que estavam no ambiente enquanto vivíamos a
experiência.
Nem sempre esses vieses vêm apenas do ambiente
diretamente. Na verdade, a memória é uma grande faca de dois
gumes nessas situações. Tanto ela é intensamente afetada por
como as emoções guiam nossa atenção, percepção e consciência,
levando a definição das prioridades para o que deve ser consolidado
como memória; como ela interfere no reconhecimento dos
elementos do ambiente, conectando-os inclusive com as emoções
que eles remetem, redirecionando a atenção nesse caso e
interferindo muito no funcionamento da consciência nessas
situações.
Essa consolidação mencionada é o processo que diferencia a
memória de curto prazo da memória de longo prazo. A memória de
curto prazo é a informação recém-percebida ou recém-recuperada,
e que será usada naquele momento enquanto você a percebe ou se
lembra. A consolidação é a modificação dessa memória como algo
que pode ser descartado para algo que precisa ser incluído no seu
acervo mais duradouro de informações, a memória de longo prazo.
Outra modalidade, a memória de trabalho (Figura 5), é o
mecanismo correspondente à manutenção um pouco mais
prolongada de uma memória de curto prazo (que duraria apenas
alguns segundos) por meio do uso de funções executivas
(capacidades cognitivas relacionadas ao raciocínio e a consciência).
Ela é especialmente representada pela experiência, um pouco
envelhecida, confesso, de tentar decorar um número de telefone.
Nós não apenas olhamos ou ouvimos o número. Será essencial que
nós usemos a técnica de recitar ou visualizar no pensamento aquilo
que se pretende manter um pouco mais na consciência, antes de
finalmente telefonar e pedir a pizza que se quer.
FIGURA 5 – CORTE CORONAL DO ENCÉFALO, NA ALTURA DAS ESTRUTURAS DE MEMÓRIA
O implacável esquecimento, entretanto, atinge todas as
memórias de uma forma ou outra. Tudo o que vivemos retoma
memórias e as modifica pouco a pouco, uma vez que elas nunca
são reconsolidadas exatamente da mesma maneira que foram
lembradas. Quando olhamos uma obra abstrata pela primeira vez,
ela nos trará emoções, guiará nossa atenção, será base para
formação de percepções baseadas em nossas memórias que serão
revividas enquanto olhamos para a obra. Quando terminarmos de
apreciá-la, as memórias antigas terão algo dessa nova experiência
que as recuperou e podem ser até drasticamente modificadas.
Nossas memórias somos nós, todo nosso potencial de ser e pensar,
e isso nos guia, tornando nosso mundo único, que são modificados
a cada nova experiência. Redefinimos as experiências em nossos
caminhos para o futuro e pensamos nelas como nosso passado45.
Ou seja, é possível criar memórias falsas nessas modificações.
Sim, é possível esquecer memórias que são base para muitas
outras. Não, não é possível impedir o esquecimento. Pelo menos
não por completo. Ainda que busquemos reviver sempre as mesmas
memórias todos os dias, nosso humor, nossas experiências daquele
dia, sempre terão pequenas interferências. E ainda que se escolha
deixar de viver qualquer coisa que não aquela experiência (algo que
diríamos não ser muito saudável) para mantê-la “intacta”, o
envelhecimento inevitavelmente nos leva a modificações no nosso
cérebro, apagando-se aos poucos como uma página de um livro que
esvanece com o tempo.
Não é que não tenhamos memórias duradouras. Todos temos
memórias antigas que vivenciamos novamente com forte caráter
emocional, mas elas se modificarão. Não é algo que controlemos,
pois esses “ajustes” seguem as mudanças aleatórias que a vida nos
impõe.
34 Eysenck & Keane, 2017.
35 Potenciação de longa duração (LTP) é o aumento de respostas pós-
sinápticas por um período de tempo após a breve estimulação repetitiva de
estruturas pré-sinápticas.
36 Interocepção é o sentido que fornece informações sobre o estado interno das
vísceras do corpo.
37 Propriocepção é o sentido que fornece informações sobre o posicionamento
do corpo no ambiente, advindo principalmente dos músculos.
38 Eysenck & Keane, 2017.
39 Eysenck & Keane. 2017.
40 Funes, o memorioso. In: Borges, 2007.
41 Eysenck & Keane, 2017; Purves et al., 2008.
42 Eysenck & Keane, 2017.
43 Eysenck & Keane, 2017; Sternberg, 2000.
44 Purves et al., 2008.
45 Eysenck & Keane, 2017 ; Purves et al., 2008.
FORMAS DE VER O CÉREBRO
As áreas de contato entre neurociência e arquitetura têm se
mostrado diversas e promissoras. Entretanto, novas integrações de
conhecimento trazem consigo desafios para os profissionais que se
aventuram fora dos seus meios de leitura e comunicação usuais. A
arquitetura tem os braços abertos para a imensa complexidade da
vida humana, integrando muitas informações sobre sua saúde, sua
política e sua cultura. Algo que a neurociência destrincha e esmiúça,
tentando decompor o que é imenso e complexo em partes que
podem ser relacionadas ao funcionamento do cérebro.
Dessa forma, um ponto importante do caminhar de nosso livro
será apresentar a neurociência às arquitetas e arquitetos
interessados nessa nova forma de ver o espaço, sendo proveitosopara o diálogo científico gerado por esses dois campos a tradução
entre conceitos e paradigmas da arquitetura para o reducionismo
necessário aos métodos neurocientíficos.
Um bom ponto de partida é a apresentação do método
experimental, usado nesses processos em que um cenário
complexo da vida cotidiana é decomposto – o que neurocientistas
experimentais se referem como fenômenos, objetos de estudo – até
a sua representação mais simples e essencial. Assim, para que
mais pessoas possam ter referências mensuráveis e comparáveis
sobre o que está sendo estudado sem que os pontos de vista sejam
apenas análises pessoais. Uma boa possibilidade para isso é tentar
descrever claramente e recriar tal fenômeno em laboratório (ou
ainda que fora dele, mas em circunstâncias mais controladas), em
uma analogia do evento mais complexo que assistimos em nosso
mundo e que não conseguiríamos isolar das influências da nossa
experiência pessoal ao realizar análises diretamente em contato
com ele46.
(A)
(B)
(C)
O ponto mais importante desse processo é realizar tentativas
de reconstruir o mais básico daquele comportamento ou daquela
atividade cognitiva, podendo recriá-lo, ou mesmo fazer algumas
modificações nas condições do experimento para ver como ele pode
variar.
As condições que acreditamos ser responsáveis por causar ou
modificar nosso objeto de estudo são chamadas de variáveis
independentes (VI). Os eventos, gerados após a apresentação das
variáveis independentes, são chamadas de variáveis dependentes
(VD). Uma dica para se lembrar, caso você se aventure por ler
estudos e textos de neurociência, é pensar que no experimento
chamamos de VI aquilo que supomos ser a causa do que vamos
estudar e VD o efeito que buscamos estudar. Tal suposição será
criada a partir da observação e da discussão teórica em trabalhos
da comunidade científica, buscando nossa formulação mais
adequada, para então criar hipóteses que guiem nossos
experimentos47.
Se usarmos como exemplo um estudo que parta da hipótese de
que certo medicamento pode afetar a memória de curto prazo48 –
baseado em alguns relatos de casos clínicos encontrados na
literatura –, vamos precisar criar um experimento que teste essa
hipótese. Define-se a fórmula e a dose desse medicamento como a
VI, e a intensidade da perda de memória de curto prazo como VD. A
formulação da hipótese deve se preparar para verificar os três
resultados mais prováveis nas correlações:
Se o uso do medicamento produzir perda de memória
proporcional à quantidade do seu uso, dizemos que há
correlação positiva entre VI e VD (aumentar VI produz
modificações diretamente proporcionais na VD).
Se o uso do medicamento diminuir a perda de memória,
dizemos que há correlação negativa entre VI e VD
(aumentar VI produz redução nas ocorrências da VD).
Caso o medicamento em diferentes intensidades não gere
qualquer perda de memória, dizemos então que não há
correlação entre VI e VD (aumentar ou diminuir VD não
modifica em nada os parâmetros registrados da VD).
Perceba que na linguagem experimental as palavras “positivo”
ou “negativo” não têm a ver com ser bom ou ruim. Na verdade,
descobrir uma correlação negativa entre a substância e a perda de
memória seria algo bom, pois teríamos potencialmente um remédio
que atrasa ou reduz a perda de memória. Contudo, toda discussão
sobre as implicações de uma correlação entre variáveis, seus
potenciais usos e questões éticas não são feitas no experimento.
Elas dependem de mais produções, mais experimentos e estudos
de filosofia e bioética49. Por isso, não afirmamos jamais como dado
definitivo o que foi mostrado apenas em um primeiro estudo; nem
pulamos para conclusões absolutas sobre uma correlação. A
neurociência anda sempre um pequeno passo de cada vez.
Além disso, é importante ressaltar que o termo correlação é
usado para indicar que há alguma interação entre as variáveis
estudadas, mas só consideramos que algo é de fato causa de um
comportamento ou evento cognitivo50 se ele tiver uma condição de
suficiência e necessidade com a VD. O termo suficiência pode ser
definido como a condição em que a VI sozinha – sem qualquer outra
variável que também pode interferir no experimento – é capaz de
gerar a VD. Por sua vez, o termo necessidade refere-se a uma
relação em que aquela VI que identificamos interferir na VD estava
presente, sem exceções, em todos os momentos em que
conseguimos produzir aquela VD51.
Se usarmos como exemplo nosso medicamento hipotético, é
possível identificar nos resultados que o remédio está
correlacionado positivamente com a perda de memória de curto
prazo e isso pode indicar cautela e estudo específico de seu uso
clínico. Contudo, para dizer que ele causa aquele tipo de perda de
memória de curto prazo, seria preciso ter certeza que todos que
usam o medicamento terão, em algum grau, aquele tipo de perda de
memória. Nesse caso, diríamos que ele atende ao critério de
necessidade para ser chamado de causa. Também seria preciso
que nenhuma outra variável – como outra substância, condição
genética ou problema de saúde preexistentes – esteja presente para
que a perda de memória se manifeste. Caso o medicamento apenas
acelere ou piore o quadro de pessoas com Alzheimer52, por
exemplo, ou gere o quadro de perda de memória apenas se
administrado com o álcool, ainda é possível afirmar a correlação
positiva, mas definitivamente não usaremos a expressão causa,
uma vez que ela não atende ao critério de suficiência.
Por fim, para complementar nosso vocabulário básico de
neurociência experimental, é importante ressaltar que não é usada a
expressão “prova” como é dita na vida cotidiana: “Fulano provou que
isso funciona para melhorar a memória”. Prova, como termo técnico,
é aplicada ao direito ou à matemática, que curiosamente tem um
significado bem distinto em cada uma dessas áreas. Geralmente o
substituto mais correto para o que desejamos expressar com a
palavra prova é a palavra evidência. O neurocientista sempre afirma
o que pode ser descrito a partir do conjunto de evidências científicas
existentes até aquele momento. Contudo, a revisão científica é
contínua e o aspecto definitivo da prova não expressaria o princípio
de que o debate precisa sempre ser revisado e rediscutido à luz de
novos construtos, novas tecnologias. Muitas vezes na neurociência,
aquilo que se considerava como as evidências mais fortes em certo
momento é completamente desconstruído pelo surgimento de novos
experimentos ou tecnologias que permitiram medir melhor e
observar com mais dinamismo53.
Não se assuste se o assunto não parecer tão intuitivo logo na
primeira leitura. Fazer o exercício de tentar formular hipóteses
colocando os elementos que você pode identificar como possíveis
VI e VD ajuda a naturalizar essa forma de pensar, além de treinar o
olhar. Expor-se a mais leituras que usem esse vocabulário é
definitivamente a melhor maneira de se apropriar dele.
Se pudermos sumarizar o que foi dito em um pequeno mantra a
ser repetido todas as vezes que a dúvida surgir, lembre-se desse
texto e repita: “Correlação positiva não é o mesmo que causa.
Afirmamos causa apenas quando as evidências indicarem que há
relação de necessidade e suficiência entre as variáveis”. Se
conseguir lembrar desse mantra e se educar para explicá-lo a si
mesmo em situações de dúvida, você provavelmente estará
preparado para se nortear em uma vasta gama de estudos
experimentais.
Lembremos que a neurociência é uma área multidisciplinar e
muitas vezes lida com variados conceitos de disciplinas
completamente diferentes, o que lhe oferece procedimentos de
estudo muito diversos. Dentro do guarda-chuva de técnicas de
análise, encontram-se muitos experimentos que falam estritamente
dos hormônios do cérebro (neuroquímica), funcionamento dos
neurônios (neurofisiologia), estrutura e organização do cérebro
(neuroanatomia), desenvolvimento e senescência do cérebro
(neurodesenvolvimento e neuroplasticidade), adoecimento do
cérebro (neuropatologias, neuropsiquiatria, neurologia), e tantas
outras áreas54.
Por vezes, osprofissionais que recebem a alcunha de
neurocientistas terão uma formação e área de especialidade
completamente diferentes, encontrando-se apenas porque todas
essas habilidades levam ao mesmo objeto de estudo: o cérebro.
Nem o mais articulado dos neurocientistas terá conhecimento sobre
todas essas áreas, e você, como potencial neuroarquiteto,
provavelmente fará escolhas de aprofundamento e técnica a
depender do seu campo de interesse. Por isso, vamos criar aqui um
panorama geral dos métodos e técnicas que potencialmente serão
aplicadas à neuroarquitetura.
É importante ressaltar que ainda estaremos longe de oferecer
uma visão completa da neurociência em toda sua imensidão. Esta é
uma breve apresentação de algumas informações que permitirão ler
com certa crítica os dados deste livro e também aguçar o interesse
de arquitetas e arquitetos para que se aprofundem e se apropriem
do conhecimento da neurociência.
RECURSOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS PARA O ESTUDO DO
CÉREBRO
Uma grande limitação do uso de respostas comportamentais –
no estudo da atenção, por exemplo, são relatos verbais, entrevistas
ou testes que requerem apertar uma tecla em resposta a um dado
estímulo – é que elas são aferidas depois de vários outros
fenômenos cognitivos – como a percepção, mecanismos de
memória ou tomada de decisão –, de forma que fica difícil relacionar
uma dada resposta com processos atencionais. As medidas de
atividade cerebral nos respondem melhor qual etapa do
processamento da tarefa pode estar ou não fora do padrão
conhecido.
FIGURA 1 – MÁQUINA DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA FUNCIONAL (FMRI) UTILIZADA PARA CAPTAR
IMAGEM DAS VARIAÇÕES NO FLUXO SANGUÍNEO EM RESPOSTA À ATIVIDADE NEURAL
FIGURA 2 – EQUIPAMENTO DE ELETROENCEFALOGRAMA (EEG) USADO PARA AVALIAR A ATIVIDADE
ELÉTRICA DO CÉREBRO EM PROCEDIMENTO SEGURO, INDOLOR E NÃO INVASIVO
Muitas vezes, a aplicação de mais de um equipamento e
procedimento estará presente em uma mesma pesquisa ou em suas
replicações. Isso porque é necessário que tenhamos mais peças
para começar a montar esse quebra-cabeça e formar uma
perspectiva sobre o fenômeno investigado.
Existem inúmeras formas de obter informações detalhadas
sobre o funcionamento e a estrutura do cérebro. Algumas delas
popularmente conhecidas: podem ser aplicadas técnicas de imagem
cerebral, como a imagem por ressonância magnética funcional
(Figura 1) (fMRI, do inglês functional magnetic resonance imaging),
e técnicas eletrofisiológicas de registros de sinais elétricos
cerebrais, como o eletroencefalograma (EEG). Tais ferramentas
permitem encontrar as áreas cerebrais e o momento de ativação em
muitos processos cognitivos. Em certos procedimentos
experimentais, é possível até mesmo especificar a ordem em que
diferentes áreas cerebrais se tornam ativas – quando alguém realiza
uma tarefa, por exemplo –, ou descobrir se duas tarefas envolvem a
ativação das mesmas áreas do cérebro55.
Entretanto, há uma miríade de avanços tecnológicos já
consolidados em estudos de neurociência que são interessantes de
se conhecer. Estudos com estimulação magnética transcraniana
(TMS) são voltados para a investigação de quais capacidades
cognitivas ou comportamentais são modificadas por lesões
cerebrais56. Os estudos do paciente Phineas Gage no século XIX
marcaram a história da neurociência pelas mudanças
comportamentais geradas a partir da lesão na região do córtex pré-
frontal ventromedial. Ainda, estudos com animais que usam drogas
ou técnicas de análises genéticas permitem investigar mudanças
nas estruturas cerebrais ou no funcionamento cerebral desses
animais de modo seguro para humanos.
Para a neuroarquitetura, entretanto, essas técnicas descrevem
a imagem cerebral e as medições eletrofisiológicas, que são
potencialmente mais interessantes por se tratarem de
procedimentos seguros e não invasivos, com medidas de variáveis
para construção de experimentos. Elas permitirão conhecer melhor
quais as atividades cerebrais são identificadas no contato com um
ambiente ou aspecto estético dele, por exemplo.
Para esse fim, as principais técnicas não invasivas usadas para
estudar o cérebro são as técnicas de registro de potenciais
relacionados a eventos (ERP, do inglês event-related potentials). O
mesmo estímulo – ou estímulos muito similares entre si – é
apresentado repetidamente, e o registro de padrão de atividade
cerebral elétrica é realizado por meio de vários eletrodos colocados
no couro cabeludo, a fim de registrar as áreas que têm mais
atividade elétrica no momento da tarefa. Essa técnica permite
investigar vários processos cognitivos com muita precisão temporal5
7, mas sua resolução espacial58 é muito fraca. Dentre as opções não
invasivas essa é possivelmente a de menor custo e com maior
flexibilidade de local, já que é possível ter acesso a equipamentos
de ERP que possam ser transportáveis, como o EEG (Figura 2), por
exemplo.
O EEG é um método não invasivo e de alta sensibilidade para
registro de superfície dos potenciais cerebrais que refletem as
correntes elétricas nos neurônios do córtex cerebral. Essas
correntes elétricas são captadas pelos eletrodos colocados na
superfície da cabeça de um indivíduo, direto no couro cabeludo ou
com uma touca. A depender da região que apresenta mais atividade
elétrica sendo captada, além dos padrões característicos gerados –
diferentes em amplitude da onda e frequência – é possível
classificar ondas, identificadas normalmente como alfa, beta, teta,
delta e gama.
Para registrar o EEG são usados dois eletrodos: um eletrodo
ativo sobre a área da qual queremos medir as flutuações de
atividade elétrica e um eletrodo neutro a certa distância dessa área.
Comumente são utilizados também vários eletrodos ativos
colocados sobre a pele da cabeça (ou na touca), acima dos lobos
frontal, parietal e temporal (regiões cerebrais). Os registros medem
as diferenças de potencial elétrico59 entre dois eletrodos ativos ou
entre um destes e o eletrodo neutro. Em geral, as frequências dos
potenciais registrados da superfície da cabeça em um h normal
variam de 1 a 30 Hz, e a amplitude entre 20 a 100 μV (Figura 3).
FIGURA 3 – CLASSIFICAÇÃO DAS ONDAS ELÉTRICAS CEREBRAIS EM FUNÇÃO DE SUA
FREQUÊNCIA (EM HERTZ), DEPENDENDO DA ATIVIDADE ELÉTRICA DOS NEURÔNIOS
FIGURA 4 – LOCALIZAÇÃO DOS ELETRODOS PARA A ELETROENCEFALOGRAFIA NO SISTEMA
INTERNACIONAL 10-10
Quando estamos acordados, o EEG registra ondas
relativamente rápidas e de pequena amplitude (14 a 30 ciclos por
segundo, também chamados de ondas beta). Se o indivíduo fecha
os olhos ou está relaxado e se desliga do seu meio, o padrão
eletroencefalográfico beta dá lugar a uma atividade mais lenta e de
maior amplitude (8 a 13 ondas por segundo, chamadas de ondas
alfa)60.
A região do cérebro também importará para a interpretação
dessas atividades, pois certas regiões do cérebro estão geralmente
relacionadas a alguns fenômenos fisiológicos e cognitivos. Você
provavelmente verá com frequência um mapa que identifica as
regiões de eletrodos que permitem medidas que são referências
importantes para o estudo da atividade cerebral (Figura 4).
A partir dessas referências, muitas outras podem ser
estabelecidas para medir e identificar padrões cerebrais mais
comuns. Como no caso dos registros de componente de potenciais
evocados61, que também são referências interessantes, como o
P300, que tem sido usado no estudo de agrupamentos de
estímulos, ou N400 para identificar reconhecimento de novas
relações entre estímulos62.
Em muitos casos, essas técnicas de medida são usadas em
conjunto com outras técnicas de medidas fisiológicas de atividade
autonômica, tais como frequência cardíaca, respiratória, respostas
galvânicas e outras, que poderiam também servir como indicadores
fisiológicos do estado de atenção. Há outras técnicas – infelizmente
caras, por sua infraestrutura digna de uma ficção científica – que
também possuem especialidades que nem sempre obtemos com o
ERP. A tomografia por emissão de pósitrons (PET), por exemplo, é
uma técnica que envolve a detecção de pósitrons (partículasatômicas emitidas por algumas substâncias radioativas). A PET tem
razoável resolução espacial, mas pouca resolução temporal, e mede
a atividade neural apenas de forma indireta.
A imagem por ressonância magnética funcional (fMRI),
mencionada anteriormente, é uma técnica que captura a imagem da
oxigenação do sangue, usando uma máquina de imagem por
ressonância magnética (IRM). A fMRI tem resolução espacial e
temporal superiores à PET, e fornece uma medida indireta da
atividade neural. A magnetoencefalografia (MEG), por sua vez, é
uma técnica que envolve a mensuração dos campos magnéticos
produzidos pela atividade elétrica cerebral. Proporciona informações
bastante detalhadas em nível de milissegundos sobre o curso
temporal dos processos cognitivos, com uma resolução espacial
razoavelmente boa63.
Existem também os equipamentos usados nos testes
psicofisiológicos64. Eles geralmente combinam alguns equipamentos
com tipos de tarefas específicas para avaliar habilidades cognitivas,
em contraste aos equipamentos mencionados anteriormente. Um
exemplo é o Efeito Stroop – bastante usado em estudos de atenção
– que estuda os substratos neurais do controle inibitório65.
Em um desses estudos, que focava em palavras comuns, como
nomes de cores, por exemplo, elas são apresentadas em uma tela,
e o indivíduo que participa do teste é solicitado a nomear a cor em
que a palavra está impressa. Na metade das tentativas da sessão, o
nome da palavra é diferente da sua cor: a palavra verde pode
aparecer escrita na cor azul. Na outra metade da sessão, a palavra
e sua cor são compatíveis (a palavra vermelho escrita com letras em
cor vermelho). Geralmente, nessa tarefa, sentimos grande
dificuldade em nomear a cor e não ler a palavra diante de nós. Os
indivíduos sem patologias apresentam um bom desempenho no
teste, embora o tempo de resposta seja maior na situação de
conflito que na condição de compatibilidade. Essa é considerada
uma tarefa psicofisiológica, pois ela é uma tarefa comportamental
com relação já bem estabelecida como correspondente a um
processo neurofisiológico.
OS NEUROCIENTISTAS PODEM LER NOSSAS MENTES?
Os resultados apresentados pelas pesquisas voltadas para a
análise de nossa atividade cerebral são impressionantes. Com
controle adequado de variáveis, é possível identificar o que estamos
olhando por meio da leitura dos padrões de nossa atividade
cerebral; ou se o que estamos ouvindo nos agrada.
Em um estudo, pesquisadores pediram que os participantes
visualizassem figuras de oito categorias diferentes enquanto sua
atividade cerebral era monitorada por fMRI. A predição do estímulo
selecionado pelo olhar de cada participante foi correta em 96% das
vezes. Infelizmente, alguns cuidados são importantes para que as
pesquisas sejam tão eficientes: os estímulos visuais usados eram
apresentados de maneira simplificada, não estavam inseridos em
cenas complexas como encontramos em nosso cotidiano. Além
disso, antes que o teste fosse realizado, os participantes tiveram
suas atividades medidas enquanto olhavam cada um dos estímulos
a serem usados durante os testes.
Assim, seria possível aprender os padrões de atividade cerebral
de cada participante para que depois a leitura dessas atividades
sem que os pesquisadores soubessem para o que olhavam fossem
feitas. Esse método em que o participante da pesquisa é o próprio
controle do estudo é importante, porque ao contrário do que muitos
pensam (e até mesmo a neurociência pensava no passado), o
cérebro não possui um lugar para cada atividade cerebral nem tem
os padrões de ativação exatamente iguais. Há diferenças e
especificidades que esse procedimento permite controlar para uma
análise adequada66.
A escolha dos estímulos também tem um papel importante na
construção do experimento. Imagens escolhidas por serem
frequentes no cotidiano e/ou cultura dos participantes resultaram em
um bom nível de predição, mesmo em situações que a medida
acontecia pela primeira vez, sem que uma linha de base fosse
realizada para padronizar como o cérebro responderia. Essa
escolha cuidadosa de estímulos ao se conhecer mais do contexto
dos participantes permitiu um acerto na “leitura” das mentes de 92%
para um grupo e 72% para outro. Comparado aos estudos
anteriores, em que o padrão de escolha de estímulos era feito sem a
linha de base, e com estímulos escolhidos sem consideração do
contexto dos participantes, esse resultado foi de 0,8%67.
O avanço tecnológico e das pesquisas que buscam padronizar
e validar as formas de leitura dos equipamentos de neuroimagem68
têm avançado a passos largos. A grande riqueza dos dados obtidos
tem colaborado muito nas construções de modelos teóricos sobre o
funcionamento do cérebro.
Contudo, a análise dos mesmos resultados envolve muitas
recomendações de cautela na leitura desses dados. Para que o
equipamento seja usado adequadamente, não basta boa tecnologia,
mas uma base teórica clara para que o planejamento da pesquisa, e
seu controle de variáveis, seja bem feito. Seria o mesmo que
acreditar que saber usar os softwares para projetar seria suficiente
para criar bons projetos arquitetônicos. O software de desenhar
projetos sem toda a base teórica e conceitual da teoria projetual
levará a problemas no resultado final. Alguns mais evidentes, outros
menos, mas definitivamente a expertise de como usar o
equipamento interferirá no resultado final, muito mais do que usar
software ou papel e prancheta para produzir aquele projeto. Do
mesmo modo, tecnologias de registro de atividade cerebral sem
uma base teórica levarão a conclusões equivocadas, as quais
levarão a aplicações equivocadas.
O nome neurociência tem hoje forte peso midiático e,
frequentemente, o resultado de uma pesquisa é superestimado e
ganha mais força e visibilidade, mas ainda assim com problemas
metodológicos. As relações entre processos cognitivos e áreas
cerebrais de uma pequena região no cérebro (apelidadas como
“bolha” – blob) são interpretadas e noticiadas como área do medo,
área do amor, área da fé etc. Essas abordagens, tão disseminadas,
são referidas na literatura especializada como “bolhalogia”
(“blobology”) em análises críticas, um modo de rotular criticamente
as pesquisas que em suas análises realizam inferência reversa, ou
seja, inferência de um processo cognitivo a partir da ativação de
“bolha”69.
O psicólogo acadêmico britânico Michael Eysenck dá um
exemplo interessante ao mencionar esse problema em seu livro. Em
pesquisas de imagem cerebral que envolvem a apresentação de
estímulos ameaçadores, há consistentemente em seus resultados a
ativação de uma estrutura cerebral denominada amígdala (essa não
é a que fica na garganta). Logo, essa estrutura subcortical é uma
das regiões do nosso sistema do medo. Certo? Não, não é tão
simples assim, porque outra pesquisa demonstrou que o
processamento da maioria das emoções também implicou a
ativação da amígdala.
Além de as áreas do cérebro não serem envolvidas em
processos cognitivos muito diferentes, é preciso considerar no
procedimento experimental e na generalização dos resultados
questões sobre o desenvolvimento e adaptação do cérebro
(processo conhecido como plasticidade cerebral) que levam a
pequenas diferenças no funcionamento cerebral de cada pessoa. É
preciso replicação e metanálise70 para que possamos atribuir certos
locais no cérebro a certos processos cognitivos.
O problema da inferência inversa foi demonstrado claramente
em um estudo de metanálise que considerava as áreas de ativação
cerebral em 3.489 pesquisas diferentes, mostrando que algumas
áreas eram ativadas em estudos variados e muito diferentes sobre
processos cognitivos71. Pensar em processos cognitivos como algo
que está em um lugar tem deixado de fazer sentido. As estruturas
cerebrais são ativadas em certos padrões e cada um desses
padrões são característicos de certos processos cognitivos que
buscamos estudar.
Também é importante ressaltar que estudos de neuroimagem
são caros, geralmente envolvendo poucos participantes. Isso torna a
generalização dos resultadossempre curta, dependendo de
revisões para dados mais consistentes. A paciência é importante
nesses casos.
Principalmente porque problemas metodológicos podem ocorrer
e um dos principais problemas para padronizar técnicas de
neuroimagem são os ruídos durante as análises, também chamados
de falsos-positivos. O que seria isso? São os dados interpretados
como ativações cerebrais por problemas na análise estatística dos
dados coletados.
A maioria das técnicas de imagem cerebral mostra correlações
entre atividades cerebrais (VD) e um comportamento (VI). O
processo cognitivo que chamamos de atenção, ou mesmo a emoção
que denominamos amor, são conceitos que definimos a partir de
certas demonstrações comportamentais, expressões em tarefas ou
a partir de relatos, que depois são validados como o construto.
Entretanto, alguns desses construtos ainda divergem bastante sobre
a melhor definição e mudar um conceito pode mudar bastante a
forma de lidar com essa variável em uma pesquisa.
Além disso, não necessariamente os participantes estarão
engajados na tarefa como pensamos. É comum que participantes
fiquem ansiosos sobre o que precisam executar ou seu
desempenho, tanto que a ativação registrada pode não refletir a
tarefa como gostaríamos, e sim outros processos cognitivos que
aconteceram durante o experimento. Ou mesmo no processo de
ativação intrínseca do cérebro, até em ambientes com pouca
estimulação, os registros não são drasticamente alterados por uma
tarefa. São variáveis de confusão que precisam estar previstas na
discussão conceitual das variáveis do seu experimento e da forma
de medi-las durante o processo. Por isso que é interessante usar
construtos validados por outras pesquisas.
Por fim, muitas vezes, as generalizações que atribuem grandes
conclusões a dados preliminares são uma forte tentação, que têm
apelo midiático para notícias na TV e que nos fazem pensar na
neurociência como algo capaz de ler nossas mentes, mas que não
correspondem ao que de fato podemos utilizar. A arquitetura
provavelmente compartilhará as mazelas da neurociência, logo que
ela receber seu prefixo “neuro” nos estudos. Entender o método
científico e criar uma comunidade científica que replica e discute a
validade de seus dados será essencial para permitir que os
pequenos passos da neurociência ajudem a arquitetura e todas as
suas novas possibilidades.
46 Cozby, 2003.
47 Cozby, 2003.
48 Memória de curto prazo é a capacidade de reter uma pequena quantidade de
informação na mente.
49 Bioética é uma área de estudo interdisciplinar que envolve os princípios éticos
que regem a vida quando essa é colocada em risco na formação de estudos
científicos.
50 Eventos cognitivos são todos os processos internos envolvidos em extrair
sentido do ambiente e decidir que ação deve ser apropriada, como a atenção,
percepção, memória etc.
51 Cozby, 2003.
52 Alzheimer é uma doença causada pela degeneração e morte das células
cerebrais, causando um declínio constante na memória e nas funções mentais.
53 Dawkins, 2009.
54 Purves et al., 2008.
55 Eysenck & Keane, 2017.
56 Brandão et al., 2005.
57 Resolução temporal é a habilidade de registrar as linhas de evolução
temporal de potenciais elétricos gerados pela atividade neuronal; ou seja, uma
alta resolução temporal significa que é difícil saber as mudanças na natureza da
onda cerebral.
58 Resolução espacial é a habilidade de distinguir dois objetos com diferentes
intensidades de sinal; ou seja, uma baixa resolução espacial significa que é difícil
saber de qual área detalhada do cérebro foi captado o estímulo elétrico.
59 Potencial elétrico é a capacidade que um corpo energizado tem de realizar
trabalho; neste caso, a habilidade das células do cérebro de transmitir
informações.
60 Brandão et al., 2005.
61 Potencial evocado é o registro elétrico no sistema nervoso seguido de um
estímulo; é diferente dos potenciais espontâneos mais comumente detectados por
eletroencefalografia, eletromiografia ou outro método de registro de
eletrofisiologia.
62 Jaeger & Parente, 2010.
63 Eysenck & Keane, 2017.
64 Psicofisiologia é o estudo das relações entre fenômenos psíquicos e
fisiológicos.
65 Brandão et al., 2005.
66 Eysenck & Keane, 2017.
67 Kay et al., 2008.
68 Neuroimagem é o uso de técnicas para registrar imagens da estrutura,
funcionamento ou química do sistema nervoso.
69 Eysenck & Keane, 2017.
70 Metanálise é uma técnica estatística que combina resultados provenientes de
diferentes estudos.
71 Yarkoni et al., 2011.
SOBRE A
NEUROARQUITETURA E SUA
FORMA DE PROJETAR
O conhecimento das respostas humanas sobre os ambientes detém
alto poder de decisão no planejamento e criação dos espaços que
buscam uma interação harmoniosa entre humano e ambiente.
Desse modo, a qualidade do ambiente construído está associada ao
nível do entendimento de nossas respostas aos estímulos do
espaço – quanto mais soubermos sobre esse feedback, mais
acurada será a projetação e materialização espacial para seus
usuários.
Pensemos em uma das obras mais icônicas de Oscar
Niemeyer, a Catedral Metropolitana de Nossa Senhora Aparecida,
mais conhecida como Catedral de Brasília, um dos símbolos da
arquitetura moderna brasileira. Localizada no centro da capital, o
edifício possui 16 pilares de concreto que nos remetem à imagem
abstrata de duas mãos em oração (Figura 1). O piso do edifício se
encontra abaixo do nível do solo (semienterrado), sendo a entrada
marcada por quatro enormes esculturas dos evangelistas Marcos,
Mateus, Lucas e João em direção a uma rampa descendente e
escura. Para entrar no edifício, paulatinamente, à medida que se
caminha pela rampa, o ambiente urbano desaparece, o espaço
contrai, nossas pupilas se ajustam com a diminuição de luz, os sons
da cidade vão sumindo e o eco do silêncio vai tomando conta do
ser. Ao final, saímos da escuridão e nos deparamos com a luz, um
contraste de expansão do vazio e refração da radiação solar nos
vitrais. A monumentalidade do ambiente nos faz elevar os olhos aos
céus, onde anjos sobrevoam o interior em forma de escultura,
passando uma sensação de chegada a um espaço sagrado (Figura
2).
FIGURA 1 – VISTA EXTERNA DA CATEDRAL METROPOLITANA DE BRASÍLIA (1970) PROJETADA PELO
ARQUITETO MODERNISTA OSCAR NIEMEYER
Podemos pensar nessa experiência como um conjunto de
decisões projetuais carregadas de simbologia e domínio da
manipulação espacial. No entanto, só é possível sentir e entender
esse percurso graças à nossa capacidade de movimento, visão,
audição, de conseguir ver uma imagem e abstrair um significado
dela. Para tudo isso, precisamos do nosso sistema nervoso.
FIGURA 2 – VISTA INTERNA DA CATEDRAL METROPOLITANA DE BRASÍLIA (1970) PROJETADA POR
OSCAR NIEMEYER: À ESQUERDA, O OBSERVADOR ESTÁ NA RAMPA; À DIREITA, O OBSERVADOR
ESTÁ NO ÁTRIO DO EDIFÍCIO, COM OS ANJOS ESCULPIDOS POR ALFREDO CESCHIATTI ACIMA
O ser humano está em constante interação com o mundo a sua
volta, recebendo estímulos do espaço que habita e criando
respostas a esses estímulos, sejam elas físicas, sejam elas mentais.
Onde quer que estejamos, nosso sistema nervoso está
constantemente processando informações em relação ao que
estamos sentindo. Isso faz com que o cérebro humano seja um
órgão complexo, difícil de entender e de explicar. Assim, por um
bom tempo, a compreensão das respostas da mente às questões da
arquitetura vem sendo definida em termos de experiências e
comportamentos humanos, sensações, emoções e processos
cognitivos no ambiente construído.
A preocupação das arquitetas e arquitetos com a relação
mente-meio de certa forma sempre existiu, mas apenas começou a
ser estudada de forma sistemática a partir da década de 1960 com
pesquisas focadas na relação entre o ambiente e o comportamento
humano. As novas teorias do ambiente construído promoveram a
colaboração entre arquitetura e neurociência a partir de pesquisas
sobre ambiente e comportamento. Essa é uma época de
descontentamento de grande parte das pessoas com a arquitetura,
na qual há um sentimento contra os aspectos mecanicistas e
materialistasda cultura ocidental presente. Iniciou-se, então, uma
busca por um pensamento mais humanista da vivência arquitetônica
e urbana, sendo necessário considerar no projeto a complexidade
do ser humano, uma vez que “o espaço fragmentado, que aboliu a
rua, revelou-se fonte de dissociação e desintegração mental”72.
Nessa época, os estudos usavam técnicas tradicionais de
pesquisa, como levantamento de dados, questionários e
observações, a fim de obter evidências mais concretas. Pensadores
acreditavam que o Modernismo estava em declínio no mundo pela
crítica de que os arquitetos se preocupavam, sobretudo, com a
forma das coisas, em uma busca por uma estética agradável, para
só depois se atentar à experiência que o espaço construído
despertaria nas pessoas. Muitos estudos partiram do princípio de
que a cidade deve ser feita para o ser humano, e não para as
máquinas, com pesquisas sobre a aglomeração urbana quanto às
ressonâncias do comportamento humano. Os urbanistas
começaram a perceber que:
Um planejamento higiênico e uma distribuição racional do espaço
urbano não são em si incapazes de assegurar aos habitantes o
sentimento de segurança ou de liberdade, a riqueza na escolha das
atividades, a impressão de vida e o elemento de distração necessários
à saúde mental e sua repercussão na saúde física73.
Essa postura é bem marcada nas ideias de Jane Jacobs (1916-
2006), escritora e ativista norte-americana, que fez severas críticas
ao modelo urbano modernista corbusiano em detrimento aos
espaços de vivência mais acessíveis. Verdadeira precursora da
criação das cidades amigáveis, ela defendeu a importância da
comunidade e da escala humana, ou seja, o ponto de partida
deveria ser a pessoa, já que “uma rua viva sempre tem tanto
usuários quanto meros espectadores”74.
Paralelamente a Jacobs, um grupo europeu diverso de cunho
político e artístico, autodenominado Internacional Situacionista,
começou a se aglutinar sob a bandeira da rejeição ao urbanismo
modernista. Com seu maior influenciador, o escritor francês Guy
Debord (1931-1994), os situacionistas criaram uma série de
trabalhos para conscientizar o público sobre a importância de
participar da vida cotidiana nas cidades. Dentre muitas coisas,
estabeleciam uma relação de liberdade com o espaço, a fim de
quebrar as amarras da vida cotidiana, e fugir da alienação.
Igualmente defensor do uso amigável do espaço urbano, com
outros modos de apropriação e percepção, o filósofo marxista e
sociólogo francês Henri Lefebvre (1901-1991) defendia que deveria
ser feita uma humanização da vida cotidiana, com paixão e emoção,
no locus cidade. Figura influente desse período, explicou a
alienação individual como perda da essência do ser, resultado da
fragmentação do espaço e da dissociação da vida cotidiana.
Lefebvre defendia que o cidadão deve ter direito à cidade e, desse
modo, os espaços são vinculados à realidade social, sendo
definidos como espaço percebido por meio dos canais sensoriais,
concebido através de sua representação e vivido por seus usuários.
O movimento situacionista e as reivindicações de Lefebvre
compartilham um terreno comum em suas afirmações. Ambos
defenderam que as deficiências inerentes às teorias urbanas
contemporâneas levaram ao sofrimento humano e causaram a
alienação das pessoas que enfrentam os tipos de problemas
encontrados na vida cotidiana “simples”75.
Outra importante figura desse processo de transformação do
pensamento projetual, o urbanista e escritor Kevin Lynch (1918-
1984) estudou o importante conceito de imageabilidade ou
legibilidade. Ou seja, em destaque à qualidade visual citadina, deve
ser entendido o quanto a cidade é clara em seus símbolos para a
formação mental de sua imagem pelos usuários. Lynch investigou
cidades norte-americanas por meio de mapas mentais – ferramenta
clássica da Psicologia Ambiental –, considerando que o ambiente
urbano e sua paisagem são carregados de elementos que
transmitem prazer ou aflição, identidade ou repulsa, impõem
segurança e bem-estar, ou não. A favorabilidade dessas
características implica a orientação e movimento de quem os
vivencia (Figura 3).
FIGURA 3 – DIAGRAMAS BASEADOS E INSPIRADOS POR KEVIN LYNCH E SEUS ELEMENTOS DE
ANÁLISE
Muitas são as variáveis envolvidas nas quais os usuários
percebem e podem se identificar com aquele determinado espaço
urbano. Assim, por meio de elementos como caminhos, limites
físicos, bairros, pontos nodais e marcos76, a cidade passa a ser
reconhecida e se constitui em cenário de significados e vivência
para as pessoas. Comungando com as ideias de Jane Jacobs, o
ritmo e a dinâmica urbana suscitam os estímulos sensoriais a
despertar o prazer do viver o espaço urbano. Sem dúvida, é através
de Lynch que tomamos consciência do envolvimento dos processos
mentais no ambiente construído, principalmente a memória, na
sistematização da percepção visual para a formação das imagens
mentais que construímos, transformando em identidade e
significado os elementos componentes da paisagem urbana
(Figuras 4 e 5).
FIGURA 4 – VIDA URBANA NA 5TH AVENUE EM NOVA YORK, EUA, COM O FLATIRON BUILDING (1902)
PROJETADO POR DANIEL BURNHAM NO CENTRO
FIGURA 5 – VIDA URBANA NA E. WASHINGTON STREET EM CHICAGO, EUA, COM O JAY PRITZKER
PAVILION (2004) PROJETADO POR FRANK GEHRY AO FUNDO
A maneira como o ambiente se apresenta é muito importante
para quem dele usufrui, já que a imagem que vemos é aquela que
vai impactar e influenciar nosso comportamento nesse espaço.
Então, por que quando questionados sobre determinado ambiente,
as pessoas têm observações diferentes? Por que determinados
elementos chamam a atenção de uma pessoa, mas não de outra?
A resposta para isso é muito simples e simultaneamente
complexa: as reações humanas são conduzidas pela expectativa,
pelo julgamento e pelos processos cognitivos de cada um de nós. O
interesse acontece de acordo com características próprias do
indivíduo e se relaciona com nossas memórias (emocionais e
sensoriais), hábitos, cultura, aspectos intelectuais, entre outras
questões.
Quando interagimos com um ambiente, sensações são
desencadeadas, o que nos levam a formar uma opinião sobre esse
espaço, gerando emoções que são relacionadas à cognição. Cabe
aqui ressaltar que a emoção pode vir a se relacionar unicamente
com a visão, por meio de características intrínsecas visualizadas,
sendo algo racional e executado de forma consciente. Contudo, a
cognição é mais complexa pelo seu caráter subjetivo: ela está
associada à evocação das diversas experiências vividas.
Considerado como sistema, usuário e ambiente interagem em
uma relação simbiótica, contínua (já que ocorre em tempo integral) e
indissociável (sempre existirá um ambiente envolvido nas ações
humanas), em que as respostas das pessoas frente ao espaço
desencadeiam comportamentos impactados por sentimentos e
julgamentos feitos pela apreensão da realidade à nossa volta.
Nesse sentido, é possível afirmar que ao experienciarmos um
ambiente, todos vemos o mesmo espaço circundante; o que
diferencia é a interpretação, a maneira como cada um de nós
entende as informações absorvidas.
Por outro lado, a questão projetual da arquitetura envolve os
anseios das pessoas à materialização dos espaços no
desenvolvimento das atividades ali praticadas, contemplando
aspectos físicos, funcionais e estéticos. Nesse caso, a estética não
se resume apenas ao que é belo, mas se constitui em algo maior: a
harmonia do conjunto, a maneira como os diversos elementos
“conversam” entre si (forma, materiais, textura, cor, etc). Ou seja, o
processo de percepção envolve tanto o reconhecimento das
propriedades físicas do ambiente (forma, tamanho, profundidade,
iluminação, etc), quanto o estado emocional e afetivo do
observador77, em que todos atuam sobre o comportamento humano.
Assim, a compreensão comportamental dos espaços a partir da
comunicação humana é expressa por meio de linguagem verbal e
não verbal (gestos, posturas, orientação corporal, entre outros),
participando do processo de comunicação interpessoal, assim comoda interação pessoa-ambiente. Esse diálogo não verbal de natureza
contínua e bidirecional78 revela, entre outros fatores, a importância
de aspectos funcionais e estéticos dos ambientes na apreensão da
percepção dos usuários relacionada aos espaços, face à otimização
do desempenho das atividades operacionalizadas. Assim, a
compreensão espacial é fundamental para entender o
comportamento humano e as sensações que envolvem as pessoas
e ambientes.
Desse modo, a percepção espacial concentra sua importância
na permuta entre estímulos visuais e proprioceptivos, levando as
pessoas a não só identificar objetos em relação a outros, mas
também seu próprio posicionamento dentro dos espaços79.
Ocorrendo de modo dinâmico e por meio de representações
integradas entre objeto físico e social, essa identificação acontece
sob a forma de esquemas socioespaciais80, abrangendo objetivos
particulares do indivíduo e experiência anterior. Nessa direção, a
presença de esquemas espaciais vincula-se à orientação espacial
por intermédio da imagem corporal gerada e de relações
experienciais associadas a fatores biológicos e à capacidade de
representação espacial.
AS RELAÇÕES ENTRE MENTE E ESPAÇO
O fim da Segunda Guerra Mundial trouxe uma demanda por
orientação para o programa de reconstrução das cidades,
necessário após a destruição resultante do conflito. A fim de
fornecer requisitos de planejamento, muitos países estabeleceram
centros de pesquisa que estudaram como as pessoas usavam o
espaço.
Com a crescente preocupação com o meio nesse contexto, a
Psicologia Ambiental foi formada durante as décadas de 1950 e
1960, e consolidada a partir da Conferência de Estocolmo81, com
raízes internas e externas à Psicologia. Em suas raízes internas
destacam-se os “elementos ligados à Escola da Gestalt, ao
behaviorismo, à Psicologia Social e à incorporação da perspectiva
ambiental à compreensão do indivíduo”82. Já entre as raízes
externas, encontramos conhecimentos das ciências sociais –
antropologia, sociologia e geografia – assim como da arquitetura e
urbanismo.
Essa nova disciplina também contribuiu para a área de
pesquisa dos fatores humanos, mostrando que as escolhas de
métodos e objetos nem sempre eram lógicas e frequentemente
seguiam motivos irracionais. Compete à Psicologia Ambiental cuidar
das relações entre pessoas e ambiente físico-social, natural ou
construído83, visando ao entendimento da influência e do impacto
gerado entre comportamento e indivíduos84. De caráter
multidisciplinar e com enfoques teóricos e metodológicos, essa
disciplina aborda o ambiente físico como um todo, em uma visão
holística85.
O interesse principal desse novo campo de investigação
psicológica repousava na descoberta da importância da dimensão
espacial-física do ambiente como parte das ações e experiências
humanas nos níveis intrapessoal, interpessoal, grupal, intergrupal e
social. Os primeiros estudos do cientista social Roger Barker86
(1903-1990) sobre configurações de comportamento na área da
psicologia ecológica, assim como os estudos dos psicólogos Robert
Sommer87 (1929-2021) e Irwin Altman88 (1930) sobre espaço
pessoal e comportamento social, permanecem como marcos iniciais
da psicologia ambiental. Destacam-se também os estudos de
William Ittelson, Harold Proshansky, Leanne Rivlin e Gary Winkel,
definindo vários conceitos com a publicação em 1974 do livro An
introduction to environmental psychology.
Essa é uma área da psicologia cujo foco de investigação é a
inter-relação do ambiente físico com a conduta e as experiências
humanas, compreendendo uma ampla área de estudos em
constante evolução. A percepção implica o processo de conhecer o
ambiente físico imediato por meio dos sentidos, proporcionando as
informações básicas que determinam as ideias que o indivíduo
forma sobre o ambiente, bem como suas atitudes em relação a
ele89.
A Psicologia Ambiental é o estudo das inter-relações entre o
indivíduo e seu ambiente físico e social, nas suas dimensões
espaciais e temporais. O ambiente é uma construção daquele que o
percebe, incluindo-se a dimensão cultural nessa relação, em que é
feita a análise das percepções, comportamentos e atitudes dos
indivíduos com o contexto físico e social no qual esses convivem90.
A Psicologia Ambiental faz o papel de uma ponte entre a arquitetura
e a psicologia, já que nenhuma dessas áreas do conhecimento
humano consegue abranger todos os aspectos da relação homem-
ambiente, o que permite a produção de ambientes mais
humanizados e ecologicamente coerentes91.
Assim, as pesquisas nessa área passam a considerar o
comportamento e as experiências humanas. A organização
perceptiva espacial torna-se mais evidente segundo modificações
ambientais, promovendo a necessidade de adaptação para a
realização das atividades programadas. De outro lado, o ambiente
construído se constitui em um meio para o processamento das
experiências, associadas aos canais sensoriais e a aspectos
culturais, criando relações afetivas com os espaços com os quais o
usuário interage. Dessa maneira, percepção e comportamento
estão vinculados a diferentes contextos ambientais e sob influências
culturais diversas, permitindo interpretações variadas de uma
mesma realidade.
Então, falar sobre o ambiente ultrapassa os limites
tridimensionais, uma vez que o sentimento de afeto e atração ou de
repulsa e incômodo por diferentes espaços é desenvolvido pelas
pessoas em suas relações com esses ambientes e também
conduzido por experiências anteriores ou mesmo pela própria
imaginação, decorrente do desejo subconsciente do indivíduo.
Sem dúvida o tema é amplo, tendo alargado suas fronteiras ao
longo de décadas de estudo, em que se assistiu à proposição e ao
desenvolvimento de muitas técnicas e procedimentos com objetivos
de melhor entender a percepção humana acerca dos espaços e
suas variáveis. Como exemplos de algumas dessas ferramentas,
podemos citar: a técnica de mapeamento visual, o modelo de
análise hierárquica, o método de análise visual, o walktrough, a
observação incorporada, o poema dos desejos, a seleção visual, a
constelação de atributos, dentre tantos existentes.
Nos processos de entendimento dos estímulos e sensações
promovidos pelos ambientes carecemos de aprofundamento nesses
elementos, sucintamente expostos nessa introdução e isso será
encontrado nas seções e capítulos que compõem esta obra.
A partir dessas rápidas incursões na Psicologia Ambiental e na
Neurociência, objetivamos estabelecer as relações entre as duas,
ao tempo em que as delimitamos em seus campos de atuação. Os
estudos da neuroarquitetura aparecem como um caminho natural da
mente investigativa que já não se satisfaz em identificar a existência
dos processos perceptivos, suas origens e seus canais, mas busca
agora entender onde e como acontecem e como reverberam em
sensações e comportamentos. Uma espécie de evolução do
conhecimento guardando especificidades em duas áreas distintas,
mas interconectadas.
NEUROCIÊNCIA NA ARQUITETURA
Nos anos 2000, o papel desempenhado pelo cérebro humano
na experiência do ambiente construído foi introduzido nas
pesquisas, buscando entender o processamento da percepção e
das emoções. Os avanços nos métodos neurocientíficos tornaram
possível estudar a influência de diferentes elementos arquitetônicos
por meio de dados baseados em evidências. Medições
psicofisiológicas e técnicas de neuroimagem passam a fazer parte
do vocabulário de um pequeno nicho de arquitetos. Abre-se espaço
para a discussão da neurociência aplicada à arquitetura, com novos
movimentos e tendências arquitetônicas que priorizam a qualidade
do espaço e a confirmação científica da efetividade de suas
decisões de projeto.
Isso significa que, enquanto a Psicologia Ambiental nos informa
sobre qual comportamento está ocorrendo no espaço, a
neurociência vai além e explica o porquê de esse comportamento
acontecer. Essa mudança de paradigma no entendimento do
ambiente construído possibilitou novas perspectivas que relacionam
o cérebro humano ao espaço que ele habita.
A neurociênciafaz parte das ciências cognitivas e estuda o
sistema nervoso com foco específico no cérebro humano. Com as
ferramentas da neurociência, muitas dimensões subjetivas do
ambiente construído podem ser quantificadas e mais bem
entendidas.
Um bom exemplo dessa transformação de paradigma é a
pesquisa que relaciona cognição e aprendizagem realizada pela
neurocientista Eleanor Maguire e sua equipe, na University College
London92. Foram feitas medições cerebrais por ressonância
magnética (MRI) do hipocampo (Figura 6) de pessoas com vasta
experiência em navegação: taxistas licenciados em Londres há mais
de um ano e meio, tendo participantes com esse tempo de
experiência até outros com 42 anos “de estrada”. Esses dados
foram analisados, e comparados com as medições de indivíduos do
grupo de controle que não dirigiam táxis. O que os pesquisadores
descobriram foi que as regiões posteriores dos hipocampos dos
taxistas eram significativamente maiores em relação aos dos
indivíduos do grupo de controle. Em contraposição, uma região mais
anterior do hipocampo foi maior em indivíduos controle do que em
taxistas (Figuras 7 e 8).
O volume do hipocampo se correlacionou na pesquisa com a
quantidade de tempo gasto como motorista de táxi (positivamente
na região posterior e negativamente no hipocampo anterior). Esses
dados estão de acordo com a ideia de que o hipocampo posterior
armazena uma representação espacial do ambiente e pode se
expandir regionalmente para acomodar a elaboração dessa
representação em pessoas com alta dependência de habilidades de
navegação. Parece que há uma capacidade de mudança plástica
local na estrutura do cérebro humano adulto saudável em resposta
às demandas ambientais.
FIGURA 6 – MRI: À ESQUERDA, CORTE SAGITAL; À DIREITA, CORTE CORONAL DO HIPOCAMPO
FIGURA 7 – SAGITAL: AUMENTO DO VOLUME POSTERIOR DOS HIPOCAMPOS ESQUERDO E DIREITO
(LH E RH, RESPECTIVAMENTE) DOS TAXISTAS EM RELAÇÃO AOS CONTROLES
FIGURA 8 – MRI EM CORTE CORONAL EM TRÊS COORDENADAS DIFERENTES NO EIXO Y PARA
ILUSTRAR A EXTENSÃO DA DIFERENÇA AO LONGO DO EIXO LONGO DO HIPOCAMPO
A descoberta de que o hipocampo posterior aumenta de volume
quando há dependência ocupacional da navegação espacial é
evidência de diferenciação funcional dentro do hipocampo. Em
humanos, como em outros animais, o hipocampo posterior parece
estar preferencialmente envolvido quando a informação espacial
previamente aprendida é usada, enquanto a região anterior do
hipocampo pode estar mais envolvida (em combinação com o
hipocampo posterior) durante a codificação de novos layouts
ambientais93.
A nova consciência da complexidade dos processos cognitivos
e emocionais envolvidos na experiência diária de ambientes
projetados vem crescendo rapidamente. Tal interesse também levou
à fundação da Academia de Neurociência para Arquitetura (ANFA)
no ano de 2003 em San Diego, EUA. Desde então, várias
contribuições importantes surgiram nos campos envolvidos na
temática.
Assim, compreender as principais partes e sistemas do cérebro
nos permite pesquisar como pensamos, percebemos, movemo-nos,
lembramos, aprendemos e sentimos sobre o ambiente construído.
Quanto mais aprofundamos nosso conhecimento do cérebro
humano, mais perto podemos estar de compreender a experiência
humana no ambiente construído e, assim, projetar espaços mais
adequados ao seu uso, permitindo qualidade de vida e bem-estar.
Naturalmente, essa mudança paradigmática requer novas
perspectivas para relacionar o cérebro humano ao ambiente
construído dentro da prática da arquitetura. A própria natureza do
conhecimento da neurociência requer uma análise profunda de
estudos experimentais, expandindo-se essa necessidade para a
prática projetual. Logo, antes de qualquer coisa, é necessário
explorar a experiência humana no ambiente construído de uma
forma multidimensional, holística e abrangente.
72 Choay, 2015, p. 45.
73 Choay, 2015, p. 43.
74 Jacobs, 2011, p. 35.
75 Heynen, 1999 apud Karakas & Yildiz, 2020.
76 Lynch, 2011.
77 Nasar, 2008.
78 Elali, 2009.
79 Pinheiro & Elali, 2011.
80 Lee, 1977.
81 A Conferência de Estocolmo, realizada em junho de 1972 em Estocolmo,
Suécia, foi a primeira grande reunião de chefes de estado organizada pelas
Nações Unidas (ONU) para tratar da degradação do meio ambiente,.
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Conferência_de_Estocolmo)
82 Elali, 2006, p. 5.
83 Aragonés & Amérigo, 1998.
84 Cavalcante & Elali, 2011; Gifford et al., 2011.
85 Holismo é um sistema de abordagem que define que as propriedades de um
sistema não podem ser explicadas apenas pela soma dos seus componentes,
mas visto em sua totalidade para entender como se comportam as partes.
86 Ver Barker, R. G. Ecology of motivation. In: Nebraska Symposium on
Motivation, Lincoln: University of Nebraska Press, 1960. p.1-49.
87 Ver Sommer, R. Studies in personal space. In: Sociometry, v.22, 1959, p. 247-
260.
88 Ver Altman, I. The environment and social behavior: Privacy, personal space,
territoriality and crowding. Monterey, CA: Brooks/Cole, 1975.
89 Holahan, 1999.
90 Moser, 2005.
91 Elali, 1997.
92 Maguire et al., 2000.
93 Maguire et al., 2000.
PERCEPÇÃO VISUAL E O
PROJETO ARQUITETÔNICO
Ler este livro pode parecer algo simples. Na verdade, é muito mais
complexo do que se imagina. E não estamos falando do conteúdo
discutido aqui – já que arquitetas e arquitetos estudando fisiologia
certamente saem da zona de conforto –, mas sim da ação de leitura
em si. É preciso observar as letras, utilizar regras fonéticas e
gramaticais – preestabelecidas e previamente aprendidas – para
organizá-las em palavras, e então ser capaz de entender o conteúdo
que se quer transmitir. Esse é um processo que faz uso de muitas
estruturas encefálicas do sentido da visão e da percepção visual,
sem falar dos processos cognitivos de memória e aprendizagem que
estão envolvidos.
A visão é o sentido mais usado conscientemente para entender
o espaço em que se está. Tanto que ela pode influenciar como as
informações captadas pelos demais sentidos serão interpretadas.
Onde quer que se esteja, o corpo humano é constantemente
bombardeado por inúmeras sensações do que está à volta. Ou seja,
o sistema nervoso recebe estímulos do ambiente, que são
transformados em informação para ser processada pelo cérebro.
Assim, perceber o mundo é o resultado do processamento que se
faz das informações que os olhos captam e enviam ao sistema
nervoso. Nesse sentido, podemos fazer uma analogia de que não
vemos o mundo apenas com nossos olhos, mas principalmente
com nosso cérebro.
Neste capítulo, dedicaremo-nos a explicar o funcionamento da
visão e seu processamento perceptual, a fim de criar um panorama
das habilidades bidimensionais do nosso corpo. Além disso, cabe
aqui reiterar que estamos falando da visão por ela ter certa força
sobre as outras percepções, mas os processos de percepção
sonora, térmica, tátil, e tantas outras, são cada uma um verdadeiro
mundo de informações à parte. Claro que terão algumas similares,
mas as áreas corticais envolvidas serão diferentes, o que tornaria
esse texto muito extenso.
Assim, é importante dizer que a capacidade visual humana
evoluiu ao longo do tempo em função das características da energia
encontrada no planeta, o que permitiu que a espécie se adaptasse
às condições do mundo, sendo o uso da visão referência principal.
Hoje, os olhos humanos são adaptados para enxergar a luz refletida
pelos objetos em diferentes padrões.
A energia radiante provinda da luz se manifesta ao mesmo
tempo como partícula (fótons) e onda, capaz de se propagar em
uma direção determinada e de vibrar na orientação ortogonal. Para
entender a visão, é necessário compreender as características
irradiantes e ondulatórias da luz. Convencionou-se representar a
propagação da luz como uma curva senoidal94 (Figura 1) que
descreve uma trajetória vibratória, determinando uma amplitude,
que é a quantidade de energia contida em uma radiação (quanto
maior a amplitude, mais forte é a luz); e o comprimento da onda,
que é a distância entre duas cristas ou dois valesda curva. Esse
comprimento é inversamente proporcional à frequência da onda,
que determina a quantidade de vibrações ao longo do tempo
(quanto maior a frequência, menor o comprimento e mais rápida a
vibração da onda).
As inúmeras combinações entre amplitude, comprimento e
frequência permitem ao indivíduo realizar operações funcionais no
sistema visual, destinado à realização de múltiplas tarefas. Dessa
forma, há a localização espacial, que possibilita identificar no campo
de visão a posição de um objeto; a tarefa de medida da intensidade
da luz estima o brilho de cada objeto em relação ao ambiente; a
capacidade de discriminação de formas diferencia e reconhece os
objetos segundo seus contornos; a detecção de movimento permite
que percebamos que alguns objetos se movem e outros ficam
parados; e, por fim, há a possibilidade de visão das cores. Cada
uma dessas tarefas é uma submodalidade visual que trabalha em
função da ativação específica de diferentes regiões neurais
interconectadas vindas do olho95.
O ponto de partida do sistema visual são os olhos, órgãos
sensoriais da visão que conseguem detectar diferentes padrões de
luz refletidos pelos objetos. A onda luminosa atravessa a córnea do
olho – uma espécie de “vidro transparente” –, que ajuda a focar a
imagem e protege a abertura ocular, a pupila; essa é controlada pela
íris, a responsável por abrir mais ou menos esse vão (pela
contração e dilatação). O cristalino, uma lente que existe atrás
dessa abertura, trabalha com a íris no processo chamado de
acomodação para focar melhor a imagem e deixá-la nítida. O
cristalino também irá direcionar a luz para a região de células no
fundo do olho, chamada de retina. É ela o receptor sensorial da
visão que tem conexão direta com o nervo óptico, que faz parte do
sistema nervoso central.
FIGURA 1 – ESTRUTURA DO OLHO HUMANO COM REPRESENTAÇÃO DA CURVA SENOIDAL DA ONDA
LUMINOSA
Com mais de 130 milhões de células diversificadas na retina, é
nela que estão localizados os cones e bastonetes que detectam as
ondas luminosas. Os cerca de 6 milhões de cones existentes em
cada olho ficam progressivamente mais concentrados na região da
retina chamada fóvea, na qual a visão é mais distinta96. Nesse ponto
da retina não existem bastonetes – que somam uma média de 120
milhões –, estando mais concentrados nas bordas externas da
retina.
Há três tipos de cones, sendo que cada um é sensível a uma
faixa de comprimento de onda do espectro luminoso visível aos
seres humanos. São percebidas as ondas que correspondem às
cores vermelha (comprimentos de onda maiores), verde e amarela
(comprimentos de onda por volta de 550 nm), e azul (comprimento
de ondas menores), sendo que os diferentes matizes e tons entre
elas são distinguidas pela análise do cérebro a partir da ativação
dessas células fotossensíveis97. Logo, se estivermos olhando dois
objetos, um verde e outro azul e com a mesma luminância98, o
objeto verde parecerá mais intenso por produzir maior estímulo
elétrico nas fibras do nervo óptico.
Quanto à intensidade da luz, a avaliação dos receptores
dependerá de fatores que vão além da característica da própria
energia, como: nível de adaptação da retina ao ambiente claro ou
escuro; nível de “ruído interno” do próprio sistema visual, já que os
neurônios da retina disparam impulsos a uma certa frequência,
mesmo sem estimulação externa, o que define o limite inferior de
sensibilidade; cor do estímulo, como já foi explicado; e as condições
de contorno em volta do estímulo, já que o contraste do objeto em
fundo escuro é percebido com mais intensidade (mais claro) e em
fundo claro com menos intensidade (mais escuro)99. Além disso, os
bastonetes são capazes de identificar as luzes de menor
intensidade – o que permite a visão noturna dos seres humanos –,
mas têm dificuldade de identificar cores e detalhes finos da imagem
captada. Já os cones registram ambientes de maior luminosidade
com diferenciação de cores e maiores detalhes.
Essas células fotossensíveis deflagram o processo de
transdução: uma vez que a luz é captada pelos cones e bastonetes,
as células da camada média da retina realizam uma série de
“cálculos” sobre as características das ondas. Dessa camada são
formadas as células ganglionares e retinais, responsáveis por gerar
o sinal elétrico, esse sinal será conduzido por uma série de axônios
inervados na retina que se juntam no chamado ponto cego do olho,
uma pequena área que não contém receptores de luz, para então
formar o nervo óptico. Ou seja, a transdução é a conversão da
energia luminosa em sinal elétrico para envio ao encéfalo.
Vale ressaltar que a luz projetada no ponto cego não é
processada como informação no encéfalo. O que acontece é que no
processamento mental da imagem esse ponto é preenchido com
informações do que está ao redor e com informações registradas
pelo outro olho, sendo que a imagem formada no cérebro não é
capaz de representar sombra. Façamos um teste: cubra o olho
direito e foque o olho esquerdo no + abaixo; de forma lenta e
gradual, afaste a cabeça do livro enquanto foca a visão apenas no
+, prestando atenção na região periférica; haverá uma posição em
que o círculo à esquerda irá sumir do seu campo de visão. Se você
continuar a se movimentar, o círculo irá reaparecer.
O PROCESSAMENTO NEURAL DA VISÃO
Com mais de 1 milhão de fibras100, o nervo óptico sai de cada
globo ocular e cruza101 em uma região chamada quiasma óptico, no
qual por volta de metade das fibras que saem do olho esquerdo
cruza em direção ao lado direito do cérebro. Da mesma forma, cerca
de metade das fibras que saem do olho direito passa para o lado
esquerdo. O restante permanece do mesmo lado. Esse cruzamento
parcial das informações é essencial para que cada hemisfério do
cérebro receba sinais visuais captados por ambos os olhos.
Em seguida, as fibras passam a se chamar trato óptico e levam
o estímulo elétrico para alguns locais diferentes do cérebro (Figura
2). O primeiro destino é o hipotálamo, uma estrutura subcortical do
diencéfalo que regula o metabolismo do corpo e irá utilizar a
informação visual para sincronização do relógio biológico com o
ciclo noite-dia102. Essa função temporizadora do organismo levará
em conta a diferença de acionamento dos cones e bastonetes para
“saber” o horário. Assim, entende-se que ambientes escuros, onde
se desenvolvem tarefas que demandam um tempo prolongado,
favorecem a sonolência e falta de concentração. Ao mesmo tempo,
se a tarefa a ser desenvolvida necessita de um estado mental de
relaxamento, mecanismos para diminuição da luminosidade são
essenciais.
FIGURA 2 – PLANO HORIZONTAL DO ENCÉFALO COM REPRESENTAÇÃO DO SISTEMA DA VISÃO,
DESDE OS OLHOS (ACIMA) ATÉ O CÓRTEX VISUAL PRIMÁRIO (ABAIXO)
FIGURA 3 – PLANO LATERAL DO ENCÉFALO COM REPRESENTAÇÃO DO SISTEMA DA VISÃO, DESDE
OS OLHOS (À ESQUERDA) ATÉ O CÓRTEX VISUAL PRIMÁRIO (À DIREITA)
Outro destino do trato óptico é o corpo geniculado lateral do
tálamo, importante estrutura subcortical para a percepção visual. Ele
serve como estação celular intermediária na via visual para em
seguida projetar axônios ao córtex cerebral. Nesse contexto, do
tálamo para o córtex visual, existem duas vias paralelas que
transmitem a informação: a via com células parvocelulares (células
P) e a via com células magnocelulares (células M). As células P são
estimuladas pela atividade que vem dos cones, sendo sensíveis à
cor e pequenos detalhes dos objetos. Elas são relacionadas à via
ventral que sai do córtex visual – em que realizam processos
perceptuais que identificam as características do estímulo, como cor
e forma (qual é o estímulo) – em direção ao córtex temporal inferior.
Já as células M são estimuladas pela atividade nos bastonetes,
sendo sensíveis a informações sobre o movimento. Essas células se
relacionam com a saída do córtex visual pela via dorsal (Figura 3),
que segue em direção ao córtex parietal, com a informação de como
e onde está o estímulo captado. A partir dessas vias, o corpo caloso
conecta os dois hemisférios do cérebro paraunificação da
percepção dos objetos no campo visual.
A informação saída do tálamo chega inicialmente no córtex
visual primário, primeiro nível do processamento cortical da
informação visual no centro do lobo occipital. Desse ponto, o sinal
elétrico irá se espalhar pelas demais áreas corticais visuais de
ordem superior (consciência), que serão responsáveis por diferentes
aspectos da visão. Essa “divisão de responsabilidades” em grupos
funcionais é importante, já que permite que o encéfalo possa
minimizar a quantidade de neurônios acionados para analisar
diferentes aspectos da visão.
Assim, o processo completo de análise pelo encéfalo de uma
cena visual se dá em três níveis. Em um primeiro nível “mais
simples”, são identificados aspectos como contraste local,
orientação, cor e movimento. Em um nível intermediário, o foco é na
análise da disposição da cena, com criação de um mapa topográfico
do espaço e definição de propriedades das superfícies, distinguindo
o que é primeiro plano e o que é o plano de fundo. Em um nível
superior, que requer a atividade racional do cérebro, há o
reconhecimento do objeto, sendo necessário acessar áreas da
memória.
Vale ressaltar que ainda há controvérsia (como em qualquer
área científica) sobre as funções exatas do córtex visual,
necessitando maiores estudos. Além disso, o sistema visual é uma
estrutura complexa, em que a plasticidade do nosso cérebro faz
com que essas análises não possam ser consideradas absolutas.
PISTAS PERCEPTIVAS DA VISÃO
Imagine que você está dirigindo pela cidade e se depara com
um cruzamento em que o “sinal fechou”. Provavelmente, você ficará
olhando o semáforo à espera de um estímulo provindo do espaço
urbano, onde ondas luminosas na cor verde serão emitidas
(propriedade física do ambiente). Em seguida, os receptores
sensoriais dos olhos (cones e bastonetes) irão captar a energia
física do semáforo (sensação) para que possa ser transformada em
sinais elétricos e transmitida ao cérebro (transdução). Essa
informação será então traduzida e interpretada (percepção) para
que se decida a ação a ser tomada para voltar a movimentar o
carro. Tudo isso em milésimos de segundos.
Nessa situação, os estímulos recebidos podem ser a luz com
comprimento de onda verde, amarela e vermelha, estando a
informação qualitativa do estímulo nos diferentes receptores que
conseguem perceber essa variação de cores. E dependendo da
hora do dia, esse estímulo do ambiente pode ser percebido com
mais ou menos brilho. Ao anoitecer, é possível perceber de maneira
quantitativa uma maior intensidade do estímulo pela variação da
taxa de disparo em um neurônio específico em relação ao que
acontece na claridade da manhã, por exemplo, o que cria uma
melhor nitidez da informação. Vale salientar que detectar um
estímulo é uma decisão subjetiva do indivíduo. Essa decisão é
afetada pela sensibilidade a ele em comparação a outros estímulos
que possam causar distração, assim como os critérios usados para
julgar uma informação ambígua recebida.
O ambiente construído está cheio desses estímulos que podem
acionar diferentes órgãos sensoriais, mas nem todos eles o nosso
corpo consegue captar. Falar de uma “força” mínima do estímulo
para que ele seja captado é chamado de limiar absoluto, que define
a intensidade da estimulação para desencadear a sensação.
Da mesma forma, a quantidade mínima para detectar a
mudança entre dois estímulos de uma mesma natureza é o limiar de
diferença. Um exemplo disso é que se você estiver em um ambiente
interno e, de repente, alguém tirar uma foto com flash sem você
esperar, isso irá chamar a atenção nessa diferença entre estímulos
(a luz no espaço e luz do flash da câmera).
A percepção da forma também é feita pela avaliação
tridimensional do objeto em relação ao ambiente em que está
inserido. “Os objetos são geralmente vistos como configurações
concretas de tamanhos e formas, arranjados espacialmente com
relação uns aos outros e estendendo-se para fora em um espaço
tridimensional, a alguma profundidade ou distância no espaço
físico”103. No entanto, a forma com que captamos essa visão se dá
de maneira bidimensional, sendo apenas no encéfalo transformada
em uma representação tridimensional. Isso traz dificuldades na hora
de se entender profundidade e distância no ambiente construído, já
que esses aspectos precisam ser “construídos” pelo encéfalo.
Para tanto, a própria retina desenvolveu a capacidade de
distinguir algumas características da incidência luminosa no espaço,
o que chamamos de pistas perceptivas ou pistas pictóricas (Figuras
4 e 5), que irão ajudar na construção desse mapa mental. É muito
provável que como projetistas tenhamos familiaridades com elas,
sem sabermos seus funcionamentos. As pistas trabalham a partir de
elementos de referência – e que aprendemos por exposição – para
perceber as dimensões e texturas do ambiente. Ou seja, são
estímulos que tendem a ser usados pelo cérebro como comparação
para criar estimativas sensoriais.
FIGURA 4 – ANÁLISE DO RECORTE DA OBRA ESCOLA DE ATENAS (1509) DO PINTOR ITALIANO
RAFAEL SANZIO
FIGURA 5 – ANÁLISE DA OBRA “A AULA DE MÚSICA” (1662) DO PINTOR HOLANDÊS JOHANNES
VERMEER
Todas as pistas dão informações ambíguas e, com frequência,
pistas diferentes dão informações conflitantes. Elas são tanto
fornecidas pelo movimento do observador ou de objetos no
ambiente visual, como por estímulos não visuais (p. ex., baseadas
no tato ou na audição), ainda que nossa visão seja soberana sobre
todos os nossos sentidos.
A percepção de profundidade gerada por pistas oculomotoras é
fundamentada na percepção de contrações dos músculos em torno
dos olhos. Elas podem ser monoculares, quando os indícios da
percepção são registrados por cada olho de maneira isolada; e as
binoculares, com indícios de percepção requeridos por ambos os
olhos de forma simultânea. Ambas são muito importantes para que
a estimativa de uma distância chegue mais perto do acerto, além de
necessariamente depender das informações enviadas por dois
olhos. As pistas monoculares são muitas e incluem: sobreposição,
perspectiva aérea, sombreamento e iluminação, altura, perspectiva
linear, gradientes de textura e tamanho relativo. Há também pistas
monoculares dinâmicas: paralaxe de movimento, perspectiva de
movimento e acomodação. Já nas pistas binoculares existem dois
tipos: convergência e disparidade binocular104.
A sobreposição ou oclusão parcial diz respeito à nossa
capacidade de entender a forma de um objeto que está
parcialmente oculto por outro. Nesse caso, o objeto não oculto será
percebido como um elemento mais próximo ao observador, o que
cria a noção de uma profundidade relativa, comparativa. Essa é uma
noção também relacionada às experiências que temos desde a
infância, nos primeiros contatos com o ambiente, em que logo
desenhamos sóis sorridentes atrás de montanhas sobrepostas. O
simples desenho de um aluno pré-escolar, ainda que pouco realista,
passa-nos a sensação de que há superposição entre as montanhas
e o sol, com detalhes muito simples e sutis.
A perspectiva aérea ou nitidez fala sobre o quão claro e em
foco o objeto parece ser (objeto próximo) em oposição à aparência
sem nitidez e desfocada (objeto distante). Isso acontece pelo efeito
das partículas suspensas da atmosfera, já que quando a luz as
atravessa, elas criam uma espécie de “filtro” que deixa a imagem
com menor “limpeza”, além de que a luz refletida de objetos com
maior profundidade no campo visual precisa percorrer distâncias
maiores.
O sombreamento lida com o jogo de sombra e luz, conceito
familiar na projetação do espaço construído. Para a neurociência,
essa pista lida com a intensidade do brilho do objeto, já que o objeto
afastado da luz parece ter menos brilho e mais sombra. Além disso,
o padrão de nossos ambientes é a superfície plana, bidimensional,
que não cria sombras por si mesma. Essa pista perceptual também
auxilia no entendimento de profundidade em uma superfície
descontínua, marcando as reentrâncias e saliências existentes.
Na pista perceptivade altura, vê-se o horizonte mais elevado
verticalmente que o primeiro plano. Assim, os objetos mais altos no
campo visual estão mais distantes do que aqueles que parecem
mais abaixo.
A ideia de profundidade em uma imagem reticular pode ser
enfatizada pela perspectiva linear, o que envolve a diminuição
sistemática dos objetos. O que se vê é uma conversão das linhas
em direção a um mesmo ponto, chamado de ponto de fuga, técnica
de representação muito conhecida entre arquitetas e arquitetos.
Para a visualização de profundidade e distância na imagem, o
gradiente de textura representa a mudança relativa da densidade do
material de acordo com a posição do objeto no espaço. A textura
(lisa, rugosa, felpuda, pedregosa) se torna mais ou menos visível a
depender da distância. Assim como na perspectiva linear, a textura
parece ficar com padrões menores e mais próximos – mais
comprimidos – à medida que se afastam do primeiro plano do
campo visual.
Outra pista útil é o tamanho familiar. Quando sabemos o
tamanho do objeto, podemos estimar o tamanho de sua imagem na
retina (células que capturam as imagens em nosso olho) para
fornecer uma estimativa precisa de sua distância. No entanto,
podemos nos enganar se um objeto não estiver em seu tamanho
familiar. Outra é a pista de tamanho relativo que se dá quando há
dois objetos semelhantes. Comparam-se os tamanhos para melhor
entender a posição de cada um no espaço e assim aferir a relação
de profundidade do ambiente. Dessa forma, o emprego dessas
pistas monoculares estáticas aqui descritas dentro de uma imagem
bidimensional torna possível a percepção pictórica, tendo-se a
impressão de profundidade.
Existem também as pistas monoculares com informação
dinâmica ou cinética. Elas permitem a percepção de movimento da
imagem. Com o movimento do observador, ou dos objetos próximos
a ele, produz-se a paralaxe em função da profundidade e distância
entre esses objetos, sendo esse efeito o movimento relativo
aparente dos objetos. Essa pista está associada à diferença de
deslocamento, podendo ser percebida quando a pessoa fixa o olhar
em um ponto da cena visual e a cabeça mexe, mesmo que bem
lentamente, fazendo com que os objetos mais próximos do ponto
fixo movam-se com maior rapidez que os mais distantes.
Outro aspecto da paralaxe é que a direção aparente do
movimento não é a mesma entre objetos mais perto, que parecem ir
na direção oposta da cabeça e os objetos longe parecem se
deslocar na mesma direção. Uma forma simples de se entender a
paralaxe é fechar um olho e colocar dois dedos alinhados
diretamente ao campo de visão monocular, com uns 20 cm de
distância entre eles, mantendo-os parados. Movimente levemente a
cabeça para um lado e para o outro. Ao focar o olhar no dedo de
trás (mais distante), ele parecerá se mover na mesma direção que a
sua cabeça. Ao focar no olho mais perto, ele parece se mover ao
contrário da sua cabeça.
James Jerome Gibson (1904-1979) foi um psicólogo americano
reconhecido como um dos colaboradores mais importantes no
campo da percepção visual. Ele definiu perspectiva de movimento
como a pista monocular que fornece informações sobre a distância
dos objetos no padrão de fluxo óptico105. Esses padrões “criados
pelo movimento em direção a uma superfície, ou paralelos a ela,
fornecem informações sobre a velocidade e a direção do
movimento”106. O efeito disso é perceber objetos que passam perto
do observador parecem se deslocar mais rapidamente que objetos
mais distantes.
Por fim, como pista monocular dinâmica, existe a acomodação,
que consiste nos músculos dos olhos fazerem ajustes para que o
cristalino possa focar melhor para criar uma imagem retiniana nítida.
Apesar de diferenciar a contração muscular de formas diferentes
para objetos perto ou longe, essa é uma pista com limitação relativa,
funcionando em seres humanos com distâncias de até 2 m107.
Algumas fontes de informação do espaço necessitam do uso
dos dois olhos ao mesmo tempo, as chamadas pistas binoculares. A
convergência lida com a tendência que os olhos têm de se moverem
coordenadamente em direção um ao outro para observar objetos
perto do observador (Figura 6; I). Enquanto isso, para objetos
distantes, os olhos ficam mais próximos da linha de visão. Isso faz
com que o próprio controle muscular indique ao encéfalo um sinal
de profundidade ou de distância (Figura 6; II).
FIGURA 6 – MOVIMENTO DO OLHO: (I) CONVERGÊNCIA OCULAR AO FOCAR EM UM OBJETO
PRÓXIMO, COM CRISTALINO ABAULADO; (II) CONVERGÊNCIA OCULAR AO FOCAR EM UM OBJETO
DISTANTE, COM CRISTALINO RELATIVAMENTE PLANO; (III) IMAGENS EM DISPARIDADE BINOCULAR
Os olhos humanos estão direcionados para a frente do corpo, o
que cria um campo de visão relativamente abrangente. No entanto,
por causa da distância de 5 a 7,5 cm que existe um do outro, as
informações chegam levemente diferentes. Essa diferença de
imagem retiniana é conhecida como disparidade binocular, dando
ao encéfalo acesso a essas duas informações de forma simultânea.
Com elas, nossa mente é capaz de “calcular” a distância entre os
objetos de maneira altamente precisa.
A disparidade binocular produz estereopsia, que é a percepção
de profundidade produzida pela disparidade binocular. A estereopsia
é muito potente a curtas distâncias e para testá-la basta colocar um
dedo a poucos centímetros do seu nariz e alternar o fechamento de
um dos olhos. Você terá a sensação de que o dedo, ainda que
imóvel, deslocou-se. Tal sensação de deslocamento é maior a
objetos mais próximos de nossos olhos e gradativamente menor à
medida que observamos objetos distantes. Isso porque as
informações dos dois olhos terão diferenças (disparidades) de
ângulo de objetos mais próximos ao nosso rosto e menor diferença
de objetos que estão próximos à linha do horizonte. A discrepância
nas imagens retinianas de um objeto diminui a um fator de cem
quando sua distância do observador aumenta de 2 para 20 m.
No entanto, apesar dessas pistas, nossos olhos podem nos
enganar. Tudo dependerá de como o cérebro irá interpretá-las para
criar a percepção. Técnicas de ilusão de ótica, por exemplo, acabam
sendo muito interessantes para se entender melhor a visão. Uma
vez que são muitas informações captadas pelos olhos para serem
processadas a cada instante, somos condicionados pelo cérebro a
ver a interpretação mais provável. Em alguns casos, duas pessoas
interpretam a cena visual de formas diferentes e quando essa
interpretação é errada, chamamos de ilusão de óptica.
Um exemplo é a sala ou caixa de Ames. Desenvolvida pelo
oftalmologista norte-americano Adelbert Ames Jr. em 1946, essa
ilusão óptica é centrada no uso de um ambiente distorcido. Vista
frontalmente, ela parece um espaço cúbico regular. Porém, se duas
pessoas se posicionarem nas duas arestas do fundo, o observador
da posição frontal irá ver uma disparidade impressionante no
tamanho das duas pessoas. Na realidade, o espaço é trapezoidal e
o que se vê é um truque de perspectiva (Figura 7).
FIGURA 7 – ILUSÃO CAIXA DE AMES CRIADA PELO NORTE-AMERICANO ADELBERT AMES JR
Já a ilusão das cobras giratórias foi desenvolvida pelo psicólogo
e professor Akiyoshi Kitaoka em 2003 com base em cores e formas
geométricas que criam efeitos de movimento (Figura 8). Essa
imagem estática trabalha com o conceito de ilusão de deriva
periférica, refere-se a uma ilusão de movimento anômalo que pode
ser observada na visão periférica. O movimento ilusório tende a
aparecer na direção de uma região mais escura para uma mais
clara adjacente. Essa ilusão é aprimorada por perfis de luminância
graduais, sendo que estímulos com perfis de luminância suaves
fornecem uma ilusão mais fraca. Ela é também reforçada por bordas
fragmentadas ou curvas, tendo estímulos feitos de bordas longas
um resultado mais fraco108.
FIGURA 8 – ILUSÃO DE DERIVA PERIFÉRICA COBRAS GIRATÓRIAS CRIADA PELO JAPONÊS
AKIYOSHI KITAOKA
Na construção do espaço, a técnica de ilusão já foi utilizada
muitas vezes. “Enganar” os olhos do observador pode favorecer
uma intenção espacial que se tem por objetivo.Desde a Antiguidade
grega até os dias de hoje, forçar ou enfatizar uma determinada
perspectiva do ambiente construído se apresenta como uma técnica
válida para a construção de efeitos espaciais. Isso irá influenciar
como pensamos e avaliamos uma determinada obra.
Seja na visualização do espaço construído ou na renderização
de um ambiente que irá existir, somos levados a acreditar em
imagens que na realidade não existem. Esse fenômeno é feito com
a movimentação de objetos para mais perto do plano de fundo, por
exemplo, distantes da lente – seja ela uma lente humana, seja
fotográfica. Consegue-se fazer com que o espaço pareça maior ou
menor, mais alto ou mais baixo, mais curto ou profundo do que
realmente é apenas em função da disposição dos objetos, planos e
elementos construtivos. Basta entender como o cérebro lê as pistas
perceptivas em função do tamanho angular e as dicas de contexto
existentes para que se consiga “ajustar” a realidade. Quando as
coisas têm o mesmo tamanho angular, por exemplo, o cérebro
pensa que os objetos têm o mesmo tamanho que o contexto os
define.
Assim, se o objetivo for criar a sensação de amplitude em um
ambiente pequeno, por exemplo, um espelho poderia alongar as
linhas de contorno do espaço, dando a sensação de alongamento.
Porém, se essa for a única pista disponível, ou for contrastante com
outras pistas que dão a sensação de diminuição do local, esse efeito
não será criado. Ou seja, a experiência arquitetônica, somada com a
capacidade de nomear os elementos perceptuais usados, pode ser
um recurso rico de investigação das pistas perceptuais de modo
integrado.
Esses detalhes de deformação que são encontrados em
diferentes prédios são soluções arquitetônicas que compensam as
condições visuais de diferentes objetos, o que reforça “a unidade do
conjunto, ao estabelecer e modificar a forma dos elementos de
acordo com sua posição na obra”109. Elementos como janelas,
portas e a própria fachada não devem ser considerados
isoladamente, mas sim em consonância, a fim de identificar como
eles funcionam juntos em sua disposição geral. Uma pessoa
diretamente “ao pé” do edifício perceberá esse volume de maneira
diferente do que se olhasse de longe.
94 Curva senoidal é uma curva matemática que descreve uma oscilação
repetitiva em uma onda contínua.
95 Lent, 2010.
96 Machado & Haertel, 2013.
97 Machado & Haertel, 2013.
98 Luminância é uma medida da densidade da intensidade de uma luz refletida
em uma dada direção.
99 Lent, 2010.
100 Fibras nervosas são os axônios dos neurônios que, quando em conjunto,
formam os feixes ou tratos do sistema nervoso central e os nervos do sistema
nervoso periférico.
101 Decussação é o cruzamento em “X” das fibras nervosas.
102 Lent, 2010.
103 Schiffman, 2005.
104 Schiffman, 2005.
105 Fluxo óptico é o campo que descreve os deslocamentos ocorridos entre dois
quadros consecutivos.
106 Schiffman, 2005.
107 Schiffman, 2005.
108 Kitaoka & Ashida, 2003.
109 Pereira, 2010.
NOÇÕES MENTAIS DE
ESPACIALIDADE
A partir da ideia moderna derivada da filosofia de Immanuel Kant
(1724-1804) de que a visão é um processo ativo e criativo que vai
além das informações fornecidas para a retina, o século XX viu
surgir muitos estudiosos da percepção espacial. Um desses
estudiosos foi Hermann von Helmholtz (1821-1894), matemático,
médico e físico alemão, visto por muitos cientistas como o fundador
do estudo científico da percepção visual. Dentro de seus estudos
sobre fisiologia e psicofísica, Helmholtz contribuiu com teorias da
visão, da percepção visual, percepção espacial, visão a cores e
muitas outras. Para ele, todo fenômeno mental teria uma correlação
física, o que exige observação a partir de três aspectos: as
configurações físicas dos estímulos (como a intensidade da luz); as
condições mecânicas e eletroquímicas da estimulação no corpo (o
olho e suas conexões nervosas); e as manifestações subjetivas do
processo perceptivo, realizadas pela mente humana110.
Se considerarmos que o ser humano não nasce com um
dicionário inerente de significados preestabelecidos entre mente e
meio, qual seria então a relação entre sensação e percepção?
Helmholtz estabeleceu que essa relação é subjetiva e carece
interpretação para cada indivíduo, sendo falsa a ideia de que a
qualidade da sensação apreendida é a causa exata da percepção
do objeto. Não há relação causal entre estímulo e fisiologia para o
efeito mental criado. Isso significa que a percepção deriva do
símbolo que damos para as relações do espaço à nossa volta, um
“conjunto de expectativas sobre a base da qual nós podemos avaliar
sensações futuras e atuar sucessivamente no mundo”111. A
interpretação do espaço é, por conseguinte, subjetiva e complexa.
Sob a ótica da neurociência, a percepção é o resultado do
aprendizado e dos hábitos adquiridos, em que o tempo se apresenta
como importante dimensão, já que a percepção de algo que
tenhamos aos 20 anos pode não ser igual aos 60 anos. Além disso,
“o que é adequado e próprio para uma geração torna-se ridículo
para a seguinte, pois as pessoas adquiriram novos gostos e
hábitos”112.
Imagine, então, que você está em Praga, na República Tcheca,
em frente ao edifício Casa Dançante (Figura 1) projetado por Vlado
Milunić, em cooperação com Frank Gehry. Na faculdade de
arquitetura, você aprendeu que esse prédio é um exemplo de
arquitetura desconstrutivista, linha de projeto famosa pelos edifícios
fragmentados, que manipulam a ideia de superfície e estrutura ao
criar formas não retilíneas que distorcem os princípios clássicos da
arquitetura, como o próprio envoltório do edifício. Você sabe
também que o conceito dos projetistas foi inspirado na imagem de
um casal dançando, tanto que originalmente o prédio se chamava
Fred e Ginger, em alusão a Fred Astaire e Ginger Rogers, atores
famosos pelas cenas de dança nos antigos filmes de Hollywood de
meados do século XX.
FIGURA 1 – CASA DANÇANTE EM PRAGA, REPÚBLICA TCHECA (1996) PROJETADO PELOS
ARQUITETOS VLADO MILUNIĆ E FRANK GEHRY
O que está acontecendo é que a luz do sol está batendo no
edifício e refletindo em direção aos seus olhos, que captam esse
estímulo e o transformam em informação eletroquímica para ser
levada ao seu cérebro. No cérebro, essa imagem estimula vários
pontos do córtex, fazendo com que você perceba a imagem à sua
frente e se lembre das informações aprendidas anteriormente,
conectando a imagem aos símbolos e significados estudados. Você
vê que esse projeto arquitetônico brinca com a abstração entre
forma e figura ao indicar uma “cintura” no edifício, uma saia
esvoaçante ou um cabelo em cima da cúpula de metal do volume
em concreto.
Mas será que o turista próximo a você também consegue “ver”
tudo isso? Será que ele consegue capturar todos esses
significados? E se você não tivesse aprendido tudo isso, ainda
assim conseguiria ter a mesma percepção?
Os conhecimentos em neurociência, quando aplicados à
arquitetura, quebram paradigmas tradicionais do projeto. A
descoberta da perspectiva no século XV, com a representação das
três dimensões – altura, largura e profundidade – revolucionou a
forma de se pensar a arquitetura da época. Isso fez com que se
passasse a privilegiar uma compreensão visual do objeto
arquitetônico, em que a representação da perspectiva em si mesma
se tornou “uma forma simbólica que não apenas descreve, mas
também condiciona a percepção”113.
No entanto, hoje a discussão se volta às ideias da corporização
humana no espaço, com ênfase nas qualidades experienciais das
sensações. A cada dia, novas e variadas descobertas emergem no
campo da neurociência, com a promessa de uma compreensão
mais profunda das implicações mentais e impactos da arte de
construir. Além de sua essência como um artefato, a arquitetura
agora precisa ser vista em seu contexto fisiológico em um
paradigma emergente de mente-corpo-ambiente. Essas visões
desafiam a compreensão visual tradicional que ainda prevalece da
arquitetura e sugerem que as experiências arquitetônicas mais
significativas surgem de encontros existenciaisem vez de
percepções retinais, inteligência e estética do novo114.
Partindo-se da premissa de que “o olho apenas permite ver,
revelar através da luz, características daquilo que está diante dos
nossos olhos, aquilo que chamamos de realidade”115, ao falar sobre
percepção e colocar em foco o processo de interpretação do
estímulo recebido, essa percepção será diferente entre as pessoas.
Estamos falando de significados criados pela cultura de uma
sociedade.
Como dito por Heidegger116, o sujeito é ser-no-mundo,
entendendo-se que ele está limitado por sua temporalidade e lugar
de existência. Lembremos que para o filósofo, lugar (logos) deve ser
entendido a partir de uma definição fenomenológica e existencial –
em vez de geográfica – na qual devemos considerar o ser humano
em função de dimensões antropológicas, psicológicas e biológicas,
dentro de seu contexto de vida.
Dessa forma, o que em uma cultura pode simbolizar afeto, em
outra pode ser um gesto de desrespeito. Não existe uma percepção
universal no entendimento do símbolo por si só, mas sempre um
entendimento que passa por um filtro de racionalização daquilo que
estamos vendo a partir daquilo que já vimos. Logo, isso significa
que:
O entendimento que temos das coisas é um somatório de percepções
e visões que vão sendo guardadas no nosso cérebro, que são
articuladas com outras percepções, constituindo um arquivo de
referências que vai sedimentando a construção da imagem117.
As obras arquitetônicas que brincam com a percepção das
pessoas são mais ou menos bem-sucedidas em função da
capacidade do indivíduo de ver e perceber a ideia que se quer
transmitir, o que faz com que as experiências tidas com a arquitetura
sejam subjetivas.
Claro, o ser humano tem uma predisposição de prestar atenção
a alguns estímulos mais que outros. A detecção da presença de um
ser humano ou de um elemento natural está “embutida” em nossos
cérebros por anos de evolução da espécie. Objetos derivados de
elementos naturais, por serem mais comuns e conhecidos, foram
mais expostos à nossa capacidade de percepção, o que implica em
um reforço desse aprendizado no ser humano.
A ANÁLISE DA FORMA
A forma é um dos principais aspectos do ambiente construído e
decidir quais usar é um dos aspectos mais desafiadores do
processo de projeto. Embora arquitetas e arquitetos sejam
responsáveis por considerar a função e a tecnologia de seu projeto,
eles são geralmente livres para projetar a forma de acordo com suas
ideias e preferências individuais.
A própria palavra forma abrange diferentes conotações. Ela
pode ser considerada a partir de um pensamento filosófico (a forma
platônica ou aristotélica), lógico (forma versus matéria do juízo),
epistemológico (a forma kantiana no espaço e tempo) ou estético
(os limites exteriores da matéria)118. No campo da arquitetura, esse
termo é empregado quando se fala da estrutura formal do projeto,
dentro de uma lógica de composição coerente. A forma está
embutida de padrões, relações e hierarquias organizacionais que
definem o espaço. Lembremos que na geometria – base de muitas
discussões na arquitetura – a forma se refere à massa ou ao
volume, enquanto que os elementos compositivos, como linhas ou
contornos, delimitam essa forma. Para tanto, existem quatro
características da forma que prevalecem no projeto: formato,
tamanho, cor e textura.
O formato é a característica de conforto, o limite que se
estabelece para criar a “figura” da forma. Falamos então da
configuração da superfície em um plano bidimensional que, quando
em conjunto com outras superfícies, é possível identificar a forma. O
tamanho são as características dimensionais – largura,
comprimento, altura – que ao serem definidas em função de um
elemento referencial passa a ser entendido como escala. Daí poder
dizer que um edifício é baixo ou alto, largo ou estreito: isso
dependerá dos elementos aos quais a forma é comparada.
Conforme o fenômeno de luz e percepção visual, tratados no
capítulo Percepção Visual e o Projeto Arquitetônico, a cor pode ser
atribuída à forma em função das dimensões de matiz, saturação,
tom e brilho. Já a textura lida com a topografia na superfície, o que
produz mais ou menos sombra no material. Tendo uma qualidade
visual e tátil, a textura pode sofrer variações em função do tamanho,
formato, proporção ou disposição das superfícies da forma. Além
disso, elas trazem, inerente à forma, uma série de propriedades
relacionais da composição dos elementos: posição, orientação e
inércia visual119. Uma vez que a arquitetura consiste no
ordenamento da passagem de um espaço dado a um espaço
habitado, também essas características qualificam o objeto em
análise.
A posição fala da situação do objeto em estudo em relação ao
ambiente que ocupa, seja um edifício em função da cidade, seja um
ambiente em função do edifício, seja de um mobiliário em função do
ambiente. A orientação é a determinação da direção da forma
considerando o plano do solo, os pontos cardeais ou o campo visual
do observador. Já a inércia visual lida com o quão estável e
equilibrada, ou não, é a forma. Essa propriedade combina a posição
e a orientação com a própria geometria do objeto arquitetônico, que
irá lidar com a relação gravitacional – e estrutural – em função da
linha do horizonte no campo de visão120.
A forma pode ser apreendida como dura ou macia, leve ou
pesada, tensa e solta, independente da materialidade de sua
estrutura ou superfície. É uma associação intuitiva, feita a partir de
diferentes estímulos vividos. Podemos, por exemplo, conectar a
experiência com um tecido de algodão macio e extrapolar para uma
“maciez” da parede revestida de um material similar. Isso significa
que mesmo sem tocar o material, a nossa memória dele em uma
situação diferente influencia nossa percepção da arquitetura. Essas
“sensações” são ferramentas que projetistas possuem para
influenciar a compreensão das pessoas quanto a um determinado
ambiente ou volume. Com as qualidades perceptivas de material,
forma, textura, cor etc., é possível empregar um “caráter” específico
ao edifício, em que “cada implemento exerce seu próprio efeito
particular sobre nossas mentes”121.
Assim, a percepção espacial – uma dimensão da arquitetura
que tanto exploramos em nossos projetos – fala da nossa
capacidade de relacionar o contexto em que estamos com nós
mesmos. Iniciamos no ponto bidimensional mais simples, no qual o
elemento é considerado por sua expressão conceitual, para aos
poucos trabalhar na complexidade do espaço tridimensional. Não é
preciso enxergar unitariamente os pontos, as linhas ou os planos da
forma arquitetônica, porque em nossas mentes eles serão sentidos.
O ponto marca a posição do espaço, sendo um elemento de
forte atração para o foco da visão. Quando centralizado no
ambiente, passa a ideia de algo estático, centralizado e sem
direção. Basta deslocar do centro que sentiremos desequilíbrio e
tensão visual entre o ponto e o espaço em que ele está. Essas
sensações estabelecem “uma condição em que cada parte de um
todo está apropriadamente disposta com referência a outras partes
e ao seu propósito, de modo a produzir um arranjo harmonioso”. No
entanto, existem determinadas composições (Figura 2) que podem
agradar mais que outras: a reação a um objeto perfeitamente
simétrico e balanceado (I), ou um que assume sua assimetria ao
manter o equilíbrio da forma (III) é diferente de um projeto sem uma
composição bem definida, que pode parecer estranha ou passar a
sensação de que tem alguma coisa errada (II).
FIGURA 2 – DIAGRAMA DA ELEVAÇÃO DE UMA CASA, DO PONTO DE VISTA EXTERNO: (I) DESENHO
SIMÉTRICO; (II) DESENHO LEVEMENTE ASSIMÉTRICO; (III) DESENHO ASSIMÉTRICO
Sabe-se hoje que existem três níveis de percepção: a
exterocepção, a propriocepção e a interocepção. A exterocepção é
a interação direta do mundo externo com o corpo, que se dá pelo
processo de captura dos estímulos ambientais pelos órgãos dos
sentidos. Isso significa que teremos sensações táteis, auditivas,
gustativas, olfativas e visuais. É por meio dessessistemas
sensoriais que interagimos com o espaço à nossa volta ao captar os
estímulos do meio e integrá-los, ou seja, organizá-los como uma
única informação entendida.
Como explicado no capítulo Nossos Processos Cognitivos, a
propriocepção é considerada a sensação de si mesmo, o que
transmite ao cérebro informações sobre posicionamento no
ambiente. Espalhados pelos músculos, tendões e ligamentos, os
receptores de propriocepção criam o sentido que nos ajuda a saber
a posição e orientação do próprio corpo. É por causa deles que
conseguimos, por exemplo, fechar os olhos e tocar o próprio nariz,
mesmo sem ver o movimento acontecer.
Por sua vez, a interocepção responde a estímulos viscerais do
corpo em uma conexão direta com o controle da homeostase122. No
entanto, essa dimensão de percepção vai além da regulação e
manutenção corporal. A percepção interoceptiva regula também um
“gatilho” comportamental importante quanto a questões emocionais,
cognitivas e de autoconsciência. Ela permite a criação de
experiências emocionais a partir de transformações fisiológicas
processadas pelo córtex insular anterior, sendo responsável por
identificarmos sensações internas como dor ou prazer. Ou seja,
essa dimensão de sensações permite que sejam criadas
representações sobre nosso espaço por meio de sentimentos e
sensações corporais.
O ESTUDO DA FORMA PELA GESTALT
Muito do que entendemos como percepção e significado da
forma deriva dos estudos desenvolvidos no século XX pelos
psicólogos alemães Max Wertheimer (1880-1943), Kurt Koffka
(1887-1967) e Wolgang Kohler (1886-1941), que aprofundaram as
teorias de Hermann von Helmholtz. Fundadores da Gestalt123,
escola de psicologia experimental, entendiam que um estímulo
dependerá de suas propriedades inerentes, mas também do
contexto em que ele foi captado em função das características do
campo visual. Enquanto Helmholtz dizia que os estímulos
ambientais seriam analisados e decompostos em sensações
inconscientes simples e independentes, os cientistas da Gestalt
afirmavam que a forma é mais que a soma de seus elementos124.
A partir de variados estudos, os cientistas da Gestalt olharam
para o processo perceptivo humano para entender o porquê de
algumas formas agradarem mais que outras. Utilizando a relação
figura-fundo em seus experimentos, acabaram por encontrar
“evidências sobre a necessidade de ordem para o ser humano, a
qual está associada ao funcionamento orgânico adequado nos
níveis fisiológicos e psicológicos”125. A clássica ilusão de ótica a
seguir (Figura 3) representa essas relações com duas possibilidades
de visualização da imagem: é possível visualizar a silhueta de um
vaso ou o perfil de dois rostos. O observador faz uma escolha
mental entre essas duas interpretações válidas, na qual, em geral,
se percebe apenas uma delas e somente após algum tempo ou
estímulo adicional, consegue perceber a segunda. Após vários
experimentos, concluíram que a forma é a unidade primitiva (mais
simples) da percepção.
FIGURA 3 – ILUSÃO DE ÓTICA CONHECIDA COMO VASO DE RUBIN
Com base na fisiologia do sistema nervoso, eles afirmaram que
o sistema visual encefálico processa as informações sensoriais de
forma, cor, distância e movimento de objetos de acordo com certas
“regras” inatas de organização da forma, preestabelecidas pela
evolução do organismo humano, dentro da relação sujeito-objeto126.
E que essas análises – de cor, brilho ou forma – não são em si
absolutas, mas percebidas em um contexto de relações. Essa
organização fala não apenas de uma regularidade da geometria, e
sim de “uma condição em que cada parte de um todo está
apropriadamente disposta com referência a outras partes e ao seu
propósito, de modo a produzir um arranjo harmonioso”127.
Dentro do pensamento da Gestalt, qualquer imagem – de
arquitetura, mobiliário, produto, desenho, pintura etc., qualquer que
seja seu tipo de manifestação visual – passa pelo princípio da
pregnância para ser captada (Figura 4), em que fatores de
equilíbrio, clareza e harmonia visual são uma necessidade do ser
humano, logo, indispensáveis. Isso significa que a legibilidade da
forma de qualquer objeto deve ser considerada como um todo –
antes de focar no detalhe –, sendo que a organização formal do
objeto, sob um ponto de vista mental, resultará em uma melhor
solução do ponto de vista estrutural.
Quanto mais complexa for a forma, com muitos detalhes,
elementos diminutos e informação pormenorizada, menor é a nossa
capacidade de identificar esses elementos, o que faz com que
foquemos no todo para melhor leitura, identificação e compreensão
da composição visual. Ou seja, quanto melhor for a nitidez, precisão
e acuidade visual da imagem captada, melhor será seu nível de
pregnância. Satisfazer esses aspectos de maneira adequada
“respeitando-se os padrões culturais, estilos ou partidos formais
relativos e intrínsecos aos diversificados objetos concebidos,
desenvolvidos e construídos pelo homem”128.
Entende-se, pois, que as relações psicofisiológicas (mente-
corpo) no fenômeno da percepção são integradas, tendo o sistema
nervoso uma característica dinâmica autorreguladora que busca
estabilidade e tende a organizar as imagens do mundo de maneira
coerente e unificada. Logo, determinados processos de
interpretação do encéfalo são inatos ao ser humano, desenvolvidos
a partir da evolução da espécie. Para os gestaltistas, esses são os
princípios básicos de organização da forma perceptual “que
explicam por que vemos as coisas de uma determinada maneira e
não de outra”129, sendo eles: unidade, unificação, segregação,
fechamento, continuidade, proximidade e segurança, todos em
função da pregnância da forma.
FIGURA 4 – IGREJA SAGRADA FAMÍLIA EM BARCELONA, ESPANHA (EM CONSTRUÇÃO) PROJETADA
POR ANTONI GAUDÍ. EXEMPLO DE BAIXA PREGNÂNCIA, HÁ TANTA INFORMAÇÃO QUE É DIFÍCIL
PERCEBER INDIVIDUALMENTE OS DETALHES CONSTRUTIVOS DA FACHADA, A NÃO SER QUE SE
CHEGUE PERTO
FIGURA 5 – COM UM GRANDE CONTRASTE ENTRE ELEMENTOS CONSTRUÍDOS E VEGETAÇÃO,
ESTA IMAGEM DE UMA COMUNIDADE DO RIO DE JANEIRO É VISTA COMO DUAS GRANDES MASSAS
UNIFICADAS, REALÇADAS PELAS LINHAS VERMELHAS TRACEJADAS (MARCAÇÃO FEITA PELAS
AUTORAS)
Do ponto de vista mais simples da teoria, a unidade consiste no
elemento em si ou como parte de um todo. Essa ideia pode ser vista
em um único objeto ou em um conjunto de objetos que trabalham
para criar um volume ou massa única. Não só em um edifício, mas
também a paisagem é vista dessa forma. Na Figura 5, por exemplo,
se entende o céu como uma unidade de fundo; a massa edificada
da comunidade carioca se comporta como um todo; e a mata em um
primeiro plano contrasta com os elementos construídos. Podemos
definir, assim, 3 unidades distintas. Porém, ao olhar a paisagem,
também a entendemos como uma unidade composta por essas
diferentes partes.
A segregação da forma se dá pela diferenciação do estímulo
(Figura 6). “Segregação significa a capacidade perceptiva de
separar, identificar, evidenciar, notar ou destacar unidades, em um
todo compositivo ou em partes deste todo, dentro de relações
formais, dimensionais, de posicionamento”. Logo, para se ter
unidade de elementos, é preciso contraste para que se possa
diferenciar as formas. Caso não haja contraste nos estímulos
recebidos, o entendimento das formas será o da unidade. Em
contrapartida, a força de unificação age a partir da igualdade do
estímulo recebido. Ela se dá quando a ordenação da forma é
percebida como harmônica, equilibrada e coerente, em função de
aspectos relacionais (formas, dimensões, cores, sombras etc.).
FIGURA 6 – CONGRESSO NACIONAL EM BRASÍLIA, DF (1960) PROJETADA POR OSCAR NIEMEYER;
POR SUA COMPLEXIDADE VOLUMÉTRICA, APESAR DE SABERMOS QUE É UM ÚNICO EDIFÍCIO,
VISUALMENTE SE ENTENDE UMA SEGREGAÇÃO EM 5 PARTES: A BASE, AS CÚPULAS E OS
VOLUMES VERTICAIS
FIGURA 7 – GOLDEN GATE BRIDGE EM SÃO FRANCISCO, EUA (1937) PROJETADA POR IRVING
MORROW. OS CABOS DE AÇO EM CURVA QUE SUSTENTAM A PONTE PASSAM UMA IDEIA DE
CONTINUIDADE DO MOVIMENTO, APESAR DE SEREM LINHAS ISOLADAS NAESTRUTURA
Quanto ao fator do fechamento (Figura 8), pesquisas de
Wertheimer definem que é inerente ao ser humano a atividade
mental de unir intervalos e estabelecer ligações. “Obtém-se a
sensação de fechamento visual da forma pela continuidade em uma
ordem estrutural definida, ou seja, por meio de agrupamento de
elementos de maneira a constituir uma figura total mais fechada ou
mais completa”130. Por exemplo, na Figura 6, a base do edifício do
Congresso Nacional não é definida apenas pelas linhas horizontais
da laje. A marcação rítmica dos pilares cria um efeito de
proporcionalidade ao criar visualmente múltiplos retângulos que
compõem o todo.
A continuidade é outro princípio de organização da forma, em
que se tenha a impressão visual de sucessividade das partes do
objeto. A ideia é que uma unidade linear tende, psicologicamente, a
se prolongar na mesma direção e com o mesmo movimento (Figura
7). Ou, se ela modifica sua direção suavemente, ainda entendemos
como um movimento contínuo. Essa impressão, claro, pode ser
formada não só pela linha, como também pela repetição de pontos
ou planos, assim como pode ser definida por aspectos como cor,
brilho ou tamanho. O importante é que se encontre fluidez na
organização da forma.
As distâncias entre os elementos auxiliam na organização da
forma por proximidade (Figura 8). Quanto menor for a distância
entre os objetos, maior a tendência de os agrupar e perceber como
parte de uma composição. No entanto, a simples proximidade por
vezes não basta para explicar o agrupamento de elementos. É
necessário que esses tenham qualidades em comum, seja qual for o
aspecto formal. Uma vez que buscamos visualizar o espaço em
busca de unidade, essa semelhança das partes (Figura 9) – por
formato, cor, tamanho, direção, etc. – auxilia nesse processo. Isso
desperta a tendência dinâmica de constituir unidades, isto é, de
estabelecer agrupamento das partes semelhantes.
FIGURA 8 – IGREJA DA LUZ EM IBARAKI, JAPÃO (1989) PROJETADA POR TADAO ANDO; À
ESQUERDA: VISTA EXTERNA; À DIREITA: VISTA INTERNA. A PARTIR DO CONTRASTE DE LUZ E A
ORGANIZAÇÃO DA SUPERFÍCIE EM 4 QUADRANTES, É POSSÍVEL VER UMA CRUZ PELO FATOR DE
FECHAMENTO
FIGURA 9 – LAS VEGAS, EUA: À ESQUERDA, HOTEL BELLAGIO (1998); AO CENTRO, HOTEL CAESARS
PALACE (1966). EM AMBOS OS EDIFÍCIOS, É POSSÍVEL AGRUPAR AS JANELAS PELA PROXIMIDADE
E SEMELHANÇA DOS ELEMENTOS CONSTRUTIVOS
Apesar de abordados aqui de forma individual, os princípios de
organização da forma da Gestalt são interconectados. A
proximidade e semelhança afetam a unificação tanto quanto a
segregação; a segregação auxilia na visualização da unidade; a
unificação permite a ideia de continuação; etc. Logo, perceber a
forma arquitetônica como uma composição única, harmoniosa e
balanceada, com coesão entre suas diversas partes, “implica
percepção de unidade e de uma estrutura na organização dos
elementos compositivos, provoca uma reação satisfatória ao
estímulo e é condição para uma percepção apropriada da forma”131.
FIGURA 10 – DIAGRAMAS EXPLICATIVOS DAS LEIS DE ORGANIZAÇÃO DA FORMA DESENVOLVIDOS
PELA GESTALT
Porém, essas características e propriedades da forma (Figura
10) são dimensões dinâmicas na arquitetura. Uma forma
arquitetônica vai além de resolver um problema e suprir uma
necessidade: “a arquitetura se pretende intenção de se apropriar
singularmente de um espaço para poder habitá-lo”132. Diferente de
outras atividades artísticas, falar de arquitetura é entender o espaço
em sua tridimensionalidade, “como uma grande escultura escavada,
em cujo interior o homem caminha”133. Sabemos que simplesmente
olhar a arquitetura não é suficiente para entendê-la. É preciso
vivenciá-la.
110 Santos & Veríssimo, 2018.
111 Turner, 1977, p. 49.
112 Rasmussen, 2015, p. 10.
113 Pallasmaa, 2011, p. 16.
114 Tidwell, 2013, p. 5.
115 Marques, 2006, p. 27.
116 Heidegger, 2005.
117 Marques, 2006, p. 27.
118 Gomes Filho, 2008.
119 Ching, 2008.
120 Ching, 2008.
121 Rasmussen, 2015, p. 28.
122 Homeostase indica um estado, relativamente constante, de equilíbrio interno
do corpo.
123 Gestalt, do alemão, significa configuração; estrutura; figura; forma.
124 Lent, 2010, p. 568.
125 Reis, 2002, p. 17.
126 Gomes Filho, 2008.
127 Ching, 2008, p. 320.
128 Gomes Filho, 2008, p. 17.
129 Gomes Filho, 2008, p. 20.
130 Gomes Filho, 2008, p. 31.
131 Reis, 2002, p. 17.
132 Boutinet, 2002, p. 158.
133 Zevi, 2009, p. 17.
A EXPERIÊNCIA
ARQUITETÔNICA
Com o surgimento e popularização da reprodução fotográfica, a
quarta dimensão arquitetônica se desvelou. A “captura da realidade”
nos fez ver que a arquitetura deve considerar o tempo a partir do
deslocamento sucessivo do campo de visão. Afinal, se um espaço é
criado para ser ocupado, pressupõe-se o movimento. Andar pelo
espaço, seja ele interno, seja externo, faz-nos descobrir diferentes
pontos de vista, criando uma realidade integral e individual.
Historicamente, os estudos arquitetônicos foram baseados em
construções filosóficas ou estéticas a fim de analisar padrões
comportamentais relacionados a como o ser humano responde ao
projeto em estudo. Classificada no universo das Belas Artes por
vários séculos, a arquitetura lida com a forma e o volume, assim
como o escultor. Lida também com a composição de cores, texturas
e padrões, assim como o pintor. No entanto, a arquitetura deve ser
utilizada além de observada, o que cria uma dimensão técnica do
espaço, que será vivenciado, experienciado. Um cemitério com suas
lápides verticais é semelhante em sua organização formal a um
bairro de edifícios altos vistos de um avião. A diferença se encontra
na escala humana, ou seja, no ponto de vista em que ocupamos e
usamos o espaço, já que “a arquitetura significa formas criadas em
torno do homem, criadas para nela se viver, não meramente para
serem vistas de fora”134.
Assim, o projetista deve trabalhar a partir da manipulação da
forma para criar o espaço, elemento fundamental da arquitetura.
Além disso, deve-se considerar que com o movimento do indivíduo
a visão se transforma, sendo o espaço captado como uma
sequência de planos em uma progressão temporal, em que a nitidez
é maior na frente do indivíduo e diminui até chegar no plano de
fundo.
A dimensão do tempo no espaço equivale a uma sucessão de
instantes espaciais: “fotos” tiradas continuamente sob perspectivas
diferentes, sendo responsabilidade do encéfalo criar o “filme” que
enxergamos. Afinal, “a arquitetura não é só arte nem só imagem de
vida histórica ou de vida vivida por nós e pelos outros; é também, e
sobretudo, o ambiente, a cena onde vivemos nossas vidas”135.
Uma vez que nossa matéria-prima é o vazio que habitamos,
emoldurado por elementos construtivos cuidadosamente pensados
para proporcionar uma determinada experiência, impomos limites à
liberdade visual e espacial do indivíduo. Percebemos a todo instante
o que está a nossa volta e como nos relacionamos com esse
entorno. Conseguir identificar diferentes escalas dos elementos,
distâncias dos objetos ou movimento de pessoas se dá por esta
vivência.
A arquitetura é nosso principal instrumento de relação com o espaço e
o tempo, e para dar uma medida humana a essas dimensões. Ela
domestica o espaço ilimitado e o tempo infinito, tornando-o tolerável,
habitável e compreensível para a humanidade136.
Por séculos, os estudos da arquitetura focaram naquilo que
funcionava estilisticamente para contar a história de uma
comunidade, sociedade ou povo. Quando, no século XIX, nasceu a
ciência clássica do método científico, a arquitetura pega
“emprestada” a linha de raciocínio de diversas outras disciplinas.
Nas últimas décadas, a arquitetura foi vista de várias perspectivas
teóricas, fornecidas, por exemplo, pela psicologia, linguística
estrutural, matemática e antropologia, bem como filosofias
desconstrucionistas e fenomenológicas. Essas análises criaram um
conjunto de critérios para o projeto em função dos locais e
finalidades que os edifícios seriam construídos.
A pesquisa social e comportamental iniciada no século passado
deu início a umatransformação na maneira que projetistas
concebem seus projetos. Há um aprofundamento na compreensão
de como as pessoas respondem aos diferentes elementos
projetuais. No entanto, embora essas pesquisas disponibilizem uma
compreensão de como as pessoas respondem aos diferentes
ambientes construídos, elas ainda não são capazes de explicar o
porquê de tais respostas. Hoje, o campo da neuroarquitetura traz
uma nova perspectiva para os efeitos do ambiente construído sobre
o indivíduo ao utilizar ferramentas neurocientíficas. Ela fornece uma
base de conhecimento com evidências claras do motivo das
pessoas serem afetadas pelos projetos arquitetônicos137.
Do ponto de vista da neurociência, a percepção espacial é a
capacidade do indivíduo de perceber as relações no ambiente.
Essas relações, interações e experiências que temos com o mundo,
seja ele físico, seja ele social, passará pelo filtro cerebral que define
a ação, a percepção e a memória. Ao mesmo tempo, o trabalho
arquitetural implica um equilíbrio entre teoria e prática. Essa relação
metodológica que dita: “nada de projeto diretor sem obra a ser
realizada, nada de obra sem um projeto que a inspire”138.
Em experiências com ratos, neurocientistas vêm se debruçando
quanto à questão da espacialidade. A equipe do biólogo
neurocientista britânico John O’Keefe descobriu que o hipocampo
(Figura 1) – estrutura localizada nos lobos temporais do cérebro
humano – possui um papel fundamental para a navegação espacial.
Essa estrutura já era conhecida como a principal sede da memória –
com a conversão da memória de curto prazo em memória de longo
prazo – e importante componente do sistema límbico139. Ao colocar
eletrodos no hipocampo de ratos, O’Keefe descobriu que alguns
neurônios do hipocampo tendem a não responder ao que o rato
estava vendo ou o que o rato estava fazendo, mas respondiam a
sua localização em relação ao ambiente do laboratório.
FIGURA 1 – VISTA SAGITAL DO ENCÉFALO COM AS ESTRUTURAS SUBCORTICAIS DOS NÚCLEOS DA
BASE COM DESTAQUE PARA O HIPOCAMPO
Enervadas no hipocampo e nomeadas como células de lugar,
esses neurônios disparam apenas quando um animal está em um
local específico. Cada célula de lugar responde a uma posição
diferente, o que ficou conhecido como seu campo perceptivo
espacial. Esse mecanismo funciona como um geoprocessamento140
cerebral. Porém, uma única célula não diz muito sobre o indivíduo
(ou o rato). O mecanismo do cérebro chamado codificação
populacional estabelece que um neurônio não “saberá” uma
informação com precisão: o segredo está no conjunto (população)
de neurônios que, em parceria, “constroem” o conhecimento. Ou
seja, uma célula de lugar pode sinalizar “você está em algum lugar
aqui” e outra célula pode sinalizar “você está um pouco para cima”
ou “você está um pouco para a direita” – e entre elas a população
dá ao rato informações muito precisas quanto à sua localização141.
Além disso, por ser uma estrutura localizada no hipocampo,
concluiu-se que o senso de lugar do indivíduo pode ser influenciado
pelas memórias formadas em experiências anteriores, seja uma no
mesmo local ou em um espaço semelhante.
Por exemplo, dois ambientes separados por um painel de vidro
podem ser fisicamente adjacentes no espaço, porém o hipocampo
os tratará como locais separados. Isso porque o indivíduo não pode
se mover diretamente de um ambiente para o outro já que o vidro é
uma barreira física. Dessa forma, uma divisória de vidro, embora
permita muita luz, ainda fornece uma separação entre uma sala e
outra. Ademais, essas barreiras não precisam ser físicas. Fatores
que reforçam caminhos consistentes de movimento em um
ambiente também servirão para separar as representações de lugar
dentro do hipocampo. Até mesmo a noção de direcionalidade
(orientação) é influenciada. Diferentes experimentos com animais,
nos quais eles tinham opções de movimento, detectaram que cada
direção possível “liga” diferentes padrões de atividade neural, ou
seja, andar em uma direção específica é efetivamente tratada pelo
cérebro como um ambiente diferente142.
Apesar de O’Keefe analisar sistematicamente os fatores
ambientais que influenciam as propriedades de disparo de
neurônios individuais do hipocampo, ainda não se sabe como nós –
ou os ratos – conseguimos entender a experiência corporal de estar
em um lugar específico, enquanto neurônios estão disparando em
uma ampla região do encéfalo. O que se sabe é que a partir das
experiências individuais da pessoa – e da repetição dessas
experiências, conhecida como fenômeno do abrasamento (do inglês
kindling)143 –, as sinapses fortalecem conexões neurais em
diferentes áreas do cérebro, representando experiências sensoriais,
motoras e tantas outras, enquanto se faz um percurso pelo
ambiente construído.
Seja do ponto de vista da navegação no espaço, ou da
navegação no tempo (memória), o hipocampo possui local de
destaque para o processamento das informações. É por isso que a
neurociência estuda o hipocampo, além de regiões cerebrais
relacionadas, a fim de melhor entender o nosso processamento sob
o foco da localização de caminhos (do inglês wayfinding) como um
componente ou propriedade particular do ambiente construído.
Assim, arquitetas e arquitetos preocupados com a experiência das
pessoas na passagem pelos espaços de um edifício devem
considerar as pistas proporcionadas pela própria estrutura espacial
do edifício – ou seja, o projeto em si – e como usar essa sinalização
a partir de aspectos simbólicos da cognição para ajudar nessa
navegação quando outras pistas falham.
A SIMBOLOGIA DA PERCEPÇÃO ESPACIAL
A neuroarquitetura está em contínua evolução, tentando
entender a correlação entre cognição, comportamento e ambiente
construído. Dentre tantas pesquisas, esses novos conhecimentos
começam a transformar fundamentalmente o entendimento que se
tem da experiência humana no espaço: o processamento do que se
vê, ouve e cheira, em correlação ao que se pensa, toca, sente e faz.
Essa experiência é guiada pelas percepções sensoriais e
influenciada pelos pensamentos, fazendo uso de ambos para
possibilitar o entendimento das informações que chegam ao cérebro
pela interação com o mundo. Logo, quando algo acontece no mundo
ou em nossas mentes, esse “algo” está sempre situado, em nossos
corpos, em um determinado momento, e em um lugar específico144.
Um exemplo interessante disso está no funcionamento da
mente quando correlaciona um símbolo com um significado. Imagine
que um ser humano primitivo ao andar por um ambiente natural se
depara com uma pegada de animal na lama. O que ele está vendo é
a composição física da lama que forma uma figura, o que este ser
humano está pensando é que um animal passou por ali145. Ele pode
ter sido ensinado por alguém em um momento de sua vida que uma
pegada desse formato significa a passagem de um animal. Ou,
então, em algum momento, ele teve a experiência de ver um animal
passar e deixar sua pegada na lama. Ou seja, é possível ver algo
que não necessariamente está físico à sua frente, mas está visível
em sua mente.
Os objetos no mundo não são compreendidos pelo ser humano
meramente como manifestação física. Consciente ou
inconscientemente, tendemos a imbuir de significado esses objetos
a partir da capacidade de correlacionar as coisas de maneira muito
mais profunda, em função de um aprendizado ou experiência.
FIGURA 2 – NOTRE-DAME DE PARIS (1163) EM PARIS, FRANÇA: À ESQUERDA, VISTA EXTERNA NA
MARGEM ESQUERDA DO RIO SENA; À DIREITA, VISTA INTERNA DA NAVE CENTRAL EM DIREÇÃO AO
ALTAR
FIGURA 3 – IGREJA DA PAMPULHA (SÃO FRANCISCO DE ASSIS) EM BELO HORIZONTE, MG (1943)
PROJETADA POR OSCAR NIEMEYER: À ESQUERDA, VISTA EXTERNA NA MARGEM OPOSTA DO RIO
SENA; À DIREITA, VISTA INTERNA DA NAVE CENTRAL EM DIREÇÃO AO ALTAR
A arquitetura nos move. Ela pode nos confortar ou intimidar; pode nos
iluminar ou nos mistificar; pode trazer alegria ou dilacerar nossos
corações. A arquitetura nos move ao tocar três camadas de memória.
Através do espaço primordial, ele pode tocar nosso núcleo emocionalmais profundo; evocando memórias sombrias do útero, da caverna, da
floresta e da luz. Pode lembrar memórias da cultura ou nosso lugar no
mundo histórico. As memórias pessoais adicionam sobreposições de
significados subjetivos, pois os edifícios são associados a eventos em
nossas vidas146.
Muitos espaços são projetados com o intuito de evocar
respostas emocionais das pessoas em um nível inconsciente. Entrar
em uma igreja gótica do século X, por exemplo, – independente de
sua crença – carrega um conjunto de significados nos elementos
construtivos e no arranjo espacial do lugar. A arquitetura medieval
considerava que “a concepção do plano e do espaço – e, portanto, a
decoração – tem somente uma medida de caráter dinâmico: a
trajetória do observador”147. A passagem do ambiente externo para
o interno se dá pelo átrio, com um mezanino acima, o que “contrai” e
escurece o vazio por onde passamos. Isso cria uma justaposição
entre átrio e nave, sendo nossos olhos direcionados para o fundo do
edifício, onde se localiza o altar-mor, que atrai e orienta o percurso
(Figura 2).
Consideremos agora uma igreja modernista do século XX.
Mesmo com as mudanças de escala e forma, sendo as construções
feitas em momentos da história da humanidade com um milênio de
diferença, a configuração espacial e a presença de elementos-chave
proporcionam uma experiência “semelhante” do espaço, onde as
referências espaciais simbólicas estão presentes em ambos os
edifícios. Na Igreja da Pampulha em Belo Horizonte, MG (1943)
projetada por Oscar Niemeyer, existe a contração entre interno e
externo, o átrio mais escuro e a orientação do arranjo espacial. Com
essas referências, o indivíduo é capaz de saber para onde ir e o que
fazer neste ambiente (Figura 3).
Se você teve a oportunidade de entrar em uma igreja medieval,
quando for visitar outra igreja – mesmo que de época diferente –,
essa primeira experiência estará registrada em sua mente. Essa
memória é capaz de despertar uma reação fisiológica por recordar
de todas as experiências sensoriais daquele momento. Esse
processo é cognitivo – imagens mentais organizadas em um
processo de pensamento – e lida com aspectos das suas
experiências anteriores. Essas avaliações cognitivas podem incluir
relacionamentos pessoais ou outras situações, sendo derivados e
guiados por disposições mantidas na memória de cada indivíduo148.
A arquitetura se comunica com as pessoas a partir do que é
conhecido em função de seus hábitos e cotidiano. A probabilidade
delas de sentir emoções específicas na vivência da arquitetura
aumenta à medida que o projetista seleciona símbolos familiares
naquela sociedade, ou comunidade, que possui um repertório
específico.
Quando se consideram os fatores que contribuem para a
configuração de um ambiente, tendemos a pensar nas
características espaciais que o definem, como a composição de
elementos ou marcos proeminentes, em conformação com os
caminhos que podem ser percorridos ao se mover pelo espaço.
Essas características influenciam a forma e a função de um
ambiente e cada uma contribui para diferentes aspectos da
percepção espacial e da memória.
Para tanto, redes neurais no córtex pré-frontal149 reagem de
maneira automática e involuntária aos sinais que surgem do
processamento das imagens que estão sendo captadas. A resposta
do córtex pré-frontal vem por representações que “lembram” de
como certas experiências anteriores aconteceram, interligadas com
as respostas emocionais à época. Como cada indivíduo tem um
conjunto de memórias diferentes, isso faz com que essa reação a
uma nova experiência semelhante seja “personalizada” para cada
pessoa.
O PROJETO DA EXPERIÊNCIA
As sensações e sentimentos que se criam com a arquitetura
são variações biológicas produzidas pela experiência de vivenciar o
ambiente construído. Quando o ser humano nasce, já estão pré-
programados em seu cérebro mecanismos automáticos de
sobrevivência, um conjunto de reações fisiológicas que regulam o
metabolismo e criam respostas instintivas a diferentes estímulos. À
medida que se desenvolve, a criança passa a receber informações
sobre estratégias sociais por meio da educação e da cultura.
Estabelecemos padrões amplamente conhecidos: a curva que
representa a mulher; a linha horizontal que fala de estabilidade; ou a
linha vertical que remete à altivez. Esses são padrões que possuem
uma interpretação específica e inerente, muito porque assim o
criamos. Logo, quando na fase adulta, o indivíduo tem mais chances
de se comunicar e sobreviver (objetivo evolutivo da espécie),
desenvolvendo uma noção do eu150.
Uma vez que a arquitetura funciona como a representação de
uma sociedade em um determinado local e em um momento
temporal específico, o ambiente construído passa a representar
essa noção de eu coletivo, transmitindo o pensamento de uma
época. O arquiteto Christian Norberg-Schulz, em seu livro Genius
Loci, afirma que a arquitetura é a concretização do espaço
existencial, que se configura como a relação básica entre o ser
humano e seu meio151.
Esse sentido existencial ao qual ele se refere fala do abrigo no
sentido de lugar, um espaço que hoje nos referimos como tendo um
caráter distinto, com uma atmosfera própria. Ter uma experiência
significativa na arquitetura fala de uma relação inerente entre
espaço exterior e espaço interior, em consonância com nosso corpo
e mente.
O espaço é então uma organização tridimensional, que é vista e
sentida, logo, experienciada a partir do tempo. Entender as
experiências no espaço equivale a compreender as operações
mentais realizadas nesse processo. Afinal:
A percepção do corpo e a imagem do mundo se tornam uma
experiência existencial contínua; não há corpo separado de seu
domicílio no espaço, não há espaço desvinculado da imagem
inconsciente de nossa identidade pessoal perceptiva152.
O Museu Judaico de Berlim projetado por Daniel Libenskind é
um bom exemplo disso.
FIGURA 4 – VISTAS EXTERNAS DO MUSEU JUDAICO DE BERLIM, ALEMANHA (1999) PROJETADO
POR DANIEL LIBENSKIND: À ESQUERDA, DESCONSTRUÇÃO DA ESTRELA DE DAVID NA FACHADA; À
DIREITA: CORREDOR COM PAREDES INCLINADAS E PISO DESNIVELADO
FIGURA 5 – VISTAS INTERNAS DO MUSEU JUDAICO DE BERLIM, ALEMANHA (1999) PROJETADO POR
DANIEL LIBENSKIND: À ESQUERDA: UM DOS “VAZIOS” NO PERCURSO DO MUSEU, SEM
CONDICIONAMENTO DE AR E POUCA OU NENHUMA ILUMINAÇÃO ARTIFICIAL; À DIREITA: AS
COLUNAS DO JARDIM DO EXÍLIO
Construído para representar e lembrar um triste momento da
história, o edifício representa em si mesmo as experiências dos
judeus na Alemanha – continuidade, holocausto e exílio. A própria
forma é uma desconstrução da Estrela de David (Figura 4), forte
símbolo judaico, que pode também ser visto nas fachadas, como
que “rasgando” o invólucro. O nazismo com certeza partiu famílias e
vidas, e a forma representa essa memória.
Os fatos desse momento histórico são tristes e angustiantes e a
arquitetura reflete e suscita tais emoções em uma imersão sensorial,
que leva a pessoa do medo à esperança. No espaço interno pintado
em tons de cinza, o arranjo espacial é feito com passagens longas e
estreitas, remetendo ao sofrimento vivido pelos judeus por muitos
anos. Alguns corredores possuem o piso e o teto levemente
inclinados, o que dificulta o movimento já que requer um “esforço” a
mais para vencer a inclinação, e quebram com a noção de
referência, já que o espaço ortogonal que se espera não existe ali.
Há relatos de pessoas que têm respostas fisiológicas a esse
espaço, como enjoo, tontura ou angústia. Dentre estas linhas de
circulação, Libenskind criou os chamados Voids, grandes vazios
com paredes de mais de 10 m de altura. Ou seja, dentro dos
caminhos tortuosos que os judeus viveram, em muitos momentos
tudo que restava era a desesperança.
Esse é um edifício que conta uma história triste de muitas
perdas. Ao final do percurso, o visitante encontra um espaço
impactante. O Jardim do Exílio (Figura 5) é composto por pilares de
concreto ocos, em inclinação de 12 graus do plano do piso. Eles são
preenchidos com terra da cidadede Berlim, exceto o pilar central,
que contém terra trazida de Jerusalém, com plantas saindo do topo.
Esse ambiente, ao fazer uso da contraposição entre concreto e
vegetação, remete ao indivíduo o processo de exílio que salvou
muitos, mas que “desorientou” as referências de um povo que teve
que lidar com um regime violento e totalitário.
Note que a própria arquitetura tem o potencial de ensinar as
pessoas, de contar uma história. A arquitetura acaba sendo um
instrumento de educação que ensina as pessoas a enxergarem
determinadas relações entre coisas, sejam elas físicas, sejam
sociais. Não são necessárias palavras para explicar o que se sente
enquanto a pessoa explora o museu: as percepções estimuladas
pelo espaço são suficientes. O arquiteto estimula emoções
específicas, antes mesmo de se tomar consciência na percepção
física e mental para entender essa reação.
Assim, o objetivo profissional de arquitetos e arquitetas deve ir
além de meramente fazer um projeto, um edifício. Os elementos
construídos, externos e internos, funcionam como um filtro
constante entre a mente humana e o mundo que nos engloba,
sendo a arquitetura uma disciplina híbrida e “impura”153. Praticar
arquitetura exige que sejam fundidas categorias conflitantes e por
vezes irreconciliáveis, como tecnologias materiais e intenções
mentais, construção e estética, fatos físicos e crenças culturais,
conhecimento e sonhos, passado e futuro, meios e fins.
O que se vê na arquitetura contemporânea é o crescente
interesse de projetistas pelo valor da experiência e da percepção
dos sentidos no espaço construído, relacionado com a
fenomenologia154. Orientados pelos pensamentos “do realismo
específico da fenomenologia dos filósofos Edmund Husserl, Maurice
Merleau-Ponty, Edith Stein e Gaston Bachelar e do existencialismo
de Marin Heidegger e Hannah Arendt”155. Essa linha de pensamento
para o projeto pode ser considerada uma grande contribuição à
arquitetura, com obras de Steven Holl, Peter Zumthor, Elizabeth
Diller e Ricardo Scofidio e muitos outros.
Com embasamento nas teorias de Juhani Pallasmaa e Alberto
Pérez-Gómez, a fenomenologia vê a arquitetura como um
instrumento que dá ao ser humano um significado existencial, uma
vez que o espaço construído tem, além dos aspectos práticos e
funcionais, um impacto psicológico nas pessoas (percepção e
simbolismo). Independente de considerarmos uma construção
vernacular ou uma monumental, não haverá diferentes tipos de
arquitetura, mas situações diferentes que requerem soluções
diferentes, o que, inevitavelmente, irá despertar reações físicas e
psicológicas nas pessoas.
Como, então, pode a neurociência informar arquitetas e
arquitetos quanto às melhores decisões projetuais para criar uma ou
outra experiência? Para a neuroarquitetura, entender o
funcionamento do corpo e da mente, além de suas relações
intrínsecas, permite encontrar soluções projetuais customizadas
para aquele local e aquele usuário. Entender o processo de atenção
e seus gatilhos permite projetar de forma mais consciente um
espaço onde idosos precisam permanecer em alerta enquanto se
movem. É possível considerar como o arranjo espacial da sala de
aula pode afetar os processos cognitivos das crianças; ambientes
de trabalho podem ser melhorados em função de seus efeitos na
produtividade; ou ainda, ter-se o objetivo de influenciar o ritmo
circadiano das pessoas com a iluminação dos ambientes de
hospitais.
Pensar no bem-estar das pessoas é entender sua propensão a
um comportamento ou outro com mais frequência, a partir dos
estímulos que irá receber no espaço. Um projeto consciente tenta
colaborar para que o indivíduo escolha ações mais produtivas e
saudáveis. O espaço cria uma “cultura” entre as pessoas que o
utilizam, podendo potencializar o convívio ou o isolamento. Uma
cidade pode deixar as pessoas mais relaxadas ou estressadas em
função de sua morfologia urbana.
O ambiente construído controla nossas emoções muito mais do
que a nossa consciência. Continuamente reagimos a ele a partir de
padrões de memória e aprendizado de estímulos anteriores. O
hipocampo, em parceria com os núcleos da base, age para que o
indivíduo aprenda a relação entre informação sensorial e resposta
motora (ação) com base no feedback de múltiplas tentativas (do
inglês trial).
Os estudos da arquitetura atrelados à neurociência têm tentado
preencher a lacuna que existe entre arquitetura e psicologia ao
descrever alguns dos mecanismos subjacentes que explicam como
as diferenças nas características arquitetônicas causam resultados
comportamentais156. Diferentes estudos em neuroarquitetura
investigaram estilos arquitetônicos, corporificação do espaço,
contornos, altura e invólucro, ambiente construído vs. ambiente
natural, iluminação, cor, e o impacto do ambiente construído na
memória humana. Isso não quer dizer que o assunto esteja
esgotado, muito pelo contrário. Essa área de investigação começa a
ser desvelada agora, apresentando muito mais perguntas do que
respostas. Como toda ciência emergente, carece de análise e
experimentação para começar a definir um corpo teórico conciso.
134 Rasmussen, 2015, p. 8.
135 Zevi, 2009, p. 28.
136 Pallasmaa, 2011, p. 16.
137 Eberhard, 2009, p. 26.
138 Boutinet, 2002, p. 158.
139 Sistema límbico é uma unidade encefálica responsável pelas emoções e
comportamento social.
140 Geoprocessamento é o tratamento das informações digitais de dados
georreferenciados.
141 Michael Arbib. In: Tidwell, 2013, p. 47.
142 Sternberg, 2000, p. 240.
143 Fenômeno do abrasamento (kindling) é quando o cérebro desenvolve uma
vulnerabilidade ou sensibilidade por repetição de estímulos.
144 Goldhagen, 2019, p. 45.
145 Hollis, 2001.
146 Christopher Egan. In: Eberhard, 2009, p. 89. Tradução livre das autoras.
147 Pereira, 2010, p. 104.
148 Eberhard, 2009, p.93.
149 Córtex pré-frontal é uma parte do cérebro localizada no lobo frontal,
responsável pela atenção.
150 Eberhard, 2009.
151 Norberg-Schulz, 1980.
152 Pallasmaa, 2011, p. 38.
153 Juhani Pallasmaa. In: Tidwell, 2013.
154 Montaner, 2016, p. 9.
155 Montaner, 2016, p. 56.
156 Banaei et al., 2017.
A NEURO APLICADA AOS
AMBIENTES
Neste ponto da leitura, acreditamos que muitos insights já tenham
brotado aí no seu encéfalo, mas também algumas dúvidas podem
ter surgido sobre como aplicar nos trabalhos e pesquisas da
arquitetura todo esse conhecimento já abordado. Esta sessão,
dividida em quatro capítulos, vem clarear essas questões, em que
nessas notas introdutórias, já apresentamos materiais de
interessantes pesquisas.
Vamos ter como ponto de partida o fato que muito antes de nós,
outras pessoas já começaram a pensar sobre a possibilidade de
usar os estudos cerebrais para aplicações nos projetos de
arquitetura. Nem sempre foram arquitetos, pois como temos
registrado aqui, diversas áreas estão envolvidas nessa complexa
temática.
A boa notícia é que esses pesquisadores já começaram a
asfaltar a estrada, deixando-a mais segura para os que chegam,
quando compartilham conosco os resultados de seus trabalhos, em
que a leitura das reações e métricas encefálicas são obtidas a partir
de equipamentos capazes de produzir respostas confiáveis.
Como tema multidisciplinar que é, nem sempre encontramos
essas pesquisas divulgadas em periódicos, congressos ou livros de
arquitetura. Muitas vezes vamos encontrá-las na literatura
especializada da saúde, da psicologia, da neurociência, da medicina
ambiental, de sistemas de computação, dentre outras. Facilmente
identificamos também que a forte incidência desses trabalhos não
está no Brasil, embora já contemos com alguns exemplos por aqui e
que alguns deles são mostrados em capítulos específicos desta
sessão. Mesmo ainda com poucos estudos e enfrentando algumas
dificuldades, temos resultados de trabalhos brasileiros muito
interessantes, como será visto adiante.
Nessa linha, resolvemos iniciar esta sessão trazendo um pouco
do material disponível, que compilamos por meio de uma revisão
realizada em importantes bases de dados da literatura científica
especializada.Um trabalho que deu pistas relevantes para nossa
busca foi o artigo de Tulay Karakas & Dilek Yildiz157, publicado em
2020 na Frontiers of Architectural Research (disponível para
download), o qual, por meio de uma Revisão Sistemática de
Literatura (RSL), elencou um número significativo de trabalhos. Ali
foram categorizados em estudos teóricos e estudos experimentais
para em seguida serem relacionados e agrupados em conceitos
emergentes, experiência humana, recursos do ambiente construído
e técnicas de medição adotadas nessas pesquisas.
Elas foram desenvolvidas em universidades e centros de
pesquisas em países diversos e utilizam tecnologias como a
ressonância magnética funcional (fMRI), eletroencefalograma
(EEG), VR glasses (óculos de realidade virtual), eye tracker
(captação e registro de movimentos oculares), gravações em vídeo,
eletromiografia (EMG), além de aferição EDA (temperatura e
condutância de pele), frequência cardíaca e pressão sanguínea,
entre outras. Alguns desses equipamentos são mais acessíveis,
tanto em valor de aquisição quanto em maior simplicidade de uso,
sendo importante destacar a utilização de softwares que ajudam
muito na análise e entendimento dos dados coletados.
Para avaliações encefálicas, como a identificação de regiões
corticais ativadas e das frequências da ativação, a
eletroencefalografia (EEG) tem sido a mais adotada. Embora nessa
tecnologia existam equipamentos complexos com alta quantidade
de canais de captação, é possível realizar trabalhos com um número
reduzido de pontos, a depender dos objetivos definidos para seu
desenvolvimento. Também são encontradas pesquisas com
utilização de dispositivos portáteis de EEG objetivando a realização
dos registros com as pessoas em movimento.
A fim de demonstrar possibilidades de aplicação e seus
resultados, apresentamos sucintamente alguns trabalhos
encontrados na literatura consultada. Evidentemente não é nosso
objetivo esgotar o tema com esse resumido número de exemplos e
recomendamos fortemente àqueles mais entusiastas do tema uma
imersão nessas buscas e leituras.
Iniciamos tratando de uma pesquisa realizada no Reino Unido
por Anastasia Karandinou e Louise Turner158 que utilizou um
dispositivo EEG portátil – o Emotiv Systems EPOC – (Figura 1) para
examinar como dados neurofisiológicos, obtidos e registrados no
equipamento, podem ajudar a entender como o cérebro responde a
ambientes físicos em diferentes indivíduos deslocando-se em
ambiente urbano. Paralelamente ao que vai sendo captado no EEG,
a rota é também gravada em vídeo objetivando observar e analisar
a relação entre o ambiente físico e o tipo de atividade cerebral do
participante.
FIGURA 1 – DISPOSITIVO EEG PORTÁTIL BRAINWEAR® DA EMOTIV SYSTEMS (EMOTIV EPOCX)
O trabalho buscava mapear a experiência dos indivíduos em
espaços cotidianos a partir das respostas neurais encefálicas,
quando foram avaliados os resultados de 10 participantes ao longo
de quatro viagens a pé em um ambiente urbano. A análise foi
concentrada em pontos-chave de tomada de decisão para definir
caminhos. Os registros de EEG foram analisados em termos de
frequência, amplitude e distribuição das ondas, paralelamente às
respostas dos participantes a uma curta entrevista, somados às
observações por meio do vídeo do percurso. A correlação desses
dados permitiu identificar onde os participantes estiveram mais
concentrados, relaxados e calmos, ou tomando uma decisão livre
sobre para onde ir, o que possibilitou associar as escolhas às
características externas dos ambientes. As análises foram
realizadas por um arquiteto e um neurocientista.
Algumas respostas foram buscadas na condução da pesquisa,
por exemplo, se o nível de familiaridade com um local tem impacto
detectável sobre a atividade encefálica dos participantes; se há
diferenças entre os registros de cada participante ao cruzar uma
rua, ou esperar nos semáforos de pedestres; como o encéfalo
responde às partes mais tranquilas do percurso e às mais agitadas;
numa estratégia de wayfinding como o encéfalo reage às tomadas
de decisão.
Outra pesquisa pertinente ao nosso tema mostra os resultados
obtidos a partir de uma conjugação de esforços entre pesquisadores
em rede internacional159, que partem da premissa que para
compreender o impacto das formas arquitetônicas tridimensionais
(3D) naturais, é essencial perceber as formas de diferentes
perspectivas. Foram planejadas possibilidades a partir das formas
extraídas de imagens de interiores residenciais e construídos
modelos de quartos em 3D. Para investigar a atividade encefálica
durante a visualização 3D dos ambientes, foi registrando o
eletroencefalograma (EEG) dos participantes enquanto eles
caminhavam naturalmente por diferentes formas de interiores em
realidade virtual (VR)160.
Esse estudo investigou a dinâmica do cérebro humano
relacionada ao impacto afetivo das formas interiores quando o
observador explora um espaço arquitetônico. Para permitir que as
experiências sejam as mais realistas possíveis, os participantes se
movimentaram nas salas, percebendo formas de diferentes
perspectivas usando um equipamento de EEG móvel sincronizado
com a RV ajustada à cabeça.
No experimento (Figura 2), foi utilizado um equipamento de
eletroencefalografia de 128 canais que apresenta um grau de
complexidade elevado, mas que garante um excelente nível dos
resultados alcançados na leitura dos sinais elétricos encefálicos.
FIGURA 2 – PARTICIPANTE DA PESQUISA: À ESQUERDA, ELE CAMINHA NO LABORATÓRIO USANDO
UM HEAD-MOUNTED VR DISPLAY (HTC VIVE) E O ELETROENCEFALOGRAMA (EEG); À DIREITA,
VISÃO PRÓXIMA DO EQUIPAMENTO COM 128 ELETRODOS ATIVAMENTE AMPLIFICADOS
Na comparação das formas entre os quartos, que foram
relacionadas ao prazer e à excitação, identificou-se que os quartos
com geometria mais linear foram associados a classificações de
prazer e excitação mais baixas e os quartos com geometrias mais
curvas identificaram-se com reações de prazer e excitação mais
altas.
Os resultados do estudo mostraram também que o
deslocamento por meio do espaço leva a respostas rápidas no
córtex cingulado anterior161 que refletem uma primeira resposta
afetiva às características do ambiente. As formas curvas
apresentaram ativação de frequência Theta mais forte nessa região
e estão correlacionadas a classificações positivas mais altas em
relação ao estado afetivo dos participantes.
O córtex cingulado posterior162 e o lobo occipital mostraram
envolvimento na percepção das diferentes perspectivas e mudanças
nas profundidades da sala, não havendo diferenças perceptuais
significativas na perspectiva entre diferentes paredes do mesmo
espaço arquitetônico.
Os autores colocam que os resultados demonstraram que a
forma interior é definida não apenas pela geometria e pelas
características como tipo, localização, escala e ângulo, mas também
pela forma como o habitante vivencia esse ambiente. A pesquisa
abriu também novas perspectivas sobre o papel do córtex cingulado
anterior na experiência vivenciada nos espaços arquitetônicos. 
Em mais um estudo que selecionamos para abordar
resumidamente aqui, falamos deste163 que utilizou um rastreador
ocular, mais conhecido como eye tracker (Figura 3), para avaliar as
reações dos pesquisados ao observarem imagens de interiores, a
fim de relacionar atributos do ambiente com reações emocionais. O
experimento foi conduzido a partir da projeção de placas que
continham padrões de interiores relacionados à iluminação, à
proporção, ao layout de mobiliário e ao esquema de cores de uma
sala, bem como à sensação de conforto e segurança mental.
FIGURA 3 – PRODUTOS UTILIZADOS PARA RASTREAMENTO OCULAR: (I) HEAT MAP PRODUZIDO
PELA AVALIAÇÃO; (II) ÓCULOS COM RASTREADOR OCULAR; (III) RASTREADOR OCULAR DE APOIO
EM TELA
O artigo apresenta os resultados mostrando que vários arranjos
do espaço e de cores vistos pelos pesquisados provocaram
diferentes respostas emocionais, confirmadas por parâmetros de
reação da pupila, medidos pelo dispositivo de rastreamento ocular.
O estudo relata a relação entreas mudanças no diâmetro da pupila
com as reações emocionais dos sujeitos, confirmando a efetividade
do uso do rastreamento ocular na avaliação de projetos
arquitetônicos, possibilitando avaliação do impacto no bem-estar e
na saúde dos usuários.
Os trabalhos que trouxemos aqui são uma pequena amostra do
que a literatura especializada nos oferece. Já existem muitos
experimentos usando a neurociência na prática para as questões de
ambientes e projetos arquitetônicos e precisamos nos abastecer
com a riqueza de detalhes disponibilizados. Também foram
localizados estudos que utilizaram fMRI, mas devido à
complexidade e ao custo do equipamento, geralmente realizados
em hospitais e grandes laboratórios, demos preferência a citar o uso
do EEG, da RV e do eye tracker.
Como informado anteriormente, já contamos com experiências
brasileiras na aplicação dessas ferramentas nos estudos da
neuroarquitetura, ainda que com poucos registros. Os trabalhos que
abordamos a seguir expõem algumas dessas experiências. A
primeira reúne pesquisadores de duas universidades nordestinas
(UFRN e UFPB) e uma no Sul do país (UFSC) em uma experiência
que utiliza o eye tracker na perspectiva de validá-lo como
instrumento que permite conhecer a percepção do usuário na
definição de rotas e tomada de decisão.
O artigo164 consultado apresenta uma pesquisa desenvolvida
com objetivo de identificar o foco de atenção visual em pessoas com
deficiência motora usando o eye tracker. Para realizar a experiência,
o trabalho contou com uma pessoa cadeirante e um usuário de
prótese na perna realizando um trajeto interno em edificação de uso
público. Os autores apontam que “os resultados indicam que a
ausência de informação visual dificulta que as pessoas localizem e
identifiquem a rota correta para o deslocamento dentro de um
edifício, e o uso de tecnologias assistivas diminuem a subjetividade
na tomada de decisões para tornar os ambientes acessíveis”.
As análises dos dados (por softwares especializados) obtidos
pela utilização do equipamento mostram que os participantes não
fixaram o olhar em pontos específicos, visto que procuravam por
informações visuais na edificação. A ausência da sinalização gerou
falta de orientação e dificuldades para definir a rota certa para o
alcance do objetivo de destino.
Os participantes não conheciam o local e o experimento
analisou os caminhos de varredura, mapas de calor (heat maps),
desempenho de indicadores e gráficos, a partir da identificação do
olhar para um conjunto de busca visual e tarefas de seleção usadas
pelos participantes para obter orientação visuo-espacial no edifício
(sem instruções de rota específicas). Os pesquisados poderiam
solicitar informações a pessoas que encontrassem no trajeto.
Essa experiência validou a efetividade do equipamento para
contribuir na tomada de decisão dos profissionais de projetos para
tornar os ambientes acessíveis, além da possibilidade de serem
usados na análise de diversas tarefas, contribuindo no design, no
projeto de arquitetura e na engenharia. É importante destacar que
na revisão de literatura realizada no âmbito desta pesquisa, muitos
outros trabalhos utilizando equipamentos de rastreamento ocular
foram localizados. Neles podem ser encontradas outras
possibilidades para utilização dessa tecnologia, além das duas
aplicações que trouxemos neste texto.
A partir dessa apresentação resumida das pesquisas
demonstradas nesses artigos, todas publicadas em veículos
especializados na divulgação da pesquisa científica, queremos
estimular os nossos leitores para o estudo desses que se encontram
referenciados neste livro e outros mais que possam acessar.
As pesquisas abordadas em maior detalhe nos capítulos
seguintes têm participação direta de autoras desta obra, sendo
assim mais bem explicadas e apresentadas com maior riqueza de
detalhes, tanto na condução metodológica quanto na exposição dos
resultados.
157 Karakas & Yildiz, 2020.
158 Karandinou & Turner, 2018.
159 School of Architecture and Environmental Design, Iran University of Science
and Technology; Department of Psychology, University of Tehran, Tehran, Iran;
Department of Psychology and Ergonomics, Berlin Institute of Technology, Berlin,
Germany; Center for Advanced Neurological Engineering, University of California,
United States; School of Software, University of Technology Sydney, Australia.
160 Banaei et al., 2017.
161 Parte frontal do córtex cingulado é a região responsável por regular tanto
funções autônomas, como a pressão sanguínea, quanto cognitivas, como a
emoção e o aprendizado.
162 O córtex cingulado posterior tem como principal função a orientação
visuoespacial.
163 Tuszyńska-Bogucka et al., 2020.
164 Merino et al., 2018, p. 07.
NEUROARQUITETURA EM
AMBIENTES RESIDENCIAIS
A compreensão dos mecanismos cerebrais e seu envolvimento na
cognição humana concorrem para o entendimento da percepção
dos ambientes físicos. Quanto mais se conhece sobre a maneira
como o cérebro interpreta os estímulos sensoriais e as sensações e
emoções provocadas ao experienciarmos um ambiente, tantos
novos direcionamentos são apontados e agregados à área
emergente vinculada à neurociência e à arquitetura.
Se a figura humana e o ambiente interagem e são influenciados
em uma relação de reciprocidade e a máxima da arquitetura é a
criação dos espaços (aqui expresso de modo bem minimalista),
entendemos que o comportamento também é influenciado pela
arquitetura. Nesse caso, é possível que o ambiente afete
diretamente o modo como nosso inconsciente reage frente aos
estímulos, sem que parte desse impacto seja percebido
conscientemente. Mesmo que de modo inconsciente, a arquitetura
representa uma forma de linguagem em diálogo constante e
interativo entre as pessoas e o ambiente, seja por funcionalidade,
seja por valores estéticos, seja por culturais165. Portanto, é fato que
os espaços físicos são determinantes, não apenas à realização de
atividades, mas, principalmente, quanto aos sentimentos gerados
por esses lugares aos usuários.
Seguindo esse raciocínio, sabemos que não comandamos
sensações ocasionadas em nosso inconsciente e o papel
preponderante que o espaço exerce sobre tal situação em seus
usuários. Isso significa que todos esses sentimentos podem ser
verbalizados pelas pessoas ao serem questionados, sem sequer
serem expressos – ocorrendo por falta de conhecimento do fato ou
mesmo por não querer comunicar seu verdadeiro motivo. É como se
algo nos impedisse de externar a experiência com o ambiente –
vergonha, medo, falta de vontade e até mesmo de atingir o que de
fato acontece.
De outro modo, vimos que por meio de técnicas de imagens, é
possível identificar áreas do cérebro ativadas por meio da execução
de tarefas predefinidas (ação). Portanto, temos como identificar a
correspondência entre pensamento e visualização? Indagando isso,
como a neuroarquitetura pode atuar como elemento de suporte à
concepção de ambientes agradáveis, seguros e que suscitam o que
há de melhor em nós? Afinal, o que todos queremos é permanecer
em ambientes prazerosos, com estética primorosa e que nos tragam
bem-estar.
Nessa linha de adequação e qualidade espacial, o Grupo de
Pesquisa em Ergonomia Aplicada ao Ambiente Construído da UFPE
tem desenvolvido trabalhos e, a partir da tese “Percepção de salas
residenciais por idosos – uso das técnicas de Seleção Visual,
Realidade Virtual e Eletroencefalografia” defendida no início de
2018, passou a inserir a neurociência em suas pesquisas.
Assim, a pesquisa discute as relações entre o usuário idoso, as
preferências ambientais e as qualidades afetivas relacionadas aos
ambientes residenciais de sala. Encontra direcionamentos na
neurociência aplicada à arquitetura, por intermédio da
eletroencefalografia, assim como na utilização da tecnologia de RV
como elementos inovadores, conjugados na busca do entendimento
das preferências voltadas ao ambiente. Por meio da percepção
ambiental, apoiou-se na técnica de Seleção Visual166 para o
reconhecimento de preferências ambientais e qualidades afetivasdo
usuário idoso relacionadas ao ambiente residencial de sala.
Dito isso, antes mesmo de expor a pesquisa propriamente dita,
vamos aqui trazer em linhas gerais o cenário que envolve a
temática.
“Velhice não é doença”167. Entretanto, requer um olhar mais
aguçado quando a questão é o espaço habitado por pessoas da
terceira idade.
Aos ambientes físicos de moradia é remetido o conceito de
identidade do lugar com a criação de vínculos emocionais e afetivos,
além de representações concretas e simbólicas, impondo ao espaço
o sentido de lugar, a partir das experiências e vivências de seus
usuários. Esse sentimento de espaço físico, convertido em espaço
significativo para o indivíduo, é tido como um dos mais relevantes no
processo de interação das pessoas com o ambiente168.
No âmbito residencial há que se considerar a natureza dos
ambientes e dimensões mínimas estabelecidas em legislações,
associadas ao aspecto afetivo do usuário, como objeto central,
atentando para a emoção causada pelo ambiente ao fazer parte do
sistema de ocupação e vivência dos espaços. Essa preocupação é
importante para usuários idosos que por força do curso vital
apresentam alterações cognitivas, funcionais, sensoriais e motoras.
Essas alterações exercem impacto direto na realização das
atividades, sobretudo em ambientes residenciais onde são
requeridos espaços físicos com adequação dimensional para as
áreas de natureza física (espaço livre e zona de alcance) e de
natureza visual (campo de visão horizontal e vertical).
Ainda com relação aos ambientes residenciais vivenciados por
idosos, o conhecimento das respostas comportamentais e dos
atributos dos espaços identificados por seus usuários permitem
compreender de que modo a pessoa idosa interpreta seus espaços,
contribuindo, assim, para uma melhor adequação e qualidade
espacial. Sobre os ambientes físicos internos, as pessoas
demonstram quatro níveis de respostas aos espaços: sentimentos
sobre ele (julgamento sobre o espaço); sentimentos nele (estado de
humor sobre o ambiente); pensamentos sobre ele (significado e
características do ambiente); e comportamento169.
Em direção paralela, rapidamente a tecnologia ganhou espaço
no campo das pesquisas gerando a visualização de ambientes
virtuais em 3D de modo interativo em tempo real por meio da
realidade virtual. As interfaces cada vez mais intuitivas tornaram
mais fáceis a representação do imaginário, assim como do ambiente
real, permitindo interações mais naturais, extrapolando os limites
físicos do display de imagens170. Constituindo-se em processo que
visa à influência recíproca entre ambientes sintéticos e computador,
os sistemas de RV se apoiam nos princípios da imersão, interação e
envolvimento, por meio da integração de interface ao corpo ou ao
ambiente em que está o usuário.
Contudo, apesar de todo avanço tecnológico, a interação do
sistema humano-virtual não permite uma reprodução fiel das
sensações produzidas pelo cérebro e em conjunto com o sistema
sensorial, no sentido de identificar de modo exato o imaginário do
mundo virtual e a imagem real. Diante de tais perspectivas, o uso da
tecnologia de visualização tridimensional de objetos e espaços tem
sido cada vez mais requisitado em situações e contextos diversos
de pesquisa, permitindo a criação de ambientes em busca de
vivências múltiplas em campos multidisciplinares e com objetivo
comum. Sua aplicação também tem se prestado como elemento de
correção (e até de predição) de inadequações espaciais em
observação comportamental e neurofisiológica da mente e do
cérebro de pessoas em situações que possam comprometer sua
segurança ou mesmo em contextos declaradamente inapropriados.
De outro lado, encontramos o cenário da pesquisa – a moradia.
Esse espaço diferencia-se então da habitação pelo vínculo afetivo e
territorial, carregado de identidade que seus moradores imprimem
aos espaços, em contraponto à simples estrutura física de
edificação. Conceitos de territorialidade, espaço pessoal e
privacidade são associados aos espaços da moradia e com reflexo
em aspectos diversos que envolvem objetos, mobiliário e arranjo
espacial (layout), revestimentos e até a frequência de uso espacial.
A sala de estar é classificada como ambiente de permanência
prolongada, com a função de “estar e lazer”, onde são
desenvolvidas várias atividades, além de guardar a intimidade das
pessoas. Portanto, entendemos que esse espaço residencial é vital
no cumprimento das necessidades diárias do idoso, diante da
dinamicidade de seu cotidiano e da redução dos alcances espaciais
para o desenvolvimento das atividades de vida diárias.
Paralelamente, a moradia envolve várias perspectivas:
características psicossociais e culturais, preferências, escolhas e
satisfação para a constituição do lar, aspectos físicos (cor, forma,
textura, revestimentos etc.), dimensionamento e layout, entre outros,
todos fundamentais para a adequação espacial e repercutindo no
bem-estar, segurança e conforto de seus usuários.
Podemos pensar, então, que o conhecimento das respostas
humanas insere diretamente o usuário no contexto participativo da
criação, propiciando ambientes mais adequados. Desse modo, com
objetivo de contribuir para a qualidade espacial de salas residenciais
vivenciadas pelo usuário idoso, a presente pesquisa extrai
preferências ambientais e confronta atributos com a geração de
sensações provocadas por meio dos pilares de imersão, interação e
envolvimento da RV, amparada pela neurociência no uso de EEG –
com uma equipe de profissionais especialistas em neurociência,
para a aquisição e interpretação dos sinais elétricos cerebrais
coletados.
DEFINIÇÕES INICIAIS DE PESQUISA E OS AGENTES SELECIONADOS
Conseguir extrair a maneira como o usuário percebe o espaço é
uma tarefa desafiadora. Quando esse indivíduo é uma pessoa
idosa, o fato adquire uma dificuldade a mais por lidar com
características específicas da idade. Ao ser incentivado a se
expressar sobre ambientes, mesmo com o cognitivo preservado, a
maioria dos idosos tende a demonstrar carência de fala e de escuta,
mencionando diferentes aspectos, mas sem referências diretas ao
espaço. Assim, a maior inquietação recaiu sobre a confirmação da
percepção dos idosos. Sim, isso mesmo: como saber se o que eles
relatam é o que eles percebem?
Perseguindo respostas à nossa apreensão, entendemos que
para atestar a verbalização dos idosos decorrente dos ambientes
precisaríamos antes de tudo saber o que eles esperavam de um
ambiente. Desse modo, o estudo foi dividido em 2 partes (Figura 1).
FIGURA 1 – ESTRATÉGIA METODOLÓGICA DO ESTUDO SOBRE A PERCEPÇÃO DE SALAS
RESIDENCIAIS DE IDOSOS
Na primeira etapa, foram reconhecidas, por meio de estímulos
visuais estáticos (fotografias), as preferências quanto aos espaços e
identificados os atributos – desejáveis e os não desejáveis – pelos
usuários idosos para os ambientes residenciais de sala. A segunda
etapa tratou de simular ambientes em Realidade Virtual (estímulos
visuais dinâmicos), a partir dos resultados da primeira etapa,
averiguando por meio do EEG as emoções dos idosos sobre as
imagens tridimensionais
A pesquisa teve aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em
Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de
Pernambuco (CEP-PE) e só após a chancela do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido que se iniciou a coleta de dados.
Como critérios de inclusão foi estabelecido que o participante
deveria ter 70 anos ou mais, preservação de função cognitiva, ser
funcionalmente independente e não apresentar visão monocular
devido à necessidade de presença de característica binocular para
visualização das imagens de RV.
Assim sendo, os idosos foram submetidos ao protocolo de
rastreamento cognitivo do Mini Exame do Estado Mental (MEEM),
apresentando escore válido para o nível de escolaridade adquirida
de cada participante. Também foram aplicados os protocolos de
Katz e a escala de Lawton-Brody para avaliação da funcionalidade
dos participantes, com resultado favorável para nível de
independência máxima narealização de atividades de vida diária
(AVD) e para as atividades instrumentais de vida diária (AIVD).
Participaram ativamente da primeira etapa da pesquisa, 7
idosos, com idade variável entre 71 e 85, do sexo masculino e
feminino, e pertencentes a universos distintos quanto ao nível
socioeconômico e cognitivo. De acordo com a cláusula de
anonimato determinado pelo CEP-PE, os idosos voluntários
passaram a ser identificados pela letra I, seguido de numeral ordinal
de 1 a 7.
O corpo amostral de imagens foi conduzido de modo aleatório e
por indicação, sendo selecionadas ao todo 12 moradias de
diferentes tipologias (casa e apartamento) e dimensionamentos de
área física. As moradias foram identificadas pela letra M seguida de
numeral ordinal sequenciadas de 1 a 12, de acordo com o momento
da adesão do morador idoso à pesquisa.
Apresentada no padrão bidimensional (fotografia), impressa em
cores e no tamanho 10 x 15 cm, a amostra dos estímulos visuais
estáticos selecionados era um total de 24 imagens de salas
residenciais, após análise e triagem para a seleção das imagens
mais representativas para a investigação. Os registros fotográficos
impressos receberam em seu verso numeração de 1 a 24 e
posteriormente analisados segundo o número de elementos em
suas composições e categorizados para os níveis de complexidade
baixa, média e alta.
Iniciando a primeira etapa da investigação, foi solicitado a cada
um dos idosos participantes selecionar e classificar em ordem
decrescente de preferência (da maior à menor opção) e de acordo
com critérios especificados por eles para essa escolha, 5 estímulos
visuais estáticos (ambientes de sala residencial) de um universo
composto por 24 imagens apresentadas.
Para cada uma das imagens selecionadas foi solicitado ao
idoso apontar para cada fotografia o critério que o fez eleger a
imagem, bem como verbalizar os aspectos positivos e negativos
relacionados a cada uma das imagens. Ao final, as preferências
foram categorizadas e sintetizadas em um quadro e, após análise,
foram identificadas as 3 imagens mais citadas como de maior
preferência, assim como os critérios de seleção adotados e atributos
mais citados como desejáveis e não desejáveis em ambientes de
salas residenciais.
De acordo com a ordem de preferência, as salas residenciais
mais recorrentes corresponderam a uma de baixa complexidade,
seguida de uma imagem com alta complexidade e, por último, uma
classificada como nível médio de complexidade. Portanto, essas
imagens foram manipuladas e transformadas em estímulos visuais
dinâmicos (RV), que em associação a uma técnica de Neurociência
(EEG) buscaram identificar correspondência entre o perceber
(emoção provocada) e o verbalizar a experiência real sentida, em
exploração às respostas inconscientes.
DEFINIÇÃO E CARACTERIZAÇÃO PARA A MODELAGEM DE AMBIENTES 3D
Para visualização tridimensional das imagens das salas
residenciais, foi adotada a técnica de Realidade Virtual imersiva,
com a utilização dos óculos Gear VR, marca Samsung, em uso
simultâneo de equipamento de eletroencefalografia wireless. Quanto
à modelagem dos ambientes, foi utilizado o programa de
modelagem SketchUp para a criação dos ambientes tridimensionais,
mantendo a estrutura física (planta baixa) original das salas
selecionadas, que foram registradas graficamente em padrão
bidimensional (2D) assistido pelo software AutoCAD.
À modelagem das imagens de RV (ambientes simulados) foram
acrescentados ou suprimidos elementos dos ambientes
selecionados (ambientes reais), de acordo com os requisitos mais
desejados pelos idosos entrevistados para os espaços avaliados na
etapa anterior com a técnica de seleção visual, acarretando em
nova classificação quanto ao nível de complexidade, diferentemente
daquele classificado originalmente (Figura 2).
FIGURA 2 – PROPOSIÇÃO DE CARACTERÍSTICAS PARA AMBIENTE DE SALA DA M-11 SIMULADO
PARA O NÍVEL DE COMPLEXIDADE BAIXA
A moradia M-4 (casa), que foi classificada inicialmente como de
baixa complexidade após manipulação dos elementos compositivos
do espaço, passou a ser reconhecida por RV nº 1 e classificada
como de alta complexidade. A moradia M-11 (RV nº 2) categorizada
como de média complexidade passou a ser de baixa, enquanto que
a moradia M-10 (RV nº 3), identificada como de alta complexidade,
foi manipulada para complexidade intermediária (Figura 3).
FIGURA 3 – AMBIENTE DE SALA DA MORADIA M-4 (DIREITA), M-11 (CENTRO) E M-10 (ESQUERDA)
Do grupo de sete idosos entrevistados na etapa anterior de
aplicação da técnica de Seleção Visual, apenas 5 idosos (I-1; e I-2;
I-4; I-6 e I-7) se disponibilizaram para avaliar a percepção dos
ambientes simulados por meio da técnica de RV associada ao
equipamento de EEG. Para esse grupo, os voluntários
apresentaram idade entre 75 e 81 anos, com níveis de escolaridade
distintos e de ambos os sexos. Apesar de principiantes no uso de
óculos de RV, os idosos se mostraram receptivos e tranquilos, não
externando constrangimentos ou desconforto algum com o uso.
REALIDADE VIRTUAL E EEG: O RELATADO E O PERCEBIDO
Os sinais elétricos cerebrais foram captados de forma não
invasiva utilizando o amplificador Neurobox (neuroUP, Recife,
Brasil), com comunicação Bluetooth 3.0 ao computador e com taxa
de amostragem de 250 Hz. Esse aparelho foi conectado à touca
elástica neuroCAP (neuroUP, Recife, Brasil), que contêm oito
eletrodos de Ouro (Au), posicionados de acordo com o Sistema
Internacional 10-20, com referência no processo mastoide esquerdo,
com um eletrodo ground na posição AFz, e utilizando um gel
eletrolítico (Electrogel) para facilitar a condução do impulso elétrico.
Para cada idoso pesquisado foram efetuadas 3 aquisições –
relativas a cada uma das RVs visualizadas, totalizando 15 eventos,
com tempo de aquisição de dois minutos por tarefa.
A convocação dos idosos foi feita em ordem aleatória, contudo
predefinida antes da chamada, assim como a ordem de visualização
das imagens 3D para cada um dos idosos pesquisados. Dessa
maneira, os voluntários ficaram referenciados como Idoso I-1, I- 2, I-
3, I-4 e I-5, enquanto que as imagens em 3D foram reconhecidas
por: RV nº 1 – imagem simulada tridimensional de baixa
complexidade; RV nº 2 – imagem simulada tridimensional de média
complexidade; e RV nº 3 – imagem simulada tridimensional de alta
complexidade. O processo para a visualização das 3 imagens
tridimensionais, por meio dos óculos Gear VR com o celular modelo
S7 da marca Samsung, associada à captura de impulsos elétricos
cerebrais por intermédio de touca neuroCAP foi semelhante para
todos os idosos.
Foi visível a ansiedade dos voluntários idosos, não de modo
negativo, mas decorrente da expectativa em participar de algo novo
e tão inovador.
Cada um deles foi convidado a sentar e acondicionar
corretamente o equipamento de EEG e após a estabilização dos
sinais cerebrais, permanecer com olhos fechados (30 segundos) até
o comando para sua abertura. De olhos abertos, os idosos
observaram cada uma das imagens 3D por 2 minutos, em silêncio e
sem movimentações bruscas, para familiarização da imagem e do
equipamento. Nesse intervalo, foram capturadas as ondas elétricas
cerebrais para comparação do envolvimento de cada idoso com
cada uma das imagens visualizadas, assim como entre os idosos
por cada imagem (Figura 4).
FIGURA 4 – IDOSOS PARTICIPANTES DA PESQUISA COM ÓCULOS RV E TOUCA DE EEG
Após esse tempo, iniciaram-se as verbalizações livres com
relação às impressões sobre o estímulo visual dinâmico, sendo todo
o processo de aquisição e manifestações verbais gravados e
filmados para posterior transcrição e análise dos dados.
PROCESSAMENTO DE SINAIS DE EEG
Os sinais elétricos cerebrais captados pelo EEG devem passar
por uma série de processamentos com o objetivo de melhorar a
relação sinal-ruído, de forma que se possa fornecer as informações
representativas em relação aos sinais gerados pelo organismo.
As aquisições passaram por pré-processamento dos sinais
eletroencefalográficos, realizado no programa MATLAB com a
ferramenta EEGLAB.Foram aplicados filtros do tipo butterworth
passa-banda na faixa entre 1 Hz e 50 Hz e também um filtro Notch17
1 em 60Hz. Além disso, foi calculada a re-referência digital utilizando
a média comum de todos os canais. Trechos com amplitudes
maiores que 100 mV e com amplitudes maiores do que 50 mV na
faixa de frequência entre 20-35Hz foram automaticamente
rejeitados.
Em seguida, foi aplicada a Análise de Componentes
Independentes (ICA) por meio do algoritmo RUNICA, com o objetivo
de separar componentes relacionados com artefatos biológicos e
não biológicos. A rejeição dos componentes foi realizada de forma
semiautomática com o algoritmo Multiple Artifact Rejection Algorithm
(MARA), que calculou a probabilidade de esses não serem
relacionados aos sinais cerebrais de acordo com critérios como
topografia, análise espectral e desvios da normalidade.
Os sinais cerebrais obtidos durante as visualizações das
imagens 3D foram decompostos em ritmos Alfa, Beta, Theta, Gama
e Delta usando a análise matemática de tempo-frequência para
calcular os biomarcadores de Valência Emocional, índice de
Memória e índice de Atenção.
A seguir, apresentamos os resultados das aquisições dos sinais
cerebrais por meio do EEG que foram captados em visualização
simultânea aos estímulos visuais dinâmicos (imagens 3D), para os
biomarcadores de Valência Emocional, Índice de Atenção e Índice
de Memória. Para uma melhor compreensão visual dos gráficos foi
adotada a cor azul para a RV nº 1 (baixa complexidade), a cor verde
para a RV nº 2 (média complexidade) e a cor roxa para a RV nº 3
(alta complexidade).
BIOMARCADOR DE VALÊNCIA EMOCIONAL
Localizado no córtex frontal (FC172), o centro do pensamento e
das emoções é considerado o controle encefálico. Essa medida tem
como objetivo mensurar a assimetria do FC.
O cálculo é realizado por meio dos eletrodos F3 e F4 (próximo
ao córtex dorsolateral pré-frontal). Esses sinais são transformados
pela potência espectral no ritmo Alfa, realizando a subtração entre
os eletrodos direito e o esquerdo (F4-F3). A interpretação é que
valores negativos refletem emoções de valência negativa e valores
positivos indicam emoções positivas. O hemisfério direito tem a
tendência de processar emoções negativas de evitamento
(withdraw), enquanto que o esquerdo é ativado por emoções
positivas de aproximação (approach).
Portanto, os dados coletados para o biomarcador de Valência
Emocional evidenciaram que o ambiente de baixa complexidade
(RV nº 1) evocou emoções positivas, e os ambientes de média (RV
nº 2) e de alta (RV nº 3) complexidade evocaram emoções
negativas, progressivamente.
Considerando que valores menores que zero representam
emoções negativas, significando evitamento, a imagem em 3D
referente ao ambiente de sala com alta complexidade (RV nº 3) foi a
imagem que registrou o maior valor negativo, portanto, não
provocando emoção positiva nos idosos investigados (Gráfico 1).
Contudo, a RV nº 1 (baixa complexidade) foi aquela que mais
positivamente evocou emoção nos idosos.
GRÁFICO 1 – AQUISIÇÕES DE SINAIS ELÉTRICOS CEREBRAIS REFERENTE AO BIOMARCADOR DE
VALÊNCIA EMOCIONAL
O resultado para a valência positiva desse biomarcador
encontra eco nas verbalizações livres, aqui transcritas, do idoso I-7
ao visualizar a RV nº 1 e expressar: “Está bonito! O ambiente é
simples e gostoso”; ou mesmo o idoso I-6, ao falar: “A sala é
interessante, não faz mal a ninguém. O ambiente é pequenininho,
mas arrumadinho”.
Com relação à RV nº 2, o idoso I-7 manifestou satisfação, mas
não euforia, indicando certa indiferença: “Está mais alegre, mais
ornamentado, de mais bom gosto. Está mais espaçoso que o outro.
Serve para você sentar e jantar e do outro lado para conversar,
tomar um vinhozinho... (sorrisos)”.
Já a imagem de alta complexidade (RV nº 3) provocou
sensação de desagrado ao idoso I-4, que afirmou: “Acho esse
ambiente pequeno. É muito acanhado; muito pequeno. A decoração
é até agradável. Cheio de quadro. Tem muita porta”.
ÍNDICE DE MEMÓRIA
Esse marcador tem ligação com o recrutamento de memória
pelo hipocampo, que é o responsável pelo armazenamento da
informação na memória de longa duração, influenciada pela emoção
e ligação com memórias anteriores173.
A frequência Theta é um ritmo gerado em regiões profundas e
de geração hipocampal. Esses sinais são transformados na potência
espectral em Theta no eletrodo T3, localizado no hipocampo
esquerdo, na área do lobo temporal. Como leitura, podemos afirmar
que a elevação desse índice indica aumento de recrutamento de
memória.
Apesar do resgate de armazenamento de memória ter ocorrido
de modo progressivo para as 3 imagens, observamos que a
diferença entre valores atribuídos para as imagens de baixa (RV nº
1) e média (RV nº 2) complexidade foi maior que aqueles referentes
ao intervalo para as imagens 3D de média (RV nº 2) e alta
complexidade (RV nº 3).
O resultado do EEG demonstra que o estímulo visual
tridimensional classificado como de alta complexidade (RV nº3) foi a
imagem que mais provocou a ativação de memórias anteriores para
o reconhecimento das informações apresentadas na Realidade
Virtual imersiva (Gráfico 2).
GRÁFICO 2 – AQUISIÇÕES DE SINAIS ELÉTRICOS CEREBRAIS REFERENTES AO ÍNDICE DE
MEMÓRIA
O discurso da idosa I-2 para a imagem 3D de alta complexidade
(RV nº 3), manifesta insatisfação expressa: “... É mais descontraído,
apesar de estar tudo entulhado. É muito enfeitado demais! O
ambiente escurece por conta do teto... não gosto do teto, não gosto
das pinturas; aqui é tudo muito excitante”. Essa verbalização vem
confirmar o resultado apresentado no Gráfico 2, acima.
Entretanto, observamos que a imagem 3D de baixa
complexidade (RV nº 1) foi aquela que provocou um menor resgate
da atividade de reconhecimento de informações anteriores. Para
esse estímulo, a idosa I-6 deixou clara sua satisfação ao visualizar a
imagem 3D de baixa complexidade (RV nº 1):
Está bonito! O ambiente é simples e gostoso. Mesa bem grande, larga.
Planta deixa tudo mais relaxante; gostei. É uma sala gostosa; só essa
janela aí bem iluminada e bem clara já dá boa impressão. Eu gosto
muito de claridade! As almofadas listradas são bonitas; poltronas
gostosas; eu vejo que é bem agradável.
ÍNDICE DE ATENÇÃO
A atenção é um processo decorrente de várias estruturas
corticais, subcorticais e redes neurais. O estado de alerta deflagra o
processo de recepção dos estímulos resultante dos órgãos
sensoriais e varia sob a forma de atenção sustentada (estado de
alerta por um período); atenção dividida (desempenho simultâneo
de tarefas); e atenção seletiva (direcionamento voluntário para
determinado interesse)174.
Esse índice tem ligação com a ativação da via de atenção no
córtex frontal (FC) e é calculado através da razão Beta/Theta no
eletrodo Cz. O ritmo Beta é gerado no córtex e é ativo em situações
de demanda de atenção, enquanto que o ritmo Theta é gerado em
regiões profundas e tem ligação com a introspecção e redução de
atenção ao ambiente. A interpretação é que esse índice é
aumentado quando o participante intensifica a atenção ao ambiente
externo.
Apresentamos no Gráfico 3, o resultado para as aquisições com
objetivo de identificar a atenção dos idosos provocada pela
visualização das imagens tridimensionais de ambientes de salas
residenciais.
O ambiente simulado com alta complexidade (RV nº 3) se
destaca como o de maior índice, portanto, o que mais atenção
despertou entre as 3 imagens tridimensionais. Contudo, analisando
esse indicador isoladamente não se pode afirmar que o parâmetro
do nível de atenção para a RV nº 3 tenha provocado mais
sentimentos positivos.
GRÁFICO 3 – AQUISIÇÕES DE SINAIS ELÉTRICOS CEREBRAIS REFERENTE AO ÍNDICE DE ATENÇÃO
Entretanto, se for analisado em conjunto com o Biomarcador de
Valência Emocional, os resultados sugerem que a imagem de alta
complexidade (RV nº 3) foi aquela que mais chamou a atenção dos
idosos, porém de modo negativo. Situação semelhante se encontra
quando comparamos ao Biomarcador de Memória, que destaca a
alta complexidade(RV nº 3) como a imagem que mais requer
resgate de experiências anteriores. Ou seja, a imagem 3D (RV nº 3)
foi avaliada por meio da aquisição de sinais elétricos cerebrais como
imagem pouco preferida pelos idosos participantes do estudo.
Esse resultado tem consonância com as verbalizações livres
promovidas pelos entrevistados, conforme as transcrições das
verbalizações do idoso I-7:
Totalmente diferente dos anteriores. Muito colorido. Essa porta aqui do
lado direito acho que é a porta de entrada. Os quadros são
pequenininhos. O tamanho da sala é meio acanhado. A sala é
pequena, aí os quadros são tudo agarradinho; tinha que distribuir mais.
Uma sala sem quadros é triste. Um quadro dá muita vida numa sala.
Cor influencia muito, (a pesquisadora perguntou: E se a parede fosse
vermelha?). Se a parede fosse vermelha seria ruim ... um ambiente
pequeno com uma parede vermelha seria muito chocante.
E o discurso da idosa I-2:
O ambiente é muito apertado... É muito pequeno o ambiente. Aqui é
uma sala. É mais descontraído, apesar de estar tudo entulhado. É
muito enfeitado demais! O ambiente escurece por conta do teto... não
gosto do teto, não gosto das pinturas, aqui é tudo muito excitante. Eu
aqui não ia ficar calma não...
E PARA CONCLUIR... CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A PESQUISA
A pesquisa apresenta a contribuição inovadora da Realidade
Virtual associada à técnica não invasiva da Neurociência de
Eletroencefalografia para a verificação de emoções do usuário ao
visualizar imagens tridimensionais manipuladas com as preferências
ambientais extraídas, a partir da técnica de Seleção Visual.
A utilização dessa técnica se mostrou eficiente no entendimento
das preferências dos idosos relacionadas aos ambientes
residenciais de sala, bem como de elementos não desejáveis, por
exemplo, o uso de tapetes, citado como agente de risco acidentário
de quedas no ambiente domiciliar. Os resultados mostraram, por
intermédio dos atributos verbalizados, que os idosos, indiferente à
idade, têm consciência dos elementos necessários para a
composição de espaços interiores adequados. Suas escolhas foram
determinadas pela condição de seu bem-estar e conhecimento de
suas limitações quanto a alterações posturais e de campo de visão,
mesmo todos sendo funcionalmente independentes. Também ficou
claro que eles se preocuparam mais com a funcionalidade,
dimensionamento e conforto dos ambientes residenciais de sala do
que com a estética espacial e de seus elementos compositivos.
Em outra direção, o uso de Realidade Virtual imersiva como
instrumento de compreensão dos ambientes físicos no
reconhecimento de preferências ambientais associado à técnica da
Neurociência (EEG) como elemento auxiliar no reconhecimento das
preferências de idosos sobre os espaços estudados se constituiu
em elemento inovador para essa investigação, que obteve
resultados bastante positivos.
A Neurociência, por meio de EEG, mostrou-se eficaz no
reconhecimento de emoções positivas do usuário idoso ao
expressar atributos subjetivos relacionados às preferências
ambientais ocasionadas por estímulos visuais dinâmicos (Realidade
Virtual).
Por fim, essa pesquisa não se propôs a comparar as
modalidades dos estímulos visuais (estáticos e dinâmicos), mas se
apropriar dos estímulos visuais estáticos para certificar, no grupo de
idosos avaliados, que os atributos mais desejáveis por eles para um
ambiente residencial de sala seriam reconhecidos em imagens
tridimensionais, em Realidade Virtual imersiva.
E nessa direção, o EEG presente nessa avaliação teve como
propósito identificar se a emoção ao vir uma imagem 3D com
características desejáveis corresponderia aos resultados
verbalizados e identificados durante a visualização dessas imagens,
em resposta às sensações provocadas pelo ambiente.
Assim como em pesquisas envolvendo a usabilidade de
produtos, o uso de EEG em ambiente construído revelou ser uma
técnica de grande potencialidade no sentido de contribuir para a
qualidade espacial em adequações de ambientes existentes, assim
como para conhecimento de parâmetros norteadores de novas
concepções projetuais.
Desse modo, entendemos a associação da utilização da técnica
de Eletroencefalografia à Realidade Virtual em espaços residenciais
com usuários idosos como elemento inovador e com grande
potencial para futuras investigações do ambiente construído de uma
forma geral, permitindo novas concepções mais adequadas do
ponto de vista ergonômico.
165 Moore, 1979.
166 Sanoff, 1991
167 Zimerman, 2000, p. 32
168 Tuan, 2013
169 Zeisel, 2006; Nasar, 2008
170 Kirner & Sisouctto, 2007
171 O filtro Notch é um filtro muito nítido que atenua certa frequência no sinal.
No EEG, um filtro de entalhe a 50 (60) Hz é usado para filtrar o ruído do sistema
elétrico na sala (Kropotov, 2009).
172 Denominação em inglês Frontal Cortex.
173 Gazzaniga et al., 2006.
174 Nahas, 2001.
EXPERIÊNCIA DA
NEUROCIÊNCIA EM AMBIENTE
URBANO
O trabalho que mostraremos neste capítulo vem sendo desenvolvido
desde o início do ano de 2019, em que parte da equipe do Grupo de
Pesquisa em Ergonomia Aplicada ao Ambiente Construído da
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) está envolvida. O
projeto foi iniciado em Fortaleza, com um grupo da Pós-graduação
em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará
(UFC)175.
Estávamos muito animados com o primeiro trabalho que havia
sido desenvolvido no grupo usando os conceitos e técnicas da
neurociência na avaliação de ambientes. A tese da Marie Monique
Bruère Paiva (uma das autoras deste livro), abordada no capítulo
anterior e que tinha usado a RV combinada com o EEG, mostrou-
nos grandes possibilidades.
Foi nesse clima de muita expectativa que formatamos a
pesquisa em que se usaria o EEG para estudos da acessibilidade
urbana e que seria desenvolvida em parceria com a professora Zilsa
Santiago da UFC, docente entusiasta e reconhecida nos estudos do
Design Universal e Acessibilidade.
É importante destacar que esses nossos trabalhos têm sido
realizados em equipes que contam sempre com neurocientistas
experientes na eletroencefalografia e principalmente nas análises
dos seus resultados. Registramos aqui um agradecimento especial
ao Dr. Paulo Nascimento do Instituto Le Santè em Fortaleza,
psicólogo, neurocientista, especialista em neurofeedback, que com
sua seriedade e alta competência tem participado dos estudos com
grande contribuição, elevando a qualidade dos trabalhos com sua
incontestável experiência.
Nesta pesquisa, temos trabalhado com a eletroencefalografia
para avaliação de navegação de pessoas com cegueira em rotas
urbanas, utilizando-se tanto a informação verbalizada quanto os
mapas táteis para definição dos trajetos. Partimos da hipótese que o
EEG nos ajudaria no entendimento da mobilidade das pessoas com
deficiência visual, contribuindo na definição de estratégias para dar
melhores condições de deslocamento e independência a essa
parcela da população.
Sabemos que é muito usual as pessoas com cegueira ouvirem
explicações de como chegar em algum lugar, mas algumas utilizam
os apps de mobilidade disponíveis para smartphones, e outras ainda
dependem de amigos ou parentes que as levam aos lugares onde
precisam estar. No entanto, nós que estudamos as Tecnologias
Assistivas (TA) e as legislações e normas de acessibilidade,
sabemos que as pessoas com deficiência precisam de autonomia
na vida diária e trabalhamos no sentido de colaborar nessa
condição. Aqueles que têm cegueira procuram aprender a leitura e
escrita Braille, o uso da bengala, fazem cursos de mobilidade e
deslocamentos, e alguns contam com a ajuda de cães-guia, na
busca de recursos que os tornem independentes.
É nesse contexto que se localiza nossa preocupação com uma
TA muito abordada em estudos e textos científicos e que está
presente em projetos de rotas acessíveis urbanas: o mapa tátil. Na
verdade, ele ainda é pouco adotado no Brasil e muitas cidades não
contam com nenhum exemplar. Muitas vezes eles são encontrados
com mais frequência no interior de edifícios como museus, terminaisrodoviários e aeroviários, shoppings centers e grandes edifícios
públicos, sendo mais raros nas vias urbanas. Essa carência faz com
que muitas pessoas cegas nunca tenham tocado em um mapa tátil e
pudemos constatar isso com as pessoas da nossa pesquisa.
Mas como exatamente o trabalho foi realizado?
Objetivando avaliar as ativações do córtex encefálico desses
indivíduos e a partir delas entender melhor como eles reagem ao
realizar um trajeto urbano, estabelecemos os passos metodológicos
(Figura 1) da pesquisa: primeiro, as pessoas recebem instruções
verbalizadas para realizar um percurso urbano definido, estando
monitoradas por EEG enquanto escutam as instruções, para depois
realizar o percurso até alcançar o destino apontado e novamente ser
avaliado por EEG; em seguida recebe um mapa tátil e nele define
seu caminho de volta ao local de origem, condicionado a passar em
um determinado ponto preestabelecido pelos pesquisadores, de
modo a não voltar pelo mesmo percurso da ida; ao final do trajeto,
novo EEG é captado.
FIGURA 1 – ESQUEMA METODOLÓGICO PARA PESQUISA DE CAMPO COM VOLUNTÁRIOS CEGOS
Esse é um estudo de casos múltiplos, com amostragem não
probabilística, acidental e, por conveniência, composta por 8
participantes com cegueira total, domínio da leitura Braille, e com
experiência de deslocamentos em vias urbanas com auxílio de
bengala. Das pessoas pesquisadas até o momento, identificam-se
100% de falta de familiaridade com os mapas táteis, o que gera
ansiedade, stress e até medo.
Como já citado, a pesquisa iniciou-se em Fortaleza, onde
tivemos uma pessoa participando no teste piloto para os ajustes
necessários, e em seguida trabalhamos com os demais
participantes. No ano de 2020, a pesquisa foi implantada também
em Recife, na UFPE com um grupo mais ampliado na equipe
executora.
É importante comentar sobre as dificuldades encontradas com
a chegada da pandemia da Covid-19. Em Fortaleza, havíamos
iniciado as coletas de dados em campo, quando na semana
seguinte tudo parou, deixando-nos muitos meses sem possibilidade
de dar continuidade aos experimentos, impactando inclusive no
número de pessoas pesquisadas. Em Recife, tivemos que utilizar
quase todo o ano de 2020 na elaboração de projetos para captação
de bolsas de Iniciação Científica, treinamento e reuniões à distância
e realização de revisões de literatura. Somente próximo ao final do
ano, realizamos em ambiente interno de um edifício da universidade
um trajeto com captação de EEG em voluntários com cegueira.
Foram quatro pessoas e após as férias de janeiro não conseguimos
mais continuar devido ao agravamento nos números da pandemia.
FIGURA 2 – REALIZAÇÃO DO PERCURSO URBANO, ONDE A EQUIPE DE PESQUISA ACOMPANHA
FIGURA 3 – VOLUNTÁRIA COM TOUCA DE EEG, SENDO INJETADO GEL CONDUTOR NOS
ELETRODOS CABEADOS
Detalhando a realização do trabalho, esclarecemos que quando
os voluntários chegavam ao Instituto Le Santè, recebiam a
explicação sobre a pesquisa e eram submetidos a um teste com
uma psicóloga, o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de
Lipp (ISSL), para logo em seguida ter a touca colocada na cabeça e
iniciada a primeira captação de EEG. Esse teste é aplicado no início
e no final dos percursos (Figura 2) a fim de identificar alterações nos
níveis de estresse nos voluntários.
Não iremos aqui descrever todos os casos estudados, mas nos
ateremos a mostrar alguns resultados que consideramos
importantes para nossos leitores.
Nesse primeiro caso mostrado aqui (o piloto da pesquisa), o
equipamento utilizado no EEG foi: touca em Neoprene com
eletrodos de Prata de lei 950, proteções com tubulações termo
retráteis, serial de 25 pinos e malha náutica; capas de eletrodos em
impressão 3D em material Tritan ht, Tesk 20 canais; softwares
especializados para leitura; gravação e disponibilização dos dados
dos eletroencefalogramas.
A touca (Figura 3) deve ficar bem ajustada à cabeça da pessoa
e em cada ponto de contato dos canais é injetado um gel condutor
que facilita a transmissão dos impulsos elétricos encefálicos
captados pelos eletrodos, que estão ligados por cabos ao
equipamento que funciona como amplificador dos sinais, para então
transmiti-los ao computador no qual são armazenados em software
específico.
CAPTAÇÃO DE DADOS ENCEFÁLICOS
Os dados coletados em um eletroencefalograma precisam ser
tratados e analisados até termos imagens geradas por softwares
específicos que possam ser mais bem entendidas por nós,
profissionais da arquitetura. Sugerimos fortemente o estudo do
capítulo Sobre a Neurociência e Suas Estruturas deste nosso livro a
fim de entender um pouco mais sobre o encéfalo. Nesse ponto,
conhecer suas regiões e as funções de cada uma delas é
fundamental para o entendimento da experiência que expomos aqui.
Embora o encéfalo trabalhe de forma sincronizada,
acontecendo tudo com muita rapidez quando as regiões se
interconectam, há características específicas para cada uma dessas
partes. Os neurônios trabalham em conjunto comunicando-se
continuamente. Quando observamos essa interação em atividade, é
possível entender que cada área trabalha uma função específica,
mas em distintas frequências das ondas encefálicas.
O encéfalo funciona por frequências elétricas definidas como
Delta, Theta, Alfa, Beta e Gama, como já abordado no capítulo
Formas de Ver o Cérebro, mas que pela natureza da pesquisa
exposta aqui, estamos detalhando mais um pouco.
Delta é a frequência de repouso, de sono profundo. Ela tem
localização difusa, o que significa que está presente no cérebro
inteiro, geralmente com olhos abertos em amplitudes mais baixas.
Com essas características, ela não apresenta importância nesta
pesquisa. Já Theta é uma frequência internalizada. É quando a
pessoa está dentro de si própria, não tem muita interconexão com o
mundo externo, apresenta geralmente comportamentos de
desatenção. Essa faixa de frequência é vinculada a devaneios,
alguns estados de meditação e geralmente é a faixa na qual se
apresentam alguns insights. É ela que se apresenta nos resgates
das memórias armazenadas na região do hipocampo.
Alfa é uma frequência considerada por alguns autores como
“frequência média”, estando ligada a um estado intermediário de
ativação, como um pouco de relaxamento. Verifica-se, então, em
Alfa, um estado de corpo relaxado, de atenção, mas uma atenção
leve e sem muitas racionalizações, sem processo de muito cálculo
nem grande planejamento, mas também sem devaneios. A pessoa
está presente na situação, mas relaxada e tranquila. Esse é um
estado geral de tranquilidade. 
Já Beta está dividida em três faixas. Beta 1 é um estado
cognitivo leve, como quando se está assistindo a uma aula,
conversando com alguém. Beta 2 funciona como um estado
cognitivo mais elaborado, como quando fazemos cálculos,
planejamentos ou elaboramos uma estruturação de raciocínio. E
High Beta está mais vinculada às funções de ansiedade, medo,
tensão, preocupação.
Por fim, Gama está vinculada às funções cognitivas. Ela é
responsável por conduzir algumas frequências no encéfalo, fato
denominado como acoplamento. No entanto, esta frequência não
será aprofundada neste estudo ora apresentado, por haver muitas
complexidades e não ser fundamental para o quadro de avaliação
desta pesquisa.
As ondas mais importantes aqui estudadas foram Alfa, Beta e
Theta. O lobo frontal e o lobo parietal são os mais trabalhados nesta
pesquisa pela função perceptiva que tendem a representar,
seguidos do lobo temporal. Em situações de grande ansiedade, é o
frontal que racionaliza e identifica situações positivas ou negativas.
Estando ele em conjunto com os parietais, está ligado no
reconhecimento da sensação. O lobo frontal é usualmente vinculado
às ondas médias e rápidas, apresentando mais Alfa e Beta-1, e
também Beta 2, quando da realização de tarefas. É nos parietais
que mais se identifica a frequência Alfa de observação e das
sensações.
Quando se observa a ocorrência de situação de estresse
gerado por ambientes, as frequências rápidas tendem a ser
identificadas nos lobos parietais,como funções clássicas de medo,
de fobia, de estresse, de irritabilidade. Nessa pesquisa, foi
observada a presença dessa frequência, uma vez que o participante
é submetido ao que o retira de sua zona de conforto, configurada na
definição do seu percurso a partir do mapa tátil, ou mesmo na
escuta do caminho que ele vai ter que percorrer.
Quando a mente reconhece o ambiente, ele logo gera uma
função e já responde a esse meio. Se esse meio for estável,
tranquilo, sem elementos que causam medo, preocupação, tensão,
observa-se a geração da imagem de um encéfalo equilibrado, com
baixo nível de ondas rápidas. Se esse encéfalo reconhece que esse
ambiente representa riscos, pode produzir alguma função de
proteção: vai aumentar as ondas rápidas, principalmente nos
parietais, occipitais e temporais. Os parietais apresentam esse
aumento para que se incremente a capacidade de percepção,
reduzindo assim as frequências rápidas dos frontais, isso porque
quando se está sob risco, o cérebro não está preocupado em
calcular, está preocupado em fugir. Esses padrões perceptivos vão
depender da história de vida do indivíduo, dos momentos que ele
passou e do que o cérebro dele reconhece desses ambientes, a
partir da ativação de suas memórias. 
Esses conhecimentos, ainda que elementares, são
fundamentais para o entendimento da pesquisa, visto que se
trabalha com a identificação das frequências encefálicas e das
ativações das regiões, na perspectiva de avaliar as sensações e
percepções dos sujeitos pesquisados frente às situações por eles
vividas.
Para a interpretação das imagens que mostram as leituras
encefálicas, que são demonstradas nas representações das
cabeças que estão adiante, devemos registrar que a cor azul forte
representa ausência de ativação e essa vai aumentando à medida
que se aproxima do amarelo, alaranjado e vermelho, que é a cor da
ativação máxima da região onde se apresenta.
As imagens a seguir foram obtidas na aplicação do piloto do
projeto e são representações de vistas de cima da cabeça da
voluntária (a quem demos o nome fictício de Maria), em que
identificamos quais regiões foram ativadas e qual tipo de onda foi
registrada mais fortemente. Na Figura 4, vemos a representação do
EEG obtido quando a pessoa estava ouvindo a descrição do
percurso que deveria fazer, sendo identificada uma ativação de
ondas lentas e médias (Delta, Theta e Alfa), dentro do padrão da
normalidade para a faixa em repouso ou pouca atenção. Já nas
bandas de frequências Beta 1 e Beta 2, houve ativação mais
significativa das áreas temporais. Com esses resultados, verifica-se
que nessa etapa do EEG, a pessoa pesquisada apresenta
processamento de função auditiva ou imagética.
FIGURA 4 – IMAGENS REGISTRADAS POR EEG A PARTIR DA ESCUTA DO PERCURSO A SER
REALIZADO
FIGURA 5 – IMAGENS REGISTRADAS POR EEG UMA VEZ QUE O PARTICIPANTE FINALIZOU A
PRIMEIRA PARTE DO PERCURSO URBANO
Sabemos que a escuta é o processo mais usual para as
pessoas cegas se deslocarem num determinado trajeto. Em via de
regra, as pessoas videntes explicam o caminho, elas memorizam e
seguem auxiliadas por suas bengalas – que é a Tecnologia Assistiva
(TA) mais usada para a caminhada. Isso pode explicar a
tranquilidade registrada, sendo apenas solicitado que fosse repetida
a instrução, a fim de melhor fixar os detalhes. Em seguida, iniciou-se
a primeira etapa do percurso.
Vencida a primeira parte, foi realizada nova gravação do EEG
(Figura 5) ao chegar no primeiro ponto de destino. Verificou-se
nesse resultado muita tranquilidade, ausência da ansiedade, com
Beta 2 baixo, Alfa baixo, um pouco de Beta 1 registrado do lado
esquerdo da cabeça, identificando-se no geral pouquíssima
alteração. O caminho foi percorrido sem dificuldades, estresses ou
erros.
A próxima etapa é bem mais complexa, quando para a
continuidade do trajeto um mapa tátil é entregue à pesquisada
informando que o segundo trecho seria definido por ela a partir
daquela TA que lhe estava sendo entregue. Nessa etapa, apenas foi
esclarecido que os pontos principais estavam identificados no mapa
(local onde a pessoa pesquisada estava, ponto de destino e um
ponto condicionante por onde teria de passar), e que o participante
deveria traçar sua rota e memorizá-la, para continuar em seguida.
As imagens da gravação dessa fase do EEG estão na Figura 6.
Ao passar a manusear o mapa tátil (Figura 7) para
entendimento e memorização da próxima etapa, o EEG (Figura 6)
começa a apresentar alterações mais fortes, com ativação em Beta
1, que indica pensamento, raciocínio, cálculo, tanto nas regiões
temporais e nas temporo-frontais, como toda a parte posterior, que é
a occipital; apresenta ansiedade em Beta 1, principalmente nas
regiões temporais, deixando evidente que ela ficou mais ansiosa,
com o cérebro trabalhando muito mais, gastando energia para
perceber e aprender o caminho.
Mapas táteis não são comumente encontrados nas cidades
brasileiras, podendo ser essa umas das explicações para o registro
da ansiedade. O receio de não ter sucesso na definição do
percurso, de não conseguir sair-se bem no trajeto causa tensão na
participante da pesquisa, mesmo sabendo ser acompanhada pela
equipe de pesquisa a todo o tempo.
FIGURA 6 – IMAGENS REGISTRADAS POR EEG A PARTIR DA MANIPULAÇÃO DO MAPA TÁTIL
FIGURA 7 – PARTICIPANTE DA PESQUISA COM A TOUCA DE EEG ENQUANTO MANIPULA O MAPA
TÁTIL
Observando os registros dos EEGs, identifica-se forte aumento
de Beta no uso do mapa tátil, com cérebro gastando mais energia,
estando mais ansiosa e, ao final do segundo percurso, quando
chega desse caminho obtido pelo mapa, ela se apresenta mais
insegura, mais preocupada, mais tensa.
Na Figura 8, em que há a gravação da linha de base da
chegada ao ponto final, percebe-se uma grande ativação em Beta 1
no cérebro inteiro, mais notadamente nas regiões temporais,
inclusive com Beta 2, indicando que foi mais complicado para ela
cumprir a tarefa nessa função. Nesse percurso, Maria apresentou
uma forte dúvida na penúltima rua a atravessar, pensando ser essa
já a última rua onde deveria dobrar logo à esquerda, quando de fato
ainda havia uma quadra a percorrer. Nesse ponto, foi preciso a
intervenção da equipe.
FIGURA 8 – IMAGENS REGISTRADAS POR EEG UMA VEZ QUE O PARTICIPANTE FINALIZOU O
SEGUNDO PERCURSO
Diferente desses achados após o percurso realizado a partir do
mapa tátil, comentamos que na fase do caminho apreendido por
intermédio da explicação por escuta, Maria se apresentou mais
tranquila, a memorização foi mais fácil e ela não demonstrou
ansiedade nem muito gasto energético encefálico, chegando no
primeiro destino até mais tranquila que na linha de base 1, quando
de sua chegada ao ambiente da pesquisa no Instituto le Santè.
Como já citamos anteriormente, não vamos descrever os
resultados de todos os participantes aqui. Tendo explicado o piloto
da pesquisa, acrescentamos mais dois casos que consideramos
importantes.
O trabalho realizado com a primeira pessoa (Maria) foi mais
bem detalhado para a explanação do passo a passo da metodologia
adotada. Para os dois descritos em seguida, mostramos apenas um
resumo dos principais resultados dos EEGs.
É importante destacar que houve uma mudança no
equipamento do EEG e por isso as imagens das cabeças que
vemos são diferentes do padrão anterior, mas mantendo o mesmo
princípio de cores para as áreas ativadas.
A PESQUISA COM JOSEFA (NOME FICTÍCIO)
Como resultados do EEG registrado na escuta do percurso
(Figura 9), verifica-se a ocorrência de Theta central, mas com
espalhamento em outras áreas, que significa um Theta cognitivo de
planejamento e memória. O Alfa dela chama atenção e vemos
também a existência de Beta 2, indicando que se ela tem bastante
Theta e também Beta bem frontal, mostrando um bom indicador de
que Josefa está processando a informação numa frequência mais
alta de Beta 2. Isso pode estar relacionado com um processo
cognitivo mais forte, como se estivesse gastando muita energia.
Frequências de Beta no córtex frontal estão vinculadas a
processamento de informação,mas pode ser também indicador de
um pouco de ansiedade. Josefa apresenta um pouco de Beta do
lado direito na região temporal, o hemisfério que tende a ser mais
vinculado com a ansiedade. Vemos mais ativação do lado direito, o
que se acredita indicar o registro de funções mais negativas,
segundo alguns autores, inclusive Richard Davidson, que criou a
teoria dos hemisférios na década de 1960.
FIGURA 9 – À ESQUERDA: JOSEFA COM A TOUCA DO EEG; À DIREITA: IMAGENS DO EEG NA ESCUTA
DO PERCURSO
Podemos inferir que Josefa estava processando as informações
ouvidas, mas estava preocupada. Registrou-se Alfa na área motora.
Ela não só estava escutando, mas estava em tempo real fazendo
mentalmente a caminhada. É como se já estivesse fazendo o
movimento. Embora sendo uma tarefa corriqueira, a de escutar e
definir caminhos, Josefa já aumenta um pouco o nível de
preocupação ou ansiedade e vemos também uma ativação
significativa na área motora neste momento da escuta, como se o
cérebro dela já estivesse traçando o caminho e até fazendo o
deslocamento. A imagética motora explica que quando se pensa no
movimento, o cérebro o realiza, mesmo sem que ele aconteça em
nível muscular.
Para os resultados do EEG registrados na definição do
percurso de volta no Mapa Tátil (Figura 10), verificamos que a
frequência de Theta se espalha no cérebro todo. Josefa começa a
recrutar várias redes de conexão cerebral para trazer as ondas Beta
com as informações. A participante nunca tinha tido um contato com
mapa tátil e começou a buscar informações de várias memórias
existentes. Quem estava trazendo essa rede eram as faixas de
Theta, recrutando várias redes de conexão para transportar
frequências rápidas para várias estruturas encefálicas, a fim de ter a
solução do problema.
FIGURA 10 – À ESQUERDA: JOSEFA COM O MAPA TÁTIL; À DIREITA: EEG OBTIDO NO USO DO MAPA
TÁTIL
Vemos o cérebro todo ativado em Theta, com Beta
processando muito no frontal. Têmporas ativadas, provavelmente
vinculadas a medo, a stress, receio se vai ou não dar certo. Também
houve ativação do córtex visual (embora seja cega, o que é muito
interessante), para perceber, estruturar o ambiente.
Mas Josefa responde bem ao estímulo, processando – meio
tensa, com certo medo –, mas buscando alternativas. O tato
aparece junto com o córtex motor. Ao final, a participante consegue
fazer o percurso muito bem a partir da memorização do caminho
que traçou pelo mapa tátil.
A PESQUISA COM JOÃO (NOME FICTÍCIO)
Observando o EEG registrado na escuta do percurso desse
rapaz (Figura 11), encontramos uma frequência de Theta presente
no córtex frontal e central indicando ativação de memória, visto que
são ondas condutoras que tendem a conduzir a memória. Ele se
mostrou muito focado nesse momento. Mas também verificamos
que ele não tem a presença de Beta (onda rápida), que indicaria o
processamento das informações trazidas da memória; ou seja, ele
não faz com que essa memória venha ao consciente. Como já
vimos, as faixas de Beta são frequências vinculadas à função de
planejamento para realização de tarefas. Ele precisaria memorizar o
caminho e realizar a função.
No entanto, o que vemos é a demonstração de que João capta
a informação, mas não processa bem. Aumenta Alfa que é uma
onda média, ligada à função “piloto automático”. É como se ele
acionasse uma memória de gravar e seguir, mas sem planejar, sem
“visualizar” o trajeto mentalmente.
Está tranquilo, mas sem planejamento. Nas imagens do EEG
não se registra ativação em Beta, o que é indicador de ausência de
atividade de planejamento, falta de uso das memórias, quando
deveria uni-las ao que está sendo ouvido, estabelecer um rumo
racional. João apresentou um pouco de dificuldade para realizar o
percurso, mas chegou ao destino.
FIGURA 11 – À ESQUERDA: JOÃO NA CAMINHADA; À DIREITA: IMAGENS DO EEG - ESCUTA
PERCURSO
Para os resultados do EEG registrados na definição do
percurso de volta pelo Mapa Tátil, verificamos que o cérebro do
João continua sem função de Beta. Ele não consegue planejar a
ação.
Embora seja possível entender que ele quer responder no piloto
automático, mas não há correspondência, ele não tem Alfa,
portanto, não desenvolve essa ativação. A diferença é grande em
relação aos demais casos. Aqui resgatamos uma teoria chamada de
familiarização. João não estava familiarizado, não tinha referencial,
não tinha ainda tido contato com um mapa tátil, e quando não se
tem noção do que está fazendo, não tem piloto automático.
Nessa primeira experiência com o mapa, a frequência Beta
seria fundamental para planejar e raciocinar, e isso não aconteceu.
Na imagem da Figura 12, vê-se o cérebro em Beta todo azul, ou
seja, sem nenhuma área ativada. Theta só é registrada na linha
média, então, há pouco Theta, há pouco acoplamento. As
informações não se ligam, não produzem efeito nenhum.
Há muita informação, mas não consegue planejar, não ativa
Beta, pode ser um foco ansioso. Não consegue gerar energia
adequadamente e isso geralmente acontece em pessoas que
sofreram traumas, pessoas que desistem, abandonam as tarefas,
entram em descontrole, começam a se irritar.
João foi o único a não conseguir ler o mapa nem traçar seu
caminho por meio desta Tecnologia Assistiva. Os demais
voluntários, mesmo com alguma dificuldade, conseguiram cumprir a
tarefa contento.
FIGURA 12 – À ESQUERDA: JOÃO COM O MAPA TÁTIL; À DIREITA: EEG NO USO DO MAPA TÁTIL
CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESQUISA
A partir da utilização da tecnologia do eletroencefalograma
pudemos identificar a existência de ansiedade nos sujeitos da
pesquisa, notadamente quando se veem diante do mapa tátil, do
qual não tinham experiência anterior. A Tecnologia Assistiva de
Mapas Táteis é pouco adotada no Brasil. Embora muito se fale e
publique sobre ela, há um enorme nível de dependência do Poder
Público para a expansão do uso, não sendo identificadas políticas
significativas na implantação de rotas acessíveis e,
consequentemente, não são encontrados Mapas Táteis com
frequência nas cidades.
Observando os registros de EEG de Maria, identifica-se forte
aumento de Beta no uso do mapa tátil, com cérebro gastando mais
energia, estando mais ansiosa, e, ao final do segundo percurso,
quando chega desse caminho obtido pelo mapa, ela se apresenta
mais insegura, mais preocupada, mais tensa. Na escuta, ela se
apresenta mais tranquila, a memorização foi mais fácil e ela não
apresentou ansiedade, nem gasto energético encefálico, chegando
no primeiro destino até mais tranquila que na primeira gravação de
EEG.
A Josefa foi uma pessoa que teve um desempenho bem
satisfatório em todos os momentos da pesquisa de campo. Embora
no registro da escuta do percurso tenha apresentado uma pequena
ansiedade, memorizou fácil e rapidamente todo o percurso,
realizando-o com tranquilidade e assertividade.
Ela é uma atleta e essa condição facilitou a realização do
percurso. No entanto, como todos os demais, apresentou muito
receio na utilização do Mapa Tátil. Ela interagiu bem, mas
apresentou muitas conexões cerebrais ativadas durante o
conhecimento do mapa e a busca de fazer o seu percurso. Como já
descrevemos anteriormente, Josefa registrou um forte
processamento de informações nesse momento e o seu encéfalo
estava ativado em todas as frequências, indicando o desejo de
“fazer acontecer”, de ter sucesso naquele desafio que lhe foi
proposto. Ao final, ela acertou o caminho e o realizou com
tranquilidade.
Infelizmente, o João foi o único que não conseguiu de forma
alguma interagir e entender o Mapa Tátil. Ele precisou ser trazido de
volta a partir da orientação do integrante da pesquisa que o
acompanhava. Ele não interagiu, não teve reação alguma em
frequências de Beta que indicaria um processamento mental.
Algumas teorias podem ser levantadas sobre a condição geral do
João, como sendo de alguém que sofreu traumas, mas tais
diagnósticos não integram o escopo da pesquisa.
A eletroencefalografia aplicada a pesquisas da acessibilidade
configura-se como estudo de ponta e pioneiro, tanto no campo da
arquiteturae planejamento urbano quanto na área da neurociência
aplicada. Foi fascinante para nós enxergarmos claramente como
uma pessoa que não ativa frequências de Beta apresenta seu
desempenho prejudicado nas tarefas que lhe foram entregues.
A realização deste trabalho, embora com uma amostra reduzida
de sujeitos de pesquisa e sendo configurada como um estudo de
casos múltiplos (o que não permite generalizações), aponta para a
forte necessidade de um olhar direcionado à utilização dos Mapas
Táteis por pessoas com cegueira.
Hoje, a tecnologia dos Apps para Smartphones contribui
fortemente para a mobilidade de pessoas cegas, mas nunca
fornecerá a noção do traçado urbano, do bairro ou do entorno,
nunca promoverá a formalização mental dos percursos. Sempre
ficará faltando o Mapa Mental, completamente necessário para a
apreensão do espaço.
Um dos pesquisados, mostrando-se muito animado com o
Mapa Tátil, expressou que gostaria de ter um deles para cada
bairro, para cada trecho que precisasse percorrer. Esse foi o único
do grupo, de nove pessoas ao todo, que já havia tido experiências
com esse tipo de mapas.
Essa Tecnologia Assistiva muito desejada pelos que militam na
área da acessibilidade urbana, precisa ser difundida entre a
comunidade de cegos, que devem ser treinados nos institutos e
associações que existem nas grandes capitais e se destinam a
prover elementos facilitadores para as pessoas com cegueira.
Consideramos, ao final desta etapa do trabalho, que é preciso
agir junto ao Poder Público para provisão de rotas acessíveis
dotadas de Mapas Táteis nas grandes cidades. É uma tecnologia
relevante e de bom auxílio à navegação das pessoas com cegueira,
mas pelo desconhecimento e a falta de uso, torna-a difícil e
complicada para a população alvo. Nessa direção, identifica-se a
necessidade de ação também junto a institutos e associações de
cegos para que haja treinamentos na leitura e apropriação dos
mapas táteis. Para que a tecnologia seja bem utilizada, é preciso
familiaridade com ela. Estima-se que a exemplo da leitura Braille e
da mobilidade auxiliada por bengala, que são ensinadas e treinadas,
o mesmo deve ser realizado em relação às demais tecnologias
assistivas, incluindo os mapas táteis.
Apesar dos poucos sujeitos pesquisados no estudo, pode-se
inferir que as técnicas e equipamentos apontados como adequadas
na literatura especializada e adotadas neste trabalho têm
encontrado resultado favorável quanto às avaliações das sensações
encefálicas.
Consideramos de alta relevância a possibilidade de melhor
entender por meio dos registros e leituras dos EEGs, as sensações
e reações das pessoas às situações a que são expostas
cotidianamente. Comparando os resultados que temos obtido nesta
pesquisa frente aos trabalhos da neurociência aplicados aos
estudos dos ambientes encontrados na literatura internacional e
aqui citados, identificamos uma forte convergência na linha de
atuação que temos adotado para nossas pesquisas.
175 Registramos a participação da equipe da pesquisa: a Profa. Dra. Zilsa
Santiago; a bolsista PIBITI-UFC a estudante de Arquitetura e Urbanismo Raquel
Medeiros; a mestranda do PPGAUD-UFC Alana Vasconcelos; a estudante de
Arquitetura e Urbanismo-UFC Thanara Pereira, as duas últimas voluntárias da
pesquisa; o Ms. Paulo Nascimento, neurocientista e psicólogo e a Profa. Dra.
Andrea Quezada da UNIFOR, doutora em neurociência e psicóloga responsável
pela aplicação e análise dos testes de stress.
UMA NOVA FORMA DE
PROJETAR
Ao longo da história da humanidade, os estudos de arquitetura e
das ciências biológicas têm sido continuamente inspirados uns nos
outros. No entanto, só recentemente começaram a compartilhar de
forma efetiva as perspectivas teóricas e metodológicas
interdisciplinares. Hoje, a contribuição dos neurocientistas está
influenciando ativamente o debate arquitetônico. Percebe-se que a
compreensão do comportamento humano não depende apenas de
autorrelatos derivados de pesquisas de pós-ocupação, já que não
temos acesso consciente aos muitos processos que orientam
nossas escolhas.
Pessoas percebem inconscientemente espaços e estímulos de
formas distintas, evidenciando-se a necessidade de mensurar tais
reações. A utilização de métodos de aplicação de estudos
neurocientíficos específicos para nossos projetos serve como ponto
de partida para o desenvolvimento da neuroarquitetura não apenas
baseada em evidências científicas que foram feitas em outros
lugares do mundo e em contextos completamente diferentes.
Por meio de uma arquitetura vinculada a conhecimentos
neurocientíficos, mensuráveis e até mesmo preditivos, podemos ir
além do projeto e criar experiências únicas (e por que não,
memoráveis?). As novas tecnologias e métodos à nossa disposição
permitem inferências reais sobre o espaço, sendo possível verificar
se o estímulo inserido no projeto gera interesse ou repulsa.
Embora muitos continuem aplicando apenas conceitos que já
eram bem conhecidos na psicologia, discutindo a questão do
espaço, das cores, da amplitude, da semiótica, precisamos ter claro
que esses elementos já compunham essas discussões há algumas
décadas. O recurso que a neurociência tem para trazer está muito
mais associado à construção de significado em níveis hierárquicos
de processamento, reatividade, tomada de decisão, ao estudo das
emoções. Isso perpassa por questões metodológico-científicas, que
envolvem a biometria, a leitura da atividade de eletroencefalografia,
análise de tomografia e tantas outras técnicas que viabilizam a
formulação de teorias a respeito do funcionamento cerebral diante
das diferentes questões da arquitetura.
Manter o preciosismo metodológico é fundamental para que
possamos embasar os conhecimentos relacionados à neurociência
aplicada à arquitetura, em pleno desenvolvimento. Assim, nosso
objetivo neste capítulo é mostrar um pouco do que tem sido feito e
falado atualmente em relação às práticas da neurociência aplicada à
arquitetura.
SAINSBURY WELLCOME CENTRE
Localizado na pequena cidade de Fitzroviana, área central de
Londres, Inglaterra, o edifício Sainsbury Wellcome Centre (SWC)
leva a autoria do escritório Ian Ritchie Architects. O projeto foi
concluído em 2016, substituindo um antigo centro de pesquisa da
University College London (UCL), existente desde 1959. Hoje, o
novo edifício é um laboratório de última geração, encomendado para
ser a nova casa da Unidade de Neurociência Computacional de
Gatsby (GCNU). O projeto do SWC ganhou uma série de prêmios,
incluindo Projeto de Construção Principal do Ano no British
Construction Industry Awards, bem como os prêmios de Projeto do
Ano e Projeto Através da Inovação (do inglês design through
innovation) no 2017 RICS Awards.
A equipe do projeto visitou laboratórios de neurociência em toda
a Europa e nos Estados Unidos, a fim de coletar dados de
ambientes que permitissem o desenvolvimento de abordagens
inovadoras para laboratório. Por mais de 4 anos, eles tiveram
contato direto com neurocientistas para embasar suas decisões e
fornecer oportunidades nos ambientes para uma interação entre
cientistas teóricos e experimentais, com liberdade para o
desenvolvimento científico176. Vale destacar que a colaboração entre
indivíduos de diferentes disciplinas permite que pessoas criativas
abordem questões de novas perspectivas e a maioria das inovações
científicas surgem de um pensamento conjunto.
Com área interna de aproximadamente 13.805m2, o Sainsbury
Wellcome Centre (SWC) foi uma das primeiras edificações do
mundo projetado com a mente em mente, como diz o próprio título
do livro do arquiteto Ian Ritchie, Neuroarchitecture: Designing with
the Mind in Mind, com um processo de design único que partiu “de
dentro para fora”. O partido do projeto é o questionamento e análise
de como os espaços em que vivemos e trabalhamos afetam nosso
humor e a maneira como nos comportamos.
FIGURA 1 – VISTA NO NÍVEL DA RUA DO EDIFÍCIO SAINSBURY WELLCOME CENTRE EM LONDRES,
INGLATERRA (2016) PROJETADO PELO ESCRITÓRIO IAN RITCHIE ARCHITECTS
FIGURA 2 – VISTASUPERIOR DO EDIFÍCIO SAINSBURY WELLCOME CENTRE EM LONDRES,
INGLATERRA (2016) PROJETADO PELO ESCRITÓRIO IAN RITCHIE ARCHITECTS
Em seu livro, Ritchie cita Charles Spence, professor de
psicologia experimental na Universidade de Oxford, que pesquisa a
integração de informações em diferentes modalidades sensoriais.
Ou seja, nossos sentidos afetam uns aos outros simultaneamente,
com destaque para algumas maneiras pelas quais as regras de
integração multissensorial177 e influência cross-modal178 estão sendo
reveladas pela neurociência, e que têm o potencial de criar uma
abordagem multissensorial na prática arquitetônica.
Para os clientes, o prédio tinha que ser capaz de atrair as
melhores equipes de pesquisadores do mundo e oferecer um
ambiente de trabalho adaptável e flexível o suficiente para
acomodar as demandas em rápida evolução da pesquisa científica
pelos próximos 60 anos ou mais. Assim, os neurocientistas John
O’Keefe e Peter Dayan abraçaram a ideia de colaborar
estreitamente com a equipe de projeto para garantir que as
necessidades espaciais e de pesquisa fossem amplamente
atendidas179.
O próprio instituto de pesquisa SWC explica que, apesar da
necessidade de mais pesquisas na área, as atuais evidências
apontam que os projetos arquitetônicos têm um impacto biológico e
neurológico real. O que se percebe pelas pesquisas é que os seres
humanos parecem preferir espaços projetados em que possamos
ver de longe todo o espaço, ao mesmo tempo que gostamos de nos
sentir conectados uns com os outros. Gostamos de ter vários pontos
de vista e espaços visuais variados – alguns íntimos e outros mais
abertos.
Assim, internamente, o edifício foi organizado priorizando a alta
visibilidade e conectividade entre os ambientes, com múltiplos
pontos de vista, vários volumes visuais e permeabilidade. Em um
arranjo espacial organizado com múltiplas escalas de ambientes,
faz-se uma alusão à rede “sem escala” do cérebro: sistemas
celulares dinâmicos e flexíveis com “centros” principais e
secundários de atividade com muitas conexões entre eles.
O edifício é composto por amplos espaços flexíveis de
laboratórios, salas de conferências, escritórios, salas de reuniões e
instalações para seminários. Com um programa de necessidades
distribuído em 6 andares acima do solo e 2 pavimentos no subsolo,
um aspecto interessante do projeto foi a obrigatoriedade de
laboratórios flexíveis e adaptáveis (Figura 3) para facilitar
experimentos de tamanhos diferentes. Principalmente porque, em
longo prazo, o edifício deveria acomodar equipamentos científicos
que ainda não haviam sido inventados. Além disso, os cientistas
queriam ser capazes de escrever em qualquer lugar, à medida que
tivessem seus insights, por isso todas as faces internas em vidro do
edifício podem ser usadas como superfícies de escrita.
FIGURA 3 – LABORATÓRIOS DE CIÊNCIAS NO THE SAINSBURY WELLCOME CENTRE
As principais vias de circulação em cada andar possuem
dimensões generosas, incentivando as pessoas a parar e trocar
ideias. Eles são projetados com linhas de visão em todo o edifício,
de modo que, onde quer que a pessoa esteja, tenha uma sensação
de conexão com todos os outros lugares.
A pesquisa mostra que as pessoas que têm vista para o exterior e
acesso a espaços ao ar livre tendem a se sentir menos estressadas e,
de outra forma, mental e fisicamente mais saudáveis. Portanto, há
terraços na cobertura, bem como uma ‘brasserie’180 que se abre para
um jardim de flores silvestres que oferece um foco social para todos no
edifício. Os neurocientistas também aprenderam que as pessoas se
sentem melhor e permanecem mais saudáveis quando expostas aos
níveis naturais e ciclos da luz do dia. Nossa arquitetura nem sempre
permite esse tipo de luz nos edifícios, embora seja particularmente
importante para as pessoas que passam a maior parte do tempo
dentro deles. E isso certamente foi contemplado nesse projeto181.
Uma vez que toda a razão de ser do edifício é incentivar a
comunicação, os arquitetos quiseram garantir que o exterior do
SWC também se relacionasse e tivesse interação com o público.
Sob a marquise, uma instalação artística mostra partituras de Bach
que ilustram a criatividade do cérebro de um lado, e do outro,
formam os rostos das estrelas da Neurociência (Figura 4). Se você
não olhar para cima, poderá perder a oportunidade de interagir com
essa arquitetura.
FIGURA 4 – CIRCULAÇÃO EXTERNA DO SWC - INTERAÇÃO DO AMBIENTE E DO USUÁRIO
Não há dúvidas de que futuros estudos interdisciplinares
abrangendo a arquitetura e a neurociência irão gerar novos
conhecimentos sobre as relações ocultas entre as pessoas e o
ambiente construído. No entanto, enquanto houver tão poucos
estudos nesta área, defensores de estudos interdisciplinares talvez
precisem ser mais cautelosos ao interpretar os resultados para
evitar mais confusão. Não há nada de errado em reconhecer
potencial, nem mesmo com interpretações “românticas” de
evidências científicas disponíveis, mas é melhor que as conexões
entre as duas disciplinas sejam apresentadas no campo de
hipóteses em vez de afirmações182.
MAJID AL FUTTAIM
Majid Al Futtaim é uma empresa dos Emirados Árabes Unidos
com sede em Dubai, pioneira no segmento de lazer em todo o
Oriente Médio, África e Ásia. Para entender melhor como eles
poderiam atender seus clientes, criando bons espaços para viver,
trabalhar e residir, decidiram investigar a mente subconsciente
usando a neurociência, tendo por base estudos que comprovam que
autorrelatos são insuficientes para saber o que as pessoas
realmente sentem, pensam e escolhem.
FIGURA 5 – COMBINAÇÃO DE EEG COM EYE TRACKING
Conduzido pela Neurons Inc.183, o estudo encomendado pelo
Majid Al Futtaim usou eletroencefalografia (EEG) e tecnologia de
rastreamento ocular (Figura 5) para medir como os participantes nos
Emirados Árabes Unidos reagiram a 100 imagens urbanas e de
paisagens ao redor mundo, tanto em nível subconsciente quanto
consciente.
Majid Al Futtaim revelou os resultados desse estudo de
neurociência inédito na região, projetado para identificar os
impulsionadores mais poderosos por trás do apego emocional a
empreendimentos urbanos e comunidades.
Nesse estudo, foram recrutados 31 participantes (faixa etária
25-43 anos, mulheres e homens) nos Emirados Árabes Unidos para
serem expostos a diferentes imagens e conceitos que
representavam espaços humanizados. O que interessava era
entender melhor como as pessoas respondiam aos diferentes tipos
de espaços de convivência, conforme fossem apresentados, em que
prestavam atenção e como respondiam emocional e
cognitivamente. Além disso, foram avaliadas as associações dos
participantes a esses ambientes.
Uma distinção clara entre respostas conscientes e
subconscientes foi identificada pelo estudo. Enquanto os
entrevistados declararam conscientemente gostar de ambientes
vibrantes com elementos de interação social altamente ativa, sua
atividade cerebral subconsciente apontou para uma preferência por
atividades humanas simples e cotidianas (Figura 6).
FIGURA 6 – ESTUDO DE NEUROCIÊNCIA DE MAJID AL FUTTAIM - MAPA DE CALOR DA ATIVIDADE
HUMANA
Os neurocientistas descobriram que das 100 imagens
apresentadas aos participantes, os elementos de atividades
humanas cotidianas tiveram um foco visual de 80% dentre as 10
imagens de melhor desempenho; vegetação, 70%; recursos
artísticos, 50%; e cores vibrantes, 50%. Os elementos de atividades
humanas cotidianas foram os impulsionadores mais poderosos do
envolvimento emocional com destinos e ambientes.
Uma ênfase foi encontrada na vegetação natural configurada de
uma forma que fornecesse uma sensação de escala humana e
privacidade. O estudo identificou também a preferência
subconsciente por tons de azul e verde no design e nas
características artísticas com as quais as pessoas pudessem
interagir. Entre as respostas negativas mais fortes, foram registradas
por imagens que exibiam uma visível falta de interação humana e de
paisagens naturais. A sujeira e os danos também mostraram ter um
impacto negativoimediato e duradouro nos participantes. 
Comentando o estudo, Hawazen Esber, diretor executivo da
Majid Al Futtaim Communities, disse que, historicamente,
pesquisadores e incorporadores têm se concentrado nos
motivadores conscientes de preferência por design e
desenvolvimento imobiliário. Ele acrescenta que “Nosso estudo
exclusivo de pesquisa em neurociência permite uma compreensão
mais profunda do que impulsiona subconscientemente o valor
emocional e um sentimento de pertencimento para nossos clientes e
a comunidade em geral”.
Esber disse que o estudo apoiaria o objetivo de “criador de
destinos”, especialmente no segmento de edificações de uso misto
quando adotou valores emocionais e funcionais na abordagem de
Majid Al Futtaim para o planejamento, design e desenvolvimento de
empreendimentos imobiliários. Mais de um milhão de dados foi
coletado e analisado para chegar a esses resultados.
“É muito emocionante. É o primeiro estudo desse tipo na região,
e eu diria que provavelmente o primeiro no mundo a se aprofundar
no mercado imobiliário. Quando se trata de uso misto, escritório e
residencial, há muitos benefícios, mas provavelmente também pode
ser expandido para outros setores. [...] A menos que você meça,
você não pode realmente personalizar seus produtos de acordo com
o que as pessoas querem”, explica Esber.
A partir do desenvolvimento deste trabalho, esse compromisso
vai ainda mais longe, quando se planeja aprimorar seus recursos
analíticos avançados, o que permitirá à empresa reunir insights mais
profundos do consumidor, permitindo-lhe criar experiências
personalizadas para os clientes. Ao investir em análises avançadas,
esperam ser capazes de compreender e prever as necessidades e
preferências em evolução e oferecer experiências que criem
“momentos memoráveis” para os clientes no dia a dia.
O olhar diferenciado para o processo da criação de espaços,
ouvindo os clientes e dando opções de escolhas para eles, tem
ocupado um lugar de destaque E Esber conclui:
Por fim, quero enfatizar que a pesquisa que empreendemos é muito
estimulante. É algo que não é apenas novo para o mercado, mas o
pensamento por trás disso também é completamente novo. Acredito
que essa é uma das vantagens que teremos, no sentido de casar
know-how e arte com a ciência.
Embora os estudos de neuromarketing e neurociência do
consumidor tenham sido usados por muito tempo para testar o
comportamento das pessoas no consumo, como respostas a
anúncios, escolhas na loja e respostas aos produtos, poucas
experiências arquitetônicas contaram com tais estratégias. Mais
recentemente, e impulsionado pelo trabalho pioneiro da Neurons
Inc, o estudo das respostas emocionais e cognitivas às experiências
arquitetônicas foram viabilizadas.
Nesse estudo apresentado, o objetivo foi mostrar o poder da
neurociência em nos oferecer dados científicos para projetarmos
ambientes de forma mais assertiva, bem como nos possibilitar a
avaliação dos resultados.
GOOGLE BH
Google é uma empresa multinacional de serviços on-line e
software dos Estados Unidos que dispensa maiores apresentações.
Embora o estudo que iremos aqui apresentar tenha sido para essa
empresa americana, foi desenvolvido por três arquitetas brasileiras,
Ana Paula Guedes, Anadélia Rechi e Paula Tempelaars.
Trata-se de um certame, realizado no segundo semestre de
2020 (em plena pandemia da COVID-19), no formato de uma
“maratona de arquitetura”, com prazo de uma semana para o
desenvolvimento de um estudo preliminar para o novo andar do
Escritório da Google em Belo Horizonte, MG, com uma área de
aproximadamente 1.200m².
Um desafio e tanto, já que as arquitetas se propuseram além de
fazer o projeto, apresentar ao cliente um estudo de neuroarquitetura,
no qual foram inseridos conhecimentos práticos de neurociência
aplicada à arquitetura, por meio de resultados mensuráveis e até
mesmo preditivos. Especificamente para esse projeto foram
realizadas análises de captação de atenção automática por
intermédio de uma ferramenta neurocientífica de análise e predição
de resultados de rastreamento ocular.
FIGURA 7 – ESTUDO DE NEUROCIÊNCIA PARA O ESCRITÓRIO DO GOOGLE BH - MAPA DE CALOR DE
SALIENCY
Esses procedimentos foram adotados no sentido de dar o
primeiro passo no entendimento do usuário do espaço e captar a
sua atenção para os elementos que realmente importam para ele. A
tecnologia foi utilizada para promover o poder da emoção humana,
trazendo à tona o sentimento de pertencimento das pessoas,
reforçando sua identidade e criando estímulos emocionais
necessários para ser produtivo e realizar-se no trabalho.
Primeiro, foram analisadas as características do edifício
existente para, posteriormente, entrar na fase das decisões e
escolhas de opções de design para o projeto baseadas nos
resultados dos estudos neurocientíficos de rastreamento ocular
feitos especialmente para cada ambiente ou elemento de referência
escolhido.
As análises produziram mapas de calor (do inglês, heat map)
de cada ambiente. Trata-se de uma análise de saliência da imagem
(do inglês, saliency), predizendo quais são os elementos que mais
irão se sobressair. Considera-se que a atenção é o primeiro passo
para envolver as pessoas. O heat map mostra um mapa de cores
codificado de menor saliência (nas cores azul ou verde), passando
pelo amarelo e depois o laranja, até chegar ao vermelho, em que
estão as regiões de maior saliência, ou destaque, conforme indicado
na Figura 7.
Com esse tipo de análise, também é possível verificar se o
ambiente está causando algum impacto negativo nos usuários
devido ao excesso de demanda cognitiva que ocorre quando muitos
elementos “competem” entre si para captar sua atenção.
Na imagem seguinte (Figura 8), o objetivo era fazer com que as
pessoas notassem facilmente o robozinho Android que está
posicionado no local. Como exemplo de aplicação do heat map,
verificou-se que a melhor opção seria utilizar o Android com
acabamento metalizado, já que na outra proposta avaliada ele
passaria praticamente despercebido. Verificam-se claramente na
imagem da direita os elementos que se sobressaem e os que não
captam a atenção automática nos primeiros 3 a 5 segundos de
exposição aos estímulos.
FIGURA 8 – ESTUDO DE NEUROCIÊNCIA PARA O ESCRITÓRIO DO GOOGLE BH - SIMULAÇÃO DE
ACABAMENTOS PARA DEFINIÇÃO DA MELHOR OPÇÃO
Para esse experimento, foi utilizada a ferramenta
multiplataforma184 de resposta rápida (as imagens são analisadas
em segundos), com abordagem no modelo de aprendizado de
máquina, para garantir atenção visual. A ferramenta adotada é
baseada em dois parâmetros fundamentais: um grande banco de
dados de rastreamento ocular de alta qualidade (com 12.000
participantes) e uma variedade de modelos de aprendizado de
máquina (N = 30) treinados e comparados para produzir a melhor
previsão de modelo possível. O modelo científico automaticamente
selecionado prevê rastreamento ocular com mais de 90% de
precisão.
Aqui o mapa de calor de rastreamento ocular representa o
número de pessoas e o tempo gasto olhando para cada área da
tela. A cor indica o tempo cumulativo de fixações oculares em cada
(A)
(B)
(C)
região de uma imagem ou vídeo, com cores mais quentes indicando
mais atenção. Esse conjunto de dados foi alimentado no modelo de
aprendizado de máquina. A precisão do modelo não foi apenas
treinada para sensibilidade (acertar o alvo certo), mas também
especificidade (ignorar os alvos errados).
Estudos de rastreamento ocular são métodos poderosos e
confiáveis, mas requerem um conjunto mínimo de participantes, um
alto tempo de resposta para os resultados e demanda recursos
financeiros elevados, inviabilizando que muitos os utilizem. Embora
existam soluções on-line para monitoramento de atenção, como
rastreamento ocular baseado em webcam, esses métodos não são
suficientemente sensíveis ou confiáveis para fornecer insights
válidos ao ponto de orientar as decisões de design. Como disse
Thomas C. Redman185, “se seus dados forem ruins, suas
ferramentas de aprendizado de máquina serão inúteis”.Complementando, a ferramenta utilizada permitiu que as
arquitetas pudessem avaliar:
Demanda Cognitiva – Uma pontuação que mostra a
quantidade de informações que o visualizador tem que
processar diante de sua imagem/vídeo. Quando as
imagens são mais complexas, elas elevam a carga
perceptiva e, portanto, mais demanda cognitiva.
Clareza – Um índice de quão grande é a parte de sua
imagem que cria atenção. Quando as imagens têm muitos
itens que chamam a atenção das pessoas, é menos
provável que elas vejam qualquer parte da imagem e,
portanto, a imagem fica menos clara. Pontuações mais
altas de clareza são obtidas quando uma única ou muito
poucas áreas estreitas chamam a atenção.
Intensidade de Cor e Brilho - Resume o grau de
vermelhidão, verde e azulado, além de brilho da imagem.
Não há níveis recomendados aqui, mas os valores são
parâmetros interessantes se você espera que uma imagem
tenha um perfil de cor muito particular. Também oferece
uma boa maneira de alterar perfis de cores diferentes em
seus estudos visuais.
Por fim, nosso objetivo na apresentação desses três estudos é
despertar o senso crítico para o tema da neuroarquitetura, trazer de
fato um maior entendimento da aplicação prática da neurociência a
ambientes construídos e ratificar quão grande ainda é o caminho
que temos a percorrer para alcançarmos resultados científicos
relevantes.
ALGUMAS PUBLICAÇÕES
É fato a notoriedade que a neuroarquitetura ganhou
recentemente. Entretanto, muitos ainda têm confundido
neurociência com psicologia, afirmando que o projeto arquitetônico
está fundamentado em evidências neurocientíficas utilizando-se de
padrões alheios à aceitação da própria comunidade científica.
Dentre infinitas discussões, as medições do funcionamento
encefálico de indivíduos experimentando o ambiente construído
parece ser mesmo o caminho para o desenvolvimento da
neuroarquitetura.
Para finalizar este capítulo, selecionamos alguns trechos de
publicações, de fontes de reconhecida credibilidade, que enfatizam
a importância dessas neurométricas como a grande contribuição da
neurociência para a arquitetura – a prática da neuroarquitetura que
vai além da aplicação de evidências.
A neurociência é uma disciplina que reúne outras áreas de
estudo que evidenciam como o ser humano se comporta em
diferentes ambientes e em resposta a diferentes estímulos. Seu foco
é fortemente científico e serve de base para outras áreas, como
programação, robótica, marketing, entre outras. Está próxima (mas
longe da psicologia mais teórica) do feng shui e de outras áreas
igualmente interessantes, mas que não se aplicam aos protocolos
objetivos da comunidade científica e se baseiam em noções mais
subjetivas. Suas origens remontam por volta do ano de 2002,
quando a revista Forbes apresentou estudos que investigavam
como diferentes áreas do cérebro eram ativadas com o uso de
diferentes produtos de consumo, conforme afirma o neurocientista
Antonio Ruiz, em seu artigo intitulado Neuroscience, a tool for
modern architecture186 (Neurociência, uma ferramenta para a
arquitetura moderna), publicado em novembro de 2019.
Construtores e arquitetos antigos compreenderam
instintivamente o que está no cerne da neuroarquitetura, mesmo
que eles não tivessem ainda uma palavra assertiva para isso ou não
tivessem as ferramentas para medi-la. Na verdade, nossas reações
ao ambiente construído datam do início da humanidade.
Mas a novidade é que agora podemos medir o como, e
começar a entender por que reagimos da maneira como o fazemos.
É aqui que entra a neuroarquitetura, de acordo com o artigo
intitulado Neuroarchitecture: could this movement lead to the
architecture of the future187 (Neuroarquitetura: esse movimento
poderia levar à arquitetura do futuro?), publicado em maio de 2020.
“O que é diferente sobre a neuroarquitetura é que agora
estamos nos aproximando de um momento em que nossa
compreensão da função cerebral progrediu ao ponto em que
podemos começar a dizer coisas sensatas sobre sua relação com a
arquitetura e o design”, diz o Dr. Colin Ellard188.
Seguindo esse pensamento, a arquiteta Ana Paula Guedes189
afirma na matéria sobre neuroarquitetura, intitulada O poder da
arquitetura e da decoração, publicada em fevereiro de 2019190, que
a neurociência tem desenvolvido processos capazes de comprovar
a influência dos ambientes na vida das pessoas, ou seja, o poder da
arquitetura sobre a saúde e o comportamento humano. Assim
expõe: “Por meio desses experimentos sabe-se, objetivamente, que
toda experiência que o ser humano vivencia é consequência do
resultado de atividades do cérebro, da mente e de sua percepção
individual”.
As pessoas respondem ao design individualmente. Não existe
uma reação universal a um espaço singular e os neurocientistas
levam isso em consideração.
Campo em expansão, a neuroarquitetura aplica o rigor científico
da neurociência ao mundo do design, buscando compreender
melhor como os humanos percebem e vivenciam os espaços
construídos em um nível biológico. O objetivo final é extrair
descobertas que possam ser aplicadas na prática, fornecendo
um suporte científico para projetar ambientes que moldem
positivamente a experiência do usuário, enfatizam Emily Winer191 e
Julia Kein192, no artigo intitulado Design on the brain: combining
neuroscience and architecture193 (Design no cérebro: combinando
neurociência e arquitetura), publicado em outubro de 2018.
A tecnologia desempenha um papel fundamental no futuro da
neuroarquitetura. As tecnologias líderes em neurociência, incluindo
técnicas de monitoramento humano e realidade virtual auditiva e
visual, foram adaptadas para se adequar a muitos dos objetivos da
arquitetura. Os pesquisadores agora podem estudar a atividade
cerebral à medida que as pessoas interagem com componentes do
ambiente construído. Equipamentos de eletroencefalografia
fornecem uma maneira não invasiva e acessível de monitorar o que
está acontecendo no cérebro, transmitindo dados sem fios (wireless)
para o computador de um pesquisador. Quando combinados com
dados fisiológicos, como frequência cardíaca, esses achados
revelam informações sobre o estado mental de uma pessoa, níveis
de estresse e mecanismos de aprendizagem ao interagir com o
espaço, complementam Winer e Kein.
Um dos temas discutidos no ano em 2015, no evento Sculpting
the Architectural Mind: Neuroscience and the Education of an
Architect (Esculpindo a mente arquitetônica: neurociência e a
educação de um arquiteto), realizado pela Academy of
Neuroscience for Architecture (ANFA) e a Pratt Institute School of
Architecture, foi a questão da realidade virtual representar uma
oportunidade crescente para compreender e antecipar as reações
humanas ao ambiente construído e os impactos potenciais de
formas futuras antes de serem construídos. 
Eduardo Macagno, Professor de Ciências Biológicas da UC San
Diego, discutiu algumas tecnologias que estão tornando isso
possível. Esses desenvolvimentos empolgantes podem ajudar os
designers a testar seus projetos antes de serem construídos,
permitindo ajustes com base em como as pessoas realmente
experimentarão um ambiente, afirmou Melissa Marsh em seu artigo
intitulado The future of neuro-architecture has arrived (O futuro da
neuroarquitetura chegou), publicado na Work Design Magazine, em
março desse mesmo ano.
São muitas as referências publicadas abordando a
neuroarquitetura e sua relação intrínseca com métricas de
funcionamento cerebral. Trouxemos aqui apenas algumas delas
para melhor entendimento da interseção neurociência e arquitetura.
176 Ian Ritchie Architects, 2021, on-line.
177 Integração multissensorial, ou como integração multimodal, é o estudo de
como as informações das diferentes modalidades sensoriais podem ser
integradas pelo sistema nervoso.
178 Percepção cross-modal envolve interações entre duas ou mais modalidades
sensoriais diferentes. Exemplos incluem sinestesia, substituição sensorial e o
efeito McGurk, no qual visão e audição interagem na percepção da fala.
179 Ian Ritchie Architects, 2021, on-line.
180 Na Françae no mundo francófono, brasserie é um tipo de restaurante com
um ambiente descontraído, que serve pratos simples e outras refeições; também
é uma palavra francesa para cervejaria e, por extensão, é um “negócio de
cerveja”. (https://pt.wikipedia.org/wiki/Brasserie).
181 Sainsbury Wellcome Centre, 2021, on-line. Tradução livre.
182 Saidi, 2019.
183 Empresa de neurociência do consumidor com sede na Dinamarca, que utiliza
ferramentas e insights da neurociência para entender e melhorar a experiência do
usuário.
184 Ferramenta multiplataforma trabalha em todas as plataformas digitais,
incluindo telefones, tablets e computadores.
185 Thomas C. Redman ,“the Data Doc,” é presidente de soluções de qualidade
de dados. Ajuda empresas e pessoas, incluindo start-ups, multinacionais,
executivos e líderes em todos os níveis, a traçar seus cursos para futuros
baseados em dados. Dá ênfase especial à qualidade, análises e capacidades
organizacionais.
186 https://ark-architects.com/neuroscience-a-tool-for-modern-architecture-ark-arc
hitects/
187 https://ark-architects.com/neuroarchitecture-could-this-movement-lead-to-the-
architecture-of-the-future-ark-architects/
188 Autor e professor de neurociência cognitiva no Canadá, que mede como
nossos cérebros e corpos respondem a espaços e lugares.
189 Arquiteta e urbanista no Brasil, com atuação em neurociência aplicada à
arquitetura desde 2016.
190 https://estadodeminas.lugarcerto.com.br/app/noticia/decoracao/2019/02/27/int
erna_decoracao,50610/neuroarquitetura-ensina-que-o-ambiente-fisico-influi-nas-e
mocoes-e-no.shtml
191 Bacharel em psicologia pelo Carleton College e um MPH pela Mailman
School of Public Health da Columbia University, onde passou um tempo
pesquisando a influência do design de bairros urbanos nos comportamentos de
caminhada entre as populações de adultos mais velhos. É líder do conceito de
mente em Desenvolvimento de Padrões do International WELL Building Institute
(IWBI). Seu trabalho se concentra na promoção da saúde mental e do bem-estar
por meio de políticas de construção e local de trabalho, programas e estratégias
de design.
https://ark-architects.com/neuroscience-a-tool-for-modern-architecture-ark-architects/
https://ark-architects.com/neuroarchitecture-could-this-movement-lead-to-the-architecture-of-the-future-ark-architects/
https://estadodeminas.lugarcerto.com.br/app/noticia/decoracao/2019/02/27/interna_decoracao,50610/neuroarquitetura-ensina-que-o-ambiente-fisico-influi-nas-emocoes-e-no.shtml
192 Analista na equipe comercial do International WELL Building Institute (IWBI).
Bacharel em Estudos Internacionais, Saúde Global e Meio Ambiente pela
University of Michigan e um MPH pela Mailman School of Public Health da
Columbia University, onde pesquisou como as políticas de planejamento urbano
em nível municipal têm o potencial de moldar a saúde mental dos residentes.
193 Design on the brain: Combining neuroscience and architecture | Articles |
WELL International WELL Building Institute (wellcertified.com).
CONCLUSÃO
UM OLHAR PARA O FUTURO
Existe certa analogia entre entrar em um ambiente – experimentá-lo,
senti-lo, observar seus detalhes, procurar entendê-lo – e penetrar
em um livro, que igualmente deve ser explorado, entendido e ter seu
conteúdo apreendido. Ambos nos trazem experiências que podem
ser mais ou menos impactantes na medida em que despertam
maiores ou menores sensações, emoções e interesses.
O nosso sentimento ao concluir este livro é de encerramento de
uma tarefa desafiadora. Como enfatizado ao longo do texto, para
nós não é possível desassociar a neuroarquitetura dos estudos
observacionais que utilizam métricas encefálicas, por ser a
neurociência em si mesma definida como o ramo do conhecimento
que trata do encéfalo e do sistema nervoso no todo. A forma de ler
esses dados, entretanto, varia em cada uma das áreas de
conhecimento que fazem parte do guarda-chuva da neurociência,
que é multidisciplinar. Serão feitos aprofundamentos diferentes na
psicologia, medicina ou farmácia. Na neuroarquitetura, isso não é
diferente. O debate sobre o que mais interessa aprofundar durante a
discussão de seu campo de conhecimento recém-desbravado é
parte da proposta deste livro, que tentou esboçar por onde esse
debate tem caminhado. Contudo, a conversa mal começou e esse
debate deverá continuar e se expandir à medida que a comunidade
neurocientífica e neuroarquitetônica se tornar maior.
Para isso, um grande desafio foi expor conteúdos
neurocientíficos em linguagem mais acessível e simplificada para
um público formado prioritariamente por profissionais da arquitetura
e do design de interiores. Por outro lado, não poderíamos deixar de
abordá-los por sabermos da impossibilidade de alguém entender o
impacto dos ambientes na mente das pessoas, sem conhecimentos
mínimos da anatomia e fisiologia dessas estruturas.
Até conseguimos olhar uma imagem de um encéfalo ativado em
algumas de suas regiões e identificar a existência de ativações. No
entanto, seria muito superficial concluir apenas que o ambiente
ativou o encéfalo. Certamente nos questionaríamos: ativou o quê?
Como? Por quê? Qual o sentido da ativação? Que tipo de sensação
despertou? Essas são perguntas cujas respostas só acontecem a
partir do entendimento de como os estímulos são captados, como
são processados, como chegam ao encéfalo e o que produzem ali.
Ora, se as neurociências aplicadas à saúde (onde seus estudos
foram iniciados) utilizam equipamentos que permitem
“visualizações” e “medições” da atividade cerebral para melhor
entender e explicar o que acontece nessa importante estrutura, não
seria diferente para outras áreas do conhecimento que tenham esse
interesse. A literatura está repleta de exemplos que embasam nossa
afirmação e cuidamos de mostrar aqui alguns deles, aplicados aos
estudos dos ambientes.
Tanto quanto as nossas preocupações em tornar os ambientes
atrativos e agradáveis aos que os vivenciam, tentamos elaborar um
livro interessante e que desperte bons estímulos para aqueles que
penetram em suas palavras e imagens.
No entanto, sabemos ser muito provável que nossos leitores
encerrem esta leitura com muitas interrogações, o que nos anima,
porque tínhamos mesmo esse objetivo. Questionamentos nos fazem
querer aprender mais, buscar mais, procurar soluções, ainda mais
quando tratamos de um tema altamente dinâmico, que se expande a
cada dia e incorpora novas tecnologias e procedimentos oriundos
das pesquisas que não param.
Cremos firmemente que estamos em um caminho sem volta,
embora consigamos clareza da existência de pelo menos três
questões emergentes: o custo dos equipamentos; a dificuldade de
interpretação dos dados obtidos; como relacionar grupos de
pessoas a características de reações encefálicas.
Para cada uma dessas dificuldades muito presentes no atual
momento que vivemos (primeiro semestre de 2021), temos algumas
expectativas de solução. Os equipamentos tendem a ter seu custo
reduzido, à medida que se tornam mais utilizáveis e já
presenciamos isso, se considerarmos todos os equipamentos que
foram lançados nas últimas décadas e que foram incorporados ao
cotidiano de milhões de pessoas. Além disso, tornam-se mais
simples de serem usados. Para a dificuldade de entendimento dos
resultados de um eletroencefalograma, por exemplo, já temos
notícias de estarem em desenvolvimento algumas ferramentas que
melhoram as análises de dados, facilitando esse trabalho que
requer experiência de quem o realiza. E, finalmente, para as
possibilidades de identificação de perfis encefálicos para grupos de
pessoas, contamos com as equipes de pesquisadores que vêm
estudando e buscando alternativas para facilitar as aplicações
práticas.
Esse último é mais polêmico e talvez de mais difícil solução.
Sabemos que cada ser humano é único, percebe o mundo de
maneira diferente dos demais, tem memórias, vivências e
percepções diferenciadas e esse pode ser um forte impedimento
para aplicações em grupo desses estudos. No entanto, muitas
coisas impossíveis no passado são hoje realidade corriqueiraem
nossas vidas.
A ciência avança e nós crescemos junto com ela. Estamos
estimuladas a continuar firmes nessa jornada, crendo que em um
futuro não muito distante teremos muitas descobertas para mostrar,
quem sabe em um volume II desta obra.
Nós nos encontraremos em breve!
LISTA DE FIGURAS
SESSÃO 1
SOBRE A NEUROCIÊNCIA E SUAS ESTRUTURAS
FIGURA 1 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 2 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 3 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 4 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 5 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 6 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 7 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
NOSSOS PROCESSOS COGNITIVOS
FIGURA 1 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 2 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 3 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 4 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 5 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FORMAS DE VER O CÉREBRO
FIGURA 1 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 2 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 3 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 4 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
SESSÃO 2
SOBRE A NEUROARQUITETURA E SUA FORMA DE PROJETAR
FIGURA 1 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 2 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 3 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 4 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 5 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 6 – MAGUIRE ET AL., 2000, P. 4399. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 7 – MAGUIRE ET AL., 2000, P. 4399. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 8 – MAGUIRE ET AL., 2000, P. 4399. ADAPTADO PELAS AUTORAS
PERCEPÇÃO VISUAL E O PROJETO ARQUITETÔNICO
FIGURA 1 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 2 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 3 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 4 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS.
ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 5 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS.
ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 6 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 7 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 8 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
NOÇÕES MENTAIS DE ESPACIALIDADE
FIGURA 1 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 2 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 3 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 4 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE MARIE MONIQUE PAIVA
FIGURA 5 – PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO. ADAPTADO PELAS
AUTORAS
FIGURA 6 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 7 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 8 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 9 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE NICOLE FERRER
FIGURA 10 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
A EXPERIÊNCIA ARQUITETÔNICA
FIGURA 1 – ILUSTRAÇÃO POR NICOLE FERRER
FIGURA 2 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL WIKIMEDIA COMMONS
FIGURA 3 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL DO IPHAN
FIGURA 4 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL ARCHDAILY BRASIL
FIGURA 5 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL ARCHDAILY BRASIL
SESSÃO 3
A NEURO APLICADA AOS AMBIENTES
FIGURA 1 – IMAGENS DA EMOTIVE®. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 2 – BANAEI ET AL., 2017, P. 4. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 3 – IMAGENS DA TOBII PRO®. ADAPTADO PELAS AUTORAS
NEUROARQUITETURA EM AMBIENTES RESIDENCIAIS
FIGURA 1 – VILLAROUCO ET AL., 2020. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 2 – ILUSTRAÇÃO POR MARIE MONIQUE PAIVA
FIGURA 3 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE MARIE MONIQUE PAIVA
FIGURA 4 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE MARIE MONIQUE PAIVA
EXPERIÊNCIA DA NEUROCIÊNCIA EM AMBIENTE URBANO
FIGURA 1 – VILLAROUCO ET AL., 2020. ADAPTADO PELAS AUTORAS
FIGURA 2 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 3 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 4 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 5 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 6 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 7 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 8 –IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 9 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 10 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 11 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
FIGURA 12 – IMAGENS DO ACERVO DE PESQUISA DE VILMA VILLAROUCO
UMA NOVA FORMA DE PROJETAR
FIGURA 1 – IMAGENS DO SITE DO ESCRITÓRIO DE ARQUITETURA IAN
RITCHIE ARCHITECTS
FIGURA 2 – IMAGENS DO SITE DO ESCRITÓRIO DE ARQUITETURA IAN
RITCHIE ARCHITECTS
FIGURA 3 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL SMARTSTYLE INTERIORS
FIGURA 4 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL SMARTSTYLE INTERIORS
FIGURA 5 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL NEURONS INC.2
FIGURA 6 – IMAGENS DO PORTAL DIGITAL ALARABIYA NEWS
FIGURA 7 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE ANA PAULA GUEDES,
ANADÉLIA RECHI E PAULA TEMPELAARS
FIGURA 8 – FOTO DO ACERVO PESSOAL DE ANA PAULA GUEDES,
ANADÉLIA RECHI E PAULA TEMPELAARS
REFERÊNCIAS
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conceptuales y metodológicos. In: ARAGONÉS, Juan I.; AMÉRIGO, Maria.
Psicología Ambiental. Madrid: Ediciones Pirámide, 1998. p. 21-41.
ARBIB, Michael A. Why should architects care about neuroscience. In:
Architecture & Neuroscience. Espoo: The Tapio Wirkkala-Rut Bryk Foundation,
2013. p. 42-72.
BANAEI, Maryam; HATAMI, Javad; YAZDANFAR, Abbas; GRAMANN, Klaus.
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Cidades vacinadas
Marques, Leila
9786587913353
296 páginas
Compre agora e leia
O uso da expressão "Cidades Vacinadas" é a grande provocação
deste livro. Ele é escrito no primeiro trimestre de 2021, quando as
cidades do Brasil estão iniciando o processo de vacinação contra a
primeira pandemia planetária do século XXI, e nem se sabe quanto
tempo levará para se poder aplicar-lhes esta alcunha de fato e de
direito. Por outro lado, sabe-se que essa "vacina", aqui, representa
as várias necessidades, dos vários territórios de nossas cidades. A
vacina é a saúde das cidades, mas pode ser também o
comportamento do cidadão, a consciência do político, o prato de
comida na mesa, o emprego do trabalhador, a solidariedade
humana, o desenvolvimento humano, o equilíbrio social etc.
Carregado destes significados, mais de 60 autores e autoras
convidados, pesquisadores, mestres e doutores de várias áreas do
conhecimento científico (Arquitetura, Urbanismo, Engenharia,
Direito, Turismo, Biologia, Administração, Comunicação, Relações
Internacionais, Antropologia, História, Geografia, Paisagismo,
Economia, Artes e outras especializações), apresentam seus
ensaios, organizados pela Conselheira do INPUC, Arquiteta e
Urbanista Leila Marques, com textos concisos e claros,
http://www.mynextread.de/redirect/Amazon+%28BR%29/3036000/9786587913476/9786587913353/cb879be7c83d7693478531e4b639824b
referenciando e atualizando estudos anteriores, abrindo
questionamentos e caminhos para serem seguidos no momento que
essa pandemia for debelada, e desde já, naquilo que é possível ser
feito, respeitando-se o presente distanciamento social. Paulo Sergio
Niemeyer Presidente do INPUC
Compre agora e leia
http://www.mynextread.de/redirect/Amazon+%28BR%29/3036000/9786587913476/9786587913353/cb879be7c83d7693478531e4b639824b
	Créditos
	Folha de Rosto
	Sumário
	Apresentação
	Introdução: Uma nova forma de ver a arquitetura
	O que é neuroarquitetura?
	1. Bases da neurociência
	Sobre a neurociência e suas estruturas
	Somos o que pensamos
	Mover ou sentir, eis a questão
	Nossos processos cognitivos
	O funcionamento da mente
	Ao perceber o mundo
	Ao compreender o mundo
	Formas de ver o cérebro
	Recursos teóricos e metodológicos para o estudo do cérebro
	Os neurocientistas podem ler nossas mentes?
	2. Definições da neuroarquitetura
	Sobre a neuroarquitetura e sua forma de projetar
	As relações entre mente e espaço
	Neurociência na arquitetura
	Percepção visual e o projeto arquitetônico
	O processamento neural da visão
	Pistas perceptivas da visão
	Noções mentais de espacialidade
	A análise da forma
	O estudo da forma pela Gestalt
	A experiência arquitetônica
	A simbologia da percepção espacial
	O projeto da experiência
	3. Neuroarquitetura na prática
	A neuro aplicada aos ambientes
	Neuroarquitetura em ambientes residenciais
	Definições iniciais de pesquisa e os agentes selecionados
	Definição e caracterização para a modelagem de ambientes 3D
	Realidade Virtual e EEG: o relatado e o percebido
	Processamento de sinais de EEG
	Biomarcador de Valência Emocional
	Índice de Memória
	Índice de Atenção
	E para concluir... Considerações finais sobre a pesquisa
	Experiência da neurociência em ambiente urbano
	Captação de dados encefálicos
	A pesquisa com Josefa (nome fictício)
	A Pesquisa com João (nome fictício)
	Considerações sobre a pesquisa
	Uma nova forma de projetar
	Sainsbury Wellcome Centre
	Majid Al Futtaim
	Google BH
	Algumas publicações
	Conclusão: Um olhar para o futuro
	Fontes de figuras
	Referências

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